PROVA - RECONSTITUIÇÃO DOS FATOS, COM A PARTICIPAÇÃO DO JUIZ, DAS PARTES, E DOS AUXILIARES DA JUSTIÇA, VISANDO À CONSTRUÇÃO DA SENTENÇA, QUE É UM ATO ESSENCIALMENTE DEMOCRÁTICO - VALORAÇÃO E VALORIZAÇÃO DA PROVA - SISTEMA DA PERSUASÃO RACIONAL - ARGUIÇÃO DE NULIDADE - REJEIÇÃO - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF33256 - LT

 

 

PROCESSO TRT/RO Nº 0010247-47.2016.5.03.0171

 

Recorrentes     :   Tadeu Adelino Marques

                              Banco Santander (Brasil) S.A.

Recorridos       :   os mesmos

Relator             :   Luiz Otávio Linhares Renault

 

E M E N T A

 

                PROVA. RECONSTITUIÇÃO DOS FATOS, COM A PARTICIPAÇÃO DO JUIZ, DAS PARTES, E DOS AUXILIARES DA JUSTIÇA, VISANDO À CONSTRUÇÃO DA SENTENÇA, QUE É UM ATO ESSENCIALMENTE DEMOCRÁTICO. VALORAÇÃO E VALORIZAÇÃO DA PROVA. SISTEMA DA PERSUASÃO RACIONAL. ARGUIÇÃO DE NULIDADE. REJEIÇÃO. O processo é o conjunto de atos e de fatos, por intermédio dos quais, observados o contraditório/participação/integração, o juiz, as partes, e os auxiliares da justiça procuram reconstituir a verdade dos fatos, para, progressivamente, construir uma sentença justa. A verdade, assim como a justiça, e o bem, são valores fundamentais em qualquer sistema. A prova compõe-se de vários meios, elementos e instrumentos, sem nenhuma gradação prévia. A sentença, por sua vez, é ato de persuasão racional fundamentada do juiz; ela não é uma chancela automática da prova produzida, sem que haja uma prévia e fundamentada valoração. Com efeito, as provas devem ser valoradas, vale dizer, devem ser, no primeiro momento, intelectíveis, perceptíveis, inclusive no tocante à sua legitimidade, e valorizadas, conjuntamente, em seus respectivos conteúdos, dentro e fora de si, harmonicamente. Saber se um fato ocorreu ou não e como ocorreu, é voltar atrás, seguindo, como diz Carnelutti, as pegadas do mesmo caminho em sentido contrário. A valoração das provas possui, por assim dizer, uma conotação material, objetiva, intelectual e perceptiva, ao passo que a valorização possui vibração axiológica, cujas características básicas são a bipolaridade, pouco importando quem a produziu, a referibilidade, a dedução lógica-fundamentada, o grau de relevância e de importância, assim como a coerência interior e exterior, vis-à-vis das presunções, dos indícios, da verossimilhança, das técnicas de experiência do juiz, da razoabilidade e da realidade social. Em sua aplicação, ato valorativo, a valoração é sempre subjetiva, por isso que compete ao juiz, utilizados todos métodos de interpretação, a demonstração fundamentadamente das razões pelas quais considerou que tal ou qual fato constitutivo do direito foi devidamente comprovado, admitindo ou rejeitando a produção de novas provas.

                Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, interposto de decisão do d. Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Itabira, em que figuram, como Recorrentes e como Recorridos, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. e TADEU AVELINO MARQUES.

 

R E L A T Ó R I O

 

                O d. Juízo da 2ª. Vara do Trabalho de Itabira, por meio da decisão da lavra do MM. Juiz ADRIANO ANTÔNIO BORGES, ID. 8675152, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou PROCEDENTE, EM PARTE, a pretensão deduzida em juízo por TADEU AVELINO MARQUES em face do BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., condenando o Reclamado ao pagamento das parcelas constantes no dispositivo, devidamente corrigidas.

                Os embargos de declaração opostos pelo Reclamante foram julgados IMPROCEDENTES, consoante decisão de ID. a033eeb.

                O Reclamado interpôs recurso ordinário, ID. 380b325, pretendendo a reforma da r. sentença, no que se refere à prescrição do FGTS, à indenização por dano moral e à justiça gratuita.

