NOTA 63, DE 01 DE OUTUBRO DE 2018, PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA
NACIONAL E COORDENADORIA-GERAL DA REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA FAZENDA NACIONAL -
MEF33189 - AD
Documento público.
Ausência de sigilo.
Recurso Especial nº 1.221.170/PR Recurso representativo de
controvérsia. Ilegalidade da disciplina de creditamento
prevista nas IN SRF nº 247/2002 e 404/2004. Aferição do conceito de insumo à
luz dos critérios de essencialidade ou relevância.
Tese definida em sentido desfavorável à Fazenda Nacional. Autorização
para dispensa de contestar e recorrer com fulcro no art. 19, IV, da Lei nº
10.522, de 2002, e art. 2º, V, da Portaria PGFN nº 502, de 2016.
Nota Explicativa do art. 3º da Portaria Conjunta
PGFN/RFB nº 01/2014.
I
Objetivo da presente Nota Explicativa
1. Trata-se da análise do julgamento do Recurso Especial (RESP) nº
1.221.170/PR,[1] submetido à sistemática dos recursos repetitivos de que tratam
os arts. 1.036 e seguintes do nCPC,
no qual o Superior Tribunal de Justiça (STJ) assentou as seguintes teses
"(a) é ilegal a disciplina de creditamento
prevista nas Instruções Normativas da SRF ns.
247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal
como definido nas Lei nº 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo
deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja,
considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item -
bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada
pelo Contribuinte."
2. Pretende-se, nesta Nota Explicativa, formalizar a orientação da
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN quanto à dispensa de contestação
e recursos nos processos judiciais que versem acerca da matéria julgada em
sentido desfavorável à União, bem como delimitar a extensão e o alcance do
julgado, viabilizando a adequada observância da tese por parte da Secretaria da
Receita Federal do Brasil - RFB.
II
Breve relato da controvérsia
3. O STJ, apreciando a matéria sujeita à análise, decidiu
desfavoravelmente à Fazenda Nacional, consoante se irá detalhar no tópico da
delimitação do julgado.
4. Por meio do Memorando SEI nº 15/2018/CASTJ/PGACET/PGFN-MF, de 08 de
junho de 2018, a Secretaria da Receita Federal do Brasil foi cientificada
quanto à publicação do acórdão do RESP nº 1.221.170/PR, em 24 de abril de 2018,
e da provável inclusão da matéria na lista de dispensa de contestar e recorrer,
porquanto os Embargos de Declaração opostos em face do acórdão visam apenas ao
esclarecimento de que a tese firmada não afasta as hipóteses em que a própria
legislação veda o creditamento. Não foram
encaminhadas, até a presente data, a esta Coordenação-Geral, quaisquer
considerações ou questionamentos quanto à extensão, ao alcance ou à
operacionalização do cumprimento da decisão, na forma do art. 2º, §2º, da
Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 01/2014.
5. É o relato da controvérsia. Passa-se à apreciação.
III
Delimitação do julgado
6. Consoante já relatado, o STJ julgou o RESP 1.221.170/RS, submetido à
sistemática dos arts 1.036 e seguintes do nCPC, desfavoravelmente à Fazenda Nacional, definindo que a
disciplina de creditamento prevista nas Instruções
Normativas da SRF nº 247/2002 e 404/2004, uma vez que compromete a eficácia do
sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS
e da COFINS, conforme definido nas Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003.
Definiu-se também que o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios
de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade
ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para desenvolvimento da
atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
7. A empresa recorrente, no caso submetido à apreciação do STJ, pretendia
a adoção de conceito de insumo para os elementos, diretos e indiretos,
necessários à fabricação de produtos e a prestação e serviços de modo a
alcançar os custos gerais de fabricação e despesas gerais comerciais, que
seriam, na visão da empresa recorrente, imprescindíveis para toda a atividade
produtiva, conquanto não estivessem diretamente relacionados à sua atividade
final. Sustentava que as balizas interpretativas previstas nas Instruções
Normativas da SRF nº 247/2002 e 404/2004, as quais restringiam o direito de
crédito aos insumos que fossem diretamente agregados ao produto final, ou que
se desgastassem com o contato físico com o produto ou serviço final, impediriam
que se alcançasse a não-cumulatividade pretendida
pelas Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003.
8. Entendia a recorrente que o regime das referidas Instruções
Normativas seria justificável para tributo cuja materialidade seja a
industrialização de produtos, que seria justamente o caso do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI), porém não se aplicaria na hipótese do PIS e da
COFINS, que têm como materialidade a receita bruta.
9. A Fazenda Nacional defendeu a concepção restritiva adotada nos
normativos, inclusive, destacando que sua adoção impediria que fosse
desnaturada a hipótese material de incidência das contribuições incidentes
sobre o faturamento, de modo que passassem a incidir sobre o lucro.
Ressaltou-se que a interpretação restritiva encontrava ressonância na
jurisprudência do próprio STJ.
10. Sucessivamente, acaso não prevalecessem os critérios adotados pelas
Instruções Normativas da SRF nº 247/2002 e 404/2004, pugnou a Fazenda Nacional
por uma interpretação intermediária, aferindo-se a essencialidade do custo
diante da efetiva agregação de valor ao produto ou serviço final, de maneira
que, se subtraído o bem ou serviço, o produto final deixaria de existir ou não
seria mais útil.
11. Cumpre destacar que, conquanto o STJ tenha entendido pela
ilegalidade da
interpretação restritiva do conceito de insumo, não proibiu toda e
qualquer regulamentação feita em âmbito administrativo. O que o julgado
estabeleceu é que a regulamentação levada a efeito pelas Instruções Normativas
da SRF nº 247/2002 e 404/2004 fere a lógica da sistemática da não-cumulatividade prevista na legislação de regência para
as contribuições ao PIS e da COFINS, que se baseiam no faturamento/receita,
frustrando, portanto, a intenção contida nas leis, ao adotar a lógica da não-cumulatividade prevista para o IPI e o ICMS.
12. Com efeito, considerou-se que interpretação restritiva do conceito
de insumo inviabilizaria a tributação exclusiva do valor agregado do bem ou
serviço, como determina o comando legal contido no art. 3º, II, da Lei nº
10.637/2002 e no art. 3º, II, Lei nº 10.833/2003.
