APELAÇÃO CÍVEL - ADMINISTRATIVO - CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA - AUXILIAR EDUCACIONAL - NULIDADE DO CONTRATO ADMINISTRATIVO - AUSÊNCIA DE DIREITO AO RECEBIMENTO DE QUAISQUER VERBAS, EXCETO EVENTUAL SALDO DE VENCIMENTO - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO - SENTENÇA REFORMADA EM REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF34119 - BEAP

 

 

                1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a contratação temporária não pode ter por objeto a seleção ou recrutamento de pessoal para atividades ordinárias ou permanentes do órgão público, porquanto a norma inserta no artigo 37, IX, da Constituição da República, trata de hipóteses anômalas, de exceção, não podendo se tornar prática comum na Administração Pública, pena de ofensa ao principio do concurso público.

                2. São nulos de pleno direito contratos administrativos celebrados sem a indicação do fundamento jurídico para contratação temporária, e com o escopo de admitir servidor para exercício de função de caráter permanente.

                3. Sendo os contratos nulos de pleno direito, deles não exsurgem quaisquer direitos ao servidor, com exceção do saldo de vencimento, ensejando, em tese, a punição da autoridade responsável por ato de improbidade administrativa, nos termos do disposto no artigo 37, § 2º, da Constituição da República.

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0672.10.002998-8/001 - Comarca de ...

 

Apelante  :  Estado de Minas Gerais

Apelado  :  ...

 

A C Ó R D Ã O

 

                Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO E REFORMAR A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO.

 

 

DES. BITENCOURT MARCONDES

Relator

 

 

 

V O T O

 

                Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Minas Gerais contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito César Aparecido de Oliveira, da Vara da Fazenda e Autarquias da comarca de ..., que nos autos da ação ordinária ajuizada por ..., julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para condenar o réu ao pagamento das férias acrescidas do terço constitucional, e décimo terceiro salário, proporcionais aos períodos de contratação temporária, observada a prescrição quinquenal, com incidência de correção monetária conforme art. 1º-F da Lei n. 9.494/97. Condenou as partes, ainda, ao pagamento das custas, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada, isento o réu, por tratar-se de Fazenda Pública. Ademais, diante da sucumbência recíproca, arbitrou honorários no importe de R$ 800,00 (oitocentos reais), autorizada a compensação nos termos da Súmula 306 do STJ.

                Pugna pela reforma da sentença, em síntese, aos seguintes argumentos: (i) o autor estaria se beneficiando da própria torpeza ao pleitear verbas trabalhistas, vez que foi beneficiário dos contratos administrativos firmados; (ii) inexiste comprovação de qualquer prejuízo por parte do autor a caracterizar enriquecimento ilícito do ente estatal; (iii) em se tratando de contratação temporária, o trabalhador faz jus somente aos direitos previstos no próprio contrato; (iv) a previsão de remuneração extra de 50% (cinquenta por cento) ao fim de cada contrato semestral já cobre o benefício do décimo terceiro salário; (v) os trabalhadores temporários estão sujeitos a um regime administrativo especial, não fazendo jus a direitos essencialmente estatutários ou celetistas.

                Não foram apresentadas contrarrazões (f. 276).

                É o relatório.

                Conheço do recurso de apelação, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade, bem como conheço, de ofício, do reexame necessário, com fulcro no art. 475, I do CPC/73 e Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça.

 

                I - DO OBJETO DO RECURSO

                Insurge-se em face da sentença de parcial procedência da demanda, argumentando, em síntese, que em se tratando de contratação temporária, o servidor faria jus somente aos direitos previstos no próprio contrato e na legislação vigente, haja vista submeter-se a regime distinto do estatutário ou celetista. Aduz, ainda, quanto à parcela de décimo terceiro salário, que a previsão de remuneração extra de 50% (cinquenta por cento) ao fim de cada contrato teria o condão de substituir mencionado benefício.

