ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO BRASILEIRO E CANADENSE  - MEF32533 - BEAP

 

 

GABRIEL JESUS DE SOUZA *

 

 

                1. INTRODUÇÃO

                A Contabilidade Aplicada ao Setor Público (CASP) vem passando, ao longo das últimas décadas, por profundas mudanças, entre outras, essas mudanças decorrem da ampliação dos mecanismos de controle social, da cobrança da transparência dos gastos governamentais e, principalmente, do avanço nas formas de responsabilização dos governos.

                Ressalta-se que as transformações da CASP são fundamentais aos governos, que têm como dever e obrigação, no estado democrático de direito, a prestação de contas. Segundo a Norma Brasileira de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (NBC TSP) - Estrutura Conceitual, a CASP orienta os governos e as entidades do setor público na gestão fiscal transparente dos recursos públicos, instrumentalizando-os no apoio à tomada de decisões governamentais e na adequada prestação de contas.

                Dessa forma, o objetivo geral deste artigo é realizar uma análise comparativa entre a Contabilidade Aplicada ao Setor Público brasileiro e canadense, evidenciando as suas principais características, similaridades e diferenças.

                A importância da análise comparativa deve-se, principalmente, ao atual processo de harmonização contábil internacional no âmbito do setor público, que visa proporcionar uma maior comparabilidade e transparência aos usuários da informação contábil. Ademais, deve-se a relevância do Canadá e do Brasil na economia global, figurando o Canadá no grupo dos países mais economicamente desenvolvidos (G-7), enquanto o Brasil, no grupo daqueles que estão em rápido crescimento econômico (Brics).

                Nesse sentido, este artigo está organizado em seis partes, que se iniciam nesta introdução. Na segunda parte, o referencial teórico, com os conceitos que guiaram o processo de investigação. Na terceira seção, é apresentada a metodologia empregada no presente estudo. Em seguida, na quarta seção, são analisados os dados comparativos de cada país. E por fim, na última parte, são feitas as considerações finais.

 

                2. REFERENCIAL TEÓRICO

                Os assuntos abordados nesta seção permitiram elucidar o problema levantado, fornecendo subsídios durante todo o processo de investigação. Nesse sentido, estão organizados em cinco tópicos nos quais se enfocam: os conceitos sobre Contabilidade Pública na doutrina e legislação brasileira; o breve histórico da Contabilidade Pública no Brasil e no Canadá; as características e responsabilidades dos principais atores envolvidos, sistema de contabilidade canadense e brasileiro; e o sistema jurídico e político de cada país, incluindo o Sistema Normativo vigente. Além disso, são explicitados os critérios de apresentação das Demonstrações Contábeis exigidas de cada Governo.

 

                2.1 Conceitos de Contabilidade Pública na doutrina e legislação

                A literatura tem abordado o conceito de Contabilidade Pública ou Contabilidade Aplicada ao Setor Público de forma ampla e abrangente. Nesse sentido, buscando uma compreensão melhor sobre o assunto, o emérito mestre da área pública, professor Lino Martins Silva (2011), leciona que a Contabilidade Pública, especialização da Ciência Contábil, “é voltada para o estudo e análise dos fatos administrativos que ocorrem na administração pública”.

                Petri (1984) apud Slomski (2013) complementa que a Contabilidade Pública se trata de um ramo da Contabilidade Geral aplicada às entidades de Direito Público interno. Ainda conforme Slomski (2013), seu objetivo é evidenciar os atos e fatos ligados à administração orçamentária e aos fatos relacionados aos eventos relativos à gestão financeira e patrimonial da entidade pública com o objetivo de apresentar o patrimônio da entidade em determinado momento.

                O mestre Valmir Leôncio (2014) define a Contabilidade Pública como sendo o espaço de atuação do contador público, o qual demanda estudo, interpretação, mensuração, avaliação e evidenciação dos fenômenos contábeis oriundos das diversas variações patrimoniais ocorridas no âmbito das entidades do setor público.

                Nessa toada, ainda sobre o conceito de Contabilidade Pública referenciada pela doutrina, Araújo e Arruda (2009) entendem a Contabilidade Aplicada ao Setor Público como “sistema de informações voltado a selecionar, registrar, resumir, interpretar e divulgar os fatos mensuráveis em moeda, que afetam as situações orçamentárias, financeiras e patrimoniais de órgãos e entidades públicas”.

                No tocante à legislação brasileira, as Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP) estabelecem que a Contabilidade Pública é o ramo da Ciência Contábil que aplica, no processo gerador de informações, os Princípios de Contabilidade e as normas contábeis direcionados ao controle patrimonial de entidades do setor público (CFC, 2016).

                O Art. 83 da Lei nº 4.320/1964 assevera que a Contabilidade Pública deve evidenciar perante a Fazenda Pública a situação de todos os que utilizem, arrecadem, gerenciem e administrem bens públicos. Além disso, deve também evidenciar todos os fatos ligados à administração orçamentária, financeira, patrimonial e industrial.

