DAS
IRREGULARIDADES EM EDITAIS DE LICITAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO, LOCAÇÃO OU
LICENCIAMENTO DE SOFTWARE DE GESTÃO PÚBLICA - MEF34063 - BEAP
COMENTÁRIOS
DE MÁRIO LÚCIO DOS REIS *
INTRODUÇÃO
Destacamos o título acima, que integra o capítulo 4
do ''Manual de boas práticas em licitação para contratação de sistemas de
gestão Pública'', editado em 2015 por uma plêiade de especialistas do egrégio
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, cujos capítulos
Neste ensejo, queremos ressaltar para nossos
assinantes os profundos estudos da doutrina e jurisprudência pesquisados pelo
TCE/MG que levaram à conclusão de não cabimento dos critérios de julgamento por
''melhor técnica '' ou ''técnica e preço'' nas licitações para contratação de
sistemas informatizados de gestão pública, salvo casos excepcionais.
Resta, pois, definitivo, que o critério de julgamento
será o de '' menor preço'', ficando a grande dificuldade e responsabilidade por
conta da especificação do termo de referência e do próprio edital,
assegurando-se o preço mais vantajoso, porém sem prejuízo da boa técnica
necessária, serviço de suporte e assistência técnica permanentes para
implantação, manutenção e customização eficazes, inclusive na importação da
base de dados do sistema anterior em caso de vir a ser substituído.
FRACIONAMENTO DO OBJETO
Discutiu-se muito se uma única empresa teria que
fornecer todos os softwares (julgamento pelo menor preço global) ou se
seria fracionado o objeto (julgamento pelo menor preço unitário), concluindo-se
que qualquer da hipótese adotada terá que ser criteriosamente motivada e
justificada nos autos do processo.
É muito importante, portanto, entender e deixar claro
que não se trata de um mero aluguel ou licenciamento de um programa, sendo mais
importante e até mais custoso, o suporte, a customização e a manutenção de todo
o sistema, com atuação de analistas e programadores competentes.
SEGURANÇA DO SISTEMA INFORMATIZADO
Se todos os softwares forem pertencentes a uma
única empresa, a integração entre os mesmos é praticamente automática, sendo
também os custos de manutenção mais reduzidos, pois um único profissional, em
uma única visita técnica, atenderá a todos os departamentos.
Com o atual nível de evolução do SICOM e outros
sistemas, é praticamente inconcebível a utilização de vários sistemas não
integrados entre si, além de ser minimizada a ocorrência de erros atribuídos
aos sistemas.
Finalmente salientamos a grande importância da
garantia, no contrato de softwares, da manutenção dos arquivos da base
de dados quando ocorrer a rescisão contratual, para o que se recomenda a
inclusão de cláusula que obrigue a empresa provedora do programa a liberar o
sistema para consultas aos arquivos com senha livre, definitiva e por prazo
indeterminado, sem mais ônus para a contratante após a rescisão contratual.
Transcrevemos a seguir o capítulo 4 e seus subitens
4.1, 4.2, 4.3 e 4.4, do manual ora analisado, a saber:
4 DAS IRREGULARIDADES EM EDITAIS
DE LICITAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO, LOCAÇÃO OU LICENCIAMENTO DE SOFTWARE DE
GESTÃO PÚBLICA
Por
tópicos, relacionam-se a seguir as principais deliberações desta Corte
referentes às licitações cujo objeto seja a aquisição, locação ou licenciamento
de softwares de gestão pública.
4.1 DA IMPROPRIEDADE DA ELEIÇÃO
DO TIPO DE LICITAÇÃO "TÉCNICA" OU "TÉCNICA E PREÇO" COMO
CRITÉRIO DE JULGAMENTO DA LICITAÇÃO
Concorrência, Tomada de Preços,
Convite, Leilão e Pregão são modalidades de licitação. Tipo de licitação, por
outro lado, é o critério de julgamento para a seleção da proposta mais
vantajosa. O art. 45, §1º, do Estatuto Licitatório pátrio, Lei n. 8.666/93,
prevê 04 (quatro) critérios de julgamento: (i) menor preço; (ii) melhor
técnica; (iii) técnica e preço e (iv) maior lance ou oferta.
Independentemente da modalidade
eleita para o procedimento licitatório, a regra nas licitações é o emprego do
tipo "menor preço", reservando-se o "maior lance ou oferta"
a situações específicas e a "melhor técnica" ou "técnica e
preço" a casos excepcionais.
Não se desconhece que é próprio
do serviço a sua natureza intelectual, típica quando a obrigação é de fazer.
Entretanto, esse atributo, isoladamente, não tem o condão de validar o tipo da
licitação "técnica" ou "técnica e preço" quando o objeto é
a locação ou o licenciamento de sistemas de gestão pública.
Com efeito, ainda que o serviço
em foco seja tipificado como complexo, os padrões de desempenho e de qualidade
são conhecidos, dominados e oferecidos amplamente no mercado. Assim, a
complexidade do objeto não impede a definição objetiva do que é posto em
disputa. Logo, a locação ou o licenciamento de sistemas de gestão pública
caracteriza-se como um serviço comum, nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei nº
10.520/2002, que institui a modalidade de licitação denominada Pregão.
Nesse sentido, esclarecedoras
manifestações do Tribunal de Contas da União - TCU, quanto à aparente oposição
entre "bens e serviços comuns" e "bens e serviços
complexos":
[…]
5. Não obstante a indicação
legislativa, a matéria continuaria controversa no âmbito da Administração
Federal e desta Corte de Contas, talvez em razão da longa e sedimentada prática
de contratação de bens e serviços de TI por licitação do tipo técnica e preço.
E, também, da confusão que ainda hoje se faz quanto ao que se entende por 'bens
e serviços comuns', no sentido de que seriam o oposto de 'bens e serviços
complexos', de maneira que os bens e serviços de TI, por serem muitas vezes
considerados "complexos" (portanto não seriam comuns) não poderiam
ser contratados por pregão.
6. Ocorre que 'bem e serviço
comum' não é o oposto de 'bem e serviço complexo'. Bens e serviços comuns,
segundo o art. 1º, § 1º, da Lei 10.520/02, são aqueles cujos padrões de
desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos por meio de
especificações usuais no mercado. Isto é, são aqueles que podem ser
especificados a partir de características (de desempenho e qualidade) que
estejam comumente disponibilizadas no mercado pelos fornecedores, não
importando se tais características são complexas, ou não.
