CONSIDERAÇÕES
FINAIS AO MANUAL DE LICITAÇÕES PARA CONTRATAÇÃO DE SISTEMA DE GESTÃO
PÚBLICA-TCE/MG/2015 - MEF34160 - BEAP
COMENTÁRIOS
DE MÁRIO LÚCIO DOS REIS *
INTRODUÇÃO
Em dois artigos anteriores analisamos e tecemos
nossos comentários técnicos acerca do excelente trabalho desenvolvido por uma
equipe técnica do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, no ano de 2015,
cuja íntegra pode ser vista no site do TCE/MG, sob o título de ''Manual de boas
práticas em licitação para contratação de sistemas de gestão pública''.
Os capítulos 1, 2 e 3 do referido manual foram objeto
de nosso primeiro trabalho, que abordou as definições, o planejamento da
licitação, seu edital e termo de referência, bem como a motivação e
justificativas da decisão entre comprar, locar ou utilizar softwares
gratuitos.
O segundo trabalho abordou os capítulos 4.1, 4.2,
4.3, 4.4, relativos a dúvidas e problemas como: adoção dos tipos melhor
técnica, técnica e preço ou menor preço; exigências de certificados,
parcelamento do objeto e segurança do sistema.
Nesta oportunidade, estamos abordando os capítulos
finais, quais sejam os de nos 4.5, 4.6, 4.7 e 4.8 do citado manual,
que abordam certificações, atestados, exigência de amostras por todos os
licitantes, limites a subcontratações e obediência às leis de transparência
fiscal e acesso a informação.
NOSSOS COMENTÁRIOS
De todos os estudos se conclui que a modalidade
licitatória para contratação de sistema de gestão é pregão, por ser a mais
adequada e, portanto recomendada pelo TCE/MG, assim como o critério de
julgamento que será sempre o de menor preço, global ou por itens, desde que
devidamente justificado o tipo escolhido.
Foi visto que tão importante quanto fornecer um software
de boa qualidade, seguro, funcional e eficiente, é disponibilizar uma equipe
técnica competente para suporte à implantação, manutenção e customização do
sistema.
Registra-se finalmente a importância do máximo esmero
na elaboração do edital e do correspondente termo de referência, documentos que
vão assegurar a escolha do preço mais vantajoso para a Administração, aliado à
aquisição de um sistema funcional, eficiente e seguro, contando com adequada
equipe de profissionais de tecnologia da informação para o devido suporte na
manutenção e customização, de modo a cumprir todas as exigências de informações
e relatórios, tanto contábeis como gerenciais, nos prazos e condições legais.
A seguir transcrevemos os itens 4.5, 4.6, 4.7 e 4.8
do manual em pauta, ora analisados e referenciados, sabendo-se que a edição
completa pode ser vista no site do
TCE/MG.
MANUAL
DE BOAS PRÁTICAS EM LICITAÇÕES PARA CONTRATAÇÃO DE SISTEMAS DE GESTÃO PÚBLICA
4.5 EXIGÊNCIA DE ATESTADOS DE CAPACIDADE TÉCNICA
EMITIDOS EXCLUSIVAMENTE POR PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO
Frequentemente, esta Casa tem se deparado com editais
de licitações cujo objeto é a locação ou licenciamento de sistemas de gestão
pública nos quais os entes limitam a emissão de atestados de capacidade técnica
a órgãos ou entidades públicas. O argumento usual para validar tal exigência
reside no fato de o software destinar-se à gestão pública. Logo, as
pessoas jurídicas de direito privado não licitariam e não se ajustariam à
prestação desse serviço e, por conseguinte, seria materialmente impossível
atestar capacidade técnica nesse sentido.
A lógica do argumento, contudo, não o torna adequado
sob o prisma jurídico-legal.
Com efeito, o art. 30, § 1º, da Lei nº 8.666/93,
preceitua que a "comprovação de aptidão, […] no caso das licitações
pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados fornecidos por
pessoas de direito público ou privado [...]". (Grifou-se)
Em sede constitucional, o art. 37, inc. XXI, da CR,
autoriza que sejam feitas somente exigências de qualificação técnica e
econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações que serão
futuramente assumidas pelo contratado, a conferir:
Art.
[...]