                Na visão do Glossário das Estatísticas do Canadá (2017), a Contabilidade Pública é um sistema que registra, mede e relata os eventos econômicos e financeiros de uma entidade do setor público. A entidade do setor público, segundo o Glossário, consiste em todas as unidades governamentais residentes no Canadá, instituições sem fins lucrativos, que são controladas e financiadas principalmente por unidades dos governos, incluindo também neste conceito as empresas comerciais governamentais.

 

                2.2 Breve Histórico da Contabilidade Pública no Brasil e no Canadá

                O surgimento da CASP canadense ocorreu simultaneamente ao da Confederação do Canadá. O processo de unificação das colônias britânicas, formador do Domínio do Canadá, exigiu inicalmente a Prestação de Contas Públicas por parte dos governantes, o qual foi estabelecido com fulcro na tradição legislativa britânica, no qual afirma que a despesa somente pode ser executada ou tributos somente podem ser criados após a anuência prévia do Parlamento (CANADA, 2017).

 

                Assim, desde 1867 (Constituição do Canadá), o papel da Contabilidade Pública e Auditoria Governamental tem sido realizado pelo Comitê de Permanente de Contas, visando preservar a harmonia dos Poderes e o Controle Direto das Finanças Públicas pelo Poder Legislativo (CANADA, 2017).

 

                Nos últimos anos, o quadro contábil para entidades do setor público canadense tem mudado. Em dezembro de 2010, o Conselho de Normas de Contabilidade e o Conselho de Contabilidade do Setor Público (CCSP) emitiram cada um normas contábeis para organizações sem fins lucrativos, incluindo aquelas controladas pelo Governo.

                Outrossim, a Contabilidade Pública canadense vem contribuindo e influenciando o trabalho da contabilidade internacional do setor público. Para isso, o Canadá adotou estratégias visando aumentar sua visibilidade no cenário mundial, tais como: aumento de sua influência no desenvolvimento dos padrões do setor público na Ipsasb; fortalecimento da parceria com o Ipsasb, por meio de reuniões e participações em grupos de discussões e de trabalho; liderança de projetos de financiamento do Ipsasb; e programa de contribuição à entidade Ipsasb, desde 2010, fornecendo quase 10% por cento do orçamento total do Ipsasb (PSAB, 2017).

                Já no tocante à CASP brasileira, segundo Giacomoni (2012) apud Júnior, Lima, Piscitelli (2014),

                A origem da contabilidade governamental no Brasil ocorre em 1808, com a abertura dos portos e a necessidade de maior disciplina na cobrança dos tributos aduaneiros. Nessa época, Dom João VI iniciou um processo de organização das finanças públicas, criou o Erário Público (Tesouro Nacional) e ordenou o uso da Contabilidade no Brasil Colônia por meio das partidas dobradas.

 

                Félix (2013) sinaliza que, com o processo de evolução da Contabilidade Pública no Brasil, acompanhado da modernização da administração pública brasileira, houve uma crescente demanda pelas informações contábeis por parte dos seus usuários, internos e externos, sobretudo dos usuários externos no que diz respeito à cidadania e ao controle social.

                Nesse contexto, o primeiro marco histórico foi a edição da Lei nº 4.320/1964, que estabeleceu importantes regras para propiciar o controle das finanças públicas, e a construção de uma administração financeira e contábil sólidas no País, tendo como principal instrumento o orçamento público.

                Segundo Félix (2013), atualmente a CASP no Brasil passa por um momento histórico, especialmente pelo processo de convergência às normas internacionais de contabilidade aplicada ao setor público (Ipsas), destarte a padronização permite a unificação a nível global das informações contábeis nos diferentes países.

 

                2.3 Características e responsabilidades dos atores do sistema de contabilidade pública canadense e brasileira

                Há quatro principais atores envolvidos no sistema de contabilidade pública canadense, que são agentes responsáveis pela organização, normatização, regulação e uniformização de práticas, técnicas e demais procedimentos contábeis, aplicados ao setor público, conforme Figura 1.

 

Figura 1 - Atores do Sistema de Contabilidade Pública do Canadá

 

"FIGURA NÃO INSERIDA POR ILEGÍVEL NA CONVERSÃO. NA NECESSIDADE OU EVENTUALIDADE, SOLICITAR FAX OU E-MAIL."

 

Fonte: Elaboração do autor.

                O Conselho Profissional de Contadores do Canadá (CPA Canadá) é a organização nacional criada para apoiar uma profissão de contabilidade canadense unificada. A CPA Canadá e os demais conselhos operam a distância uns dos outros. Essa relação permite que cumpram suas obrigações sem qualquer influência indevida e sirvam de fato ao interesse público. Outra atribuição da CPA é fornecer orientação aos contadores profissionais com vistas ao entendimento de relatórios financeiros (CPA CANADA, 2017).

                Já o segundo ator é o Conselho de Contabilidade do Setor Público (CCSP). De acordo com o CPA Canadá (2017), este Conselho tem como missão servir ao interesse público, estabelecendo padrões e outras orientações para a elaboração de relatórios financeiros por todas as entidades canadenses do setor público e, além disso, contribui para o desenvolvimento de padrões de relatórios financeiros do setor público internacionalmente aceitos. O papel do CCSP é contribuir para apoiar a tomada de decisões e a prestação de contas informadas por meio da manutenção de um quadro que forneça uma base para a informação de alta qualidade sobre o desempenho organizacional relatada por entidades do setor público canadiano.