O administrador público, ao
analisar se o objeto do pregão enquadra-se no conceito de bem ou serviço comum,
deverá considerar dois fatores: os padrões de desempenho e qualidade podem ser
objetivamente definidos no edital? As especificações estabelecidas são usuais
no mercado? Se esses dois requisitos forem atendidos, o bem ou serviço poderá
ser licitado na modalidade pregão.
A verificação do nível de
especificidade do objeto constitui um ótimo recurso a ser utilizado pelo
administrador público na identificação de um bem de natureza comum. Isso não
significa que somente os bens pouco sofisticados poderão ser objeto do pregão,
ao contrário, objetos complexos podem também ser enquadrados como comuns.
A complexidade, portanto, não é
atributo que retira da locação ou do licenciamento de softwares a sua
natureza de serviço comum.
A padronização do software,
uma das características necessárias para nomeá-lo como comum, não precisa ser
absoluta. Em se tratando de sistemas destinados às diversas áreas da gestão
pública, v.g., orçamento, contabilidade, patrimônio,
frotas, licitações, compras, contratos, tributação, orçamento, pessoal, dentre
outros módulos, há soluções prontas, padronizadas e disponíveis no mercado que
podem ser adaptadas às demandas de cada ente. Essa padronização quer significar
"a possibilidade de substituição de uns por outros com o mesmo padrão de
qualidade e eficiência", nos termos da autorizada doutrina de Hely Lopes Meirelles.
Por essas razões, entende-se que
é impróprio utilizar os tipos de licitação "melhor técnica" ou
"técnica e preço" para locação ou licenciamento de sistemas de gestão
pública, porquanto a natureza intelectual, por si só, não é essencial para a
satisfatória execução desse objeto. Via de regra, o critério de julgamento em
licitações desse tipo é o "menor preço" e a modalidade de licitação,
recomendada pelo TCEMG aos municípios, é o Pregão, dada a sua presunção de
eficiência e de notável utilidade para obtenção de preços mais interessantes ao
poder público. Entretanto, a legislação federal e a estadual mineira, que
constituem paradigmas para a adoção de boas práticas pelos gestores municipais,
tornaram obrigatória a adoção da modalidade pregão para aquisição de bens e
serviços comuns.
Para locação ou licenciamento de
sistemas de gestão pública, o tipo de licitação é o "menor preço" e
constitui grave violação à norma reguladora da matéria utilizar como critério
de julgamento a "melhor técnica" e "técnica e preço". Nas
esferas federal e estadual, a modalidade Pregão é obrigatória por força de
legislação. No caso dos municípios, a modalidade recomendada pelo TCEMG é o
Pregão.
A jurisprudência do TCEMG
consolidou-se quanto à inadequação do tipo "melhor técnica" ou
"técnica e preço" para locação ou licenciamento de sistemas de gestão
pública. Em sequência, colacionam-se alguns excertos de decisões proferidas
nessa linha:
a) Da escolha inadequada do tipo
'Técnica e Preço'
[...]
Inicialmente, cumpre esclarecer
que o art. 46 da Lei nº 8.666/93 dispõe que o tipo "técnica e preço"
será utilizado, exclusivamente, para serviços de natureza predominantemente
intelectual, o que não é o caso dos autos.
A respeito do tipo 'técnica e
preço', Hely Lopes Meirelles ["in"
Licitação e Contrato Administrativo. 14ª ed., atualizada por Eurico de Andrade
Azevedo e Vera Monteiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 90]
preleciona:
A Lei nº 8.666, de 1993, dispõe
que o tipo de licitação de melhor técnica e técnica e preço sejam utilizados
exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual
(projetos, cálculos, fiscalização, gerenciamento e outros ligados à engenharia
consultiva em geral). Não obstante, em caráter excepcional, poderão ser
adotados para fornecimento de bens, execução de obras ou prestação de serviços
de grande vulto, dependentes de tecnologia sofisticada, nos casos em que o
objeto pretendido admita soluções alternativas e variações de execuções, com
repercussões significativas sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e
durabilidade.
Com efeito, depreende-se que o
objeto da licitação não consiste na prestação de serviços intelectuais em que
se exijam a arte e o talento humanos para sua criação e execução satisfatória,
mas sim de serviços comuns de informática, com amplas opções no mercado de
diversas empresas que prestem os serviços objeto da contratação em análise, com
padrão usual de execução.
Assim, tendo em vista que no
presente caso a Administração poderá desempenhar suas funções por meio de uma
prestação de serviço que atenda aos requisitos mínimos do edital, sem haver
necessidade de um serviço que apresente características especiais ou
peculiares, entendo que o tipo 'menor preço' melhor se adéqua ao presente caso.
Ademais, não pode prevalecer o
argumento dos defendentes de que o Decreto Federal nº 1.070/94 impunha a adoção
do tipo "técnica e preço", pois, além dessa regra aplicar-se
exclusivamente no âmbito da União, já existia regra expressa, aplicável a todos
os entes da federação, autorizando a adoção de licitação do tipo 'menor preço'
e da modalidade pregão na aquisição de serviços comuns de informática.
Considero irregular, portanto, o
tipo de licitação adotado.
b) Inadequada escolha do tipo de
licitação 'técnica e preço'.
[...]
Assim, apesar da argumentação
desenvolvida pela denunciada, entendeu o órgão técnico ser imprópria a
utilização de licitação do tipo técnica e preço para o certame em questão,
tendo em vista que os bens e serviços previstos no objeto são classificados
como comuns, sendo recomendada, portanto, a utilização da modalidade Pregão,
considerando que esta poderá se afigurar como a solução mais econômica, além de
mais célere, na busca e obtenção do menor preço ofertado, reduzindo, por
consequência, o custo total do procedimento e da aquisição dos bens e serviços
licitados.
Ademais, se os serviços e bens a
serem contratados podem ser caracterizados por 'comuns', apesar de complexos,
como no caso em tela, vislumbro vantagens inquestionáveis para a Administração
referentes à competitividade, celeridade e economicidade na sua contratação por
menor preço, não tendo prosperado nenhum argumento em contrário trazido aos
autos, nada que lograsse êxito em justificar a escolha de modalidade de técnica
e preço para o certame em espécie.