XXI - ressalvados os casos
especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão
contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade
de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações
de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o
qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (Grifou-se)
Paralelamente, o art. 3º, § 1º, inc. I, da Lei nº
8.666/93, veda a inclusão no edital de cláusulas ou condições que comprometam,
restrinjam ou frustrem o caráter competitivo do certame e estabeleçam
preferências ou distinções em razão de qualquer outra circunstância
impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato. A aptidão do
licitante para prestar um serviço é comprovada por meio de experiência anterior
na execução de objeto semelhante, independentemente da personalidade jurídica
do sujeito, de direito público ou privado, a quem foram locados ou cedidos os
sistemas.
As empresas públicas e as sociedades de economia
mista, embora sejam pessoas jurídicas de direito privado, sofrem forte
influência do regime jurídico de Direito Público, especialmente no que diz
respeito a licitações e pessoal. Dessa forma, restringir a emissão de atestados
de capacidade técnica a pessoas jurídicas de direito público é, a toda
evidência, o mesmo que não permitir a participação na disputa de empresas que
tenham prestado serviços similares a pessoas jurídicas de direito privado.
Nessa linha, seguem excertos de decisões desta Corte:
B) Exigência de atestados de capacidade técnica
emitidos exclusivamente por pessoas jurídicas de direito público, fl. 03:
Há clara restrição à competitividade na exigência
contida no item 9.2.3.1 do edital, quanto à previsão de comprovação de
prestação do serviço à empresa jurídica de direito público, já que não há
justificativa legal que fundamente a exclusão dos atestados emitidos por
empresas jurídicas de direito privado.
É de se ressaltar que esta Corte já se manifestou
neste sentido ao apreciar a Denúncia apresentada em face da Prefeitura
Municipal [...] [omissis], distribuída sob o
nº 796.103, em que prevaleceu o voto do Conselheiro Relator Conselheiro Eduardo
Carone Costa, que assim se manifestou:
“constato, em análise perfunctória dos autos,
impropriedades nas cláusulas que não contemplam a possibilidade de pessoas
jurídicas de direito privado fornecerem atestados com o objetivo de comprovar a
qualificação técnica dos licitantes, o que, por si só, fere o princípio da
competitividade, corolário ao princípio da isonomia”.
Assim, entendo que é irregular a restrição contida na
cláusula 9.232 em relação aos atestados emitidos por pessoas jurídicas de
direito privado, que se constitui em afronta à previsão contida no art. 30, §
1º, inc. I da Lei nº 8.666/93.
Posto isto, julgo procedente a Denúncia no que se
refere à exigência de atestados emitidos por pessoas jurídicas de Direito
Público.
A entidade promotora da licitação, ao limitar os
atestados àqueles oriundos apenas de entidades de direito público, viola o
disposto no inciso I, § 1º, art. 3º, que veda aos agentes públicos 'admitir,
prever, incluir [...], nos atos de convocação, cláusulas ou condições que
comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam
preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos
licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para
o específico objeto do contrato;
O entendimento apresentado é confirmado pela
jurisprudência do TRF da 1ª Região, que firmou a seguinte decisão:
'Com efeito, a norma contida no item 14.3, alínea b,
do Edital, que impossibilita a apresentação de atestados fornecidos por pessoas
jurídicas de Direito Privado, é incompatível com o artigo 30, parágrafo 1º, da
Lei nº 8.666/93, que expressamente permite a apresentação de atestados
fornecidos por pessoas jurídicas de Direito Público e Privado.' (TRF da 1ª
Região, Apelação em Mandado de Segurança nº 1999.01.00.014752-7/DF, 3º T. Suplementar,
rel. Juiz Wilson Alves de Souza, j. em 29.05.2003, DJ de 18.06.2003)
Conclui-se que a Administração requerer atestados de
capacidade técnica emitidos somente por pessoas jurídicas de Direito Público
viola o Princípio da Legalidade (art. 37, CR), pois os critérios habilitatórios perfazem atos administrativos vinculados ao
teor do artigo 27, Lei nº 8.666/93, e é direito do licitante comprovar sua
aptidão com atestados emitidos por entes de qualquer regime de direito.
Comungo o entendimento do Órgão Ministerial de que a
irregularidade em comento não conserva relação de dependência com as condutas
adotadas pela denunciante no procedimento licitatório, uma vez que não afeta
apenas a ela, mas macula de legitimidade todo o procedimento licitatório, pelo
que considero irregular o apontamento denunciado.
B) Da exigência de atestado de capacidade técnica
fornecido exclusivamente por pessoa jurídica de Direito Público
[...]