                O CCSP estabeleceu ainda um Grupo de Discussão sobre Contabilidade do Setor Público como fórum público regular, no qual são deliberadas questões sobre a aplicação do Manual de Contabilidade do Setor Público (PSA). O objetivo do Grupo é auxiliar a Comissão de Valores Mobiliários no que se refere a questões relacionadas à aplicação do Manual do PSA. No entanto, o Grupo não emite pronunciamentos, outras comunicações ou oferece interpretações de normas (CPA CANADA, 2017).

                O Conselho de Supervisão de Normas Contábeis (CSOC) é um órgão voluntário independente criado pelo CPA, e tem, entre outras competências, servir o interesse público, supervisionando e fornecendo contribuições para as atividades relacionadas às normas contábeis, tendo como função também supervisionar e contribuir para as atividades do Conselho de Contabilidade do Setor Público (CCSP).

                O último ator envolvido no Sistema de Contabilidade Pública do Canadá é o Conselho do Tesouro, que é um Comitê de gabinete do Conselho Privado da Rainha. Esse Conselho é responsável pela prestação de contas, financeira, pessoal e administração, e tem como função complementar aprovar regulamentos relativos à Contabilidade Pública. Além disso, cabe ao presidente do Conselho, em conjunto com o ministro das Finanças, apresentarem a forma e o conteúdo das Contas Públicas (CANADA, 2017).

                Semelhantemente ao Canadá, há quatro atores relevantes envolvidos no Sistema de Contabilidade Pública do Brasil, conforme Figura 2.

 

Figura 2 - Atores do Sistema de Contabilidade Pública do Brasil

 

"FIGURA NÃO INSERIDA POR ILEGÍVEL NA CONVERSÃO. NA NECESSIDADE OU EVENTUALIDADE, SOLICITAR FAX OU E-MAIL."

 

Fonte: Elaboração do autor.

 

                O primeiro ator é o Conselho Federal de Contabilidade (CFC)

 

                O CFC é uma Autarquia Especial Corporativa dotada de personalidade jurídica de Direito Público. Tem, entre outras finalidades, principalmente a de orientar, normatizar e fiscalizar o exercício da profissão contábil, além de regular acerca dos princípios contábeis, do cadastro de qualificação técnica e dos programas de educação continuada, bem como editar Normas Brasileiras de Contabilidade de natureza técnica e profissional. (CFC, 2017).

 

                Em 2006, o CFC, com o apoio das demais entidades envolvidas (Secretaria do Tesouro Nacional, Tribunais de Contas e Universidades) criou o Grupo Assessor e editou Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, alinhadas as International Public Sector Accounting Standards (Ipsas) - emitidas pelo International Public Sector Accounting Standards Board (Ipsasb).

                Inicialmente o Grupo Assessor das NBCASP foi constituído com a missão de realizar um resgate, consolidação e necessária atualização à realidade nacional e internacional de todos os trabalhos e estudos desenvolvidos voltados à Contabilidade Pública pelo CFC ao longo dos anos. O Grupo surgiu com o objetivo de submeter esses trabalhos à ampla discussão pública, com o envolvimento de diversos profissionais da Contabilidade atuantes no setor público, bem como a participação das entidades interessadas, de modo a unificar a coordenação das ações e projetos do CFC nessa área.

                Para Souza (2017), em decorrência da Lei nº 10.180, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) foi incumbida, como órgão central do Sistema de Contabilidade Federal, tendo “como função principal gerir as contas públicas de forma eficiente e transparente, zelando pelo equilíbrio fiscal e pela qualidade do gasto público” (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2017). Entre outras competências, cabe ainda à STN manter e aprimorar o Plano de Contas Único da União; e estabelecer normas e procedimentos para o adequado registro contábil dos atos e dos fatos da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e nas entidades da administração pública federal.

                Com o objetivo de promover auxílio e consultoria, a Secretaria do Tesouro Nacional criou 3 Grupos Técnicos e Consultivos: o Grupo Técnico de Padronização de Procedimentos Contábeis (GTCON), o Grupo Técnico de Padronização de Relatórios e Demonstrações Fiscais (GTREL) e o Grupo Técnico de Sistematização de Informações Contábeis e Fiscais (GTSIS). Esses Grupos são compostos de representantes de diversas instituições e entes da Federação e manifestam-se por meio de recomendações, buscando reduzir assimetrias informacionais, sempre em prol da transparência fiscal, da racionalização de custos e do controle social (TESOURO, 2017).

 

                2.4 Sistema jurídico e político - estrutura normativa vigente

                De acordo com CANADA (2017), o Canadá é uma monarquia parlamentarista constitucional, um Estado Federal. Isso significa que a autoridade de fazer leis está dividida entre o Parlamento do Canadá e as legislaturas das províncias, prevalecendo o direito comum (Commom Law) nas províncias.