Por tal razão, entendo imprópria
a modalidade e o tipo de critério de julgamento escolhidos, recomendando ao
[...] que nas licitações a serem realizadas no Município opte sempre que
possível pelo certame que vise o menor preço a ser contratado sem,
evidentemente, efetuar concessões ao critério de bom serviço a ser prestado.
[...]
Entendo que o art. 46 da Lei n.
8.666/93 é taxativo ao determinar a adoção do tipo de licitação 'técnica e
preço', tão somente, para serviços de natureza predominantemente intelectual,
ou seja, em situações especialíssimas em que o objeto a ser licitado deva ser
dotado da melhor técnica possível.
O Tribunal de Contas da União,
inclusive, entende que:
'É vedada a licitação do tipo
'técnica e preço' quando não estiver caracterizada a natureza predominantemente
intelectual da maior parte do objeto que se pretende contratar, a vista do
disposto no art. 46, caput, da Lei nº 8.666/1993.' Acórdão 2391/2007
Plenário (Sumário)
Marçal Justen
Filho ['in' Comentários à lei de licitações e contratos administrativos.
14ª ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 621], pondera, aliás, que o § 4º do art.
45 da Lei de Licitações e Contratos representa um estágio inicial da evolução
tecnológica e que este dispositivo perdeu sua razão de ser com a evolução e
progresso dos bens e serviços na área de informática, os quais se inseriram no
processo de produção em massa. Adverte, nesse sentido, que:
'[...] tem de interpretar-se o
§4º de modo compatível com a Constituição, para evitar o resultado prático de a
Administração ser obrigada a desembolsar valores superiores aos necessários. A
licitação de tipo técnica será aplicada sempre que a necessidade administrativa
envolver alguma característica especial ou peculiar, que não possa ser
satisfeita por meio de produtos padronizados.
Ausentes as justificativas
pormenorizadas de que o serviço demandado é predominante intelectual a ensejar
a obtenção de proposta de maior qualidade e menor preço possível e diante das
ressalvas feitas Órgão Técnico de que "há soluções de TI prontas, amplamente
comercializadas, que exercem várias das funções especificadas nos Anexos X e
XI, senão todas", fl . 110, irregular a escolha
do tipo de licitação técnica e preço.
No mesmo sentido, decisões desta
Corte nos autos de nº 800.679, 811.101 e 862.638:
3. Da escolha do tipo de
licitação técnica e preço
[...]
Entendo que o art. 46 da Lei n.
8.666/93 é taxativo ao determinar a adoção do tipo de licitação 'técnica e
preço', tão somente, para serviços de natureza predominantemente intelectual,
ou seja, em situações especialíssimas em que o objeto a ser licitado deva ser
dotado da melhor técnica possível.
O Tribunal de Contas da União,
inclusive, entende que:
É vedada a licitação do tipo
'técnica e preço' quando não estiver caracterizada a natureza predominantemente
intelectual da maior parte do objeto que se pretende contratar, à vista do
disposto no art. 46, caput, da Lei nº 8.666/1993. Acórdão 2391/2007
Plenário (Sumário)
[...]
Ausentes as justificativas
pormenorizadas de que o serviço demandado é predominante intelectual a ensejar
a obtenção de proposta de maior qualidade e menor preço possível, irregular a
escolha do tipo de licitação técnica e preço.
6. Inadequada escolha do tipo de
liquidação 'técnica e preço'
Da manifestação técnica de fls.
451/452, extrai-se, em suma, que 'a utilização de licitação tipo técnica e
preço é imprópria para o certame em análise'.
Os defendentes alegaram, fls.
486, que 'o critério de julgamento para contratação de bens e serviços de
informática no presente caso, é o de técnica e preço, porque o objeto da
licitação é de locação de software para a administração pública, o que
s. m. j. é considerado específico, visto que a administração pública tem suas
peculiaridades e necessita muitas vezes de programas desenvolvidos para cada
Município, e que, na implantação dos sistemas, há critérios diferenciados, por
exemplo, em razão do regime de previdência adotado, se próprio ou oficial, do
regime jurídico dos servidores, se celetistas ou estatutários, se há pagamento
de FGTS ou quinquênios, enfim, argumentam que são várias as diferenciações de
Município para Município, que exigem, muitas vezes, adaptações técnicas e
programadores, para adequação dos sistemas operacionais às realidades locais'.
O Órgão Técnico, no reexame
(fls. 537/538), afastou as alegações da defesa ressaltando que
'[...]' devido à padronização
existente no mercado, os bens e serviços de tecnologia da informação geralmente
atendem a protocolos, métodos e técnicas preestabelecidos e conhecidos e a
padrões de desempenho e qualidade que podem ser objetivamente definidos, por
meio de especificações usuais no mercado, logo, via de regra, esses bens e
serviços devem ser considerados comuns para fins de utilização do procedimento
licitatório, na modalidade Pregão.
Assim, apesar do argumento
exposto pelos Defendentes, de que a Administração tem suas peculiaridades e
necessita muitas vezes de adaptações nos programas, objetivando atender as
necessidades de cada Município, tais adaptações não implicam a descaracterização
da classificação dos programas como bens e serviços comuns. Pelo exposto, na
análise já mencionada, entendeu o Órgão Técnico ser imprópria a utilização de
licitação do tipo técnica e preço para o certame em questão, tendo em vista que
os bens e serviços previstos no objeto são classificados como comuns, sendo
recomendada, portanto, a utilização da modalidade Pregão, considerando que esta
poderá se afigurar como a solução mais econômica, além de mais célere, na busca
e obtenção do menor preço ofertado, reduzindo, por consequência, o custo total
do procedimento e da aquisição dos bens e serviços licitados.
Quanto à menção dos Defendentes,
acerca da utilização como parâmetro de julgamento, do critério de avaliação por
técnica e preço, na forma então estabelecida no art. 1º, do Decreto nº
1.070/94, conforme já observado no 'item 2.4' do presente estudo técnico, o
regulamento da licitação em comento foi expedido em 05.10.2009, como se vê à
fl. 41, portanto, posteriormente, à época da entrada em vigor da Lei nº 10.520/2002.