Com efeito, à Administração Pública não cabe fazer
exigências que inadvertidamente frustrem o caráter competitivo da licitação,
devendo agir com vistas a assegurar a participação do maior número possível de
concorrentes no certame, desde que tenham qualificação técnica para garantir o
cumprimento das obrigações.
A exigência de atestado fornecido exclusivamente por
pessoa jurídica de Direito Público é desarrazoada, uma vez que pode impedir a
participação de empresa que, apesar de nunca ter celebrado contrato com o setor
público, tenha vasta experiência na seara privada no que cinge ao objeto
licitado e possua interesse em participar do certame.
Ademais, o art. 30, § 1º, da Lei nº 8.666/93, é
taxativo ao dispor que a comprovação de aptidão técnica será feita por
atestados fornecidos por pessoas jurídicas de Direito Público ou Privado.
Por fim, o ato convocatório é expresso em definir os
atestados de capacidade técnica fornecidos por entidades de Direito Público
como elemento necessário à avaliação das propostas técnicas, não sendo razoável
que não sejam valorados os atestados fornecidos por empresas que atuem em áreas
afins.
Quanto à exigência de quantidade mínima de atestados,
por ter o condão de restringir a ampla competitividade, deve existir apenas
naquelas hipóteses em que a especificidade do objeto assim o recomende,
situação em que os motivos de fato e de direito deverão estar devidamente
explicitados no procedimento administrativo licitatório, circunstância que não
restou evidenciada.
Considero irregular, portanto, a previsão editalícia e procedente a alegação da Denunciante.
Atestados de capacidade técnica destinados à
locação ou cessão de sistemas de gestão pública podem ser emitidos tanto por
pessoas jurídicas de Direito Público quanto de direito privado.
4.6 EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE AMOSTRA POR TODOS OS
LICITANTES
Em se tratando de software, a prova de teste
ou a demonstração técnica faz as vezes de amostra. O tratamento jurídico é o
mesmo. O que altera somente é o objeto do exame: amostra para aquisição de bens
e demonstração técnica para prestação de serviços.
A exigência de amostra ou prova de teste objetiva
verificar se as características do que foi proposto pelo licitante correspondem
às especificações técnicas estabelecidas pela Administração no ato
convocatório. Com essa avaliação, a Administração afere os parâmetros de
desempenho, as funcionalidades do software e a qualidade do objeto em
face das especificações do edital e da proposta vencedora. As normas para
realização da amostra devem estar previamente fixadas no edital para amplo e
prévio conhecimento dos licitantes.
Em se tratando de amostra ou demonstração técnica de software,
a avaliação deve destituir-se de quaisquer critérios subjetivos e não pode
ficar condicionada ao livre arbítrio dos membros da Comissão de Licitação ou do
Pregoeiro e sua equipe de apoio. Essa tarefa deve ser confiada a técnicos especializados
no assunto com vínculo funcional com a Administração. Deverá ser dada
publicidade de data e local para apresentação, cujo prazo deve ser razoável e
facultado o acompanhamento dessa exibição a todos os interessados. A
Administração deve disponibilizar estrutura para a demonstração técnica de modo
a não impor ônus excessivo ao licitante.
A rotineira exigência de amostras a todos os
licitantes, tanto nas tradicionais modalidades de licitação quanto no pregão,
tem ensejado dúvidas, especialmente no que tange ao momento oportuno de sua
apresentação.
Sobre a matéria, o TCEMG se manifestou:
Exigência de apresentação de amostra por todos os
licitantes
Consta do Edital, no item 12.4, que a imposição de
apresentação de amostras deve ser efetuada por todos os licitantes e não
somente para o licitante vencedor do certame (fls. 205/206).
Asseverou a Unidade Técnica, em seu exame inicial
(fls. 96), que 'A demonstração prática faz-se apenas por meio da exigência
de amostras. A exigência de amostras é razoável. Há, porém, o momento em que
será cabível a exigência de apresentação de amostras: o licitante que sagra-se
vencedor do certame deverá apresentá-las antes de contratar com a
Administração, desde que haja previsão editalícia.
Os Denunciados não se manifestaram acerca deste item.
Entendo, portanto, que permanece a irregularidade
constatada no item 12.4 do Edital, arrimado no entendimento do Tribunal de
Contas da União:
'A exigência de amostras a todos os licitantes, na
fase de habilitação ou de classificação, além de ser ilegal, pode impor ônus
excessivo aos licitantes, encarecer o custo de participação na licitação e
desestimular a presença de potenciais interessados". Acórdão 1113/2008
Plenário (Sumário).'