                A Constituição do Canadá de 1867 estabelece o federalismo como forma de governo e distribui os poderes e as funções entre o governo federal e os governos provinciais. Dessa forma, as províncias do Canadá têm autoridade para fazer leis concernentes a questões de natureza local ou particular. Além disso, também podem criar governos locais ou municipais para resolverem questões sobre estacionamento de regulamentos e negócios e licenças de construção (CANADA, 2017).

                Consoante abordagem do CANADA (2017), as práticas contábeis e orçamentárias no âmbito do setor público são estabelecidas principalmente na Lei da Constituição de 1867, na Lei de Administração Financeira (Financial Administration A), nas convenções não escritas, nos procedimentos do Parlamento Britânico e nas regras da Câmara dos Comuns e do Senado.

                A Lei de Administração Financeira (FAA) do Canadá é considerada a principal base jurídica para a gestão financeira geral e prestação de contas de organizações de serviço público e corporações das nações britânicas. Ela estabelece uma série de princípios fundamentais sobre a forma como os gastos do governo podem ser aprovados, as despesas podem ser feitas, as receitas obtidas, e os fundos emprestados.

                Já as normas de Contabilidade Pública canadense são autorizadas para a contabilidade financeira e relatórios elaborados por meio de um processo organizacional organizado e emitidos por um órgão normativo reconhecido. Essas normas contábeis especificam como as transações e outros eventos devem ser reconhecidos, mensurados, apresentados e divulgados nas demonstrações contábeis de uma entidade do setor público. O objetivo dessas normas é satisfazer às necessidades dos utilizadores das demonstrações contábeis, fornecendo as informações necessárias para a responsabilização e tomada de decisões. Embora as normas contábeis do setor público canadense abordem a contabilidade e divulgação de governos, não fornecem orientação específica sobre as entidades que são componentes integrantes do governo, como departamentos, fundos e contas.

                Outro normativo que se destaca é o Manual de Contabilidade do Setor Público do CPA Canadá, documento formal que contém normas contábeis que se aplicam a todas as entidades do setor público (governos, componentes governamentais, organizações governamentais e certas parcerias governamentais) que emitem declarações financeiras de propósito geral.

                Quando as normas contábeis do setor público canadense permitem uma discricionariedade ou especificidade ou possuem uma lacuna, o Conselho do Tesouro publica determinadas normas de contabilidade do Tesouro que visam fornecer orientação adicional sobre a preparação das demonstrações contábeis departamentais, complementando as normas contábeis do setor público canadense e garantindo mais transparência e compreensibilidade. Essas normas devem se basear nas normas de Contabilidade Pública canadense.

                E, por fim, dentro da estrutura normativa canadense, há a figura do Manual de Contabilidade e Codificação do Governo do Canadá (CGAH), que fornece informações suplementares que indicam as escolhas e políticas contábeis do governo e fornece políticas específicas relevantes para demonstrações contábeis departamentais e relatórios financeiros trimestrais. Outrossim, fornece orientação adicional para complementar e apoiar a aplicação das normas contábeis do setor público canadense.

                Já as características do sistema político e jurídico brasileiro diferem substancialmente das características presentes no sistema canadense.

 

                O ordenamento jurídico brasileiro é baseado na tradição romano-germânica, isto é, civil law. A Constituição da República Federativa do Brasil, em vigor desde 1988, organiza o país em uma República Federativa, formada pela união indissolúvel dos estados, dos municípios e do Distrito Federal. Os 26 estados federados têm autonomia para elaborar suas próprias Constituições Estaduais e leis.

                Entretanto, sua competência legislativa é limitada pelos princípios estabelecidos na Constituição Federal.

                Os municípios também gozam de autonomia restrita, pois suas legislações devem seguir as prescrições da Constituição do Estado ao qual pertencem e, consequentemente, as da própria Constituição Federal. (OEA, 2017)

                No setor público brasileiro, a obrigatoriedade da prestação de contas, votação direta e universal e a periodicidade do mandato decorrem da condição de res publica, corroborando o que afirma Souza (2013) sobre o seguinte preceito da Carta Magna de 1988:

 

                [...] prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.

 

                De acordo com Júnior, Lima e Piscitelli (2014), a Lei nº 4.320/1964, de 17 de março de 1964, denominada Lei Geral dos Orçamentos, principal legislação aplicável sobre Contabilidade Pública, é voltada para o orçamento público e seu foco está na arrecadação da receita e na execução da despesa e no confronto entre a previsão e a fixação das receitas e despesas inclusas na Lei de Orçamento (BRASIL, 1964).

                Para Castro (2010) apud Júnior, Lima e Piscitelli (2014), a Lei nº 4.320/1964 reafirma o conceito de exercício financeiro e determina quais demonstrações devem ser apresentadas pelas entidades da administração e a estrutura dessas demonstrações. Apesar de a referida lei tratar as demonstrações em quatro dimensões (orçamentária, financeira, patrimonial e compensação - atos potenciais), a visão orçamentária foi priorizada, inclusive nas demonstrações contábeis.

 

                As Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP), editadas pelo CFC, estabelecem os conceitos e procedimentos de avaliação e mensuração, registro e divulgação de demonstrações contábeis aplicados ao Setor Público, bem como quaisquer procedimentos técnicos de controle contábil e prestação de contas previstos, que propiciem o controle social, além da observância das normas aplicáveis (CFC, 2012).

