MANUAL DE BOAS PRÁTICAS EM LICITAÇÃO PARA CONTRATAÇÃO DE SISTEMAS
DE GESTÃO PÚBLICA - MEF33980 - BEAP
COMENTÁRIOS DE MÁRIO LÚCIO DOS REIS *
Sob o título acima, pode ser consultado no site do
TCE/MG o interessante trabalho desenvolvido em 2015 por um seleto grupo de
técnicos especialistas do Tribunal, abordando especificamente o tema de
licitações para contratação de sistemas informatizados de gestão pública, quais
sejam os softwares de Contabilidade,
Recursos Humanos, Folha de Pagamento, Tributação, Tesouraria, Patrimônio,
Almoxarifado, Licitações, Compras, Nota fiscal eletrônica, dentre outros.
Por sua vez o TCE/MG editou o referido trabalho motivado
pelo crescente número de denúncias e de consultorias abordando o tema,
atribuídas ao impacto do vertiginoso avanço da tecnologia da informação.
Trata-se de um manual abrangente e esclarecedor que
dá asas ao exercício da função pedagógica do Tribunal de Contas, apresentado em
quatro capítulos, sendo que, neste ensejo estamos abordando os três primeiros
capítulos, restando o quarto capítulo para uma próxima oportunidade, que aborda
as irregularidades mais comuns nas licitações do tipo.
PLANEJAMENTO
NECESSÁRIO
Primeiro e muito importante passo a ser dado por
todos os entes públicos é a decisão quanto a adquirir, locar ou usar softwares livres, decisão esta que vai
depender essencialmente da equipe técnica interna de analistas e programadores
pertencentes aos quadros do ente público.
Com efeito, se contar com estes profissionais,
pode-se decidir pelo software livre,
fornecido pelo Governo Federal, que é gratuito, porém exigirá dedicação
intensiva da equipe técnica própria para a manutenção e customização do sistema
a tempo e a hora para atender as exigências das leis de transparência fiscal e
de acesso à informação.
Não dispondo dessa equipe, forçosamente se deve
decidir pela locação ou compra do sistema, sabendo-se que, em ambas as
hipóteses, há que se esmerar na elaboração do termo de referência que acompanha
o edital, assegurando-se de que a empresa fornecedora do software manterá equipe de suporte em tempo integral para a
implantação, manutenção e customização do sistema, responsabilizando-se pelo
cumprimento dos prazos legais para geração de todos os relatórios exigidos
pelas normas do MCASP, pela Secretaria do Tesouro Nacional, Tribunal de Contas
e demais órgãos fiscalizadores.
O manual ora examinado é rico em informações,
análises e interpretações legais que conduziram à conclusão de que a
contratação de sistemas de gestão pública, apesar da complexidade envolvida, é
considerada serviço comum na forma preconizada pela Lei n° 10.520/2002, que
regulamenta a modalidade de pregão, que, no caso, portanto, é a mais
recomendável para tal contratação.
Reproduzimos a seguir os três capítulos do manual, in literis:
1 INTRODUÇÃO
Os impactos causados pelo avanço
da tecnologia, com inúmeros recursos e soluções oferecidos pela informática,
refletiram sobremaneira na rotina da Administração Pública e, inexoravelmente,
no crescente aumento de licitações cujo objeto envolva sistemas de gestão. Com
isso, intensificou-se o número de denúncias enviadas ao Tribunal de Contas do
Estado de Minas Gerais - TCEMG.
Ao longo do tempo, as decisões
desta Casa sobre a matéria culminaram na consolidação de uma jurisprudência,
resultado de um intenso processo de dilemas, experiências e construções
advindas do diuturno exercício da missão constitucional de fiscalização e controle,
bem como pedagógica, confiada a esta Corte.
No exercício de sua competência,
esta Casa envida esforços a fim de auxiliar os jurisdicionados na missão de
gerir os bens, recursos e valores postos sob a tutela dos agentes públicos.
Muitos desses esforços e mobilizações concentram-se em ações de cunho
pedagógico que ensejam a edição de publicações contendo decisões, recomendações
e orientações. A prática tem demonstrado resultados bastante positivos e um
grande alcance dessa linha de atuação, que contribui decisivamente para a
melhoria das ações dos órgãos e entidades submetidos à jurisdição desta Corte.