                O Reclamante aviou recurso ordinário, ID. b5e621d, arguindo preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa. No mérito, insurge-se contra o r. julgado a quo, no que se refere ao não cumprimento das normas internas, o que enseja na reintegração às diferenças salariais decorrentes da aplicação do PCS, às diferenças de PPE, ao acúmulo de função, às diferenças de PLR sistema de remuneração variável e à indenização por dano moral.

                Ofertadas contrarrazões pelo Reclamante e pelo Reclamado, IDs ed35aff e 239605a, respectivamente.

                Dispensada a manifestação da d. Procuradoria Regional do Trabalho, conforme art. 20 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho.

                É o relatório.

 

                JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

                Conheço dos recursos ordinários, porque presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

 

                JUÍZO DE MÉRITO

                Tendo em vista a arguição de preliminar pelo Reclamante, inverto a ordem de análise dos recursos.

                RECURSO DO RECLAMANTE

                PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, POR CERCEAMENTO DE DEFESA - DESCONSIDERAÇÃO DO DEPOIMENTO DA ÚNICA TESTEMUNHA OUVIDA

                O Reclamante arguiu preliminar de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, ao argumento de que o d. Juízo de origem, ao desconsiderar o depoimento da única testemunha inquirida nos autos, violou os princípios do contraditório e da ampla defesa.

                A desconsideração do depoimento prestado pela testemunha do Autor não induz cerceamento de defesa, tratando-se de valoração da prova conferida pelo d. Juízo originário, que pode ser objeto de reapreciação em segunda instância — como de fato será.

                Logo, quando da análise do mérito dos pedidos, será reapreciada a questão da isenção de ânimo da testemunha para depor e, no caso de acolhimento da tese obreira, esta circunstância importará na validação do depoimento para o desate dos pleitos da lide.

                Forçoso repisar que o magistrado detém ampla liberdade na apreciação da prova, a teor do art. 371 do NCPC, além de ter o poder diretivo do processo (artigos 139 e 370 do NCPC e 765 da CLT).

                Nesta senda, tendo a testemunha prestado depoimento sob o compromisso de dizer a verdade, remanesce ao juiz atribuir às suas informações o valor que possam merecer, em consonância com os demais elementos de prova existente nos autos — o que foi visto na instância de origem, e será revisto nesta instância revisora (artigos 371 e 447, §4º, do NCPC), dado o amplo efeito devolutivo dos recursos.

                Rejeito.

 

                REINTEGRAÇÃO - NORMAS INTERNAS

                O Reclamante insiste na sua reintegração ao emprego. Diz que o denominado Plano Tático de RH, datado de 30.11.2012, prevê condições para a dispensa dos empregados, o qual deve ser obedecido, pois trata-se de norma interna, aplicável a todos os empregados. Acrescenta que o superintendente regional da Reclamada, em depoimento no Processo 11618-2014-029-09-00-1, que tramitou na 20ª. Vara do Trabalho de Curitiba, confirmou a existência de regramento interno para se determinar as demissões, sendo estas premissas básicas a serem observadas pelos chefes imediatos.

                Alega, ainda, que não há como se imaginar que a empresa crie um plano tático, e as diretrizes ali expressas não criem regras para todos os empregados.

                No aspecto, peço vênia para transcrever os brilhantes fundamentos exarados pelo Exmo. Juiz Adriano Antônio Borges, adotando-os como razões de decidir para rejeitar a pretensão recursal (ID. 8675152 - p. 5/7):

 

                “O reclamado contestou a alegação da existência de “Plano Tático de Recursos Humanos” ou de PDI - Plano de Desenvolvimento Individual e também de norma interna com critérios para demissão de empregados ou para regular os processos de rescisão dos contratos de trabalho. Explica o reclamado que o documento anexado pelo autor tem como direcionamento único os líderes de equipe para a gestão de pessoas e não para criar regras de recursos humanos. Trata-se de orientação repassada aos gestores, com foco para melhorar a gestão de pessoas quanto a diversos temas, como exemplo, reduzir a rotatividade de empregados, promoções e, no que diz respeito ao tema demissões, com a intenção de cautela neste tema.