 

                A LRF, lei que estabelece as normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade da gestão fiscal no Brasil, determina a disponibilização em tempo real de informações pormenorizadas em relação à execução orçamentária e financeira da União, dos estados e dos municípios. A LRF, com foco no equilíbrio das contas, estabeleceu a apuração da disponibilidade de caixa, do resultado primário e do resultado nominal, por meio do Relatório de Gestão Fiscal e do Relatório Resumido da Execução Orçamentária.

                Complementam Lopes et al (2015) ao asseverarem que a LRF, além de estabelecer limites, também determina a obrigatoriedade de divulgação das contas do setor público e considera que uma das formas dessa divulgação seja em meio eletrônico de acesso público, conforme consta no art. 48 da referida lei, mais especificamente. Os aludidos autores apontam que nesse mesmo artigo é possível ler:

                Art. 48. [...] Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos. (BRASIL, 2000).

 

                O Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MBCASP) é o Manual emitido pela STN, que tem como objetivo evidenciar com qualidade os fenômenos patrimoniais e buscar um tratamento contábil padronizado dos atos e fatos administrativos no setor público. Este Manual tornou-se imprescindível à elaboração de um plano de contas nacional.

                A Portaria do Ministério da Fazenda nº 184/2008 foi o instrumento pela qual o Ministério da Fazenda do Brasil determinou à STN a adoção dos procedimentos necessários para atingir os objetivos de convergência estabelecidos pelo CFC. A Portaria MF nº 184/2008 dispõe sobre as diretrizes a serem observadas no setor público (pelos entes públicos) quanto aos procedimentos, práticas, elaboração e divulgação das demonstrações contábeis, de forma a torná-los convergentes com as Ipsas.

 

                2.5 Critérios de apresentação das demonstrações contábeis

                Conforme estabelece o art. 64 da Lei de Administração Financeira, no Canadá é exigidas do Governo a apresentação das seguintes Demonstrações Contábeis (Quadro 1).

 

Quadro 1 - Demonstrações do Setor Público Canadense

Fonte: Elaboração do autor.

 

Demonstrações

Objetivos

Demonstração consolidada das operações e déficit acumulado

Apresentar as receitas, despesas, déficit ou superávit do Governo e outras perdas ou resultados abrangentes

Demonstração consolidada da posição financeira

 

Divulgar o saldo e os investimentos de caixa do Governo, os valores devidos pelo Governo no final do ano e os ativos não financeiros do Governo, como seus ativos e estoques de capital tangíveis

Demonstração consolidada da variação da dívida líquida

Explicar a diferença entre o déficit ou superávit anual do Governo e a variação da dívida líquida do exercício

Demonstração consolidada do fluxo de caixa

Fornecer informações sobre o caixa do Governo fornecido ou utilizado para atividades operacionais, de investimento de capital, investimento e financiamento

Notas às demonstrações contábeis

Fornecer informações complementares mais detalhadas em relação às matérias reportadas nas demonstrações contábeis consolidadas

 

                O objetivo fundamental dessas demonstrações contábeis consolidadas é fornecer informações ao Parlamento e, portanto, ao público, para facilitar a compreensão e avaliação da natureza e extensão integral dos assuntos financeiros e recursos pelos quais o Governo é responsável. Essas demonstrações contábeis consolidadas – sob a égide do regime de competência integral – refletem a posição financeira do Governo na data do relatório, e seus resultados operacionais, déficit acumulado, variação da dívida líquida e fluxo de caixa do exercício findo naquela data.

                As demonstrações contábeis consolidadas do Governo do Canadá são preparadas usando as políticas contábeis do Governo, que são baseadas em normas de contabilidade do setor público canadense emitidas pelo CCSP. As demonstrações contábeis são apresentadas ao auditor-geral do Canadá, que as audita e fornece uma opinião independente à Câmara dos Comuns como parte das Contas Públicas do Canadá (CANADA, 2017).

                O processo de consolidação das contas públicas canadense envolve a combinação das contas e uma base uniforme de contabilidade e eliminação de saldos e transações interorganizacionais. Essas contas evidenciam todas as despesas efetuadas, todas as receitas auferidas e todos os pagamentos dentro e fora do Fundo de Receita. As contas de cada departamento governamental, após conciliadas com as contas do Recebedor Geral, são transferidas para as Contas Públicas do Canadá, devendo ser ajustadas à base de contabilidade governamental, enquanto, no Brasil, as demonstrações contábeis são compostas pelas demonstrações enumeradas pela Lei nº 4.320/1964, pela NBC TSP e pela Lei Complementar nº 101/2000 (Quadro 2).

 

Quadro 2 - Demonstrações do Setor Público Brasileiro

 

 

Demonstrações

Objetivos

Balanço Orçamentário

Demonstrar as receitas e despesas previstas em confronto com as realizadas

 

Balanço Financeiro

Evidenciar a movimentação financeira das entidades do setor público

Balanço Patrimonial

Evidenciar, qualitativa e quantitativamente, a situação patrimonial da entidade pública

Demonstração das Variações Patrimoniais

Evidenciar as alterações verificadas no patrimônio, resultantes ou independentes da execução orçamentária

Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC)

 

Apresentar as entradas e saídas de caixa e as classificar em fluxos operacional, de investimento e de financiamento

Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL)

Demonstrar a evolução do patrimônio líquido da entidade

 

Fonte: Elaboração do autor.