Dessa forma, ao TCEMG cabe não só a fiscalização do cumprimento das normas, mas
também o exercício da função pedagógica.
Ademais, diante da verificação
de contínuas irregularidades em editais que instruem denúncias acerca de
licitações destinadas à contratação de empresas para prestação de serviços de
locação ou licenciamento de software
de gestão pública, o TCEMG entendeu ser o momento atual mais que pertinente
para a elaboração e divulgação de um manual sobre a matéria.
Ressalta-se, ainda, como fator
primordial para a execução deste Manual, a premissa de que o escorreito
cumprimento pelos jurisdicionados das normas atinentes às contratações de bens
e serviços de Tecnologia da Informação - TI - está a demandar orientações e
recomendações que lhes sirvam de subsídios para nortear contratações dessa
natureza.
Este Manual contém deliberações
do TCEMG e outras informações afetas ao assunto. Abrange o planejamento da
contratação, inclusive as opções apresentadas à Administração — adquirir, locar
ou utilizar softwares livres —, tipos
de licitação, critérios de julgamento, exigência de certificações, desproporção
de pesos para valoração da nota técnica, impropriedades dos critérios de
pontuação, parcelamento do objeto, exigência de atestados de capacidade
circunscritos a pessoas jurídicas de direito público, apresentação de amostra,
falta de limites à subcontratação e efetividade das leis de transparência fiscal
e de acesso à informação.
A proposta de elaboração do
manual destitui-se de caráter normativo e não tem a intenção de esgotar o
assunto. Seu propósito é servir de fonte de consulta aos jurisdicionados para o
aprimoramento nos procedimentos licitatórios. O desafio é propiciar o
conhecimento em ramo relativamente novo, essencialmente técnico e dinâmico,
portanto, passível de contínuas transformações.
2 DEFINIÇÕES
Para fins deste Manual,
consideram-se:
a) Sistema de Gestão Pública: é
uma arquitetura de software que visa
ao fluxo de informação entre as Áreas de Gestão dentro de um ente público
(Prefeituras, Câmaras, Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia
Mista etc).
b) Áreas do Sistema de Gestão
Pública: funções que compõem o Sistema de Gestão Pública de forma cumulativa ou
não, tais como Planejamento de Governo, Contabilidade Pública e Tesouraria,
Controle Interno, Gestão de Contratações Públicas, Gestão de Almoxarifado,
Gestão de Patrimônio Público, Gestão de Frotas, Gestão Tributária, Gestão de
Pessoal e Folha de Pagamentos, Gestão de Processos - Protocolo, entre outros.
3 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO NAS CONTRATAÇÕES DE TI
Planejar é insito à atividade de
administrar. O planejamento, portanto, não é atividade submetida a juízo de
oportunidade e conveniência. Constitui dever do gestor manejar o recurso
público de forma eficaz e eficiente para gerar o maior benefício para a sociedade.
Como em toda e qualquer
licitação, especialmente naquela cujo objeto seja a locação ou o licenciamento
de sistemas de gestão pública, o planejamento é fundamental. Em objetos dessa
natureza, as minúcias e os cuidados devem ser redobrados, notadamente porque a
falha no planejamento vai repercutir de forma inevitável na licitação e, por
conseguinte, numa má contratação. E má contratação, em objeto dessa estirpe,
normalmente significa afetar toda a rotina da Administração, dada a singular
dependência das organizações dos sistemas de informática para a execução
orçamentária, financeira, patrimonial e contábil.
A vantagem do planejamento está
intimamente relacionada à criação de estratégias para alcançar os objetivos
definidos pela Administração no intuito de efetivar políticas públicas e alocar
adequadamente os recursos confiados ao agente público, sem perder de vista as
premissas da obtenção da proposta mais vantajosa, da facilitação do controle,
da transparência, da sustentabilidade, da efetividade e do maior
compartilhamento de informações. Sob essa perspectiva, o planejamento pode ser
entendido como a escolha consciente de ações que aumentem as chances de obter
no futuro algo desejado no presente. É uma atividade que orienta
possibilidades, arranjos institucionais e políticos.
Em resumo, planejar é determinar
os objetivos ou metas de uma organização, como também coordenar os meios e os
recursos para atingi-los.