13. Conforme se depreende da Exposição de Motivos da Medida Provisória
(MP) nº 66/2002, a qual foi convertida na Lei nº 10.637/2002, a norma visava a
uma ampla reestruturação na cobrança das contribuições sociais incidentes sobre
o faturamento. Buscava-se, de forma gradual, introduzir a cobrança em regime de
valor agregado - inicialmente com o PIS/Pasep para,
posteriormente, alcançar a Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social (Cofins). Segundo o STJ, a interpretação
restritiva adotada pela Administração Fazendária inviabilizaria essa
sistemática introduzida pelas leis referidas.
14. Consoante se depreende do Acórdão publicado, os Ministros do STJ
adotaram a interpretação intermediária, considerando que o conceito de insumo
deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância. Dessa
forma, tal aferição deve se dar considerando-se a imprescindibilidade ou a
importância de determinado item para o desenvolvimento da atividade produtiva,
consistente na produção de bens destinados à venda ou de prestação de serviços.
15. Deve-se, pois, levar em conta as particularidades de cada processo
produtivo, na medida em que determinado bem pode fazer parte de vários
processos produtivos, porém, com diferentes níveis de importância, sendo certo
que o raciocínio hipotético levado a efeito por meio do "teste de
subtração" serviria como um dos mecanismos aptos a revelar a
imprescindibilidade e a importância para o processo produtivo.
16. Nesse diapasão, poder-se-ia caracterizar como insumo aquele item -
bem ou serviço utilizado direta ou indiretamente - cuja subtração implique a
impossibilidade da realização da atividade empresarial ou, pelo menos, cause
perda de qualidade substancial que torne o serviço ou produto inútil.
17. Observa-se que o ponto fulcral da decisão do STJ é a definição de
insumos como sendo aqueles bens ou serviços que, uma vez retirados do processo
produtivo, comprometem a consecução da atividade-fim da empresa, estejam eles
empregados direta ou indiretamente em tal processo. É o raciocínio que decorre
do mencionado "teste de subtração" a que se refere o voto do Ministro
Mauro Campbell Marques.
18. Convém destacar desde já que, se, por um lado, a decisão do STJ, no
recurso repetitivo ora examinado, afastou o critério mais restritivo adotado
pelas Instruções Normativas SRF nº 247/2002 e 404/2004, por outro lado,
igualmente, repeliu que fosse adotado critério demasiado elastecido,
o qual iria desnaturar a hipótese de incidência das contribuições do PIS e da
COFINS. Destarte, entendeu o STJ que o conceito de insumos, para fins da não-cumulatividade aplicável às referidas contribuições,
não corresponde exatamente aos conceitos de "custos e despesas
operacionais" utilizados na legislação do Imposto de Renda.
19. Assim, impende ressaltar que uma das balizas do julgado é a de que
não serão todas as despesas realizadas com a aquisição de bens e serviços para
o exercício da atividade empresarial precípua direta ou indiretamente que serão
consideradas insumos, para fins de creditamento do
PIS/COFINS.
20. Destacou-se, na decisão, que a não-cumulatividade
do PIS/COFINS, diferentemente do que ocorre com o IPI e o ICMS, é uma criação
legal, possuindo, pois, as características que as leis lhes conferem, de forma
que não se poderiam transplantar as características e conclusões próprias
daqueles impostos, na medida em que, para tais tributos, a não-cumulatividade
seria diversa.
21. Nesse contexto, constata-se do Voto do Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho, relator do RESP nº 1.221.170/PR, que o creditamento
do IPI/ICMS vincular-se-ia ao montante recolhido nas operações anteriores,
porque os fatos geradores desses impostos são, respectivamente, a
industrialização e a circulação de mercadorias. No caso do PIS e da COFINS, o creditamento, em verdade, seria um desconto, já que essas
contribuições possuem como fato gerador o próprio faturamento da empresa ou
entidade a ela equiparada.
22. Ainda segundo o Ministro Napoleão, adotando-se o entendimento
esposado por Hugo de Brito Machado em parecer, o creditamento
não consistiria em benefício fiscal, tampouco seria causa de suspensão ou
exclusão do crédito tributário, nem representaria dispensa do cumprimento de
obrigações acessórias, de forma que não precisaria ser necessariamente
interpretado de forma literal ou restritiva, como está no art. 111 do CTN.
23. Fundamental para compreensão do julgado é o voto da Ministra Regina
Helena Costa, a qual destacou a sistemática da não-cumulatividade,
no texto original da Constituição de 1988, veio expressamente contemplada para
dois impostos: o imposto sobre produtos industrializados (IPI) e o imposto
sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS). Nesse passo, a não-cumulatividade quanto aos impostos representaria
autêntica aplicação do princípio constitucional da capacidade contributiva,
objetivando impedir que o tributo se torne um "gravame cada vez mais
oneroso nas várias operações de circulação de produto ou mercadoria, de
prestação dos aludidos serviços e de industrialização de produtos, deixando-os
proibitivos."
24. Nesse contexto, a regra da não-cumulatividade
para o IPI e o ICMS colima evitar a incidência de imposto sobre imposto na
carga de tributos multifásicos, que são aqueles exigíveis em operações
sucessivas). Desse modo, com o intuito de evitar a "tributação em
cascata", estabelece-se um sistema de créditos que poderá ser usado como
forma de pagamento do tributo.
25. Ainda, no esclarecimento da Ministra Regina Helena Costa, para
tributos com outra configuração, como no caso das contribuições do PIS e da COFINS,
ainda que também lhes seja aplicável o princípio da capacidade contributiva,
por ostentarem a materialidade de imposto, a não-cumulatividade
deve revestir de sistema distinto.
26. Ora, essencial para a compreensão do julgado é observar que foi
ressaltada a diferença entre a sistemática da não-cumulatividade
para o IPI e o ICMS e para as contribuições do PIS/COFINS. Isso porque o
sistema das contribuições ao PIS e da COFINS não é aquele que garante o crédito
de tributo pago anteriormente.
27. Destarte, conquanto em ambos casos de não-cumulatividade
se vislumbre o objetivo de evitar a tributação em cascata, tratando-se de
contribuições cuja base de cálculo é a receita bruta ou faturamento, como não
há uma conexão direta com determinado produto ou mercadoria, a técnica da não-cumulatividade a se observar é a de base sobre base,
encontrando-se o tributo a pagar por meio da aplicação da alíquota sobre a
diferença entre as receitas auferidas e determinadas despesas.
28. O precedente do STJ buscou, então, a definição de insumo para fins
da não-cumulatividade de que trata as Leis nº
10.637/2002 e 10.833/2003, de modo a conferir eficácia a esse sistema. Isso
porque a mencionadas leis não definem o que deve ser considerado como insumo
para fins da sistemática de não-cumulatividade.