                Assevera o reclamado que o documento, em momento algum, traça estratégias discriminatórias de desligamentos, tampouco cria política de desligamento, mas sim diretrizes voltadas a desafios de atração, retenção e desenvolvimento na carreira.                 Analisando objetivamente os documentos e dados anexados aos autos pelo reclamante, não há relação entre os desligamentos dos empregados do reclamado ocorridos em 2012 e 2013 e sua dispensa em 03.02.2016.

                O reclamante não era detentor de estabilidade no emprego por força de lei ou instrumento normativo e não provou suas alegações de que tenha sido dispensado por critérios discriminatórios apontados na inicial, ônus que lhe competia, a teor do art. 818 da CLT.

                Também não restou provada a existência de critérios objetivos de avaliação implementados pelo reclamado de cumprimento de metas pelos empregados, denunciados pelo reclamante, como condição a ser observada em caso de dispensa, nos quais ele teria obtido notas superiores ao exigido e, por este motivo, não seria válida sua dispensa.

                Pontue-se que, ao pôr termo ao pacto laboral, o reclamado exerceu, dentro dos limites, o seu poder potestativo. Registre-se que a resilição do contrato de trabalho por iniciativa do empregador sem imputação de culpa ao empregado está expressamente autorizada no disposto do art. 477, caput, da CLT”.

 

                Nego provimento.

 

                DIFERENÇAS SALARIAIS - PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS - GRADE

                Pretende o Autor a reforma do r. julgado a quo, ao fundamento de que faz jus ao recebimento de diferenças salariais decorrentes do correto enquadramento nos níveis salariais previstos no sistema de grades. Alega, ainda, que sempre obteve o grau máximo de desempenho em todas as suas avaliações semestrais e jamais obteve as promoções da tabela salarial instituída no Regulamento do Reclamado.

                Primeiramente, cabe destacar que a Política de Salários implementada pelo Reclamado não pode ser desconsiderada como regulamento empresarial, uma vez que organiza a estrutura de cargos e diferencia funções. Todavia, o Reclamante se vincula às normas vigentes no momento de sua admissão.

                Os documentos colacionados, ID. e5a9535, demonstram que o Reclamado, a partir de junho de 2009, instituiu nova estrutura de níveis e cargos, deixando de aplicar o denominado sistema de grades.

                O Reclamante, não obstante ter sido contratado em 06.10.2010, baseia sua pretensão nas normas já extintas, tanto que requer a aplicação de reajuste de no mínimo 10% (dez por cento) semestralmente, nos exatos termos previstos nos Sistema de Grades.

                Assim, conforme expresso na r. sentença, o Autor sequer foi remunerado na forma instituída pelo aludido sistema de grades, visto que foi admitido após a alteração da norma empresarial, pelo que nada a alterar.

                Nego provimento.

 

                DIFERENÇA DE PPR - ISONOMIA

                O Reclamante entende fazer jus ao recebimento das diferenças referentes à parcela PPE - Programa Próprio Específico, ao fundamento de que os paradigmas, não obstante encontrarem-se na mesma grade/nível que o Autor, perceberam valores muitos superiores, o que implica violação ao princípio da isonomia.

                Sem razão.

                Da análise à inicial infere-se que o Reclamante, ao informar que “E na pág. 6, a Cartilha explicita, inclusive, graficamente, que cada um destes quatro critérios tem o mesmo peso na quantificação e divisão do valor, assim sendo: “ÁREA SUPERIOR 25% / ÁREA 25% / INDIVIDUAL QUALITATIVA 25% e INDIVIDUAL QUANTITATIVA 25%”, fundamenta seu pedido em norma, mais uma vez extinta, que vigorou até 2002, o que não se admite.

                Além disso, a alegação de que os modelos indicados encontravam-se na mesma grade/nível, não procede, pois conforme decidido acima, o Autor sequer foi incluído no Sistema de Grades, já que a admissão ocorreu após junho de 2009.

                E, mesmo que assim não fosse, não há que se falar em violação ao princípio da isonomia, pois o Programa Próprio Específico (PPE) tem como um dos requisitos o lucro de cada agência, consoante se infere dos documentos colacionados no ID. af47a0a. Assim, verificado que os paradigmas trabalhavam em agências distintas à do Reclamante, nada a prover.