 

                A LRF estabeleceu ainda a exigência de se realizar a consolidação nacional das contas públicas, por meio da publicação anual do Balanço do Setor Público Nacional (BSPN), congregando as contas da União, estados, Distrito Federal e municípios. O BSPN constitui, ainda, um instrumento de transparência da gestão fiscal, tendo como objetivo alcançar os vários segmentos da sociedade e assim proporcionar maior transparência, permitindo um controle social eficiente (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2017).

 

                3. METODOLOGIA

                Conforme mencionado anteriormente, o presente estudo visa realizar uma análise comparativa (cross-country analysis) entre a Contabilidade Aplicada ao Setor Público brasileiro e canadense. Para o professor Pasold (2000), “o método comparativo pesquisa dois ou mais fenômenos ao mesmo tempo ou ao longo de um tempo e, cotejando-os entre si, neles identifica e privilegia as semelhanças, considerando as diferenças”.

                Para a Estrutura Conceitual do Setor Público (CFC, 2016),

 

                a comparabilidade é uma característica qualitativa de melhoria da informação contábil, que permite a melhor visão da evolução da entidade medida sob os mesmos critérios e princípios ao longo do tempo, mas sem que isso leve à não evolução das práticas contábeis; e a comparabilidade também se aplica à adoção das mesmas práticas por empresas semelhantes.

 

                Nessa ótica, Zaapa (2012) aponta que a Contabilidade Comparada é o “método de pesquisa que tem por objetivo descobrir os elementos comuns das concepções mediante a confrontação dos sistemas contábeis relacionados entre si”. Assim, a Contabilidade Comparada refere-se a um método para o estudo contábil, que consiste na observação repetida dos fenômenos quando produzidos em meios diferentes e em condições distintas, assim se estabelecem as semelhanças e as diferenças (ZAAPA, 2012).

                A partir dos pressupostos mencionados acima, o método comparativo não se restringe a comparar apenas as normas contábeis positivadas, mas também a doutrina, instrumentos, conceitos, institutos e sistemas. Salienta-se que a Contabilidade Comparada pode ser definida como o estudo das diferenças e semelhanças entre a Contabilidade de diferentes países.

                Trata-se, portanto, quanto à forma de abordagem, de um estudo de natureza descritiva, visando apenas a observar, registrar e descrever as características de um determinado fenômeno (FONTELLES et al. 2009). Já, quanto aos procedimentos técnicos, tem-se uma pesquisa bibliográfica. Preliminarmente buscou-se uma revisão bibliográfica para, a partir desse ponto, iniciar-se a pesquisa e coleta de dados em artigos, livros, demonstrações contábeis, legislações aplicáveis, sites e outras fontes de dados.

                Niyama (2010) ressalta que os principais estudiosos do tema apresentaram diversos fatores como causas das diferenças internacionais entre sistemas contábeis dos países. Niyama (2010) explica que cada País tem seu conjunto de leis, regras, filosofias, procedimentos e objetivos e, consequentemente, seus sistemas contábeis são impactados por tais medidas. Esse estudo limitou-se a abordar somente três dessas razões, distribuídas pelas seguintes seções: Atores do Sistema de Contabilidade Pública, Estrutura Normativa Vigente e Demonstrações Contábeis apresentadas pelo Governo. Salienta-se que a principal causa das diferenças internacionais, apontada unanimemente pela literatura, o tipo e característica do sistema legal, será abordada no item Estrutura Normativa Vigente.

 

                4. ANÁLISE DOS RESULTADOS

                Nesta seção apresentam-se os resultados obtidos no estudo. Para o cumprimento do objetivo proposto pela pesquisa, discutem-se os dados coletados organizados como segue: principais características e responsabilidades dos atores envolvidos no sistema de Contabilidade Pública canadense e brasileiro (Quadro 3), Sistema Político e Jurídico (Quadro 4), Estrutura Normativa Vigente (Quadro 5) e Demonstração Contábeis (Quadro 6).

Quadro 3 - Características e Responsabilidades dos Atores

 

Atores

Sistema de Contabilidade Pública

Natureza Jurídica

Influência do Órgão da Profissão

Conselho Profissional de Contadores do Canadá (CPA Canadá)

Conselho de Contabilidade do Setor Público (CCSP)

Conselho de Supervisão de Normas Contábeis (CSOC)Conselho do Tesouro

 

Canadense

 

Predominantemente Público

Forte

Conselho Federal de Contabilidade (CFC)

Grupo Assessor NBCASP

Secretaria do Tesouro Nacional (STN)

Grupos Técnicos

 

Brasileiro

 

Predominantemente Privado

Fraca

 

 

Fonte: Elaboração do autor.