Entendeu o STJ, contudo, que, não obstante a adoção de conceito indeterminado
de insumos pelas mencionadas leis, delas é possível extrair balizas, na medida
em que nem se poderia adotar conceituação demasiado ampla, como seria a da legislação
do Imposto de Renda (IR), tampouco assaz restritiva, como a do IPI, a ponto de
comprometer a sistemática da não-cumulatividade.
29. A respeito da impossibilidade de adoção do conceito de insumos
adotado pela legislação própria do IPI, releva transcrever excerto do voto do
Ministro Mauro Campbell Marques,[2] também bastante elucidativo para
compreensão do entendimento firmado:
" (...) não há respaldo legal para que seja adotado conceito
excessivamente restritivo de ‘utilização na produção’ (terminologia legal),
tomando-o por ‘aplicação ou consumo direto na produção’ e para que seja feito
uso na sistemática do Pis/Pasep
e Cofins não-cumulativos,
do mesmo conceito de ‘insumos’ adotado pela legislação própria do IPI.
(...) Isto porque quando o legislador deseja importar tal conceituação
de ‘insumos’ para fins de cálculo de benefícios fiscais, ou faz expressamente,
como o fez, v.g., na hipótese do crédito presumido de
IPI, como ressarcimento das contribuições ao Pis/Pasep e à Cofins, previsto no
art. 1º, da Lei n. 9.363/96.
Na suso citada lei, há expressa previsão para
que sejam utilizados subsidiariamente os conceitos de produção, matéria-prima,
produtos intermediários e material de embalagem previstos na legislação do IPI.
(...)
Diferentemente, nas leis que tratam do Pis/Pasep e Cofins não-cumulativos não há menção a qualquer arcabouço
normativo em vigor para se colher o conceito de "insumos’.
Na mesma linha de raciocínio, outras razões também se me afiguram
suficientes a impedir a utilização do conceito de ‘insumos’ previsto para a
legislação do IPI. Vejamos.
(...)
Por sua vez, a não-cumulatividade da
contribuição ao Pis e da Cofins
instituída pelas Leis 10.637 e 10.833 - ainda que a expressão utilizada pelo
legislador seja idêntica - apresenta perfil totalmente diverso daquela
pertinente ao IPI, visto que a previsão legal possibilita a dedução dos valores
de determinados bens e serviços suportados pela pessoa jurídica dos valores a
serem recolhidos a título dessas contribuições, calculados pela aplicação da
alíquota correspondente sobre a totalidade das receitas por elas auferidas.
Como se verifica, na técnica de arrecadação dessas contribuições, não há
propriamente um mecanismo não-cumulativo, decorrente
do creditamento de valores das entradas de bens que
sofrerão nova incidência em etapa posterior da cadeia produtiva, nos moldes do
que existe para aquele imposto (IPI).
(...) Ou seja, esses tributos não têm sua materialidade restrita apenas
aos bens produzidos, mas sim à aferição de receitas, cuja amplitude torna
inviável sua vinculação ao valor exato da tributação incidente em cada etapa
anterior do ciclo produtivo. Note-se também que, para fins de creditamento do Pis e da Cofins, admite-se que a prestação de serviços seja considerada
como insumo, o que já leva à conclusão de que as próprias Leis 10.637/3003 e
10.833/3003 elasteceram a definição de ‘insumos’, não
se limitando apenas aos elementos físicos que compõem o produto.
(...)
Não se trata, portanto, de desonerar a cadeia produtiva, mas sim o
processo produtivo de um determinado produtor ou a atividade-fim de determinado
prestador de serviço.
(...)
Assim, a restrição pretendida pelas Instruções Normativas para o
conceito de insumos aos elementos consumidos no processo operacional, além de
ir de encontro à própria essência do princípio da não-cumulatividade,
acaba por gerar ampliação da carga tributária das contribuições em comento.
Dessa forma, é inexorável a conclusão de que os referidos atos
normativos fazendários, ao validarem o creditamento
apenas quando houver a efetiva incorporação do insumo ao processo produtivo de
fabricação e comercialização de bens ou prestação de serviços, adotando o
conceito de insumos com acepção restrita, em analogia à conceituação adotada
pela legislação do IPI, acabaram por extrapolar os termos do ordenamento
jurídico hierarquicamente superior, in casu, as leis
10.637/2002 e 10.833/2002, pois vão de encontro à finalidade da sistemática de não-cumulatividade da contribuição para o Pis e da Cofins." (grifos
ausentes no original)
30. Se por um lado o critério para aferição de insumos próprio da
legislação de IPI revela-se inadequado, por outro, igualmente o seria adotar a
legislação do imposto de renda. Sobre o ponto, cumpre também destacar que o
Ministro Mauro Campbell Marques também explica a impossibilidade de utilização
exclusiva da legislação do IRPJ, com o objetivo de encontrar o conceito de
"insumos", dentro da sistemática da não-cumulatividade
do PIS/COFINS. Confira-se:
"(...) não compartilho do entendimento pela possibilidade de
utilização isolada da legislação do IR para alcançar a definição de ‘insumos’
pretendida. Reconheço, no entanto, que o raciocínio desenvolvido já ilumina o
caminho para a solução da controvérsia ao elencar a essencialidade ao processo
produtivo como atributo utilizável no conceito de ‘insumos’ e a desvinculação
das definições próprias do IPI.
Como já mencionei, o legislador, quando deseja importar a conceituação
de ‘insumos’ para fins de cálculo de benefícios fiscais, o faz expressamente,
como fez, v.g., na hipótese do crédito presumido de
IPI, como ressarcimento das contribuições ao PIS/PASEP e à COFINS, previsto no
art. 1º, da Lei 9.363/96.
Na já referida lei, além da expressa previsão para que sejam utilizados
subsidiariamente os conceitos de produção, matéria-prima, produtos
intermediários e material de embalagem previstos na legislação do IPI, também
há a previsão para o uso dos conceitos de receita operacional bruta colhidos da
legislação do IR. (...)
Diferentemente, e já mencionei isso quando afastei a utilização da
legislação do IPI para alcançar a conceituação pretendida, nas leis que tratam
do PIs/Pasep e Cofins não-cumulativos não há
menção a qualquer arcabouço normativo em vigor para se colher o conceito de ‘insumos’.
