A INSTITUIÇÃO DA CAPITAL MINEIRA - BELO HORIZONTE - PESQUISAS CLIMÁTICAS - MEF33550 - BEAP

 

 

MANOEL PAULO DE OLIVEIRA *

 

 

                A ESCOLHA DO LOCAL

                Com a República e a descentralização federal, as capitais tiveram maior relevo: ganhava vigor a ideia de mudança da sede do governo mineiro, pois a antiga Ouro Preto era travada pela topografia. O governador Augusto de Lima encaminhou a questão ao Congresso Mineiro, que, reunido em Barbacena, em sessão de 17 de dezembro de 1893, indicou pela Lei nº 3, adicional à Constituição Estadual, a disposição de que a mudança da Capital ocorresse para local que reunisse as condições ideais. Cinco localidades foram sugeridas: Juiz de Fora, Barbacena, Paraúna, Várzea do Marçal e Belo Horizonte. A comissão técnica, chefiada pelo engenheiro Aarão Reis, julgou em igualdade de condições Belo Horizonte e Várzea do Marçal, decidindo-se ao final pela última localidade. Voltou o Congresso a se pronunciar, e depois de novos e extensivos debates, instituiu-se que a Capital fosse construída nas terras do arraial de Belo Horizonte.

                O local escolhido oferecia condições ideais: estava no centro da unidade federativa, a 100 km de Ouro Preto, o que muito facilitava a mudança; acessível por todos os lados, embora circundado de montanhas; rico em cursos d’água; possuidor de um clima ameno, numa altitude de 800 metros. A área destinada à nova Capital parecia um grande anfiteatro entre as Serras do Curral e de Contagem, contando com excelentes condições climatológicas, protegida dos ventos frios e úmidos do Sul e dos ventos quentes do Norte, e arejada pelas correntes amenas do Oriente que vinham da serra da Piedade ou das brisas férteis do Oeste que vinham do vale do Rio Paraopeba. Era um grande vale cercado por rochas variadas e dobradas, com longa e perturbada história geológica, solos rasos, pouco desenvolvidos, de várias cores, às vezes arenosos e argilosos, com idade aproximada de 1 bilhão e 650 milhões de anos.

 

                O PLANEJAMENTO E A EXECUÇÃO

                Em 1893, o arraial foi elevado à categoria de município e Capital de Minas Gerais, sob a denominação de Cidade de Minas. Em 1894, foi desmembrado do município de Sabará. No mesmo ano, os trabalhos de construção foram iniciados pela Comissão Construtora da Nova Capital, chefiada por Aarão Reis, com o prazo de 5 anos para o término dos trabalhos. Em maio de 1895, Aarão Reis foi substituído pelo engenheiro Francisco de Paula Bicalho. Aos 12 de dezembro de 1897, em ato público solene, o então presidente de Minas, Crispim Jacques Bias Fortes, inaugurou a nova Aapital. A cidade, que já contava com 10 mil habitantes em sua inauguração, custou aos cofres estaduais a importância de 36 mil contos de réis. Em 1901, a Cidade de Minas teve seu nome modificado para o atual, em virtude da dualidade de nomes, já que o distrito e a comarca se chamavam Belo Horizonte.

                Projetada pelo engenheiro Aarão Reis entre 1894 e 1897, Belo Horizonte foi uma das primeiras cidades brasileiras planejadas — algumas fontes a citam como a primeira; outras, como terceira, após Teresina e Aracaju — . Elementos chaves do seu traçado incluem uma malha perpendicular de ruas cortadas por avenidas em diagonal, quarteirões de dimensões regulares e uma avenida em torno de seu perímetro, a Avenida do Contorno.

 

                UM LEGADO PARA AS CIDADES

                Quando a infraestrutura do transporte sustentável transcende a função essencial de carregar pessoas de ponto a outro e passa a intervir no ambiente ao seu redor, deixa um legado para as cidades.