O planejamento é um dever e,
portanto, uma obrigação. Trata-se de atividade de capital importância na
Administração, especialmente nas licitações e nos contratos administrativos.
A etapa de planejamento da
licitação encerra-se com a assinatura do Termo de Referência, se a modalidade
eleita for o Pregão, instituída pela Lei n. 10.520, de 17 de julho de 2002, ou
do Projeto Básico, caso a espécie licitatória seja o Convite, a Tomada de
Preços ou a Concorrência, disciplinada pela Lei n. 8.666, de 21 de junho de
1993.
3.1 PLANEJAMENTO ASSOCIADO À ADEQUADA CONCEPÇÃO DO TERMO DE REFERÊNCIA
OU PROJETO BÁSICO: INSTRUMENTOS FUNDAMENTAIS PARA O SUCESSO DA LICITAÇÃO
O Termo de Referência ou o
Projeto Básico ganham notável influência no êxito da licitação e da ulterior
contratação.
Jair Eduardo de Santana, em
feliz intervenção, apregoa que o Termo de Referência contém os códigos
genéticos da licitação e do futuro contrato a ser firmado com o licitante
vencedor. Diga-se feliz intervenção, porquanto o doutrinador, com essa
abordagem, precisou a inafastável importância do
Termo de Referência como instrumento de gestão estratégica.
Com efeito, um Termo de
Referência, dotado de consistência e completude, tem o condão de estabelecer a
adequada e necessária conexão entre o contrato desejado pela Administração e o
planejamento que o antecedeu.
O mesmo se diga em relação ao
Projeto Básico, assim entendido como o conjunto de elementos necessários e
suficientes, com o nível de precisão adequado para caracterizar a obra, serviço
ou aquisição de materiais, devendo ser elaborado com base nas indicações de
estudos técnicos preliminares, nos termos do art. 6º, inc. IX, da Lei nº
8.666/1993. Da forma exposta, pode-se conceituar o Projeto Básico. Nesse
ínterim, indaga-se: o que vem a ser propriamente um projeto?
Segundo o Wikipédia, “um projeto
em negócio e ciência é normalmente definido como um empreendimento
colaborativo, frequentemente envolvendo pesquisa ou desenho, que é
cuidadosamente planejado para alcançar um objetivo particular”.
Como se vê, a expressão
“projeto” remete à noção de “pesquisa”, que, por sua vez, enseja “planejamento
para alcançar um objetivo particular”. Logo, a elaboração de um Projeto Básico
demanda pesquisa e planejamento esmerado para que seja atingido o objetivo de
toda e qualquer licitação: a obtenção da proposta mais vantajosa. O planejamento,
em termos práticos, materializa-se no Projeto Básico ou no Termo de Referência.
Verifica-se, então, que as
informações declinadas no Projeto Básico ou no Termo de Referência constituem
elementos imprescindíveis para caracterizar o objeto. Igualmente, esses
elementos propiciarão aos licitantes interessados no objeto licitado a formação
de um preço, condição essencial para a formulação de uma proposta à
Administração.
Atualmente, deve-se atentar para
o novo agir da Administração, que encara o particular mais como um parceiro do
Poder Público na execução de obras, serviços e no fornecimento de materiais do
que mero coadjuvante numa relação jurídica de sujeição, marcada pela
verticalidade e superioridade de outrora. Todavia, informações imprecisas ou obscuras,
ou até mesmos a falta delas, podem macular insanavelmente essa profícua relação
de parceria.
Enfim, o Termo de Referência ou
o Projeto Básico não são apenas obrigatórios e necessários. Neles havendo
falhas ou incompletudes, a licitação redunda em vício, passível de colocar sob
séria e grave ameaça o sucesso da contratação, os objetivos perseguidos pela
Administração e, a toda evidência, a tutela sobre o gasto público.
O Termo de Referência ou o
Projeto Básico completos e consistentes estabelecem íntima conexão entre o
contrato desejado pela Administração e o planejamento, que os antecederam, e
redundam no sucesso da licitação e da contratação.
Nesse particular aspecto,
cita-se jurisprudência deste Tribunal:
[...]