De outro ângulo, a utilização da legislação do IR também encontra o
óbice do excessivo alargamento do conceito de ‘insumos’ ao equipará-lo ao
conceito contábil de ‘custos e despesas operacionais’ que abarca todos os
custos e despesas que contribuem para produção de uma empresa, perdendo a
conceituação uma desejável proximidade ao processo produtivo e à atividade-fim,
que é o que se intenta desonerar, passando-se a desonerar o produto como um
todo e não especificamente o processo produtivo. Como já mencionei, não se
trata de desonerar a cadeia produtiva ou o produtor, mas o processo produtivo
de determinado produtor ou a atividade-fim de determinado prestador de serviço.
O intuito de desoneração da cadeia produtiva leva a um conceito
restritivo de ‘insumos’, a exemplo do IPI. A desoneração do produtor,
independentemente da especificidade de sua atividade, leva a um conceito
ampliativo de ‘insumos’, a exemplo das ‘despesas e custos operacionais’ do IR.
Já desoneração do processo produtivo, da atividade específica desempenhada e
daquilo que lhe é essencial, leva ao conceito desejável de ‘insumos’, que foi o
objetivado pela lei.
Com efeito, o conceito de ‘insumos’ não é próprio da legislação do Imposto
de Renda que faz uso de termos jurídico-contáveis, a exemplo dos termos ‘Custos
de mercadorias ou serviços’ e ‘Despesa Operacional’. Sob o signo ‘Despesas
Operacionais’ se encontra uma miríade de despesas que sequer se aproximam de um
conceito formulado pelo senso comum de ‘insumos’.
(...)
De fato, o excesso da amplitude do conceito já foi identificado em
doutrina, ao admitir a exclusão do creditamento em
relação às aquisições destinadas aos setores administrativos.
(...)
Além disso, a base de cálculo das contribuições ao PIs/Pasep e Cofins é a receita bruta
da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as
demais receitas auferidas pela pessoa jurídica (art. 1º da Lei 10.637/2002)
A exclusão do ‘Custo das mercadorias ou serviços’ e das ‘Despesas
Operacionais’ da base de cálculo das contribuições ao Pis/Pasep e Cofins, sob o pretexto de
serem considerados ‘insumos’, acaba por modificá-la por inteiro ao ponto de ser
tributado somente o Lucro Operacional (corresponde ao lucro relacionado ao
objeto social da empresa) somado às Receitas não Operacionais (receitas não
relacionadas diretamente com o objetivo social da empresa), desnaturando as
contribuições e aproximando a sua base de cálculo àquela do Imposto de Renda - IR
e da Contribuição sobre o Lucro Líquido - CSLL.
De observar que a base de cálculo do Imposto de Renda nada mais é que o
Lucro Operacional somado ao Resultado não Operacional (diferença entre Receitas
não Operacionais e Despesas não Operacionais) com as inclusões e exclusões
previstas para a apuração do Lucro Real.
Se esse fosse o objetivo do legislador, já teria produzido lei que
assim o determinasse expressamente. Seria muito mais simples, pois significaria
a aplicação de conceitos já sedimentados em doutrina e jurisprudência. Não o
fez. Preferiu adotar o signo ‘insumos’ para definir o que pode ser abatido da
base de cálculo para efeito da não-cumulatividade.
Fez uso de um conceito jurídico indeterminado. Isso demonstra o intuito do
legislador de não abater da base de cálculo das contribuições ao PIS/COFINS
todo e qualquer Custo ou Despesa Operacional, como deseja parte da doutrina e
como decidiu o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF em acórdão já
aqui referido." (grifos ausentes no original)
31. Diante da inexistência de definição do conceito de insumos nas Lei
nº 10.637/2002 e 10.833/2003, as Instruções Normativas nº 247/2002 e 404/2004,
para autorizar o creditamento de insumos, traduziram
o conceito de impostos incidentes sobre operações que tenham por objeto bens,
no caso do IPI, por isso a disciplina seria ilegal. A Ministra Regina Helena
Costa destacou em seu voto que existiria um claro descompasso entre o sistema
de não-cumulatividade estabelecido para as
contribuições cuja base de cálculo é a receita bruta ou faturamento e a
disciplina estabelecida pela Administração Tributária nas referidas Instruções
Normativas, ao conceituar insumos com inspiração na disciplina do IPI.
32. Assim, a vedação ao creditamento de
despesas que seriam insumos ofenderia a sistemática da não-cumulatividade
das leis e comprometeria, por conseguinte, o próprio princípio da capacidade
contributiva, porque terminaria acarretando, na prática, a CUMULATIVIDADE das
mencionadas contribuições. Propôs, então, a Ministra Regina Helena Costa que o
conceito de insumos - considerado indeterminado - para fins da não-cumulatividade decorrente da disciplina legal seja
extraído segundo critérios de essencialidade ou relevância:
"penso seja possível extrair das leis disciplinadoras dessas
contribuições o conceito de insumos segundo critérios da ESSENCIALIDADE ou
RELEVÂNCIA, vale dizer, considerando-se a importância do item - bem ou serviço
- para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo
contribuinte."
33. O julgado abriu margem para que sejam considerados insumos
elementos que, mesmo indiretamente repercutam no produto ou prestação de
serviços. A Fazenda Nacional sustentava que insumo seria elemento que, em razão
da sua função direta exercida sobre o produto ou serviço a em andamento ou
sobre o produto em fabricação, repercute no produto final ou na prestação de
serviço final, e do qual decorrerá a receita ou faturamento objeto da
incidência da contribuição do PIS e da COFINS.
34. Da adoção dos critérios de essencialidade ou relevância pode-se
afirmar que não é qualquer despesa genérica realizada dentro do processo
produtivo que irá gerar o creditamento para fins de não-cumulatividade das contribuições do PIS e da COFINS.
35. O STJ, seguindo o voto da Ministra Regina Helena Costa adotou a
posição intermediária quanto ao conceito de insumo, ao adotar os critérios de
relevância e essencialidade - também adotadas no CARF - e afastando o conceito
de insumo da legislação do IPI e IRPJ. De acordo com o voto da Ministra Regina
Helena estabeleceu-se o critério de relevância - mais abrangente que o de
pertinência adotado pelo Ministro Mauro Campbell Marques. Os Ministros Mauro
Campbell Marques e Napoleão Nunes Maia Filho realinharam os seus votos para
acompanhar Ministra Regina Helena Costa.