                Então, a cidade de Belo Horizonte, Capital do estado, fundada em 1897, de origem planejada, é fascinante não somente pela população acolhedora, pela gastronomia saborosa ou pelas obras arquitetônicas. A história de seu planejamento urbano diz muito sobre como a cidade foi moldada até aqui. Imaginar que, ao completar seu primeiro centenário, a estimativa era atingir uma população de 100 mil habitantes; nesse meio tempo passou a abrigar as atuais 2,5 milhões de pessoas.

                Desde então, com o BRT MOVE, o WRI Brasil | EMBARQ Brasil apoiou a cidade com uma série de projetos, incluindo auditorias de segurança viária, alinhamentos estratégicos, preparação para o  lançamento do BRT, entre outros.

                Certamente, nenhuma cidade é perfeita, assim como nenhuma obra ou proposta são definitivas para solucionar os problemas complexos que assolam os municípios do Brasil e de todo o mundo. Contudo, planejamento, execução e visão de futuro, bem como parceiros estratégicos, fazem parte do caminho na busca por um bom legado urbano.

 

                CONTROLE E VISÃO DA CIDADE

                Com todas as providências cogitadas, Belo Horizonte ainda é uma das capitais onde o transporte público mais perdeu espaço nesta década. Os tráfegos de carros, motos, ônibus e caminhões transitando nas suas ruas alcançaram 84%, em nove anos. O salto foi de 706 mil veículos em 2001 para 1,3 milhão em 2010, de acordo com dados da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans). Entre todas as categorias, o maior crescimento foi visto na frota de transportes individuais: motos (114%) e carros (38,8%). Os ônibus aparecem em terceiro lugar (24%).

                O fenômeno é avaliado por analistas de trânsito como o resultado de políticas públicas que privilegiaram, ao longo dos anos, o transporte individual em vez do coletivo. Aumentaram drasticamente os congestionamentos nas ruas, o que configurou um “atentado à mobilidade urbana.”

                Especialista do setor afirma que não há investimento público em túneis e viadutos que suporte a demanda. Ressalta que, ao mesmo tempo em que a cidade viu expandir sua frota nas últimas duas décadas, o transporte coletivo perdeu muita qualidade, o que acelerou a migração para o transporte individual, tornando o transporte coletivo praticamente insustentável.

                Para especialista, a melhora na mobilidade urbana depende do renascimento dos transportes públicos na matriz de tráfego. Hoje, na Capital mineira, 55% dos deslocamentos são feitos por transportes coletivos (ônibus e trens). Projeta-se chegar a 70% até 2030, como na cidade de Barcelona, quando, no início da década de 90, esse índice já havia alcançado 65%, mas foi perdendo participação para os carros.

                Outras consequências reprodutivas do atual sistema modal de transporte público, cujos dados avaliativos trazem, também, reflexos sobre as mudanças climáticas em Belo Horizonte.

 

                O FORMATO DAS CIDADES AJUDA A DETERMINAR O CLIMA E A POLUIÇÃO DO AR

                Os modelos de previsão do tempo são insuficientes para medir o clima das cidades. É o que pontua um estudo da Escola Politécnica Federal de Lausana - Suíça -,publicado no Journal of Boundary Layer Meteorology. Os trabalhos industriais, domésticos, as atividades relacionadas ao transporte, assim como o formato dos edifícios e das ruas, segundo a pesquisa, liberam calor constantemente — que fica retido nas superfícies de concreto e continua a ser emitido pelas mesmas. Ou seja: para compreender e prever o clima, precisamos olhar para as idiossincrasias das cidades.

 

                O PAPEL DOS EDIFÍCIOS

                Alguns elementos substanciais do meio urbano, como a disposição e o tamanho dos prédios, alteram a maneira como as massas de vento agem sobre determinado local, dizem os pesquisadores. E não são levados em conta nas previsões do tempo atualmente. A transferência de energia e o calor na atmosfera no nível da calçada podem ser determinantes para que diferentes partes de uma cidade tenham microclimas diferentes.

                Segundo o estudo, os elementos dispersivos devem ser calculados por meio de projeções matemáticas para que se entenda corretamente o clima urbano. A falta de projeções e cálculos computacionais melhor desenvolvidos resulta nas inconsistências dos modelos de previsão atuais.