No mesmo sentido, decisão nos autos de nº 800.679:
12. Da exigência de amostras para todos os licitantes
Inicialmente, registrou a Unidade Técnica a exigência
de demonstração prática de todos os licitantes interessados, presente nos itens
14.9, 14.10, como irregularidade a ensejar restritividade
injustificada.
No que se refere à modalidade pregão, venho
entendendo que é vedada a exigência de apresentação de amostras ou protótipos
antes da fase de lances, devendo a obrigação ser imposta somente ao licitante
provisoriamente classificado em primeiro lugar. Entendo, ainda, que, para as
demais modalidades, seria ilegal tal imposição na fase de habilitação ou
classificação, assim como se posiciona o TCU:
'A exigência de amostras a todos os licitantes, na
fase de habilitação ou de classificação, além de ser ilegal, pode impor ônus
excessivo aos licitantes, encarecer o custo de participação na licitação e
desestimular a presença de potenciais interessados'. Acórdão 1113/2008 Plenário
(Sumário).
'Utilize-se das modalidades de licitação previstas na
Lei no 8.666/1993, caso seja indispensável exigir amostras ou protótipos dos
produtos a serem licitados, observando ainda o entendimento desta Corte de que
tal obrigação somente deve ser imposta ao licitante provisoriamente em primeiro
lugar, nos termos dos arts. 45 e 46 da Lei nº
8.666/1993 e dos Acórdãos 1237/2002, 808/2003, 99/2005, 526/2005 e 1598/2006,
todos do Plenário'. Acórdão 2147/2006 Plenário.
Então, com esteio nos princípios da razoabilidade e
da economicidade, concluo que, para as modalidades de licitação previstas na
Lei n. 8.666/93, caso necessária a exigência de amostras, esta deve ser imposta
ao licitante que se classificar em primeiro lugar. Constato, em vista disso,
como irregular, a exigência de demonstração prática de todos os licitantes (item
14 do edital), a qual deve ser sanada pela Administração neste e em certames
futuros.
Deliberações do TCU têm considerado irregular a
exigência de apresentação de amostras para todos os licitantes:
Na modalidade pregão, é vedada a exigência de
apresentação de amostras antes da fase de lances, devendo a obrigação ser
imposta somente ao licitante provisoriamente classificado em primeiro lugar.
(Acórdão 1634/2007 - Plenário)
Segundo o TCU, a vedação em pauta encontra repouso
nas seguintes razões:
A exigência de amostras, na fase de habilitação, ou
de classificação, feita a todos os licitantes, além de ilegal, poderia ser
pouco razoável, porquanto imporia ônus que, a depender do objeto, seria
excessivo, a todos os licitantes, encarecendo o custo de participação na
licitação e desestimulando a presença de potenciais licitantes.
A solicitação de amostra na fase de classificação
apenas ao licitante que se apresenta provisoriamente em primeiro lugar, ao
contrário, não onera o licitante, porquanto confirmada a propriedade do objeto,
tem ele de estar preparado para entregá-lo, nem restringe a competitividade do
certame, além de prevenir a ocorrência de inúmeros problemas para a
administração.
Não viola a Lei nº 8.666/93 a exigência, na fase de
classificação, de fornecimento de amostras pelo licitante que estiver
provisoriamente em primeiro lugar, a fim de que a Administração possa, antes de
adjudicar o objeto e celebrar o contrato, assegurar-se de que o objeto proposto
pelo licitante conforma-se de fato às exigências estabelecidas no edital. 40.
O jurista Marçal Justen
Filho aborda o tema com propriedade:
Tornou-se pacífico o entendimento de ser vedada a
apresentação de amostras por todos os licitantes. Essa solução infringe o
princípio da proporcionalidade-necessidade, eis que somente se produz a análise
da amostra apresentada pelo licitante que tenha formulado o lance de menor
valor. Submeter todos os demais licitantes a apresentar amostras equivale a
generalizar um encargo econômico inútil — o qual se traduz num desincentivo à
participação na licitação.
Pelo exposto, infere-se que é impróprio exigir a prova
de teste na fase de habilitação, porquanto a finalidade desta etapa é verificar
se o licitante possui, com base em documentos definidos no edital da licitação,
qualificação para contratar com a Administração. A fase de habilitação não é o
momento adequado para se perquirir sobre os atributos do objeto proposto. A
demonstração é feita depois de encerrada a fase de propostas.
