AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO ORDINÁRIA - CONCURSO PÚBLICO - REVISÃO E ANULAÇÃO DE QUESTÕES OBJETIVAS ELABORADAS POR INSTITUIÇÃO ESCOLHIDA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUNICIPAL PARA PROPICIAR A CORREÇÃO DE PROVA DISCURSIVA - SUSPENSÃO DE HOMOLOGAÇÃO DO CONCURSO - DESCABIMENTO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS - TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA - DECISÃO MANTIDA - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF33188 - BEAP

 

 

                - A antecipação dos efeitos da tutela só pode ser concedida quando, demonstradas as alegações por prova inequívoca, o juiz se convença da verossimilhança do direito invocado, desde que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou que fique caracterizado abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu, o que, no caso específico não resta caracterizado, impondo-se a confirmação da decisão agravada.

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO CV Nº 1.0024.12.171264-0/001 - Comarca de ...

 

Agravante    :  ...

Agravados   :  Município de ..., ...

 

A C Ó R D Ã O

 

                Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em rejeitar a preliminar e, no mérito, negar provimento ao recurso, ressaindo prejudicado o pedido de perda de objeto quanto à suspensão da homologação do concurso público.

 

DES. ELIAS CAMILO SOBRINHO

Relator

 

V O T O

 

                Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por ..., contra a decisão interlocutória de fls. 123-124-TJ, integrada à fl. 126-TJ, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Belo Horizonte, que nos autos da Ação Ordinária ali ajuizada contra o Município de ... e contra a ... (agravados), indeferiu a medida liminar vindicada “para que seja corrigida a prova discursiva da candidata ..., bem como seja suspensa a homologação do concurso ocorrida em 28.06.2012”.

                Insurge-se a agravante nas razões recursais de fls. 02-08-TJ, sustentando, em suma, o equívoco em que incorreu o Juiz singular, porquanto o “fumus boni juris encontra-se caracterizado no direito da Autora de ter sua prova discursiva corrigida pela banca examinadora da Fundação Dom Cintra, haja vista que com a anulação ou modificação do gabarito das questões revestidas de erro material, atacadas na presente demanda, a Autora passa a fazer parte da lista de aprovados na 1ª Etapa do certame, de acordo com os requisitos exigidos nos itens 8.3 e 9 do edital 04/2011”. (sic) (f. 04-TJ).

                Por outro lado, ressalta que o “periculum in mora encontra-se consubstanciado no fato de que, caso não seja concedida a antecipação de tutela requerida, a Autora será preterida no concurso público por outros candidatos, que não foram aprovados após escorreita avaliação de seus conhecimentos, o que não só afronta a legalidade e moralidade do certame, como também a eficiência da Administração, que nomeará candidatos em detrimento daqueles que detinham efetivamente o conhecimento necessário para pertencer aos quadros de pessoal da Prefeitura ...., nos termos do edital”. (sic) (f. 04-TJ).

                Em destaque para jurisprudência, pugna pela antecipação dos efeitos da tutela recursal consubstanciada na correção da prova discursiva, na suspensão da homologação do concurso público e, por conseguinte, no prosseguimento do feito, dispensada a citação dos demais candidatos classificados no certame.

                Ao final, pugna pelo provimento do recurso para os fins de reverter o comando interlocutório.

                Instruem o recurso os documentos de fls. 09-126-TJ.

                Admitido o processamento do recurso sob a forma de instrumento, foi indeferida a antecipação dos efeitos da tutela recursal nos termos da decisão de fls. 131-136-TJ.

                Requisitados informes, o Juiz singular prestou as informações de fls. 142-TJ.

                O agravo regimental interposto às fls. 145-146-TJ, contra a decisão que indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, não foi conhecido, conforme se verifica do acórdão de fls. 271-276-TJ.

                Regularmente intimada, a .... ofertou as contrarrazões e documentos de fls. 151-261-TJ, pugnando, preliminarmente, pela negativa de seguimento do presente agravo de instrumento e pela perda de objeto com relação ao pedido de letra “b” das razões recursais, que diz respeito à suspensão da homologação do concurso público em questão. No mérito, em infirmação óbvia, bate-se pelo desprovimento do recurso.

                Por sua vez, regularmente intimado, o Município de .... ofertou as contrarrazões de fls. 263-269-TJ, em infirmação óbvia, pugnando pelo desprovimento do recurso.

                Desnecessária a intervenção da douta Procuradoria-Geral de Justiça.