                Desprovejo.

 

                ACÚMULO DE FUNÇÃO - VENDA DE SEGURO

                Pugna o Reclamante pelo deferimento das diferenças salariais decorrentes do acúmulo das funções de bancário com a de corretor de seguros.

                O acúmulo de função se caracteriza por um desequilíbrio qualitativo ou quantitativo entre as funções inicialmente combinadas no contrato de trabalho entre empregado e empregador, passando o trabalhador a fazer, concomitantemente, outros afazeres alheios ao contrato, sem a devida contraprestação.

                Nos termos do art. 456, parágrafo único, da CLT, o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal e, assim, as diferenças por acúmulo de funções são devidas quando provado o labor em atividade incompatível com a função para a qual o empregado foi contratado, situação que não se verifica nestes autos.

                Para o Professor Maurício Godinho Delgado:

 

                “A reunião coordenada e integrada de um conjunto de tarefas dá origem a uma função. Neste quadro, função corresponde a um conjunto coordenado e integrado de tarefas, formando um todo unitário. É, pois, um conjunto sistemático e unitário de tarefas — um feixe unitário de tarefas. Analiticamente, é a função um conjunto de tarefas que se reúnem em um todo unitário, de modo a situar o trabalhador em um posicionamento específico no universo da divisão do trabalho da empresa.

                É possível, teoricamente, que uma função englobe, é claro, uma única tarefa. Tal situação é pouco comum, entretanto. Em geral, a função engloba um conjunto de tarefas, isto é, de atribuições, poderes e atos materiais concretos. Por outro lado, uma mesma tarefa pode comparecer à composição de mais de uma função, sem que com isto venha necessariamente comprometer a identidade própria e distintiva de cada uma das funções comparadas (...).” (Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR. 6ª ed. 2007 p. 1012/1013).

 

                Por evidente, a alteração contratual, de forma lesiva, passa a materializar-se no momento em que as atribuições do empregado passam por modificações de modo significativo a desnaturar a própria essência do contrato, em rota de desvio do que foi inicialmente pactuado e acarretando prejuízo ao empregado, seja no plano financeiro, seja na própria estrutura organizacional da empresa.

                O entendimento acerca do acúmulo de funções tem vinculação direta com a sistemática remuneratória adotada no nosso ordenamento jurídico, que, via de regra, remunera todo o tempo em que o empregado se coloque à disposição do empregador. Por oportuno, peço vênia para transcrever os seguintes fundamentos proferidos por esta Turma, em situação semelhante à dos autos:

                “É importante lembrar que a sistemática remuneratória do Direito do Trabalho não leva em consideração especificamente a intensidade da jornada, mas apenas a sua extensão. Ou seja, adota um critério meramente quantitativo, em detrimento do qualitativo. Disto, aliás, decorre o preceito contido no art. 4º, da CLT, que considera tempo à disposição do empregador, e por isso remunerado, o período em que o trabalhador esteja à disposição do empregador, ainda que não esteja efetivamente trabalhando.

                A contrapartida necessária disto é que, quando houver a imposição de outras tarefas ou aumento de sua intensidade dentro do mesmo tempo de trabalho, este acréscimo não repercuta na remuneração do trabalhador, necessariamente.” (2426-2012-032-03-00-8-RO, Relator: Emerson José Alves Lage, publicado no DEJT em 09.04.2014).

 

                In casu, o pretenso acúmulo de funções diz respeito à venda de diversos seguros entre outros produtos similares, atividades inerentes ao cargo de gerente.

                Logo, se as tarefas descritas na Inicial eram exercidas desde o início do pacto laboral e inerentes ao cargo, verifica-se que não há falar em exercício de atividades alheias ao contrato e aptas a desequilibrar as funções inicialmente pactuadas, de modo a ensejar o pagamento de adicional por acúmulo de funções, estando correta a v. sentença quanto ao particular.

                Desprovejo.