                A energia acumulada ou desviada pelos edifícios tem impacto, sim. Em Londres, o reflexo do sol em um prédio derreteu a lataria de um carro. O clima diferenciado nas cidades, no entanto, vai além dos efeitos das ilhas de calor urbanas que conhecemos. As cidades podem também impactar na velocidade e direção dos ventos, pois as construções interagem com a massa de ar em movimento, gerando turbulência. Essa turbulência se espalha na atmosfera e atinge o nível do solo para, então, transportar a umidade e os poluentes para cima, na atmosfera. Ou seja, as características únicas do local tornam seu clima também único.

                “A maioria das representações da cidade utilizadas em modelos de previsão do tempo são baseadas em dados obtidos a partir de medições feitas por uma torre localizada em um ponto específico da cidade. O transporte de calor, umidade e poluentes é calculado por meio de relações matemáticas. No entanto, os cálculos feitos assumem implicitamente que a cidade é geometricamente regular, o que é uma suposição errada”, afirmou Marco Giometti, um dos autores do estudo.

 

                AS PESQUISAS CLIMÁTICAS

                O que os pesquisadores propuseram, portanto, foi uma bateria de simulações detalhadas sobre o fluxo do vento, do calor e da umidade. Foi utilizada como base a cidade de Basileia, na Suíça. Depois, eles realizaram a comparação dos resultados com medições de torres da mesma área. Ao contabilizar a variabilidade espacial de ruas e edifícios na mesma vizinhança de Basileia, foi identificado como determinados parâmetros desempenham um papel no clima local e na dispersão de fumaça e poluição atmosférica, e erros de até 200% foram identificados.

                A pesquisa destaca a importância de se levar em conta a variabilidade desses termos dispersivos. Andreas Christen, coautor do estudo, assevera como “uma única estação meteorológica é incapaz de medir termos dispersivos diretamente. Nesse espaço as simulações de computador sobre os ventos devem entrar”.

                Com essas informações, será possível desenvolver modelos precisos que irão beneficiar a população urbana. O planejamento urbano pode, no futuro, ter em mãos dados suficientes para prevenir que as cidades sejam tão quentes ou que sejam fontes de tempestades recorrentes. As construções também poderão se aproveitar dessas variáveis para gerar ou reduzir o consumo de energia. Dessa maneira, teríamos não apenas melhores previsões meteorológicas urbanas, mas cidades mais eficientes em termos energéticos.

                Por outro lado, em importante trabalho especializado, sob o título “Transporte público e mudanças climáticas em Belo Horizonte: avaliação do impacto do projeto Bus Rapid Transit (BRT) para redução da emissão de gases de efeito estufa”, de autoria de Henrique de Almeida Pereira, da Editoria da UFMG, datado de 4 de novembro de 2009, assim se resume:

 

                “Este trabalho apresenta as relações entre transporte e mudança climática. Devido à crescente pressão populacional e aos recentes incentivos criados pelo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, faz-se necessário o desenvolvimento de soluções de transporte público para reduzir o impacto climático dos centros urbanos. Foi utilizado o caso de Belo Horizonte para a discussão da contribuição do sistema de transporte público, em termos de emissões e potenciais alternativas para um sistema mais eficiente e menos emissor.

 