 

Quadro 4 - Sistemas Político e Jurídico

 

 

 

 

Político

Sistemas

Canadá

Brasil

 

Forma de Governo

 

Sistema de Governo

 

Forma de Estado

 

 

Monarquia Constitucional

 

Parlamentarismo

 

Federalismo

 

República

 

Presidencialismo

 

Federalismo

|

Jurídico

 

 

Commom Law

 

Civil Law

 

Fonte: Elaboração do autor.

 

 

Quadro 5 - Estrutura Normativa Vigente

 

Estrutura Normativa

Sistema de Contabilidade Pública

Prevalência do Due Process Law

Responsáveis pela Emissão de Normas do Setor Público

Lei de Administração Financeira (FAA)

Manual de Contabilidade e Codificação do Governo do Canadá (CGAH)

Normas Contábeis do Setor Público Canadense

Manual de Contabilidade do Setor Público

Normas de Contabilidade do Tesouro

 

 

Canadense

 

Sim

Predominantemente Privada

 

 

 

 

 

Lei 4.320/64

Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)

As Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP)

Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MBCASP)

Portaria MF 184/2008

 

Brasileiro

 

Não

Predominantemente Pública

 

 

 

Fonte: Elaboração do autor.

 

Quadro 6 - Demonstração Contábeis

 

Demonstrações

Sistema de Contabilidade Pública

Notas Explicativas

Informações do Orçamento Público

Informações da Dívida Pública

Demonstração consolidada das operações e déficit acumulado

Demonstração consolidada da posição financeira

Demonstração consolidada da variação da dívida líquida

Demonstração consolidada do fluxo de caixa

Notas às Demonstrações Financeiras

Canadense

 

Inclusas no Rol das Demonstrações Obrigatórias

 

Não são obrigatórias

 

Inclusa no Rol das Demonstrações Obrigatórias

Balanço Orçamentário

Balanço Financeiro

Balanço Patrimonial

Demonstração das Variações Patrimoniais

Demonstração dos Fluxos de Caixa

Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido

Brasileira

Não são obrigatórias

Inclusa no Rol das Demonstrações Obrigatórias

Não são obrigatórias

 

 

 

 

Fonte: Elaboração do autor.

                Ao comparar a natureza jurídica dos principais atores envolvidos no sistema de contabilidade dos dois países, podem-se constatar as diferenças entre eles no Quadro 3. Enquanto que, no Brasil, os principais atores envolvidos no Sistema de Contabilidade Pública são eminentemente governamentais, no Canadá, revestem-se, em sua imensa maioria, de natureza privada, conforme ilustrado no Quadro 3.

                Embora o principal órgão da profissão contábil do Brasil (CFC) integre a Administração Pública, não é politicamente forte o suficiente para influenciar os demais órgãos governamentais na edição de determinadas normas contábeis, conforme vaticina Niyama (2010). Por outro lado, o CPA Canadá concentra a regulamentação contábil no setor público, com pouca interferência do Governo, o que torna o sistema contábil mais confiável, independente e com mais credibilidade.

                Já em relação aos dados comparativos dos sistemas jurídico e político do Canadá e do Brasil, incluindo a Estrutura Normativa Vigente, têm-se os descritos no Quadro 4.

                Identifica-se no Quadro 4 que o sistema político é diferente entre os dois países, exceto quanto à forma de Estado. O sistema de governo de um país influencia diretamente a forma de organização das suas contas públicas, de organização da administração pública e de prestação de contas. Souza Júnior (2012) visualiza que o “sistema de governo é o modo como as instituições do poder público estão arranjadas para viabilizar suas funções específicas no esforço conjunto de atender às exigências do bem comum.

                Conforme constatado ainda no Quadro 4, a forma de Estado de ambos os países é o federalismo. Similarmente ao Canadá, no Brasil há uma distribuição de competências e funções legislativas entre o governo central e demais entes autônomos (no caso do Brasil: estados membros e, no Canadá, províncias). Pontua-se também que a forma de Estado interfere na estrutura normativa vigente de cada país.

                O sistema jurídico predominante no país repercute diretamente no papel dos operadores jurídicos, responsabilidades e relações privadas entre as instituições. Para Niyama (2010), “a estrutura legal de um país é capaz de influenciar o comportamento e o direcionamento que um País pode assumir”. Como observado no Quadro 4, o Canadá adotou o sistema jurídico anglo-saxão (Commom Law) herdado da Coroa Britânica, diferentemente do Brasil, que se baseia no sistema jurídico romano-germânico (Civil Law).

                Tratando-se exclusivamente da estrutura normativa vigente entre os dois países objeto do estudo comparativo, identificou-se a descrita no Quadro 5.

                Conforme Quadro 5, assim como existe influência do ordenamento jurídico no sistema de contabilidade, a estrutura normativa (relativa aos aspectos de Contabilidade Pública) é influenciada pelo ordenamento jurídico predominante no País. Apesar de os países analisados estabelecerem seus arcabouços normativos, por meio de leis, manuais e normas regulamentadoras, verifica-se que no sistema canadense prevalece o due-process of law¹ nas relações e responsabilidades dos atores em frente ao sistema normativo.