 

                DIFERENÇAS DE PLR - INCLUSÃO DE EMPRESAS DO GRUPO ECONÔMICO

                O Reclamante insurge-se contra o r. decisum a quo, ao fundamento de que faz jus ao recebimento das diferenças de PLR, já que laborou em prol de outras empresas do grupo econômico, o que implica a inclusão dos lucros das demais empresas na base de cálculo da aludida participação nos lucros e resultados.

                Sem razão.

                Conforme bem asseverou o d. Juízo sentenciante, não há prova nos autos de que o labor do Reclamante beneficiou cada uma das empresas integrantes do grupo econômico do Réu.

                Além disso, conforme dispõe o art. 2º da Lei nº. 10.101./2000, “a participação nos lucros ou resultados será objeto de negociação entre a empresa e seus empregados, mediante um dos procedimentos a seguir descritos, escolhidos pelas partes de comum acordo”, não havendo, assim, condições jurídicas de se impor à Reclamada o cumprimento de outros instrumentos coletivos, que não os firmados exclusivamente por ela.

                Nego provimento.

                SISTEMA DE REMUNERAÇÃO VARIÁVEL

                O Reclamante alega que não recebeu corretamente os valores referentes ao sistema de remuneração variável, fazendo jus às diferenças. Acrescenta que o Reclamado não trouxe aos autos os documentos necessários para se aferir a suposta correção dos valores quitados.

                Data venia, razão lhe assiste.

                O sistema de remuneração variável é uma política salarial que considera a análise de alguns indicadores, dentre eles o desempenho individual quantitativo e qualitativo, para, só então, proceder ao pagamento ou não da referida parcela instituída pelo Reclamado.

                Da análise ao conjunto probatório constante dos autos infere-se que não foram apresentadas provas que permitissem verificar se os valores quitados ao longo do contrato correspondiam àqueles efetivamente devidos.

                Sublinhe-se que existem normas legais e circulares do BACEN que obrigam o demandado a manter escrituração mercantil de suas operações, submetendo-a a auditores independentes, não existindo, assim, justificativa para a não juntada da documentação.

                E não poderia ser diferente, posto que, se o demandado criou uma parcela devida aos empregados justamente com base nas receitas e despesas da agência, tem que ter mecanismos para apurar estas variáveis e verificar se este levantamento foi feito de forma escorreita.

                Cumpre ressaltar que, mesmo que o Reclamante tenha asseverado em depoimento “que circulava na intranet da empresa e no quadro fixado na agência o ranking da produção de cada um”, não afasta a responsabilidade do Reclamado em trazer aos autos a documentação necessária para se verificar a correção dos valores quitados, pois a Ré tem obrigação de guarda destes documentos.

                Ademais, não restou demonstrada a possibilidade de o Autor realizar cópias dos aludidos documentos.

                Diante da ausência de documentos acerca das avaliações e indicadores pertinentes, ônus que competia ao Reclamado, reputo verdadeiras as alegações apostas na inicial, no sentido de que o banco não quitou corretamente as comissões apontadas na inicial.

                Assim, dou provimento para acrescer à condenação as diferenças de comissões, nos valores apontados na inicial, referentes à comissão por abertura de contas (SRV), compensando-se os valores pagos a título de comissões por venda de seguros e SRV e seus reflexos no aviso prévio, nas férias mais 1/3, nos 13º salários e no FGTS mais 40%, nas horas extras pagas e deferidas em outro processo.

                Improcede o pedido de reflexos das diferenças salariais ora deferidas em repouso semanal remunerado, eis que tais diferenças serão calculadas com base no salário mensal, nele já incluída a remuneração do repouso semanal remunerado, nos termos da Lei 605/1949.

 

                INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - OBRIGATORIEDADE NO PERÍODO DE GREVE

                Requer o Reclamante o recebimento de indenização por dano moral, pois restou comprovado que era proibido de usufruir de seu direito de greve.

                O reconhecimento da responsabilidade civil exige o preenchimento dos três requisitos indispensáveis à configuração do ilícito: a ação ou omissão, o dano e o nexo de causalidade.

                A reparação pretendida nesta Justiça do Trabalho de indenização por dano moral pressupõe um ato ilícito ou erro de conduta do empregador, além do prejuízo suportado pelo trabalhador em sua esfera moral e do nexo de causalidade entre a conduta injurídica do primeiro e o dano experimentado pelo último.

