FISCALIZAÇÃO SANITÁRIA E DE SAÚDE MUNICIPAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA - MEF30580 - BEAP

 

 

DIEGO AGUIAR DE LIMA *

 

 

                INTRODUÇÃO

                Fiscalização Sanitária ou Vigilância Sanitária pode se classificar como uma parcela do poder de polícia do Estado destinada à proteção da saúde como um todo, de forma a promover o seu correto desenvolvimento, principalmente no tocante à educação, sendo que sua principal finalidade é a de impedir que a saúde seja exposta a riscos, utilizando para tanto o combate dos efeitos nocivos e prejudiciais em razão de alguma falha sanitária, na prestação de serviços de interesse à saúde.

                É um conceito semelhante ao que vem na Lei Federal nº 8.080/90, em seu artigo 6º, § 1º:

 

                “§ 1º Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde”.

 

                A Constituição Federal reconhece, em seu artigo 196:

 

                “a saúde como direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

 

                Igualmente, em seu artigo 200, a Constituição Federal determina que compete ao Sistema Único de Saúde executar as ações de vigilância sanitária e epidemológica (inc. II) e fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano.

                A este tocante o artigo 23 da Constituição Federal é taxativo:

 

                “Artigo 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

                (...)

                II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”.

 

                A competência administrativa para cuidar da saúde pública é concorrente entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, cabendo-lhes o dever de atuação em uma das áreas mais sensíveis do Estado moderno.

                Portanto, administrativamente, os entes federativos possuem competência para assegurar a efetividade e plenitude da saúde pública, inclusive no tocante aos serviços de vigilância sanitária, devendo o exercício dessa competência, para evitar desnecessários embates entre os diversos entes federativos, pautar-se pelo princípio da predominância do interesse.

                O artigo 24 da Constituição Federal continua:

 

                “Artigo 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

                (...)

                XII - previdência social, proteção e defesa da saúde”.

 

                COMPETÊNCIA CONCORRENTE

                O artigo 24 da CR/88 prevê as regras de competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal, estabelecendo quais são as matérias que deverão ser regulamentadas de forma geral por aquela e específica por estes.

                A Constituição Federal brasileira de 1988 adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e Distrito Federal especificá-las através de suas respectivas leis. É a chamada competência suplementar dos Estados-membros e do Distrito Federal (CF, art. 24, § 2º).

                Tratando dos Municípios o artigo 30 da CR/88 estabelece:

 

                “Artigo 30. Compete aos Municípios:

                I - legislar sobre assuntos de interesse local;

                II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

                (...)

                VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população”.

 

                A função legislativa é exercida pela Câmara dos Vereadores, que é o órgão legislativo do Município, em colaboração com o prefeito, a quem cabe também o poder de iniciativa das leis, assim como o poder de sancioná-las e promulgá-las, nos termos propostos como modelo, pelo processo legislativo federal. Dessa forma, a atividade legislativa municipal submete-se aos princípios da Constituição Federal, com estrita obediência à Lei Orgânica dos Municípios, à qual cabe o importante papel de definir as matérias de competência legislativa da Câmara, uma vez que a Constituição Federal não a exaure, pois usa a expressão interesse local como catalisador dos assuntos de competência municipal.

 

                COMPETÊNCIA GENÉRICA

                Em relação à competência genérica em virtude da predominância do interesse local trazida pela CF/88, art. 30, apesar de difícil conceituação, interesse local refere-se àqueles interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União), pois, como afirmado por Fernanda Dias Menezes, “é inegável que mesmo atividades e serviços tradicionalmente desempenhados pelos municípios, como transporte coletivo, polícia das edificações, fiscalização das condições de higiene de restaurantes e similares, coleta de lixo, ordenação do uso do solo urbano etc., dizem secundariamente com o interesse estadual e nacional”.

                Assim, por exemplo, será de competência do município, atendendo suas peculiaridades locais, a prática genérica de vigilância sanitária em relação aos alimentos de consumo imediato até o limite de seu território, inclusive com o poder de fiscalização das condições de higiene de restaurantes e similares em toda região.

                O artigo 30, II, da Constituição Federal, preceitua caber ao município suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, podendo o município suprir as omissões e lacunas da legislação federal e estadual, embora não podendo contrariá-las, inclusive nas matérias previstas no artigo 24 da Constituição de 1988. Para tanto, a Constituição Federal prevê a chamada competência suplementar dos municípios, consistente na autorização de regulamentar as normas legislativas federais ou estaduais, para ajustar sua execução a peculiaridades locais, sempre em concordância com aquelas e desde que presente o requisito primordial de fixação de competência desse ente federativo: interesse local.

                Ressalte-se que, no caso de serviços de atendimento à saúde da população, a própria Constituição Federal presume, no artigo 30, VII, a existência de interesse local, legitimados na atuação do Município.

                Além do mais, na utilização dessa competência suplementar, o Município pode, atendendo as peculiaridades locais e em respeito à legislação federal e estadual, estabelecer normas de fiscalização para vigilância sanitária de alimentos.

                Exemplo prático - Município de São Paulo:

 

                O Município de São Paulo, por meio de convênio celebrado com a Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo, pela Lei n. 10.085/86, tem a competência de fiscalizar e controlar as condições higiênico-sanitárias nos estabelecimentos que comercializam alimentos a varejo.

                A Vigilância Sanitária de Alimentos no Município de São Paulo é responsabilidade do Departamento de Inspeção Municipal de Alimentos - DIMA, órgão vinculado à Secretaria Municipal de Abastecimento - SEMAB.

 

                CONCLUSÃO

                Para concluir brevemente o pequeno levantamento sobre o tema, temos que a competência administrativa para cuidar de Saúde Pública, inclusive no tocante aos serviços de vigilância sanitária, é comum a todos os entes federativos. Ou seja, tanto a União quanto os Estados, Distrito Federal e Municípios têm esse dever imposto pela Lei Magna.

                Logicamente, para que não haja conflito entre as diversas atuações, suas condutas devem pautar-se pelo princípio da predominância do interesse, ou seja, quando existir o interesse geral, na busca do desenvolvimento social e do cidadão como pilar principal para o feito, já que a competência a prevalecer será da União; diferentemente, o interesse regional, fará prevalecer o Estado, e, consequentemente, o interesse local, o Município.

                Em relação à competência legislativa, a Constituição Federal disciplinou-a de forma mais cuidadosa.

                Assim, compete à União legislar sobre normas gerais protetivas da saúde pública, enquanto aos Estados e Distrito Federal compete a complementação dessas normas. Nem os Estados e o Distrito Federal poderão invadir a disciplina sobre normas gerais nem a União poderá editar normas por demais específicas, sob possível pena de inconstitucionalidade por desrespeito à divisão de competências concorrentes feitas pela Constituição Federal.

                Por fim, é entendimento consolidado que o Município surge nesse contexto sempre pautando sua atuação pelo princípio da predominância do interesse local, legitimador de sua atuação na área de saúde pública, inclusive vigilância sanitária, buscando sempre a colaboração efetiva e o apoio dos demais entes federados.

 

 

* Advogado, consultor e colaborador do BEAP.

 

 

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