                Importa analisar, de início, a preliminar de negativa de seguimento do presente agravo de instrumento suscitada pela agravante, Fundação ..., diante do iterativo entendimento no sentido de que em concurso público não cabe ao Poder Judiciário examinar o critério de formulação e avaliação das provas e tampouco das notas atribuídas aos candidatos; ainda, ao Poder Judiciário não é dado adentrar no mérito do ato administrativo, substituindo a conveniência e oportunidade do Administrador, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes previsto no art. 2º da Constituição da República; e, por fim, diante da ausência dos requisitos legais para a concessão de liminar.

                E o faço para rejeitá-la, data venia, porquanto tais argumentos se referem ao próprio mérito do agravo de instrumento.

                Assim, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

                Passo à decisão.

                Ressalta-se que o objeto do agravo circunscreve-se à aplicação, ou não, das regras do art. 273 do CPC, que permite ao juiz antecipar, total ou em parte, os efeitos da tutela pretendida, desde que esteja presente prova inequívoca, e se convença o juiz da verossimilhança do direito alegado, além de verificar se se fazem presentes os pressupostos de receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou que fique caracterizado abuso de direito de defesa ou manifesta intenção de protelar. Trata-se, pois, de medida de urgência que requer do Juiz redobrada prudência, máxime quando a parte adversa é o Poder Público.

                De mais a mais, há deve ser enfatizado que em sede de agravo não se deve descer às minúcias da relação jurídica, exatamente para não tanger o mérito. Daí que, a análise de limita à verificação dos pressupostos do retrocitado art. 273, à luz dos fatos trazidos ao exame.

                Apenas a título de registro, tem-se que qualquer alegação de impossibilidade de concessão de tutela antecipada em desfavor da Fazenda Pública não seria suficiente para elidir a pretensão da autora, aqui agravante. Isto porque é entendimento consolidado que as hipóteses trazidas pela legislação devem ser interpretadas de maneira restritiva, pelo que, uma vez presentes os pressupostos autorizadores da medida de urgência, e não se tratando de vedação expressa, a tutela há de ser deferida.

                Neste sentido, é possível constatar que o caso vertente não se refere à vedação expressa contidas nas hipóteses legais, razão pela qual mister se faz uma investigação acerca da existência dos pressupostos da tutela antecipada, os quais não se limitam ao mero fumus boni iuris, porquanto deve o julgador convencer-se da verossimilhança da alegação com base na prova inequívoca produzida nos autos, sendo imprescindível, ainda, a demonstração de perigo de dano irreparável ou de difícil reparação.

                Em relação à verossimilhança do direito alegado, cediço que se refere ao juízo de convencimento a ser feito em torno de todo o quadro fático invocado, e não apenas sobre a existência do direito subjetivo material, mas, também, e principalmente, no relativo ao perigo de dano e sua irreparabilidade, ou o abuso do direito de defesa, ou o manifesto propósito protelatório do réu.

                Todavia, quanto à prova inequívoca do direito alegado, bem como o conhecimento da verossimilhança da alegação, entendo que tal requisito não se faz presente na espécie, data venia.

                Sem embargo da judiciosa argumentação deduzida pela agravante, não se vislumbra presente a plausibilidade do direito invocado, indispensável à concessão da antecipação de tutela vindicada.

                A agravante visa à correção dos pontos atribuídos à sua prova objetiva, aventando que algumas questões deveriam ter sido anuladas, sendo corretas as respostas por ela marcadas, o que lhe garantiria pontuação suficiente para ser classificada dentro do número de vagas previstas no Edital nº 04/2011 (“Concurso Público para provimento dos cargos públicos efetivos de Auditor Fiscal de Tributos Municipais e Auditor Técnico de Tributos Municipais da Carreira dos Servidores da Área da Tributação do Quadro Geral de Pessoal da Administração Direta do Poder Executivo do Município de ...”) (fls. 49-74-TJ).

                Tenho, todavia, que a análise dos supostos erros apontados pela agravante no conteúdo das questões da prova objetiva extrapolaria a competência jurisdicional.

                Cediço é que, em sede de concurso público, é vedado ao Poder Judiciário proceder ao exame de questões objetivas elaboradas pela Banca Examinadora, adentrando na aferição da correção das provas, cabendo-lhe, tão somente, o controle da legalidade do ato.

                A propósito, neste sentido posiciona-se a jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça:

 

                “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - DIREITO ADMINISTRATIVO - CONCURSO PÚBLICO - REEXAME DE QUESTÕES DA PROVA - IMPOSSIBILIDADE - PRECEDENTES - INCURSÃO NO MÉRITO ADMINISTRATIVO - INADMISSIBILIDADE.