Com relação ao citado critério
de julgamento por técnica e preço, estabelecido no art. 1º, do mencionado
Decreto nº 1.070/94, releva reproduzir trecho do voto proferido pelo Exmo. Sr.
Ministro Relator Benjamin Zimler, também, contido no
já citado Acórdão TCU-Plenário nº 313/2004, no qual
se destacou a impropriedade da aplicação do referido critério de julgamento, a
partir da vigência da Lei nº 10.520/2002, nos termos do pronunciamento
seguinte:
Tendo em vista o disposto no
art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 10.520/2002, acima citado, bem comum é
aquele para o qual é possível definir padrões de desempenho ou qualidade,
segundo especificações usuais no mercado. Destarte, o bem em questão não
precisa ser padronizado nem ter suas características definidas em normas
técnicas. Da mesma forma, não se deve restringir a utilização do pregão à
aquisição de bens prontos, pois essa forma de licitação também pode visar à
obtenção de bens produzidos por encomenda. Do exposto decorre não ser taxativa,
mas sim meramente exemplificativa e orientadora a relação constante do Decreto
nº 3.555/2000. Por tudo isso, revela-se frágil o argumento fundado no fato de
que os serviços de assistência técnica, previstos no Edital do Pregão nº
127/2002, não constarem do rol inserto no Anexo II do referido Decreto.
A alegação de que as compras de
equipamentos de informática, por exigência do Decreto nº 1.070/1994, devem ser
obrigatoriamente precedidas de licitação do tipo "técnica e preço"
também não merece prosperar. Afinal, a Lei nº 10.520/2002, diploma mais recente
e hierarquicamente superior àquele Decreto, revogou as disposições a ela
contrárias nele contidas. Assim, foi revogado o artigo desse Decreto que exigia
o tipo 'técnica e preço' para toda e qualquer licitação para contratação de
'bens e serviços de informática'. [...]'
Dessa forma, se observadas as
interpretações do Tribunal de Contas da União, a respeito do tema em questão,
tem-se que as disposições então contidas no Decreto n.º 1.070/94, contrárias às
normas estabelecidas na Lei n.º 10.520/2002, não mais prevalecem, ocorrendo,
inclusive, a exclusão do critério de julgamento 'por técnica e preço', nas
licitações destinadas à aquisição de 'bens e serviços de informática', pelo que
entende este Órgão Técnico, como imprópria, a adoção da licitação do tipo
técnica e preço, no procedimento licitatório instaurado pela Câmara Municipal
de Campestre, cujo critério de julgamento deve ser exclusivamente o de 'menor
preço', tendo em vista que os bens e serviços licitados são considerados
comuns, razão por que não ensejam acolhimento as alegações apresentadas pelos
Defendentes."
Assim, se os serviços e bens a
serem contratados podem ser caracterizados por 'comuns', apesar de complexos,
como no caso em tela, vislumbro vantagens inquestionáveis para a Administração
referentes à competitividade, celeridade e economicidade na sua contração por
menor preço, não tendo prosperado nenhum argumento em contrário trazido aos
autos, nada que lograsse êxito em justificar a escolha de modalidade de técnica
e preço para o certame em espécie.
Por tal razão, entendo imprópria
a modalidade e o tipo de critério de julgamento escolhidos, recomendando ao
Gestor de Campestre que nas licitações a serem realizadas no Município opte
sempre que possível pelo certame que vise o menor preço a ser contratado sem,
evidentemente, efetuar concessões ao critério de bom serviço a ser prestado.
2) Da adoção da modalidade
pregão
Aduz o Denunciante que o objeto
licitado é extremamente complexo e detalhado, não se encaixando no conceito de
bens e serviços comuns, motivo pelo qual entende ser indevida a utilização da
modalidade pregão no presente caso. Argumenta, ainda, que por tratar-se de
contratação de bens e serviços de informática, deveria ter sido adotado o tipo
técnica e preço e não o tipo menor preço, como foi feito.
O Órgão Técnico, às fls.
269/283, concluiu que a utilização de licitação tipo menor preço é própria para
o objeto do edital e, ainda, que os bens e serviços previstos no objeto são
comuns, recomendando a utilização da modalidade pregão.
O Parquet
de Contas acompanhou o parecer técnico, fls. 292/299.
Os defendentes não adentraram
nesta questão.
A modalidade licitatória pregão
foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro por intermédio da Lei nº
10.520/02, visando acelerar o processo de escolha de futuros contratados pela
Administração e, assim, propiciar maior celeridade e eficiência ao processo de
seleção.
O objeto do pregão destina-se à
aquisição de bens e à contratação de serviços comuns, conforme preceitua o art.
1º da Lei nº 10.520/02.
O objeto licitado por meio do
Pregão Presencial nº 156/2011, cujo edital é foco de análise nos presentes
autos, constitui a prestação de serviços comuns de informática, com ampla
receptividade no mercado e com padrões de qualidade e desempenho que podem ser
objetivamente definidos no edital.
Ademais, trata-se de serviço que
não apresenta complexidade para sua execução, podendo ser cumprido por qualquer
interessado que preencha os requisitos de habilitação.
Nesse contexto, o pregão
afigura-se como a modalidade mais adequada para o certame.
Sobreleva notar que, por
tratar-se de modalidade mais célere, havendo possibilidade de adoção da
modalidade pregão, esta deve ser escolhida pelo administrador, em atenção ao
princípio da economicidade. Vale ressaltar, inclusive, que a legislação federal
e a estadual mineira tornaram obrigatória a adoção da modalidade pregão para
aquisição de bens e serviços comuns [Art. 4º, Decreto nº 5.450/05 e art. 2º do
Decreto Estadual nº 44.786/08].
Dessa forma, considerando as
vantagens manifestas que o pregão vem trazendo para a Administração Pública,
como a redução dos preços contratados, a simplificação e a celeridade dos
procedimentos, entendo que a Administração utilizou modalidade adequada no
procedimento licitatório em exame.