No caso de Concorrência, Tomada de Preços ou Convite,
vencida a etapa da habilitação, abertos os envelopes "proposta",
confirmado o atendimento às cláusulas editalícias e
apurado o menor preço, o licitante vencedor deve se desincumbir da prova de
teste.
Na hipótese de Pregão — no qual as fases do
procedimento licitatório se invertem — a exigência de amostra ou demonstração
técnica deve se limitar ao licitante provisoriamente classificado em primeiro
lugar, quando caberá ao pregoeiro decidir motivadamente a respeito da
aceitabilidade do valor e do objeto proposto, prática que encontra guarida no
art. 4º, inc. XI, da Lei nº 10.520/2002.
Apresentação de amostra ou demonstração técnica é
procedimento da fase de classificação da licitação. Ela não pode ser exigida de
todos os licitantes, mas apenas do licitante vencedor, no caso das
modalidades de Concorrência, Tomada de Preços ou Convite, ou do licitante
provisoriamente classificado em primeiro lugar, no caso da modalidade
Pregão.
4.7 DA AUSÊNCIA DE LIMITES À SUBCONTRATAÇÃO
A natureza jurídica do contrato administrativo impõe
a análise da subcontratação à luz da indisponibilidade do interesse público.
A subcontratação do contrato administrativo só é
permitida se expressa e disciplinadamente prevista no edital, nos termos
prescritos nos arts. 72 e 78, inc. VI, da Lei nº
8.666/93:
Art. 72. O contratado, na
execução do contrato, sem prejuízo das responsabilidades contratuais e legais,
poderá subcontratar partes da obra, serviço ou fornecimento, até o limite
admitido, em cada caso, pela Administração.
[...]
Art. 78. Constituem motivo para
rescisão do contrato:
[...]
VI - a subcontratação total ou
parcial do seu objeto, a associação do contratado com outrem, a cessão ou
transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incorporação, não
admitidas no edital e no contrato;
É dever da Administração cercar-se de cautelas para
evitar a ocorrência de sobressaltos na execução contratual que prejudiquem o
normal desenvolvimento da atividade administrativa e, por conseguinte, a tutela
do interesse público.
Marçal Justen Filho
leciona:
A subcontratação será admitida nos termos e limites
previstos no instrumento convocatório. Ademais, será exigida comprovação da
viabilidade e satisfatoriedade da subcontratação.
Ainda que não se estabeleça um vínculo direto e imediato entre a Administração
e o subcontratado, deverá comprovar-se uma promessa de subcontratação e a
idoneidade do possível contratado. Afinal, a subcontratação envolve riscos para
a Administração Pública, os quais devem ser minimizados.
Ainda que a Administração não mantenha relação direta
com o subcontratado, o dever de tutelar o interesse público e, sobretudo, de
agir consoante os princípios próprios do regime jurídico administrativo,
fundamenta a decisão estatal de fixar qual parte do serviço poderá ser
subcontratada.
Sobre o limite da subcontratação, o Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais - TJMG - decidiu:
[...] E, quanto à permissão de
subcontratação de 30% do valor global da proposta apresentada, equivalente a
quase um terço do contrato, quero crer tratar-se de concessão razoável, a
permitir a formação de consórcios em percentual seguro, de molde a garantir a
segurança na realização de empreendimento de tamanha magnitude, sendo certo,
indiscutivelmente, que, quanto maior for o número de empresas vinculadas à
satisfação da concorrência, proporcionalmente maior será a possibilidade de
haver atraso na entrega do complexo eletromecânico e eletrônico que se pretende
implantar. [...]
No mesmo sentido, a jurisprudência do TCEMG:
[...] assim como a Unidade
Técnica, entendo que a Administração deve dispor adequadamente da possibilidade
de subcontratação no edital e no contrato, definindo claramente seus
parâmetros, quando aceitável, pela interpretação dos art. 72 e 78, inciso VI,
da Lei n. 8.666/93, pelo que considero irregular a ausência, no edital de
Tomada de Preços nº 001/2009, dos limites para a subcontratação ali autorizada.
O edital, em regra, deve prever e delimitar o que
e quanto do objeto poderá ser subcontratado. A subcontratação é exceção.