O Projeto Básico constitui elemento
importante na caracterização do objeto a ser licitado, de forma a indicar seu
custo, o prazo de execução, sua viabilidade técnica e econômica, visando a
possibilitar a todos o mais amplo conhecimento sobre o objeto licitado, desde a
solução técnica pretendida até os tipos de materiais e serviços que serão, no
futuro, exigidos pelo órgão público, bem como a garantir a regular execução da
obra ou serviço licitado, evitando-se correções e aditamentos custosos.
O não cumprimento deste
requisito ou seu cumprimento de forma parcial é, sem qualquer dúvida, fator
responsável pelas inúmeras irregularidades nas contratações do Poder Público.
Projetos Básicos incompletos, vagos, deficientes e sem controle de qualidade
induzem a erros e gastos desnecessários para a Administração, o que deve ser
evitado em observância aos princípios da economicidade e eficiência.
Assim, para a Administração, é
importante que o projeto básico atenda a certos requisitos, uma vez que, quando
da realização de obras e serviços, os riscos para a Administração são maiores
que os existentes nas compras, pois os contratos, em geral, geram obrigações de
fazer, que se prolongam no tempo. Existem maiores riscos, até mesmo de haver a
multiplicação dos custos, superando as previsões iniciais.
Nesse sentido, justifica-se que
a Lei Nacional de Licitações tenha estabelecido, em seu art. 12, requisitos
próprios, cercados de maiores cautelas, para a contratação de obras e serviços,
buscando evitar o desperdício, contratações desnecessárias, precipitadas ou
inexequíveis.
Marçal Justen
Filho, ao comentar acerca do cumprimento dos requisitos estabelecidos no art.
7º, observa que: “As exigências não se constituem em requisito de mera forma.
Trata-se de redução do âmbito de
liberdade de escolha da Administração. O estrito cumprimento das exigências do
art. 7º elimina decisões arbitrárias ou nocivas. São eliminadas as
contratações: a) não antecedidas de planejamento; b) cujo objeto seja incerto,
c) para as quais inexista previsão de recursos orçamentários; d) incompatíveis
com as programações de médio e longo prazo. A Lei foi mais minuciosa e exigente
que o Decreto-Lei nº 2.300/86, o que evidencia a relevância do tema”.
Na mesma vertente, a lição
abalizada do professor Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
em seu artigo intitulado “A nova dimensão do projeto básico nas licitações,”
nestes termos: “Entre as boas inovações trazidas pela Lei nº 8.666/93, que
disciplinou, no âmbito da Administração Pública, o tema da licitação e
contratos, está a obrigatoriedade do projeto básico, para a contratação de
qualquer obra ou serviço. Conquanto ainda continuem alguns a sustentar que essa
exigência só cabe para as contratações na área de engenharia, a interpretação
literal indica, de forma clara, que esse requisito foi pontualmente
estabelecido pelo legislador pátrio de modo amplo. Efetivamente o art. 7º,
notadamente no § 2º, inciso I, da Lei em epígrafe, coloca a necessidade da
prévia elaboração do projeto básico, estabelecendo que somente poderão ser
licitados os serviços e as obras depois de atendida essa exigência”.
Destarte, tendo em vista a
importância do Projeto Básico na caracterização do objeto da licitação, o que
evitará, decerto, decisões arbitrárias ou nocivas, e considerando que a lei não
fez qualquer distinção, é de se concluir que a exigência do Projeto Básico não
existe só para serviços de engenharia, como sustentam alguns, mas para toda e
qualquer obra ou serviço. Esta é, a meu ver, a interpretação adequada do art.
7º da Lei nº 8.666/93.
[...]
Destaca-se, por oportuno, que,
obviamente, o conteúdo a ser exigido para esse anexo do edital sofrerá
modificações de acordo com o que se queira contratar, sendo tão mais completo
quanto mais complexa for a obra ou serviço em licitação.
Ante o exposto, conclui-se que o
Projeto Básico é exigência legal para contratação de obras e serviços, sem
qualquer distinção. A inobservância desse requisito, essencial à fase interna e
que se reflete na fase externa da licitação, pode ensejar a nulidade de todo o
certame, haja vista que a ausência desse detalhamento prévio é considerado
vício insanável. A propósito, nesse sentido vem se constituindo a
jurisprudência do eg. Tribunal de Contas da União
sobre o tema, como demonstrado.
[...]