                A indenização por danos desta natureza se acha inserta no rol das obrigações contratuais do empregador por força do Inciso XXVIII do art. 7º da CF, estando jungida à ocorrência de dolo ou culpa.

                Na hipótese dos autos, constata-se o preenchimento dos requisitos ensejadores do pagamento da indenização pretendida, existindo prova de nexo de causalidade entre os danos sofridos e a conduta culposa da Reclamada. É o que se extrai do conjunto probatório constante dos autos.

                Com efeito, restou evidenciado nos autos que os empregados da Reclamada eram impedidos de usufruírem de seu direito de greve, consoante se conclui pela análise ao depoimento da testemunha inquirida a rogo do Autor, in verbis:

 

                “...gerente operacional disse que o trabalhador que fizesse greve iria ser dispensado; que nenhum funcionário fez greve ao longo do período da depoente;...”

 

                Além disso, verifica-se nos cartões de ponto (ID. 86f4657), nos meses de setembro, data-base dos bancários, que houve labor em todos os dias em que a categoria encontrava-se em paralisação.

                Restou provado, portanto, a impossibilidade de se gozar de um direito constitucionalmente garantido, representando um ato antissindical.

                Ao assim proceder, agiu o Réu de forma arbitrária, com o único intuito de intimidar, violando o princípio da liberdade sindical e menosprezando os preceitos constitucionais voltados à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho e à função social da propriedade, bem assim olvidando os princípios elementares do Direito Coletivo do Trabalho.

                Em nosso ordenamento jurídico, a greve (assim como os movimentos que a precedem) constitui um direito fundamental de caráter coletivo, assegurado no art. 9º da Constituição.

                Assim, entendo terem sido evidenciados, à saciedade, os danos morais provocados no trabalhador pela conduta da Reclamada, sendo imperiosa sua condenação ao pagamento da respectiva indenização.

                O valor fixado para a indenização deve, tanto quanto possível, guardar razoável proporcionalidade entre o dano, a sua extensão, as suas consequências e a sua repercussão sobre a vida exterior e interior da vítima, inclusive sob a sua psique.

                Deve, ainda, tanto quanto possível, ter por objetivo coibir o agente a não repetir o ato ou compeli-lo a adotar medidas para que o mesmo tipo de dano não vitime a outrem. O arbitramento não deve ter por escopo premiar a vítima, nem extorquir o causador do dano, como também não pode ser estabelecido de modo a tornar inócua a atuação do Poder Judiciário, na solução desta espécie de litígio, que também acarreta consequências a toda coletividade.

                Portanto, o valor não deve ser fixado irrisoriamente, a ponto de desmoralizar o instituto. Da mesma forma, não deve causar uma reparação acima do razoável, cumprindo, assim, estritamente, o seu importante caráter pedagógico.

                Considerando-se os parâmetros acima transcritos, o grau de culpa e a condição econômica do Réu (cujo capital social é superior a 62 bilhões de reais), a hipossuficiência do Reclamante e a extensão do dano, e tendo em vista, ainda, a gravidade do ato ilícito praticado (conduta antissindical - proibição de participação em greves, direito fundamental do trabalhador), entende-se por razoável fixar em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) o valor da indenização por danos morais.

                Portanto, dou provimento parcial ao recurso para acrescer à condenação indenização por dano moral, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com juros e correção monetária, nos termos da Súmula 439 do TST.

 

                RECURSO DO RECLAMADO

                PRESCRIÇÃO QUINQUENAL/TRINTENÁRIA - FGTS SOBRE SALÁRIO EXTRAFOLHA

                Insiste a Reclamada com a declaração de prescrição quinquenal dos depósitos de FGTS incidentes sobre as parcelas pagas durante a contratualidade.

                Não obstante o d. Juízo ter declarado a prescrição quinquenal, exceto no que se refere aos depósitos de FGTS incidentes sobre as parcelas pagas durante a contratualidade, a Reclamada não tem nenhum interesse recursal, eis que a condenação se limitou ao pagamento de indenização por danos morais, parcela em que não incide FGTS, pelo que nada a alterar.

                Nada há a prover.