                Consta dos autos que o apelado fora contratado temporariamente, no período compreendido entre 01.07.1998 a 31.03.1999, para o exercício da função de auxiliar educacional, com fulcro no Decreto Estadual nº 35.330/94, que "dispõe sobre a contratação de pessoal para os serviços estaduais de saúde e penitenciário", e cujo artigo 1º coloca, in verbis:

 

                Art. 1º Ficam os Secretários de Estado da Saúde e da Justiça, no âmbito de suas respectivas atribuições, autorizados a recrutar pessoal sob o regime de contrato de direito administrativo, com a finalidade de assegurar a prestação ininterrupta dos serviços estaduais de saúde e penitenciário.

 

                Referido Decreto tem como assento legal o artigo 11, da Lei nº 10.254/90. Ocorre que a contratação prevista no Decreto está em desacordo com as exceções permitidas pela Lei, a qual previa, no recentemente revogado artigo 11, in verbis:

 

                Art. 11. Para atender a necessidade temporária, de excepcional interesse público, poderá haver contratação por prazo determinado, não superior a 6 (seis) meses, sob a forma de contrato de direito administrativo, caso em que o contratado não será considerado servidor público.

                § 1º A contratação prevista no artigo far-se-á exclusivamente para:

                a) atender a situações declaradas de calamidade pública;

                b) permitir a execução de serviços técnicos por profissional de notória especialização, inclusive de nacionalidade estrangeira, nas hipóteses do art. 11 da Lei nº 9.444, de 25 de novembro de 1987;

                c) realizar recenseamento.

 

                Vale dizer, nos termos da limitação normativa estabelecida pela Lei, não seria possível a edição de Decreto prevendo a contratação temporária de pessoal para execução dos serviços estaduais de saúde e penitenciário, por não se enquadrar em nenhuma das alíneas do § 1º, do artigo 11.

                Desse modo, patente a ilegalidade do Decreto nº 35.330/94, e, via de consequência, das contratações realizadas com supedâneo neste.

                Com efeito, a norma inserta no art. 37, § 2º, da Constituição da República, estabelece que a não observância da regra da obrigatoriedade do concurso para provimento de cargos e empregos públicos (art. 37, II) gera a nulidade do ato e a punição do administrador, nos termos da lei.

                O Supremo Tribunal Federal conferiu interpretação restritiva à norma constitucional que autoriza a contratação temporária (art. 37, IX, CR/88) e o fez, certamente, com a intenção de impedir que a exceção se tornasse a regra, temeroso de abrir uma porta para a fraude sistemática ao concurso público, firmando jurisprudência no sentido de que a contratação temporária não poderia ter por objeto a seleção ou recrutamento de pessoal para atividades ordinárias, permanentes do órgão público.

                Recentemente, ao julgar do Recurso Extraordinário nº 658026/MG, em que reconhecida a Repercussão Geral da matéria (Tema nº 612), explicitou o conteúdo jurídico da norma inserta no artigo 37, IX, da Constituição da República, estabelecendo requisitos objetivos para validade desta modalidade de contratação, verbis:

 

                Ementa Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal em face de trecho da Constituição do Estado de Minas Gerais que repete texto da Constituição Federal. Recurso processado pela Corte Suprema, que dele conheceu. Contratação temporária por tempo determinado para atendimento a necessidade temporária de excepcional interesse público. Previsão em lei municipal de atividades ordinárias e regulares. Definição dos conteúdos jurídicos do art. 37, incisos II e IX, da Constituição Federal. Descumprimento dos requisitos constitucionais. Recurso provido. Declarada a inconstitucionalidade da norma municipal. Modulação dos efeitos. 1. O assunto corresponde ao Tema nº 612 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na internet e trata, "à luz dos incisos II e IX do art. 37 da Constituição Federal, [d]a constitucionalidade de lei municipal que dispõe sobre as hipóteses de contratação temporária de servidores públicos". 2. Prevalência da regra da obrigatoriedade do concurso público (art. 37, inciso II, CF). As regras que restringem o cumprimento desse dispositivo estão previstas na Constituição Federal e devem ser interpretadas restritivamente. 3. O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal, pode ser resumido, ratificando-se, dessa forma, o entendimento da Corte Suprema de que, para que se considere válida a contratação temporária, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a necessidade de contratação seja indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração. 4. É inconstitucional a lei municipal em comento, eis que a norma não respeitou a Constituição Federal. A imposição constitucional da obrigatoriedade do concurso público é peremptória e tem como objetivo resguardar o cumprimento de princípios constitucionais, dentre eles, os da impessoalidade, da igualdade e da eficiência. Deve-se, como em outras hipóteses de reconhecimento da existência do vício da inconstitucionalidade, proceder à correção da norma, a fim de atender ao que dispõe a Constituição Federal. 5. Há que se garantir a instituição do que os franceses denominam de la culture de gestion, a cultura de gestão (terminologia atualmente ampliada para 'cultura de gestão estratégica') que consiste na interiorização de um vetor do progresso, com uma apreensão clara do que é normal, ordinário, e na concepção de que os atos de administração devem ter a pretensão de ampliar as potencialidades administrativas, visando à eficácia e à transformação positiva. 6. Dá-se provimento ao recurso extraordinário para o fim de julgar procedente a ação e declarar a inconstitucionalidade do art. 192, inciso III, da Lei nº 509/1999 do Município de .../MG, aplicando-se à espécie o efeito ex nunc, a fim de garantir o cumprimento do princípio da segurança jurídica e o atendimento do excepcional interesse social.¹.