36. Com a edição das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, o legislador
infraconstitucional elencou vários elementos que como regra integram cadeias
produtivas, considerando-os, de forma expressa, como ensejadores
de créditos de PIS e COFINS, dentro da sistemática da não-cumulatividade.
Há, pois, itens dentro do processo produtivo cuja indispensabilidade material
os faz essenciais ou relevantes, de forma que a atividade-fim da empresa não é
possível de ser mantida sem a presença deles, existindo outros cuja
essencialidade decorre por imposição legal, não se podendo conceber a
realização da atividade produtiva em descumprimento do comando legal. São itens
que, se hipoteticamente subtraídos, não obstante não impeçam a consecução dos
objetivos da empresa, são exigidos pela lei, devendo, assim, ser considerados
insumos.
37. Há bens essenciais ou relevantes ao processo produtivo que nem
sempre são nele diretamente empregados. O conceito de insumo não se atrela necessariamente
ao produto, mas ao próprio processo produtivo.
38. Não devem ser consideradas insumos as despesas com as quais a
empresa precisa arcar para o exercício das suas atividades que não estejam intrinsicamente relacionadas ao exercício de sua atividade-fim
e que seriam mero custo operacional. Isso porque há bens e serviços que possuem
papel importante para as atividades da empresa, inclusive para obtenção de
vantagem concorrencial, mas cujo nexo de causalidade não está atrelado à sua
atividade precípua, ou seja, ao processo produtivo relacionado ao produto ou
serviço.
39. Vale dizer que embora a decisão do STJ não tenha discutido
especificamente sobre as atividades realizadas pela empresa que ensejariam a
existência de insumos para fins de creditamento, na
medida em que a tese firmada refere-se apenas à atividade econômica do
contribuinte, é certo, a partir dos fundamentos constantes no Acórdão, que
somente haveria insumos nas atividades de produção de bens destinados à venda
ou de prestação de serviços. Desse modo, é inegável que inexistem insumos em
atividades administrativas, jurídicas, contábeis, comerciais, ainda que
realizadas pelo contribuinte, se tais atividades não configurarem a sua
atividade-fim.
40. Nota-se, pois, que o STJ, ao definir pela utilização dos critérios
de essencialidade e relevância, segundo a importância do item para o
desenvolvimento da atividade-fim da empresa, no intuito de obter o conceito de
insumos para fins da não-cumulatividade prevista pela
legislação do PIS/COFINS, aludiu à aferição objetivamente considerada,
afastando, destarte, que o item seja subjetivamente considerado sob a ótica da
empresa ou do empresário.
41. Consoante se observa dos esclarecimentos do Ministro Mauro Campbell
Marques, aludindo ao "teste de subtração" para compreensão do
conceito de insumos, que se trata da "própria objetivação segura da tese
aplicável a revelar a imprescindibilidade e a importância de determinado item -
bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada
pelo contribuinte". Conquanto tal método não esteja na tese firmada, é um
dos instrumentos úteis para sua aplicação in concreto.
42. Insumos seriam, portanto, os bens ou serviços que viabilizam o
processo produtivo e a prestação de serviços e que neles possam ser direta ou
indiretamente empregados e cuja subtração resulte na impossibilidade ou
inutilidade da mesma prestação do serviço ou da produção, ou seja, itens cuja
subtração ou obste a atividade da empresa ou acarrete substancial perda da
qualidade do produto ou do serviço daí resultantes.
43. O raciocínio proposto pelo "teste da subtração" a revelar
a essencialidade ou relevância do item é como uma aferição de uma "conditio sine qua
non" para a produção ou prestação do serviço.
Busca-se uma eliminação hipotética, suprimindo-se mentalmente o item do
contexto do processo produtivo atrelado à atividade empresarial desenvolvida.
Ainda que se observem despesas importantes para a empresa, inclusive para o seu
êxito no mercado, elas não são necessariamente essenciais ou relevantes, quando
analisadas em cotejo com a atividade principal desenvolvida pelo contribuinte,
sob um viés objetivo.
44. Decerto, sob a ótica do produtor, não haveria sentido em fazer
despesa desnecessária (que não fosse relevante ou essencial do ponto de vista
subjetivo, como se houvesse uma menor eficiência no seu processo produtivo),
mas adotar o conceito de insumo sob tal prisma implicaria elastecer
demasiadamente seu conceito, o que foi, evidentemente, rechaçado no julgado.
Esse tipo de despesa - importante para o produtor - configura custo da empresa,
mas não se qualifica como insumo dentro da sistemática de creditamento
de PIS/COFINS. Ainda que se possa defender uma importância global desse tipo de
custo para a empresa, não há importância dentro do processo produtivo da
atividade-fim desempenhada pela empresa.
45. Com efeito, importa destacar que não foi a intenção do legislador
autorizar ampla desoneração fiscal, mas buscar a tributação do valor agregado
do bem ou serviço, diminuindo os efeitos da tributação em cascata, para
aumentar a horizontalidade na produção. Não é por outro motivo que a
importância ou não do item deve ser aferida de forma objetiva, analisando-se a
atividade econômica desenvolvida e aqueles elementos que lhe são essenciais ou
relevantes, quais sejam, aqueles que fazem parte - direta ou indiretamente - do
processo produtivo - cuja ausência acarrete na impossibilidade da prestação do
serviço ou da produção ou que lhe torne inúteis.
46. O objetivo da adoção da sistemática não-cumulativa
para o PIS/COFINS, conforme destacado no voto da Ministra Assusete
Magalhães e também do Ministro Og Fernandes, ao citar
as Exposições de Motivos das Medidas Provisórias que resultaram nas Leis nº
10.637/2002 e 10.833/2003, foi estimular a eficiência econômica, com geração de
condições para um crescimento da economia mais acelerado, vislumbrando-se a
sistemática não-cumulativa como instrumento para
correção de distorções relevantes que seriam decorrência da cobrança cumulativa
do tributo, a exemplo de vertificalização artificial
de empresas, em detrimento da distribuição da produção entre um número maior de
empresas mais eficientes de menor porte. Seria, nesse contexto, modelo que
proporcionaria maior competitividade dos produtos nacionais.
47. Demais disso, ainda nessa linha de raciocínio, é possível extrair
do julgado que, conquanto os critérios de relevância e essencialidade não sejam
sinônimos, para fins da não-cumulatividade das Leis
nº 10.637/2002 e 10.833/2003, possuem sentido muito próximos.