O termo de referência é
documento que substitui o projeto básico nas licitações realizadas sob a
modalidade pregão, constituindo item de suma importância que descreve
minuciosamente todos os elementos necessários para a formalização da
contratação. A esse respeito, ensina Marçal Justen
Filho:
O dito “termo de referência”
consiste na formalização documental das avaliações da Administração acerca
disso tudo. Nele se evidenciarão as projeções administrativas acerca da futura
contratação, de molde a assegurar que a Administração disponha de todas as
informações necessárias a determinar a necessidade, a viabilidade e a
conveniência da contratação.
O termo de referência deve
conter, nos termos da legislação mineira aplicável à matéria (Decreto nº
44.786/08 - art. 4º, XX), todos os elementos necessários e suficientes (i) à
verificação da compatibilidade da despesa com a disponibilidade orçamentária,
(ii) ao julgamento e classificação das propostas, (iii) à definição da
estratégia de suprimento, (iv) à definição dos métodos de fornecimento ou de
execução do serviço e (v) à definição do prazo de execução do contrato.
A necessidade de fazer constar o
termo de referência como um anexo dos editais de licitação deflagrados com
vistas à aquisição de pneus está consolidada no âmbito desta Corte,
encontrando-se essa orientação expressa na cartilha intitulada “Principais
irregularidades encontradas em editais de licitação - PNEUS”’:
O Termo de Referência,
específico para a modalidade de pregão, ainda que pelo Sistema de Registro de
Preços, é um instrumento de gestão estratégica, sendo, portanto, indispensável.
Representa uma projeção detalhada da futura contratação, onde são abordadas
questões como: a definição do objeto de forma detalhada, clara e precisa; as
etapas; os prazos; o valor estimado da contratação quanto ao custo unitário e
global; a modalidade da licitação; a metodologia a ser observada (envolve tanto
o tipo de insumos utilizados quanto o manuseio destes insumos); os critérios de
avaliação de qualidade do produto; forma de apresentação do produto; critérios
para avaliação da habilitação dos proponentes, além de outras questões. Em
razão disto, o Termo de Referência é utilizado como um anexo ao edital de
licitação.
A ausência de termo de
referência anexo ao edital constitui, portanto, irregularidade, que afronta o
disposto no inciso II do art. 8º do Decreto Federal nº 3.555/00 e o inciso I do
§ 10º do art. 7º do Decreto Estadual nº 44.786/08, que estabelecem o termo de
referência como anexo necessário do ato convocatório do pregão. [...]
[...] a última irregularidade
apontada pela Unidade Técnica diz respeito à ausência do Termo de Referência
como Anexo do Edital.
No Estado de Minas Gerais, o
Decreto 44.786/2008 impõe claramente a obrigatoriedade do Termo de Referência
como um dos anexos do edital, a conferir:
“Art. 6º A fase preparatória do
pregão observará as seguintes regras:
I - caberá à unidade
solicitante, que em caso de necessidade será auxiliada pela área de suprimento,
elaborar o termo de referência e iniciar o processo, com as seguintes
especificações:
[...]
Art. 7º A elaboração do edital
de pregão deverá observar, no que couber, o disposto no art. 40 da Lei Federal
nº 8.666, de 1993.
[...]
§ 10. Constitui anexo do edital,
dele fazendo parte integrante:
I - Termo de Referência e”;
O Termo de Referência, segundo
dispõe o art. 8º, inciso II, do Decreto Federal nº 3.555/2000, é “o documento
que deverá conter elementos capazes de propiciar a avaliação do custo pela
Administração, diante de orçamento detalhado, considerando os preços praticados
no mercado, a definição dos métodos, a estratégia de suprimento e o prazo de
execução do contrato”. Trata-se, pois, de documento que apresenta uma projeção
detalhada da futura contratação, eis que aborda questões como: a definição do
objeto de forma detalhada, clara e precisa; as etapas; os prazos; o valor
estimado da contratação quanto ao custo unitário e global; a modalidade da
licitação; metodologia a ser observada; os critérios de avaliação de qualidade
do produto; forma de apresentação do produto; critérios para avaliação da
habilitação dos proponentes, dentre outras.
Vale, pois, ressaltar que, caso
o Termo de Referência se apresente falho ou incompleto, a licitação estará
viciada e a contratação não atenderá aos objetivos da Administração.