No que atine ao argumento do
Denunciante, no sentido de que a adoção do tipo menor preço não foi adequada,
sendo cabível para a presente hipótese o tipo de licitação técnica e preço,
tenho a considerar que o art. 46 da Lei nº 8.666/93 dispõe que o tipo técnica e
preço deverá ser utilizado, exclusivamente, para serviços de natureza
predominantemente intelectual, o que não é o caso dos autos.
'Hely
Lopes Meirelles - Licitação e Contrato Administrativo - 14ª edição, atualizada
por Eurico de Andrade Azevedo e Vera Monteiro - Malheiros Editores Ltda - 2006, pág. 90'
A respeito do tipo técnica e
preço, Hely Lopes Meirelles ['in' Licitação e
Contrato Administrativo - 14ª edição, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo
e Vera Monteiro - Malheiros Editores Ltda - 2006,
pág. 90], preleciona:
'A Lei 8.666, de 1993, dispõe
que o tipo de licitação de melhor técnica e técnica e preço sejam utilizados
exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual
(projetos, cálculos, fiscalização, gerenciamento e outros ligados à engenharia
consultiva em geral). Não obstante, em caráter excepcional, poderão ser
adotados para fornecimento de bens, execução de obras ou prestação de serviços
de grande vulto, dependentes de tecnologia sofisticada, nos casos em que o
objeto pretendido admita soluções alternativas e variações de execuções, com
repercussões significativas sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e
durabilidade.
'[...]'
Com efeito, depreende-se que o
objeto da licitação não consiste na prestação de serviços intelectuais em que
se exijam a arte e o talento humanos para sua criação e execução satisfatória,
mas sim de serviços comuns de informática, com amplas opções no mercado de
diversas empresas que prestam os serviços objeto da contratação em análise, com
padrão usual de execução.
Assim, tendo em vista que no
presente caso a Administração poderá desempenhar suas funções por meio de uma
prestação de serviço que atenda aos requisitos mínimos do edital, sem haver
necessidade de um serviço que apresente características especiais ou
peculiares, entendo que o tipo menor preço melhor se adéqua ao presente caso.'
4.2 DA DESPROPORCIONALIDADE
NOS PESOS ATRIBUÍDOS À TÉCNICA E AO PREÇO
Em alguns casos, os serviços de
tecnologia da informação serão considerados de natureza predominantemente
intelectual por envolverem alguma característica especial ou peculiar que não
possa ser encontrada em produtos padronizados usualmente disponíveis no
mercado, hipótese de desenvolvimento de softwares.
Cabível a licitação do tipo
técnica e preço, nesse caso, é necessário que o gestor justifique, na fase
interna, os fatores de ponderação das notas das propostas técnica e preço, os
quais devem ser proporcionais ao grau de complexidade dos serviços a serem
contratados, notadamente se os pesos das valorações dessas propostas forem
diferentes de 50%.
Essa justificativa visa demonstrar,
de forma transparente, se os fatores eleitos privilegiam, de um lado, a
isonomia e a competitividade e, de outro, implicam o aumento indevido de
preços, o que poderia redundar numa contratação lesiva ao Erário, conforme
entendimento do TCEMG:
[...] Falta de razoabilidade
para a pontuação dos critérios técnicos, bem como da desproporção na valoração
do julgamento em 70% de técnica e 30% de preço (Item 12.2.5 do Edital)
Às fls. 944/946, o órgão técnico
entendeu quanto à valoração dos critérios que os itens 12.1 e 12.2.5 do Edital
estabelecem expressiva e injustificada valoração de 70 % (setenta por cento) em
relação ao critério técnico, imputando o ínfimo patamar de 30% (trinta por
cento), para o critério financeiro, o que destoa das boas práticas públicas.
Sobre o tema, os denunciados
alegam que, "ao realizar a valoração técnica (7) X preço (3), o ente
observou estritamente o disposto nos incisos IV e V do art. 3º do Decreto nº
1.070/94, que regulamenta o artigo 3º da Lei nº 8248/1991 e dispõe sobre
contratações de bens e serviços de informática e automação". Afirmaram que
do critério adotado depreende-se um valor justo e condizente com o mercado e
obtém um serviço completo e que atende integralmente as necessidades da
Administração Municipal.
No reexame de fls. 1288/1289, o
órgão técnico ratificou o entendimento firmado inicialmente, no sentido de que,
'no procedimento licitatório em análise, deve ser adotado o tipo de licitação
menor preço, eis que os serviços a serem fornecidos são comuns no mercado, não
exigindo uma tecnologia sofisticada, sendo que o critério menor preço
asseguraria à Administração uma contratação de menor custo e a fixação de peso
maior para o critério técnico não apresenta razoabilidade'.
A posição do Tribunal de Contas
da União sobre o tema é elucidativo, como se infere do Acórdão nº 828/2007- TCU-Plenário:
74. Assim, a adoção do peso 7
para a avaliação da proposta técnica (item 11 do edital, fl. 63) correspondendo
ao mais alto nível de complexidade técnica permitido pela legislação, não foi
adequado, nem justificado pela Ancine.
75. Todavia, o risco
existente no caso da licitação do tipo técnica e preço, como a ora examinada,
em que a técnica é valorada como o fator mais importante, é sagrar-se vencedor
o concorrente que obtenha a mais alta pontuação técnica, embora ofereça preço
elevado.'
Nesta esteira, a explicação
fornecida não ampara tecnicamente a valoração exacerbada da técnica, se
considerada a especialidade ou a complexidade dos serviços que serão prestados,
bens e serviços que, na atualidade, são relativamente comuns à área de
informática.
Assim, manifesto-me pela
irregularidade do critério de pontuação adotado nos itens 12.1 e 12.2.5 do
Edital. 24
[...] Da desproporcionalidade
nos pesos atribuídos à técnica e ao preço
A Unidade Técnica considerou
irregulares e desproporcionais os pesos atribuídos para os critérios de técnica
e preço, uma vez que foi determinado peso 7 para avaliação da proposta técnica
e peso 3 para a proposta de preço, o que poderia culminar em uma contratação
desvantajosa para a Administração.
Após a ratificação do
apontamento pelo Parquet de Contas, os
responsáveis asseveraram, em sede de defesa, que os percentuais fixados estão
em consonância com o disposto no art. 3º do Decreto Federal nº 1.070/94 e que
nem sempre o menor custo da contratação representa uma maior vantagem para a
Administração (fl. 936).