 

                Diante desses elementos, os contratos administrativos celebrados entre as partes litigantes são nulos de pleno direito, razão pela qual não geram quaisquer direitos ao servidor, com exceção da contraprestação pactuada: o saldo de vencimento.

                Assim, a hipótese é de improcedência da demanda e desprovimento do recurso.

 

                II - CONCLUSÃO

                Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação e reformo a sentença em reexame necessário conhecido de ofício para julgar improcedente a demanda.

                Condeno o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados na sentença em R$ 800,00 (oitocentos reais), com fulcro no art. 20, § 4º do CPC/73, suspensa a exigibilidade por litigar sob o pálio da justiça gratuita.

                É como voto.

                DES. WASHINGTON FERREIRA

                Senhor Presidente,

                Acompanho o eminente Relator, Desembargador BITENCOURT MARCONDES, para reformar a sentença, no reexame necessário procedido de ofício, e dar provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

                Destaco, por oportuno, que em julgados anteriores, sempre destaquei que as contratações que ultrapassassem a excepcionalidade prevista no artigo 37, IX, da CR/88, eram nulas.

                Nulas ou não as contratações, defendia a tese de que, durante o tempo em que estiveram prestando serviços à Administração Pública, os envolvidos sujeitavam-se às previsões estatutárias dos servidores públicos estaduais ou municipais. Ainda que declarada nula a contratação, tal declaração não teria o condão de atrair, por si, a aplicação das regras da CLT. Isso porque não restaria afastada a natureza jurídico-administrativa do pacto firmado entre as partes.

                Todavia, com base na decisão proferida na ocasião do julgamento do RE nº 765.320 RG/MG, curvo-me ao entendimento externado pelo colendo STF, segundo o qual:

 

                [...] a contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público realizada em desconformidade com os preceitos do art. 37, IX, da Constituição Federal não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos servidores contratados, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. (STF - TRIBUNAL PLENO - RE nº 765.320 RG/MG - Relator: Ministro TEORI ZAVASCKI. j. 15.09.2016)

 

                Com tais considerações, acompanho o eminente Relator.

                Custas nos termos do voto condutor.

                É como voto.

                DES. EDGARD PENNA AMORIM - De acordo com o Relator.

 

Súmula - "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO E REFORMARAM A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO."

 

¹ STF. RE 658026, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 09.04.2014.

 

 

BOCO9325---WIN/INTER

 

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LAUDO TÉCNICO DE CONSULTORIA - MELHOR ENTENDIMENTO SOBRE EFETIVO EXERCÍCIO

 

 

CONSULENTE        :  Prefeitura Municipal

CONSULTOR         :  Laurito Marques de Oliveira

 

                INTROITO

                A Prefeitura Municipal, no uso de seu direito como assinante do nosso BEAP, consulta-nos a respeito do TEMPO DE EFETIVO EXERCÍCIO, consulta que analisamos, fornecendo nosso parecer.