                CASOS PRÁTICOS DE BELO HORIZONTE

                O município se prepara para a instalação de 5 sistemas de Bus Rapid Transit (BRT). Sistemas BRT são tecnologias de transporte rodoviário com eficiência de sistemas ferroviários e vêm ganhando espaço em países em desenvolvimento devido ao relativo baixo custo de implantação, principalmente se comparado ao metrô. Objetiva-se, portanto, discutir a relação entre transporte e mudanças climáticas avaliando os sistemas BRT como tecnologia mitigadora das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no transporte público. Mais especificamente, buscou-se avaliar as emissões de GEE por transporte público no município de Belo Horizonte por meio de um estudo de caso no BRT da Avenida Antônio Carlos. O estudo aplicou a metodologia do MDL AM0031 Baseline Methodology for Bus Rapid Transit Projects ao projeto da Antônio Carlos, quantificando as reduções de emissão. Para tanto, o trabalho apresenta uma breve revisão bibliográfica sobre Mudanças Climáticas e sua relação com o transporte rodoviário. Discute ainda sobre os sistemas BRT e sua aplicação na América Latina, permitindo a construção de um paralelo com a situação do Município de Belo Horizonte. Para aplicação da metodologia AM0031, a pesquisa levantou dados operacionais junto à BHTrans, detalhando o sistema de transporte público em Belo Horizonte, a frota em operação, consumo de combustíveis, volume de passageiros e demais dados operacionais. O BRT da Avenida Antônio Carlos terá 27 km de extensão e custo estimado de R$ 556milhões. São esperados 25 mil passageiros por hora. Espera-se grande eficiência do sistema uma vez que este operará em pista exclusiva, com estações duplas e ultrapassagem. O sistema contará ainda com estações de embarque com pré-pagamento e sistemas de TI para controle de saídas e chegadas. Hidalgo (2008) avaliou a eficiência de sistemas BRT e metrô concluindo que ambos operam em faixas equivalentes entre 20.000 e 40.000 passageiros hora sentido (PHS) transportados. Este trabalho demonstra que as reduções de emissão de gases de efeito estufa oriundas do projeto totalizam 59.393 tCO2e por ano, o que representa 61,83% de redução em relação ao sistema atual de transporte urbano nesta via. Em termos absolutos, conclui-se que a redução do projeto é insignificante em relação às emissões totais do município, que totalizaram, em 2007, 3,18 milhões de tCO2e (1,86%). Entretanto, a aplicação de sistemas BRT em grande escala pode ter um impacto significativo se reduções da ordem de 60% também forem alcançadas nos demais sistemas BRT em avaliação. As emissões oriundas de fontes móveis correspondem a 80% das emissões do escopo setorial de energia em Belo Horizonte, destas o diesel é a segunda fonte mais representativa, totalizando 687.712 tCO2e em 2007.

 

                A IMPLEMENTAÇÃO DO BRT EM BELO HORIZONTE

                A Copa do Mundo de 2014 poderia ter acelerado o cumprimento da meta. Belo Horizonte foi a primeira cidade a fechar com o governo federal recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) destinados a melhorias da mobilidade urbana. Até 2014, seriam investidos R$ 1,23 bilhão nas obras que incluem o sistema de Trânsito Rápido de Ônibus (BRT, na sigla em inglês) nas avenidas Presidente Antônio Carlos, Dom Pedro I, Dom Pedro II, entre outras, além da ampliação da Central de Controle de Tráfego da BHTrans. Em outra vertente, a cidade também aposta em um ambicioso projeto de 345 quilômetros de ciclovias, o segundo maior do Brasil, atrás somente de Porto Alegre, com 495 km.

                Naquela oportunidade, na opinião do professor Nilson Tadeu Nunes, chefe do Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), os BRTs — principais projetos das cidades brasileiras para a Copa — são muito úteis. “Não dá para permitir a concentração em apenas um meio de transporte”, diz. Por outro lado, correm o risco de iniciar o funcionamento já no limite da capacidade. Em algumas vias, segundo Nunes, a demanda já supera 40 mil passageiros por trecho a cada hora. O ideal para este fluxo é o transporte por trens urbanos, mas, por falta de recursos, elas não entraram no pacote de infraestrutura para a Copa.

 

                CONCLUSÃO

                O presente estudo tem sua origem nos trabalhos desenvolvidos por um seleto grupo de profissionais, professores  e técnicos ligados à Associação Comercial de Minas Gerais e à Câmara Municipal de Belo Horizonte, designados para desenvolverem pesquisas e sugestões para aprimoramento da lei que institui o Código de Posturas do Município.

                O trabalho se reveste de extrema importância por abordar assunto de total interesse e preocupação de todas as gestões públicas municipais, que em maior ou menor grau se deparam com o grave tema da mobilidade urbana.

 

 

* Advogado, economista, contador, professor universitário, pós-graduado em Políticas Econômicas, Metodologia do Ensino Superior, Sistemas e Métodos, Custos Industriais, Planejamento de Transportes, Orçamento e Contabilidade Pública.

 

 

BOCO9264—WIN

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