A Unidade Técnica reafirmou a
inaplicabilidade do mencionado decreto ao presente caso e ratificou o entendimento
anterior.
O Ministério Público de Contas
manifestou-se pela irregularidade do item em comento.
Com efeito, naquelas situações
em que for imperiosa a realização de licitações do tipo 'técnica e preço', o
que não se afigura no presente caso, a eleição dos critérios deve respeitar o
princípio da proporcionalidade. Isso significa que devem ser graduadas as
exigências técnicas e os encargos que elas gerarão, sendo forçoso que exista
vínculo de adequação entre o critério eleito e a necessidade pública a ser
satisfeita, com vistas a evitar o desembolso desnecessário de recursos.
No procedimento licitatório em
análise, conforme demonstrado no item anterior, o tipo 'técnica e preço' não é
adequado para o objeto da contratação, que constitui serviço comum.
Nesse cenário, não se justifica,
com muito mais razão, a atribuição de peso muito mais significativo para o
critério técnico.
Cabe acrescentar que o
privilégio excessivo conferido à técnica em detrimento do critério de preço
deve ser acompanhado de justificativa apta a demonstrar sua razoabilidade, de
modo a comprovar-se que ele não proporcionará aumento indevido nos custos em
prol da obtenção de pequenas vantagens técnicas.
Reconheço, portanto, a
irregularidade dessa cláusula editalícia. 25
No mesmo sentido, decisão
exposta nos autos de nº 800.679:
[...]
4. Da falta de razoabilidade
para a pontuação dos critérios técnicos e da desproporção na valoração do
julgamento em 70% técnica e 30% preço
A Coordenadoria de Exame de
Instrumento Convocatório de Licitação entendeu, inicialmente, que a fixação de
peso maior para o critério técnico, na forma estabelecida pelo edital em seu
item 16.1 e 16.2.5, não apresenta razoabilidade e pode prejudicar a
competitividade pelo estabelecimento de valorização desarrazoada e sem relação
de pertinência com os requisitos realmente indispensáveis à boa execução dos
serviços.
O Tribunal de Contas da União
assim também tem se posicionado sobre a matéria:
'O privilégio excessivo da
técnica em detrimento do preço, sem haver justificativas suficientes que
demonstrem a sua necessidade, pode resultar em contratação a preços
desvantajosos para a Administração. O estabelecimento de condições mais
rigorosas na licitação do que aquelas que serão exigidas durante a execução contratual,
especialmente considerando os aspectos de pontuação da proposta técnica, pode
resultar na seleção de proposta altamente focada em quesitos técnicos sem
correlação com o beneficio efetivamente esperado para a execução contratual,
com sobrevalorização dos serviços sem aproveitamento de todo o potencial
técnico exigido no certame.' Acórdão 1782/2007 Plenário (Sumário)
Tendo em vista que considerei
irregular a escolha do tipo de licitação técnica e preço, vez que ausentes
justificativas no procedimento de que o serviço demandado é predominantemente
intelectual, ensejando obtenção de proposta de maior qualidade e menor preço
possível, recomendo aos gestores que, em
futuras licitações em que seja admissível a técnica e preço, registrem, no
procedimento administrativo, justificativa circunstanciada para a pontuação dos
critérios de julgamento que devem ser, necessariamente, razoáveis.
Acerca das obrigações da
Administração no processo de escolha dos fatores de ponderação técnica, o
Tribunal de Contas da União, por meio do Acórdão 1330/2008, assim se
manifestou:
'[...] 9.4.6. Ao fixar critérios
de julgamento de uma licitação, como fatores de ponderação de técnica e preço e
quantitativo de funcionários, justifique expressamente esses fatores, que devem
ser proporcionais ao grau de complexidade dos serviços a serem contratados. Ademais,
se os pesos forem diferentes de 50%, devem ser justificados de forma
circunstanciada, visando demonstrar que não representam nem privilégio nem
direcionamento e não proporcionarão aumento de preços indevido em decorrência
de pequenas vantagens técnicas'.
Por via de regra, o tipo de
licitação é o "menor preço". Licitação do tipo "técnica e
preço" somente se impõe quando o trabalho for de natureza predominantemente
intelectual. A exacerbação da valoração da nota técnica deve ser evitada para
preservar a isonomia, a competitividade e a obtenção de preços razoáveis. Se
destoarem de 50%, os fatores de ponderação das notas das propostas devem ser
expressamente justificados e guardar relação de proporcionalidade com o grau de
complexidade dos serviços a serem contratados.
4.3 DA ILICITUDE DE EXIGÊNCIA DE
CERTIFICAÇÕES COMO REQUISITO DE HABILITAÇÃO OU CLASSIFICAÇÃO DE PROPOSTAS
Os princípios da legalidade e da
isonomia, previstos no art. 37, inc. XXI, da CR e no art. 3º da Lei nº
8.666/93, constituem alicerces do procedimento licitatório. Este, por sua vez,
tem por escopo não só possibilitar a escolha da melhor proposta para a
Administração, mas também resguardar a igualdade de direitos a todos os
interessados estabelecidos no mercado.
Disso decorre que é defesa a
prática dos atos previstos no art. 3. § 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.666/93,
in verbis:
Art. 3º [...].
§ 1º É vedado aos agentes
públicos:
I - Admitir, prever, incluir ou
tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam,
restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam preferências ou
distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de
qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico
objeto do contrato;
II - estabelecer tratamento
diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou
qualquer outra, entre empresas brasileiras e estrangeiras [...].
Esclarece Marçal Justen Filho que:
[...] o ato convocatório tem de
estabelecer as regras necessárias para seleção da proposta vantajosa.
[...]. Respeitadas as exigências
necessárias para assegurar a seleção da proposta mais vantajosa, serão inválidas
todas as cláusulas que, ainda indiretamente, prejudiquem o caráter
'competitivo' da licitação. Assegura-se tratamento igualitário aos interessados
que apresentem condições necessárias para contratar com a Administração.