Essencialidade e relevância, conquanto sejam diferentes, no sentido da
interpretação do julgado, são conceitos bastante aproximados, de forma que não
se possa conceber o produto ou serviço sem aquele item, seja porque impossível
a prestação do serviço ou a produção, seja porque da ausência do item decorra
inutilidade do produto ou serviço.
48. A Ministra Regina Helena Costa esclareceu em seu voto que o item
atende ao critério da essencialidade quando configura elemento estrutural e
inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço ou, minimamente,
quando sua falta prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência. É, portanto,
essencial é o item, dentro do processo produtivo, do qual dependa "intrínseca
e fundamentalmente" o produto ou serviço.
49. Já o item relevante, ainda no escólio da Ministra Regina Helena
Costa, é aquele cuja finalidade, conquanto não seja indispensável à elaboração
do próprio produto ou serviço integra o processo de produção, ou pelas
singularidades de cada cadeia produtiva ou por imposição legal. Nesse passo, a
Ministra entendeu que o critério da relevância seria mais abrangente que o da
pertinência (que havia sido proposto pelo Ministro Mauro Campbell Marques), na
medida que esta seria caracterizada pelo emprego na produção ou na execução do
serviço.
50. Outro aspecto que pode ser destacado na decisão do STJ é que, ao
entender que insumo é um conceito jurídico indeterminado, permitiu-se uma
conceituação diferenciada, de modo que é possível que seja adotada definição
diferente a depender da situação, o que não configuraria confusão,
diferentemente do que alegava o contribuinte no Recurso Especial.
51. O STJ entendeu que deve ser analisado, casuisticamente, se o que se
pretende seja considerado insumo é essencial ou relevante para o processo
produtivo ou à atividade principal desenvolvida pela empresa. Vale ressaltar
que o STJ não adentrou em tal análise casuística já que seria incompatível com
a via especial.
52. Determinou-se, pois, o retorno dos autos, para que observadas as
balizas estabelecidas no julgado, fosse apreciada a possibilidade de dedução
dos créditos relativos aos custos e despesas pleiteados pelo contribuinte à luz
do objeto social daquela empresa, ressaltando-se as limitações do exame na via
mandamental, considerando as restrições atinentes aos aspectos probatórios.
53. Vale ressaltar que tal análise casuística é voltada para o julgador
do caso concreto nas instâncias ordinárias, mas não para Administração. Ainda
que o precedente, além de traçar as balizas a serem adotadas pelas instâncias
ordinárias do Poder Judiciário, também deva ser observado pela Administração,
isso não conduz ao entendimento de que seria impossível a regulamentação
administrativa.
54. Em verdade, conforme já salientado no bojo da presente
manifestação, o precedente do STJ reputou ilegal a sistemática adotada nas INs SRF 247/2002 e 404/2004, por ferirem a sistemática da não-cumulatividade prevista nas Leis nº 10.637/2002 e
10.833/2003. O julgado, todavia, não asseverou a impossibilidade de
regulamentação na seara administrativa.
55. Entende-se possível a regulamentação para fins de aplicação da não-cumulatividade prevista para o PIS e para a COFINS,
desde que observados os parâmetros do precedente do STJ. Com efeito, uma
regulamentação calcada nas balizas do julgado, considerando os critérios de
relevância e essencialidade dos elementos para os processos produtivos, para
definição dos itens que ensejarão créditos dentro da sistemática das contribuições
do PIS e da COFINS não-cumulativos, revela-se, em
verdade, salutar, na medida em que pode conferir uniformidade no tratamento de
contribuintes que desenvolvem a mesma atividade produtiva, evitando-se
distorções concorrenciais e garantindo-se maior segurança jurídica.
56. Outrossim, uma nova disciplina que contemple as diretrizes traçadas
no julgado do STJ é também desejável do ponto de vista da redução da
litigiosidade, já que a ausência de um critério objetivo por parte da
Administração pode resultar em um excesso de questionamentos judiciais -
sobretudo nas instâncias ordinárias - para que se determine quais elementos
poderiam ser considerados insumos ou não dentro da sistemática da não-cumulatividade.
57. Decerto não foi o objetivo do precedente do STJ ampliar a
litigiosidade nas instâncias ordinárias, na medida em que se pretendeu com a
tese adotada lançar luzes para solução das diversas controvérsias existentes.
Sendo assim, a regulamentação administrativa que incorpore o que restou consagrado
e debatido no bojo do Resp nº 1.221.170/PR contribui
para dirimir a miríade de conflitos existentes sobre a aplicação da sistemática
da não-cumulatividade das contribuições do PIS e da
COFINS.
58. Vale mencionar que existe discussão acerca da constitucionalidade
da sistemática não cumulativa, tendo em vista que no Recurso Extraordinário nº
607.642/RJ foi reconhecida a repercussão geral da constitucionalidade da Medida
Provisória nº 66/2002 (convertida na Lei nº 10.637/2002) no tocante ao ponto
que introduziu a não-cumulatividade para a
contribuição ao PIS, incidente sobre o faturamento das pessoas jurídicas
prestadoras de serviço, com a respectiva majoração da alíquota, tendo em vista
a possibilidade de aproveitamento de créditos (Tema 337). Embora o tema
submetido à repercussão geral esteja relacionado à presente Nota, não impede as
considerações ora formuladas.
59. Registra-se também a existência do RE nº 841.979/PE, no qual se
discute a
constitucionalidade do §12 do art. 195 da Constitucional Federal,
dentro da sistemática de repercussão geral (Tema 756), também pendente de
julgamento.[3] O viés da discussão nesse caso, ainda que a Fazenda Nacional
saia vencedora, não impacta no conceito de insumos definido pelo STJ, já que a
discussão relativa ao referido Recurso Extraordinário consiste no exame da
possibilidade de a legislação impor restrição à sistemática do creditamento, não se discutindo a interpretação a ser
conferida a essas restrições impostas pela legislação. Não há, portanto, óbices
à elaboração da presente Nota Explicativa, enquanto pendente o julgado, nos
termos do art. 19, V, da Lei nº 10.522/2002.
60. Por fim, é importante mencionar que, embora não esteja tão claro no
Acórdão[4], constando apenas no Voto da Ministra Assusete
Magalhães, não devem ser enquadradas como insumo as despesas cujo creditamento é, de forma expressa, vedado por lei.
Ressalvam-se, pois, do entendimento firmado pelo STJ, as vedações e limitações
de creditamento previstas em lei.