                1. Em matéria de concurso público, a competência do Poder Judiciário se limita ao exame da legalidade das normas instituídas no edital e dos atos praticados na realização do concurso, sendo vedado o exame dos critérios de formulação de questões, de correção de provas e de atribuição de notas aos candidatos, matérias cuja responsabilidade é da banca examinadora. Precedentes.

                2. O exame das questões da prova, a pretexto de rever a sua adequação ao conteúdo programático, é vedado ao Poder Judiciário, pena de incursão no mérito administrativo, podendo, ainda, demandar dilação probatória, tendo em vista a especificidade técnica ou científica do conteúdo programático e da questão em discussão.

                3. Agravo regimental improvido”. (STJ, 1ª Turma, Agravo Regimental no Recurso em Mandado de Segurança nº 32.138-PR, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, j. 09.11.2010, DJe 17.12.2010).

 

                “PEDIDO DE SUSPENSÃO DOS EFEITOS DE MEDIDA LIMINAR - CONCURSO PÚBLICO PARA O PROVIMENTO DE CARGOS DE ANALISTA JUDICIÁRIO - CORREÇÃO DE PROVA DISCURSIVA ACERCA DE QUESTÃO DE DIREITO.

                Os critérios utilizados pela comissão de concurso na elaboração, correção e atribuição de notas não podem ser revistos pelo Poder Judiciário; fosse possível, o controle judicial do critério adotado a propósito de questão de Direito teria o Poder Judiciário de estender este controle a processos de seleção em outras áreas do conhecimento, v.g., física, química e matemática. Agravo regimental desprovido.” (STJ, Corte Especial, Agravo Regimental na Suspensão de Liminar e de Sentença nº 1.286-BA, Relator Ministro Ari Pargendler, j. 06.10.2010, DJe 14.12.2010).

 

                Imperioso anotar que a banca examinadora de Concurso Público detém, com exclusividade, a competência para elaborar e corrigir as provas.

                Ao Poder Judiciário, portanto, resta apenas controlar a legalidade do procedimento e a compatibilidade das questões com o conteúdo programático do Edital, que, como é sabido de todos, é a lei que rege o Certame.

                Neste juízo inicial, mormente diante das respostas dadas pela Fundação Dom Cintra aos correspondentes recursos administrativos interpostos pela agravante (fls. 113-119-TJ), não vislumbro qualquer ofensa ao princípio da legalidade na aplicação do certame.

                Acrescente-se que o mero inconveniente da possibilidade de demora no julgamento do feito não configura risco de dano irreparável ou de difícil e incerta reparação que justifique a urgência reclamada, enquanto que, efetivamente, é forçoso reconhecer a inexistência de risco da ineficácia da decisão que vier a ser proferida quando do julgamento definitivo do agravo, até porque a própria agravante afirmou na exordial da ação principal que o concurso foi homologado em 28.06.2012 (fl. 36-TJ).

                É prudente, assim, deixar ao caderno probatório o debate quanto às questões, de fato e de direito, pertinentes ao temário em conflito, pelo que não há qualquer censura à decisão agravada, até porque, repito, a regência legal (art. 273) fala em possibilidade e não em obrigação desta antecipação.

                Por derradeiro, sobreleva assentar que o recurso de agravo pode ser identificado como “recurso de aparas”, ou seja, através dele o segundo grau reexamina a decisão singular para ajustá-la à correta prestação jurisdicional, dela expungindo nulidades, teratologias ou abusos de direito, o quê não se identifica no caso em apreço.

                Com tais considerações, rejeito a preliminar de negativa de seguimento e, no mérito, nego provimento ao recurso, ressaindo prejudicado o pedido formulado pela agravada, Fundação Dom Cintra, da perda de objeto do item “b” das razões de agravo, pertinente à suspensão da homologação do Concurso Público ora questionado.

                Custas recursais pela agravante, suspensa, contudo, a exigibilidade pelo interstício previsto no art. 12 da Lei nº 1.060/1950, por litigar sob o pálio da assistência judiciária gratuita.

                DES. JUDIMAR BIBER - De acordo com o Relator.

                DES. JAIR VARÃO - De acordo com o Relator.

 

Súmula - “REJEITARAM A PRELIMINAR E, NO MÉRITO, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, RESSAINDO PREJUDICADO O PEDIDO DE PERDA DE OBJETO QUANTO À SUSPENSÃO DA HOMOLOGAÇÃO DO CONCURSO PÚBLICO.”

 

BOCO9222—WIN/INTER

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