Segundo entendimento firmado no
egrégio TCU:
[...] quando aplicada à
licitação, a igualdade veda, de modo terminante, que o Poder Púbico promova
discriminações entre os participantes do procedimento seletivo, mediante a
inserção, no instrumento convocatório, de cláusulas que afastem eventuais
proponentes qualificados ou os desnivelem o julgamento.
Nesse sentido, a Lei nº 8.666/93
determina que:
Art. 27. Para a habilitação nas
licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa
a:
I - habilitação jurídica;
II - qualificação técnica;
III - qualificação
econômico-financeira;
IV - regularidade fiscal. (Vide
Lei nº 12.440, de 2011) (Vigência)
V - cumprimento do disposto no
inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 9.854,
de 1999).
Para Marçal Justen
Filho, a exigência constante no art. 27 "significa proibir à Administração
impor requisito de habilitação distinto daqueles previstos".
Também, nas palavras de Carlos
Pinto Coelho "A redação do art. 27 é precisa. Estabelece exatamente os
requisitos limítrofes para participação dos interessados no procedimento".
Entretanto, prática muito comum
nas licitações é a exigência de certificações (a exemplo da ISO) para fins de
habilitação e classificação de propostas, o que afronta o § 5º do art. 30 da
Lei nº 8.666/93:
Art.
[...]
§ 5º É vedada a exigência de
comprovação de atividade ou de aptidão com limitações de tempo ou de época ou
ainda em locais específicos, ou quaisquer outras não previstas nesta Lei, que
iniba a participação na licitação.
O Enunciado de Súmula nº 117 desta
Corte de Contas assinala:
Nos atos convocatórios de
licitação, as Administrações Públicas Estadual e Municipais não poderão exigir
apresentação de certificado de qualidade ISO ou outro que apresente as mesmas
especificidades como requisito para habilitação de interessados e classificação
de propostas.
No mesmo sentido é a
jurisprudência do TCU:
As exigências contidas no art.
30 da Lei nº 8.666/93 são do tipo numerus clausus, ou seja, encontram-se esgotadas naquele
dispositivo, sendo defeso aos diversos órgãos e entidades da Administração
Pública Federal, inovar[...]. Tais exigências somente seriam justificáveis se
os referidos requisitos fossem previstos em lei especial, passando a situação,
então, a enquadrar-se no inciso IV do referido art. 30. Tal situação,
entretanto, caso existisse, deveria ser expressamente consignada no edital de
licitação, em nome da motivação que deve nortear os atos administrativos. No
caso em exame, tem-se que o edital não fez qualquer alusão a eventuais leis
especiais que estivessem a requerer o cumprimento das ditas exigências.
Este Tribunal de Contas já
assentou entendimento de que a exigência de certificado ISO não pode ser
utilizada como critério eliminatório em processo licitatório, mas, quando
necessário, como critério classificatório e com pontuação razoável.
Enfim, para efeito de
qualificação técnica, o edital deve se limitar a exigir apenas e tão somente os
documentos expressamente previstos no art. 30 da Lei n. 8.666/93 ou impô-los
consoante as prescrições ali contidas.
Não é despiciendo
ressaltar que os procedimentos de certificação envolvem investimento por parte
da empresa a ser certificada, o que pode redundar em fator impeditivo à
participação no certame. Por outro lado, o procedimento de certificação requer
tempo, no mais das vezes incompatível com o prazo destinado à apresentação das
propostas no certame, o que configura obstáculo intransponível à
competitividade.
Logo, é antijurídico obrigar o
licitante a apresentar certificação de qualquer espécie como condição de
habilitação ou de classificação de proposta.
Certificados de qualidade não
podem ser utilizados como requisito de habilitação no processo licitatório.
Todavia, quando necessários, podem ser exigidos como requisito de pontuação em
licitação do tipo "técnica e preço", observada a razoabilidade da
valoração da nota.
4.4 DO PARCELAMENTO DO OBJETO
Estatui o art. 23, § 1º, da Lei
nº 8.666/93 que as obras, serviços e compras efetuadas pela Administração serão
divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente
viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos
recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da
economia de escala.
A propósito, a jurisprudência do
TCEMG arquitetada em torno da matéria culminou na edição da Súmula nº 114:
É obrigatória a realização de
licitação por itens ou por lotes, com exigências de habilitação proporcionais à
dimensão de cada parcela, quando o objeto da contratação for divisível e a
medida propiciar melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e a
ampla participação de licitantes, sem perda da economia de escala, adotando-se,
em cada certame, a modalidade licitatória compatível com o valor global das
contratações.
Colacionam-se excertos de outras
decisões, balizadas nas autorizadas doutrinas de Jessé Torres Pereira Júnior e
Marçal Justen Filho:
Obrigatoriedade do parcelamento
quando atende ao interesse público. [...] Assevera-se que, a princípio, o
parcelamento, traduzido na contratação de mais de uma empresa, indica, à luz do
artigo retro exposto, o atendimento a dois fatores que devem ser cumulativos: o
melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e a ampliação da competitividade.
Pois, ocorrendo ambos, desponta-se a conveniência para o interesse público em
parcelar a execução do objeto, resultando em vantagem, para o Município, as
contratações. O autor Jessé Torres Pereira Júnior, ao discorrer sobre o tema,
também ensina: 'Por conseguinte, parcelar a execução, nessas circunstâncias, é
dever a que não se furtará a Administração, sob pena de descumprir princípios
específicos da licitação, tal como o da competitividade. Daí a redação trazida
pela Lei nº 8.883/94 haver suprimido do texto anterior a ressalva 'a critério e
por conveniência da Administração', fortemente indicando que não pode haver
discrição (parcelar ou não) quando o interesse público decorrer superiormente
atendido do parcelamento. Este é de rigor, com evidente apoio no princípio da
legalidade'. (Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração
Pública, 6ª edição, Renovar, 2003, p. 250) [...] O mestre Marçal Justen Filho, a respeito do assunto, entende: 'O art. 23, §
1º, impõe o fracionamento como obrigatório. [...] O fracionamento conduz à
licitação e contratação de objetos de menor dimensão quantitativa, qualitativa,
e econômica. Isso aumenta o número de pessoas em condições de disputar a
contratação, inclusive pela redução dos requisitos de habilitação [...].