61. Destaca-se, nesse ponto, excerto do voto da Ministra Assusete Magalhães: "Pela perspectiva da zona de
certeza negativa, quanto ao que seguramente se deve excluir do conceito de ‘insumo’,
para efeito de creditamento do PIS/COFINS, observa-se
que as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 trazem vedações e limitações ao desconto
de créditos. Quanto às vedações, por exemplo, o art. 3º, §2º, de ambas as Leis
impede o crédito em relação aos valores de mão de obra pagos a pessoa física e
aos valores de aquisição de bens e serviços não sujeitos ao pagamento das
contribuições. Já como exemplos de limitações, o art. 3º, §3º, das referidas
Leis estabelece que o desconto de créditos aplica-se, exclusivamente, em
relação aos bens e serviços adquiridos de pessoas jurídicas domiciliadas no
País e aos custos e despesas pagos ou creditados a pessoas jurídicas também
domiciliadas no território nacional."
62. Dessa forma, verifica-se que as despesas que possuem regras
específicas contidas nas Leis nº 10.637/2002, 10.833/2003 e 10.865/2005, as
quais impedem o creditamento de PIS/COFINS, não devem
ser abrangidas pelo conceito de insumo, mesmo que, eventualmente, utilizando-se
os critérios de essencialidade e relevância ao objeto social do contribuinte,
pudesse ser defendida sua importância para o processo produtivo. Deve
prevalecer o disposto na própria legislação, que impõe vedação e limite ao creditamento.
63. Imperioso salientar que a leitura açodada do Acórdão não pode levar
à conclusão de que tais vedações poderiam ser ignoradas, ampliando-se, além dos
limites legais, o conceito de insumo, a pretexto de serem adotados os critérios
aludidos no precedente do STJ. Tal pretensão, além de contrariar frontalmente a
legislação, não estaria abarcada pela extensão do julgado.
IV
Repercussão do entendimento no âmbito administrativo
64. Feitas essas considerações, conclui-se que, por força do disposto
nos §§ 4º, 5º e 7º do art. 19, da Lei nº 10.522, de 2002, a Secretaria da
Receita Federal do Brasil deverá observar o entendimento do STJ de que:
"(a) é ilegal a disciplina de creditamento
prevista nas Instruções Normativas da SRF ns.
247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal
como definido nas Lei nº 10.637/2002 e 10.833/2003; e
(b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de
essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou
a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da
atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.
65. Considerando a pacificação da temática no âmbito do STJ sob o
regime da repercussão geral (art. 1.036 e seguintes do CPC) e a consequente
inviabilidade de reversão do entendimento desfavorável à União, a matéria
apreciada enquadra-se na previsão do art. 19, inciso IV, da Lei nº 10.522, de
19 de julho de 2002[5] (incluído pela Lei nº 12.844, de 2013), c/c o art. 2º,
V, da Portaria PGFN nº 502, de 2016, os quais autorizam a dispensa de contestação
e de interposição de recursos, bem como a desistência dos já interpostos, por
parte da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
66. O entendimento firmado pelo STJ deverá, ainda, ser observado no
âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, nos termos dos §§ 4º, 5º e
7º do art. 19, da Lei nº 10.522, de 2002[6], cumprindo-lhe, inclusive, promover
a adequação dos atos normativos pertinentes (art. 6º da Portaria Conjunta
PGFN/RFB nº 01, de 2014).
67. Por fim, cumpre esclarecer que o precedente do STJ apenas definiu
abstratamente o conceito de insumos para fins da não-cumulatividade
da contribuição ao PIS e da COFINS. Destarte, tanto a dispensa de contestar e
recorrer, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, como a
vinculação da Secretaria da Receita Federal do Brasil estão adstritas ao
conceito de insumos que foi fixado pelo STJ, o qual afasta a definição
anteriormente adotada pelos órgãos, que era decorrente das Instruções
Normativas da SRF nº 247/2002 e 404/2004.
68. Ressalte-se, portanto, que o precedente do STJ não afasta a análise
acerca da subsunção de cada item ao conceito fixado pelo STJ. Desse modo, tanto
o Procurador da Fazenda Nacional como o Auditor-Fiscal que atuam nos processos
nos quais se questiona o enquadramento de determinado item como insumo ou não
para fins da não-cumulatividade da contribuição ao
PIS e da COFINS estão obrigados a adotar o conceito de insumos definido pelo
STJ e as balizas contidas no RESP nº
1.221.170/PR, mas não estão obrigados a, necessariamente, aceitar o
enquadramento do item questionado como insumo. Deve-se, portanto, diante de
questionamento de tal ordem, verificar se o item discutido se amolda ou não na
nova conceituação decorrente do Recurso Repetitivo ora examinado.
V
Encaminhamentos
69. Ante o exposto, propõe-se seja autorizada a dispensa de contestação
e recursos sobre o tema em enfoque, com fulcro no art. 19, IV, da Lei nº
10.522, de 2002, c/c o art. 2º, V, da Portaria PGFN nº 502, de 2016, nos termos
seguintes: 1.31 - PIS/COFINS
r) conceito de insumo tal como empregado nas Leis 10.637/02 e 10.833/03
para o fim de definir o direito (ou não) ao crédito de PIS e COFINS dos valores
incorridos na aquisição. Resumo: o STJ decidiu que é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF nº
247/2002 e 404/2004, na medida em que comprometeria a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal
como definido nas Lei nº 10.637/2002 e 10.833/2003. Além disso, decidiu que o
conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou
relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de
determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade
econômica desempenhada pelo Contribuinte.
Observação 1. Observa-se que o STJ adotou a interpretação intermediária
acerca da definição de insumo, considerando que seu conceito deve ser aferido à
luz dos critérios de essencialidade ou relevância. Deve-se, pois, levar em
conta as particularidades de cada processo produtivo, na medida em que
determinado bem pode fazer parte de vários processos produtivos, porém, com
diferentes níveis de importância. Vale destacar que os critérios de
essencialidade e relevância estão esclarecidos no voto da Ministra Regina
Helena Costa, de maneira que se entende como critério da essencialidade aquele
que "diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o
produto ou serviço", a)"constituindo elemento essencial e inseparável
do processo produtivo ou da execução do serviço" ou "b) quando menos,
a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência".
Por outro lado, o critério de relevância "é identificável no item
cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à
prestação do serviço, integre o processo de produção, seja: a) "pelas
singularidades de cada cadeia produtiva" b) seja "por imposição
legal."