Então, é de se indagar: em
termos práticos, como deve ser feito o planejamento para a locação ou
licenciamento de sistemas em gestão pública? A resposta a essa indagação
perpassa o princípio constitucional da separação dos Poderes e a não
competência dos Tribunais de Contas para regulamentar a matéria, uma vez que a
Constituição confere ao ente federado o poder de se organizar, o que inclui, a
toda evidência, o poder de se normatizar.
De todo modo, sem ferir a
prerrogativa estadual e municipal, nada impede às Cortes de Contas, no
exercício de sua missão pedagógica, impor regras, rotinas e procedimentos
destinados a instrumentalizar o planejamento, assim como tecer recomendações a
respeito da matéria em pauta.
Ressalta-se que o Poder
Executivo Federal possui normatização relacionada a Bens e Serviços em Tecnologia
da Informação - TI, a qual pode ser utilizada como paradigma. Trata-se da
Instrução Normativa nº 04, de 12 de novembro de 2010, editada pela Secretaria
de Logística e Tecnologia da Informação - SLTI, do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão - MPOG, que dispõe sobre o processo de contratação de
Soluções de Tecnologia da Informação pelos órgãos integrantes do Sistema de
Administração dos Recursos de Informação e Informática - SISP - do Poder
Executivo Federal.
3.2 DA NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO: COMPRAR OU LOCAR? UTILIZAR SOFTWARES GRATUITOS?
Antes de deflagrar procedimento
licitatório tendente a obter o sistema de gestão pública, o gestor deve se
indagar qual é a opção, dentre as possíveis, que melhor atenda o interesse
público.
Seja qual for a alternativa
escolhida, cabe ao gestor expor em estudo técnico e/ou econômico os motivos da
escolha feita, especialmente se a opção, a princípio, revelar-se menos
vantajosa ao erário.
A elaboração desse estudo
decorre do princípio da motivação dos atos administrativos, fundamental para o
controle do regular exercício do poder discricionário, especialmente num Estado
Democrático de Direito. Sem motivação, inexiste transparência e sem
transparência não há controle. Por conseguinte, a falta de elementos para se
aferir a relação de pertinência entre as razões de fato e de direito com a
decisão do administrador público compromete a fiscalização confiada às Cortes
de Contas, bem como o exercício do controle social.
José dos Santos Carvalho Filho
sustenta que:
[...] o exercício do poder
discricionário deve sempre [...] sujeitar-se à devida contrapartida, esta
representada pelos direitos fundamentais à boa administração, assim considerada
a administração transparente, imparcial, dialógica, eficiente e respeitadora da
legalidade temperada.
Por sua vez, Marçal Justen Filho assim discorre sobre o controle de decisões
exercitadas por força de competência discricionária: “[...] Como toda decisão
exercitada em virtude de competência discricionária, admite-se controle
relativamente à compatibilidade entre os motivos e a realidade e no tocante à
adequação proporcional entre os meios e resultados”.
Vê-se, então, que a decisão do
gestor pela compra, locação do Sistema de gestão pública ou utilização de softwares gratuitos, no exercício da
discricionariedade, não significa ampla e irrestrita margem de atuação.
MOTIVAÇÃO - TRANSPARÊNCIA - CONTROLE - PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO
Cabe ao gestor, nos autos do
procedimento licitatório, fundamentar a escolha considerando, ao menos: (i) a vantajosidade de se utilizar softwares gratuitos existentes; (ii) a viabilidade de filiar-se às
redes de compartilhamento de soluções criadas pelo Governo Federal e Governo
Estadual;(iii) a viabilidade da celebração de consórcio público para a redução
do custo fixo de desenvolvimento do software;
(iv) vantajosidade de se adquirir a licença
permanente do software.
O gestor pode comprar ou locar o
software ou ainda utilizar software gratuito, desde que motive sua
opção sob os prismas da “vantajosidade” e da
“viabilidade”.
Ato administrativo
discricionário destituído de motivação é ato violador da transparência. E sem
transparência não há espaço para o exercício do controle, seja o estatal, seja
o social.
Nesse sentido, transcrevem-se
excertos de decisão desta Corte nos autos de nº 800.682:
[...] considero sanadas as
irregularidades, frise-se, por crer que a ausência de motivação, que consistia
no tema ora questionado, foi sanada com as justificativas apresentadas.