                Convém ressaltar que os principais responsáveis pela emissão de normas e procedimentos contábeis do setor público do Canadá são entidades privadas, tais como o CPA e CCSP, sendo que há ampla participação da sociedade atuando como principal usuária da informação contábil pública; já no Brasil há predominância dos órgãos públicos, tais como CFC e STN, na emissão de normas e procedimentos contábeis do setor público, limitando a participação da sociedade.

                Com relação ao conteúdo das demonstrações contábeis, os resultados são os descritos no Quadro 6.

                Constata-se, no Quadro 6, que as principais demonstrações exigidas do Governo brasileiro se assemelham com as exigidas do Governo canadense. Contudo, no Canadá, incluem-se no rol as informações a respeito da variação da dívida pública líquida; já no Brasil essa demonstração não é obrigatória e é apresentada anualmente por meio do Relatório Anual da Dívida (RAD) emitida pela STN. Outra diferença constada é que, no setor público brasileiro, as notas explicativas não são consideradas como demonstrações contábeis, embora sejam consideradas parte integrante das demonstrações, devendo assim ser apresentadas como informações adicionais nos quadros das DCASPs. E por fim, a última diferença existente entre as demonstrações é que no Canadá as informações acerca do orçamento público não são exigidas obrigatoriamente; já no Brasil essas informações constam no Balanço Orçamentário.

 

                5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

                O estudo objetivou realizar uma análise comparativa entre a Contabilidade Pública no Brasil e no Canadá. Inicialmente elaborou-se uma revisão bibliográfica dos conceitos e definições. Após esse procedimento, iniciou-se uma pesquisa e coleta de dados em diversas bases documentais e sítios eletrônicos.

                Em que pese a quantidade dos principais atores envolvidos no sistema de Contabilidade Pública se assemelhar entre os dois países, constatam-se diferenças entre a natureza, responsabilidades e papéis dos agentes – enquanto no Canadá adota-se principalmente o sistema jurídico Commom Law, no Brasil, adota-se o sistema rigoroso formalista Civil Law.

                De acordo com a análise de resultados, observou-se que o grau de independência dos atores do sistema de Contabilidade Pública do Canadá é maior que do sistema de Contabilidade Pública Brasileiro, decorrente da própria natureza jurídica que instituiu e delimitou a atuação cada ator, e, além disso, depreende-se a forte contribuição do aspecto cultural que influencia o fluxo decisório dos atores. Conclui-se também que, assim como a Contabilidade Pública canadense, a brasileira tem evoluído de forma célere ao longo dos últimos anos, considerando a tendência em curso mundial de convergência aos padrões internacionais.

                Este trabalho não pretende esgotar a análise comparativa entre os dois países, nem todas as possibilidades de abordagem do tema, mas limitou-se à comparação de algumas razões das diferenças internacionais entre sistemas contábeis apontados pelos teóricos (estrutura normativa, características e tipos de atores, critérios e apresentação das demonstrações contábeis).

                Para pesquisas futuras, recomenda-se a análise comparativa das normas e práticas contábeis existentes nos dois países e outros, tais como critérios de reconhecimento, mensuração e evidenciação de ativos e passivos, acrruals nos resultados, tratamento contábil de subvenções e contribuições governamentais, reavaliação dos ativos, reconhecimento do goodwill, depreciação, com o fim de contribuir para uma melhor compreensão da comparação de normas contábeis e o processo de harmonização às normas internacionais.

 

                NOTA

                1 Na Contabilidade Canadense, o instituto jurídico opera nos procedimentos e normas contábeis, os quais são projetados para servir o interesse público, abordando a necessidade para a transparência do processo de definição de padrões, ampla consulta e capacidade de resposta ao recebimento recebido e responsabilidade para todas as partes interessadas (AcSB Due Process Handbook).

 

                6. REFERÊNCIAS

                ARAÚJO, Inaldo da Paixão Santos; ARRUDA, Daniel Gomes. Contabilidade Pública - Da Teoria à Prática. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009

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                ______. Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp101.htm. Acesso em: 10 jan. 2017

                CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Normas brasileiras de contabilidade: contabilidade aplicada ao setor público: NBCs T 16.1 a 16.11. Brasília. Disponível em: http://portalcfc.org.br/wordpress/wp-content/uploads/2013/01/Setor_P%C3%BAblico.pdf. Acesso em: 10 jan. 2017

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                CHARTERED PROFESSIONAL ACCOUNTANTS OF CANADA. About CPA Canada. Disponível em: https://www.cpacanada.ca/en/the-cpa-profession/about-cpa-canada. Acesso em: 09.08.2017

                CHARTERED PROFESSIONAL ACCOUNTANTS OF CANADA (CPA Canada). Guide to Accounting Standards for Not-for-Profit Organizations in Canada. 2012. Toronto: , 2012. Disponível em: https://www.cpacanada.ca/en/business-and-accounting-resources/financial-and-nonfinancial-reporting/not-for-profit-organizations/publications/accounting-standards-for-nfps-in-canada. Acesso em 09.08.2017.

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* Possui graduação em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia (2008), especialização em Contabilidade Pública (2009), Auditoria do Setor Público (2013) e Administração Pública (2017).

 

 

(Fonte: RBC nº 230)

 

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