Observação 2. Se, por um lado, a decisão do STJ, no RESP nº 1.221.170/PR,
afastou o critério mais restritivo adotado pelas Instruções Normativas SRF nº
247/2002 e 404/2004, por outro lado, igualmente, repeliu que fosse adotado
critério demasiado elastecido, o qual iria desnaturar
a hipótese de incidência das contribuições do PIS e da COFINS. Entendeu o STJ
que o conceito de insumos, para fins da não-cumulatividade
aplicável às referidas contribuições, não corresponde exatamente aos conceitos
de "custos e despesas operacionais" utilizados na legislação do
Imposto de Renda. Desse modo, não serão todas as despesas realizadas com a
aquisição de bens e serviços para o exercício da atividade empresarial precípua
do contribuinte direta ou indiretamente que serão consideradas insumos. Ainda
que se observem despesas importantes para a empresa, inclusive para o seu êxito
no mercado, elas não são necessariamente essenciais ou relevantes, quando
analisadas em cotejo com a atividade desenvolvida, sob um viés objetivo. A
análise da essencialidade deve ser objetiva, dentro de uma visão do processo
produtivo, e não subjetiva, considerando a percepção do produtor ou prestador
de serviço.
Observação 3. Conquanto o STJ tenha entendido pela ilegalidade da
interpretação restritiva do conceito de insumo, não proibiu toda e qualquer
regulamentação feita em âmbito administrativo. O que o julgado estabeleceu é
que a regulamentação levada a efeito pelas Instruções Normativas da SRF nº
247/2002 e 404/2004 fere a lógica da sistemática da não-cumulatividade
prevista na legislação de regência para as contribuições ao PIS e da COFINS.
Observação 4. Ressalvam-se do entendimento firmado pelo STJ, as
vedações e limitações de creditamento previstas em
lei. Destarte, as despesas que possuem regras específicas contidas nas Leis nº
10.637/2002, 10.833/2003 e 10.865/2005, as quais impedem o creditamento
de PIS/COFINS, não devem ser abrangidas pelo conceito de insumo, mesmo que,
eventualmente, utilizando-se os critérios de essencialidade e relevância ao
objeto social do contribuinte, pudesse ser defendida sua importância para o
processo produtivo.
Observação 5. Destaque-se que tanto o Procurador da Fazenda Nacional
como o Auditor-Fiscal que atuam nos processos nos quais se questiona o
enquadramento de determinado item como insumo ou não para fins da não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS estão
obrigados a adotar o conceito de insumos definido pelo STJ e as balizas
contidas no RESP nº 1.221.170/PR, mas não estão obrigados a, necessariamente,
aceitar o enquadramento do item questionado como insumo. Deve-se, portanto,
diante de questionamento de tal ordem, verificar se o item discutido se amolda
ou não na nova conceituação decorrente do Recurso Repetitivo ora examinado.
Precedente: RESP nº 1.221.170/PR (temas 779 e 780)
70. Sugere-se que a presente Nota Explicativa, uma vez aprovada, seja
remetida à RFB para os fins da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 01/2014.
71. Propõe-se, ainda, que sejam realizadas as alterações pertinentes na
gestão de matérias no Sistema de Acompanhamento Judicial - SAJ, assim como a
inclusão do tema na lista de dispensa de contestar e recorrer disponível na
internet.
72. Por derradeiro, recomenda-se ampla divulgação da presente Nota
Explicativa no âmbito desta Procuradoria-Geral.
Documento assinado eletronicamente
FLÁVIA PALMEIRA DE MOURA COELHO
Procuradora da Fazenda Nacional
De acordo. À consideração superior.
Documento assinado eletronicamente
FILIPE AGUIAR DE BARROS
Coordenador-Geral da Representação Judicial
Aprovo. Encaminhe-se conforme proposto.
Documento assinado eletronicamente
CLAUDIO XAVIER SEEFELDER FILHO
Procurador-Geral Adjunto de Consultoria e Estratégia da Representação
Judicial e Administrativa Tributária
[1] Temas nº 779 e 780, sendo as questões submetidas a julgamento as
discussões acerca do conceito de insumo tal como empregado nas Leis 10.637/02 e
10.833/03 para o fim de definir o direito (ou não) ao crédito de PIS e COFINS
dos valores incorridos na aquisição.
[2] Convém mencionar que se trata de excerto do voto proferido pelo
Ministro Mauro Campbell Marques nos autos do RESP nº 1.246.317/MG, o qual foi
transcrito em seu voto no RESP nº 1.221.170/PR, para compreensão do
entendimento acerca do tema.
[3] Na realidade, além dos temas 337 e 756, cumpre registrar a
existência de outros Recursos Extraordinários também submetidos à técnica da
Repercussão Geral, cujo mérito tangencia e se relaciona com as questões nos
citados Recursos Extraordinários. São eles o RE 570122 (Tema 34), RE nº 599.316
(tema 244) e o RE nº 587108 (tema 179).
[4] Razão pela qual a CASTJ opôs embargos de declaração da decisão ora
examinada, de modo a integrar o precedente, de modo a fazer constar da sua
ementa que não podem ser consideradas como insumos as despisas
para as quais a legislação traga previsão de regra específica.
[5] Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a
não contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido
interposto, desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a
decisão versar sobre: (...) IV - matérias decididas de modo desfavorável à
Fazenda Nacional pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de julgamento realizado
nos termos do art. 543-B da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de
Processo Civil; (Incluído pela Lei nº 12.844, de 2013) (...)".
[6]"§ 4º A Secretaria da Receita Federal do Brasil não constituirá
os créditos tributários relativos às matérias de que tratam os incisos II, IV e
V do caput, após manifestação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional nos
casos dos incisos IV e V do caput. (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013) §
5o As unidades da Secretaria da Receita Federal do Brasil deverão reproduzir,
em suas decisões sobre as matérias a que se refere o caput, o entendimento
adotado nas decisões definitivas de mérito, que versem sobre essas matérias,
após manifestação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional nos casos dos
incisos IV e V do caput. (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013) § 7o Na
hipótese de créditos tributários já constituídos, a autoridade lançadora deverá
rever de ofício o lançamento, para efeito de alterar total ou parcialmente o
crédito tributário, conforme o caso, após manifestação da Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional nos casos dos incisos IV e V do caput. (Incluído pela Lei nº
12.844, de 2013)".
NOTA: CRJ/PGACET/PGFN-MF nº 63/2018 disponibilizada no portal da
Receita Federal do Brasil, acesso em 01.10.2018.
MEF33189
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