Trata-se não apenas de realizar o princípio da isonomia, mas da própria
eficiência. A competição produz redução de preços e se supõe que a
Administração desembolsará menos, em montantes globais, através da realização
de uma multiplicidade de contratos de valor inferior do que pela pactuação de contratação única'. (Comentários à Lei de
Licitações e Contratos Administrativos, 8ª edição, Dialética, 2000) [...]
Impende, assim, colacionar à discussão o entendimento do Tribunal de Contas da
União, conforme se extrai da Decisão nº 393/94, DOU de 29.06.1994, reiterado
nas Decisões nº 381/96, DOU de 18.07.1996 e nº 397/96, DOU de 23.07.1996: 'É
obrigatória à Administração, nas licitações para a contratação de obras,
serviços compras e alienações, quando o objeto for de natureza divisível, sem
prejuízo do conjunto ou do complexo, a adjudicação por itens e não pelo preço
global, com vistas a propiciar a ampla participação dos licitantes que, embora
não dispondo de capacidade para execução, fornecimento ou aquisição da
totalidade do objeto, possa, contudo, fazê-lo com referência a itens ou
unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a esta
divisibilidade' [...] O Acórdão nº 1.748/2004 do TCU reproduz, essencialmente,
a decisão acima transcrita, citando-a, e ainda acrescenta: '... caso contrário,
deve sempre estar devidamente justificado, no processo licitatório, os
motivos que levaram a Administração a proceder de outra forma [...]'.
(Representação nº 732112. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do
dia 05.06.2007) (Grifou-se)
Embora a lei não disponha sobre
a obrigação de o responsável pela licitação formalizar uma justificativa para a
reunião de várias obras em um só procedimento licitatório, Marçal Justen entende que tal motivação é devida e a defende nos
seguintes termos: "A decisão sobre o parcelamento ou a execução global
deverá ser orientada ao melhor aproveitamento dos recursos 'disponíveis no
mercado' e à ampliação da competitividade. Seria o caso em que o vulto da
contratação impossibilitasse os economicamente mais fracos de participar do
certame. Em obras e serviços de grande vulto, o licitante deverá dispor de
capital de giro elevado, recursos pessoais próprios de monta, etc. [...] Não se
admitirá o parcelamento quando não trouxer benefícios para a Administração.
[...] Em qualquer caso, a opção pelo fracionamento ou pela execução global
deverá ser motivada satisfatoriamente. '(Marçal Justen
Filho, Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 1998, p.
206/207)'. (Representação nº 706.390. Rel. Conselheira Adriene
Andrade. Sessão do dia 17.04.2007) (Grifou-se)
Licitação. Excessiva diversidade
de itens como objeto de uma única licitação. Prestação de serviços básicos de
infraestrutura, compreendendo a manutenção de vias urbanas com o fornecimento
de mão de obra, materiais e equipamentos para a realização da coleta de lixo e
serviços correlatos no Município. '[...] o objeto licitado é amplo e
diversificado, composto de itens distintos, o que requer para sua execução
empresas de especialidades diversas. [...] A Administração, ao concentrar em um
único procedimento licitatório objetos diversos, que demandam licitações
autônomas, violou o princípio da competitividade, pois certamente, ao englobar
itens distintos num mesmo certame, reduziu o universo de possíveis interessados
que não dispõem de capacidade para executar tão amplos e diversificados
serviços, podendo, inclusive, comprometer a qualidade dos serviços a serem
prestados. [...] a diversidade de itens num mesmo certame inviabiliza sua
execução por uma mesma empresa'.
Em suma, à luz da doutrina e da
jurisprudência, a obrigatoriedade do parcelamento só pode ser afastada se
comprovada sua inviabilidade técnica e econômica.
Nesse aspecto, apresenta-se
decisão deste Tribunal, referente à licitação cujo objeto é a locação de
sistemas de gestão pública:
De fato, este Tribunal vem
entendendo pela obrigatoriedade da subdivisão técnica em parcelas de objetos
licitados quando viável - por exemplo, na Representação nº 732112, Relator
Conselheiro Antônio Carlos Andrada, Sessão do dia 05.06.2007 -, para ampliação
da competitividade e para melhor aproveitamento dos recursos do mercado, desde
que não se percam de vista os ganhos de escala.
Entendo, entretanto, que devem
ser aferidas as condições para esse parcelamento caso a caso, cuja opção deve
estar sujeita à devida explicitação de suas razões, como ensina o Professor Calos
Pinto Coelho Motta.
No mesmo sentido:
Com a devida vênia ao estudo
elaborado pela área técnica, entendo que a solução tecnológica pretendida pelo
Município - embora para utilização ampla, em diversas áreas da Administração -
não prescinde da operacionalização integrada, ou seja, deve facilitar a gestão
coordenada das diversas áreas, o que significa dizer que os softwares
devem necessariamente "conversar entre si", possibilitando ao gestor
uma visão articulada.
Essa necessidade, à primeira
vista, sem aprofundamento fático e técnico, indica a dificuldade de se
franquear a contratação dos diferentes módulos a diversas empresas distintas,
vez que a operacionalização da gestão integrada seria bastante complexa.
[...] cabe a recomendação ao
gestor para que avalie e registre, neste certame e nos futuros, nos autos dos
procedimentos licitatórios, os estudos devidos, para que se adote, ou não, a
solução de subdivisão em parcelas do objeto a ser licitado.
Assim, na fase interna do
procedimento licitatório, o gestor deve declinar, em fundamentado estudo
técnico e econômico, os motivos determinantes da indivisibilidade do objeto, a
fim de que os órgãos de controle tenham elementos para aferir se as razões para
tanto validam, ou não, a opção da Administração de não parcelar o objeto,
conforme o sentido teleológico da norma contida no art. 23, § 1º, da Lei de
Licitações.
A regra nas licitações é o
parcelamento do objeto. A indivisibilidade somente se valida se amparada em
estudo técnico e econômico. À luz da doutrina e da jurisprudência, a
obrigatoriedade do parcelamento só pode ser afastada se comprovada sua
inviabilidade técnica e econômica.
(Fonte: Tribunal de Contas do
Estado de Minas Gerais - 2015)
*
Contador, auditor, economista, administrador, professor universitário,
consultor do BEAP, diretor Técnico da Magnus Auditores.
BOCO9313---WIN
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