 

                INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

                O Reclamado, em sua peça recursal, alega que não teria a Reclamante se desincumbido de seu ônus de provar a ocorrência de ato ilícito, dano e nexo causal, razão pela qual sustenta ser indevida a indenização. Aduz, por fim, que a cobrança de metas jamais poderia ser imputada como um ato ilícito.

                Quando se fala em assédio moral se está diante de um ato perverso e intencional que produz, em consequência, sofrimento ao empregado, em decorrência do ambiente de trabalho.

                Segundo Marie-France Hirigoyen, por assédio moral no local de trabalho temos que entender toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, colocando em perigo seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho.

                Para a identificação do assédio moral nas relações de trabalho, torna-se necessário que a dignidade do trabalhador seja violada por condutas abusivas desenvolvidas dentro do ambiente profissional, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções.

                Conceitualmente, podemos dizer que o assédio moral caracteriza-se, via de regra, quando um empregado sofre perseguição no ambiente de trabalho, o que acaba por provocar uma espécie de psico-terror na vítima, desestruturando-a psicologicamente.

                Obviamente que o assédio moral pode se caracterizar de várias formas dentro do ambiente de trabalho, até mesmo entre colegas.

                Todavia, o terrorismo psicológico mais frequente no ambiente de trabalho é aquele denominado assédio descendente ou vertical, que se tipifica pelo abuso do poder empregatício, diretamente ou por superior hierárquico.

                Por se tratar de um instituto novo, com a sua tipificação ainda em aberto, inúmeras variações de comportamento do sujeito ativo podem se enquadrar na figura do assédio.

                Assim, a maneira mais segura para se avaliar a caracterização do assédio moral se dá mediante a análise do caso em concreto, ficando o conceito para a sua tipificação inteiramente em aberto.

                De qualquer forma, é preciso se ter em mente que o assédio moral viola a dignidade da pessoa humana, princípio em que se fundamenta todo o ordenamento jurídico, devendo, por isso, ser reprimido, pois causa sofrimento físico e psicológico ao empregado.

                Nos presentes autos, a própria preposta da Reclamada foi clara ao noticiar que:

 

                “que havia exposição de metas em quadro na agência; que havia retaliação para quem não batia a meta;... “ ID. d2be5b5 - Pág. 1)

 

                Percebe-se, portanto, que o reclamante tinha metas a cumprir no Banco, sendo altas e cobradas individualmente, sujeitando o empregado até mesmo a punições.

                Assim, não resta dúvida quanto ao preenchimento dos requisitos legais para a responsabilização do Reclamado ao pagamento de danos morais ao Obreiro. Com efeito, restou caracterizado o assédio moral que gerou danos à personalidade e dignidade da Reclamante.

                No que se refere ao valor da indenização, JOÃO DE LIMA TEIXEIRA FILHO (in Revista LTr, Vol. 60, nº 09, de setembro de 1996, p. 1.171) estabelece parâmetros que devem ser observados pelo magistrado, quais sejam: a extensão do fato inquinado (número de pessoas atingidas, de assistentes ou de conhecedoras para efeito de repercussão); permanência temporal (o sofrimento é efêmero, pode ser atenuado ou tende a se prolongar no tempo por razão plausível); intensidade (o ato ilícito foi venial ou grave, doloso ou culposo); antecedentes do agente (a reincidência do infrator deve agravar a reparação a ser prestada ao ofendido); situação econômica do ofensor e razoabilidade do valor.

                Noutras palavras, não há regra préfixada para estabelecer o valor da indenização por danos morais, devendo ser considerada a ofensa perpetrada, a condição cultural, social e econômica dos envolvidos, além do caráter didático-pedagógico-punitivo da condenação, de modo que repugne o ato, traga conforto ao espírito do ofendido e desencoraje o ofensor a nova violação.

                Portanto, a indenização há de ser proporcional à gravidade resultante do dano moral sofrido.

                Assim, a indenização por dano moral não deve ser estabelecida em valor irrisório que desmoralize o instituto ou tão elevado que chegue a causar enriquecimento acima do razoável, cumprindo, assim, um caráter pedagógico.