Não obstante, determino aos
Denunciados que, em futuros certames, motivem a opção pelo fornecimento
remunerado de softwares, pela
inviabilidade de realização de consórcios, a escolha pela locação de softwares e o fornecimento por uma mesma
empresa, bem como para todas as escolhas de mérito que forem realizadas na
condução dos processos licitatórios.
Na mesma linha, decisão deste
Tribunal nos autos de nº 804.626:
Ressalte-se, quanto a este último
item, que a ação colaborativa, consubstanciada, por exemplo, na formação de
consórcios públicos, regulados pela Lei nº 11.107/05, ou na contratação direta
de órgãos ou entidades que integram a Administração Pública, nos termos do
inciso XVI do art. 24 da Lei nº 8.666/93, possibilita a redução do custo fixo
da “construção” do software e é
medida plenamente viável, quando se considera a semelhança nos perfis
populacional e orçamentário de grande parte dos municípios mineiros.
Demais disso, é cada vez mais
comum o intercâmbio de informações e expertise
entre os órgãos e entidades da Administração Pública na área de tecnologia da
informação, seja pela cessão de softwares,
por meio da celebração de convênios, seja pela abertura de programas-fonte a
outros entes, com o retorno dos benefícios produzidos, uma vez que se assegura
aos favorecidos a possibilidade de modificar e adaptar os programas e sistemas
para fazê-los evoluir, para corrigi-los ou para enriquecê-los com novas
funcionalidades.
Deve-se mencionar, ainda, o
acelerado desenvolvimento de softwares
públicos, que atendem de forma cada vez mais satisfatória à demanda dos
gestores, auxiliando-os na gestão pública e permitindo grande economia nos
gastos com sistemas informatizados. Exemplo disso é o e-cidade,
software público de gestão municipal
patrocinado pelo governo federal, que no município de [...] permitiu a redução
das despesas mensais nesse setor de R$ 3.000,00 (três mil reais) para apenas R$
140,00 (cento e quarenta reais) [Essas informações foram retiradas de notícia
veiculada no Jornal Gazeta do Oeste, em 07.07.11, no endereço eletrônico:
http://www.g37.com.br/index.asp?c=padrao&modulo=conteudo&url=3578].
Com efeito, deve-se ponderar que
a discricionariedade do ato administrativo não ampara decisões antieconômicas,
isto é, o gestor municipal não pode, a pretexto de atuar no exercício de seu
poder discricionário, adotar estratégias que sejam prejudiciais ao interesse
público. A motivação é requisito indispensável ao controle do regular exercício
do poder — inclusive do poder discricionário — resguardando o cidadão e o
patrimônio público contra a transformação dessa discricionariedade em arbítrio.
No mesmo sentido, decisão havida
nos autos de nº 811.101:
[...] a meu sentir, o cerne da
questão se configura tão somente com a ausência de motivação para a escolha
pelos serviços/produtos licitados e, não, com a escolha efetuada pela
Administração, que tem cunho indiscutivelmente discricionário.
Neste particular, considero
sanadas as irregularidades, frise-se, por crer que a ausência de motivação, que
consiste no tema ora questionado, foi sanada com as justificativas
apresentadas.
Não obstante, determino aos
Denunciados que, em futuros certames, motivem a opção pelo fornecimento
remunerado de softwares, a
inviabilidade de realização de consórcios, a escolha pela locação de softwares e o fornecimento por uma mesma
empresa, bem como para todas as escolhas de mérito que forem realizadas na
condução dos processos licitatórios.
Seja locação, seja aquisição,
seja software livre.
Na fase de planejamento, o
gestor deve fundamentar o porquê da escolha, considerando ao menos:
(a) a vantajosidade
de se utilizar softwares gratuitos
existentes;
(b) a viabilidade de aliar-se às
redes de compartilhamento de soluções criadas pelos Governos Federal e
Estadual;
(c) a viabilidade da celebração
de consórcio público para a redução do custo fixo de desenvolvimento do software; e
(d) a vantajosidade
de se adquirir a licença permanente do software.
(Fonte: Tribunal de
Contas do Estado de Minas Gerais - 2015)
*
Contador, auditor, economista, administrador, professor universitário,
consultor do BEAP, diretor técnico da Magnus Auditores.
BOCO9311---WIN
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