 

                DA CONSULTA

                As informações solicitadas serão divididas em 2 tópicos, para melhor entendimento, como seguem abaixo:

                1º) "O que é considerado tempo de efetivo exercício?"

                2º) "Determinado servidor público (estatutário) esteve em licença para concorrer a cargo eletivo. Este tempo é considerado de efetivo exercício?"

 

                NOSSA ANÁLISE

                Segundo a Lei nº 8.112 - Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União:

 

                "Entende-se como tempo de efetivo exercício o que tenha sido prestado à União, Estado ou Município, em cargo, ininterrupta ou consecutivamente, em órgãos de administração direta, apurado à vista dos registros de frequência, folhas de pagamento ou dos elementos regularmente averbados no assentamento individual do funcionário.

                A contagem de tempo de efetivo exercício será feita em dias e o total apurado convertido em anos, sem arredondamento, considerado de efetivo exercício o afastamento em virtude de:

                a) férias;

                b) casamento;

                c) luto;

                d) exercício de outro cargo federal, estadual ou municipal;

                e) convocação para serviço militar;

                f) júri e outros serviços obrigatórios por lei;

                g) exercício de função ou cargo de governo ou administração em qualquer parte do território nacional, por nomeação do Presidente da República;

                h) desempenho de função legislativa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

                i) licença especial;

                j) licença a servidor gestante, ao servidor acidentado em serviço;

                k) missão ou estudo no estrangeiro, quando o afastamento houver sido autorizado pelo Presidente da República; e

                l) exercício, em missão de cargos de chefia nos serviços dos Estados, Distrito Federal, Municípios ou Territórios".

 

                Em análise à Lei nº 869, Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de Minas Gerais, encontramos:

 

                "Art. 87. (...)

                § 1º Serão computados os dias de efetivo exercício, à vista de documentação própria que comprove a frequência, especialmente livro de ponto e folha de pagamento.

                Art. 88. Serão considerados de efetivo exercício para os efeitos do artigo anterior os dias em que o funcionário estiver afastado do serviço em virtude de:

                I - férias e férias-prêmio;

                II - casamento, até oito dias;

                III - luto pelo falecimento do cônjuge, filho, pai, mãe e irmão até 08 dias;

                IV - exercício de outro cargo estadual, de provimento em comissão;

                V - convocação para o serviço militar;

                VI - júri e outros serviços obrigatórios por lei;

                VII - exercício de funções de governo ou administração em qualquer parte do território estadual, por nomeação do Governador do Estado;

                VIII - exercício de funções de governo ou administração em qualquer parte do Território nacional, por nomeação do Presidente da República;

                IX - desempenho de mandato eletivo federal, estadual ou municipal;

                X - licença ao funcionário acidentado em serviço ou atacado de doença profissional;

                XI - licença à funcionária gestante;

                XII - missão ou estudo de interesse da administração, noutros pontos do território nacional ou no estrangeiro, quando o afastamento houver sido expressamente autorizado pelo Governador do Estado".

 

                Quanto ao 2º tópico, na pesquisa das referidas leis, não encontramos o afastamento para concorrer a cargo eletivo, sendo contado como TEMPO DE EFETIVO EXERCÍCIO.

 

                NOSSO PARECER

                Inicialmente, observamos que, nas leis federal e estadual, não constam como contagem do tempo de efetivo exercício a licença dada ao servidor (efetivo) para concorrer ao mandato eletivo, o que também não o impede de sê-lo, caso conste no Estatuto dos Servidores Públicos do Município ou Plano de Cargos e Vencimentos ou Lei Orgânica. Investigamos, via Internet, e não obtivemos êxito em encontrá-la, para melhor análise. Orientamos que pesquisem, nas referidas leis, se há o assunto em questão. Caso não encontrem o referido tema, é porque não se pode contar esta licença como tempo de efetivo exercício.

                Sugerimos a atualização do Estatuto dos Servidores Municipais, Plano de Cargos e Vencimentos e Lei Orgânica, com a intenção de otimizar e expandir os direitos e deveres dos servidores.

                Este é o nosso parecer, s. m. j.

 

 

BOCO9321---WIN

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