                Destarte, considerando os parâmetros acima transcritos, bem como a fundamentação adotada (a condição econômica do primeiro Reclamado, a hipossuficiência do Reclamante, o grau de culpa do Réu), entendo razoável o valor fixado da indenização de R$ 15.000,00.

                Nego provimento.

 

                JUSTIÇA GRATUITA

                O Recorrente sustenta que o Reclamante não preencheu os requisitos para que lhe fossem concedidos os benefícios da justiça gratuita.

                Sem razão.

                Ao contrário do que sustenta o Recorrente, a declaração de pobreza firmada pelo procurador do Reclamante ID. a2fe0e1 - p. 59 e 4e3b45b é o quanto basta para o preenchimento dos requisitos legais para a concessão dos benefícios da justiça, que são assegurados àqueles que perceberem salário igual ao dobro do mínimo legal ou que declararem, sob as penas da lei, sua condição de miserabilidade e que não podem demandar em Juízo sem prejuízo do seu sustento ou de sua família.

                Nada a prover.

 

                CONCLUSÃO

                Conheço de ambos os recursos interpostos e, no mérito, nego provimento ao recurso do Reclamado.

                Quanto ao recurso do Reclamante, rejeito a preliminar de nulidade, por cerceio de defesa, e dou-lhe provimento parcial para acrescer à condenação o pagamento:

                a) das diferenças de comissões, pelo período imprescrito, nos valores apontados na inicial, referentes à comissão por abertura de contas (SRV), compensando-se os valores pagos a título de comissões por venda de seguros e SRV e seus reflexos aviso prévio, férias mais 1/3, 13º salários e FGTS mais 40%, horas extras pagas e deferidas em outro processo;

                b) da indenização por dano moral, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com juros e correção monetária, nos termos da Súmula 439 do TST.

                Elevo o valor atribuído à condenação de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), com o consequente aumento das custas de R$ 300,00 (trezentos reais) para R$ 1.000,00 (um mil reais), a cargo da Reclamada, que deverá recolher a diferença, no importe de R$ 700,00 (setecentos reais), ficando, para tanto, devidamente intimada, a teor do item III da Súmula 25 do c. TST.

                Declaro que, sobre as diferenças salariais, bem como seus reflexos nos 13ºs. salários e nas férias, usufruídas no curso do contrato, há incidência de contribuição previdenciária.

 

                FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Primeira Turma, hoje realizada, preliminarmente, à unanimidade, conheceu de ambos os recursos interpostos; no mérito, sem divergência, negou provimento ao recurso do Reclamado; quanto ao recurso do Reclamante, rejeitou a preliminar de nulidade, por cerceio de defesa, e deu-lhe provimento parcial para acrescer à condenação o pagamento: a) das diferenças de comissões, pelo período imprescrito, nos valores apontados na inicial, referente à comissão por abertura de contas (SRV), compensando-se os valores pagos a título de comissões por venda de seguros e SRV e seus reflexos aviso prévio, férias mais 1/3, 13º salários e FGTS mais 40%, horas extras pagas e deferidas em outro processo; b) da indenização por dano moral, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com juros e correção monetária, nos termos da Súmula 439 do TST. Elevou o valor atribuído à condenação de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), com o consequente aumento das custas de R$ 300,00 (trezentos reais) para R$ 1.000,00 (mil reais), a cargo da Reclamada, que deverá recolher a diferença, no importe de R$ 700,00 (setecentos reais), ficando, para tanto, devidamente intimada, a teor do item III da Súmula 25 do c. TST. Declarou que sobre as diferenças salariais, bem como seus reflexos nos 13ºs. salários e nas férias, usufruídas no curso do contrato, há incidência de contribuição previdenciária.

                Tomaram parte no julgamento os Exmos. Desembargadores: Luiz Otávio Linhares Renault (Relator), Emerson José Alves Lage e José Eduardo de Resende Chaves Júnior (Presidente).

                Presente ao julgamento o il. representante do Ministério Público do Trabalho, Dr. Dênnis Borges Santana.

                Sustentação oral: Advogado Fernando de Oliveira Santos, pelo reclamado.

                Belo Horizonte, 28 de novembro de 2016.

 

LUIZ OTÁVIO LINHARES RENAULT

Relator

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 06.12.2016)

 

BOLT7563—WIN/INTER

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