4.8 DA INOBSERVÂNCIA ÀS LEIS DE TRANSPARÊNCIA FISCAL
E DE ACESSO À INFORMAÇÃO
O conceito de publicidade, previsto no caput
do art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB,- evoluiu
ao longo de décadas para hoje alçar-se ao de transparência. A legislação pátria
e as boas práticas refletem tal avanço, a exemplo da Lei de Transparência
Fiscal, da Lei de Acesso à Informação, do uso do Pregão nas compras estimadas
em até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) em detrimento do Convite (art. 22, § 2º,
da Lei nº 8.666/93), da preferência pelo pregão eletrônico ao presencial45 e da
cotação eletrônica de preços.
Nesse aspecto, a Lei Complementar nº 131, de 27 de
maio de 2009, acrescentou dispositivos à Lei Complementar nº 101, de 4 de maio
de 2000, a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de informações
pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme disposto a seguir:
Art. 48. São instrumentos de
transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive
em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de
diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer
prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão
Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência
será assegurada também mediante: (Redação dada pela Lei Complementar nº 131, de
2009).
I - incentivo à participação
popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração
e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
II - liberação ao pleno
conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações
pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos
de acesso público;
III - adoção de sistema
integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de
qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art.
48-A.
Art. 48-A. Para os fins a que se
refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação
disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações
referentes a: (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
I - quanto à despesa: todos os
atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no
momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes
ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado,
à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao
procedimento licitatório realizado;
II - quanto à receita: o
lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive
referente a recursos extraordinários.
Dessa forma, as licitações cujo objeto envolva
aquisição/locação de sistemas de gestão pública devem prever as funcionalidades
que efetivem o prescrito na LC nº 131/2009.
Sobre a matéria, cita-se decisão do TCEMG:
Omissão quanto aos dispositivos de transparência da
LC 131/2009
O Ministério Público, junto ao Tribunal, registra a
ausência de observação dos dispositivos de transparência insertos na Lei
Complementar nº 131/2009, no processo que objetiva a informatização
administrativa do Município de Varginha.
Como bem registra o parecer ministerial, a questão
central reside no atendimento ao princípio da transparência administrativa,
sendo a Lei Complementar n. 131/2009, de fato, um marco importante no
desenvolvimento desta cultura no ambiente estatal e na própria sociedade.
Recomendo, pois, nas futuras contratações, sejam
levados em consideração os termos da Lei 131/2009, para que se revejam os
termos da contratação e para que se insiram no procedimento licitatório os
comandos ali inseridos.
De forma oportuna, com a edição da Lei nº 12.527 de
18 de novembro de 2011, regulamentou-se o direito fundamental de acesso a
informações, previstos no art. 5º, inc. X e XXXIII, no art. 37, § 3º, inc. II,
e no art. 216, § 2º, da CRFB.
O princípio constitucional da publicidade permite ao
cidadão e aos órgãos de controle fiscalizar os atos do gestor que materializam
a atuação estatal, consistindo em divulgar oficialmente os referidos atos.
Já a transparência constitui um desdobramento, um
"plus" da publicidade, porquanto estimula
os gestores a agirem com responsabilidade e zelo, induz o controle social,
constrói mecanismos de combate à corrupção, fortalece a gestão fiscal e impõe o
rompimento do conceito de que todas as informações produzidas pela Administração
constituem monopólio do Estado.
Hodiernamente, uma das formas mais efetivas de
divulgação em tempo real se faz pela rede mundial de computadores (internet). O
legislador não desconheceu essa realidade. Nesse sentido, a Lei nº 12.527/2011
prescreve que o acesso à informação compreende, entre outros, os direitos de
obter informação pertinente à licitação e aos contratos administrativos (art.
7º, inc. I). Também, que constitui dever dos órgãos e entidades públicas
promover a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores
(internet), que inclui a disponibilização dos editais do certame e resultados
obtidos, bem como de todos os contratos celebrados (art. 8º).
A propósito, excerto de decisão do TCEMG que julgou
irregular a falta de divulgação do aviso de licitação e da íntegra do ato
convocatório e seus anexos no sítio eletrônico de ente jurisdicionado:
2.2.2 Da publicidade restrita do ato convocatório
O Ministério Público de Contas apontou como irregular
a publicidade restrita do ato convocatório, tendo em vista que os responsáveis
pelo certame não publicaram o aviso de licitação, bem como o inteiro teor do
edital e seus anexos no sítio eletrônico do Município de [omissis],
afrontando, dessa forma, o art. 8º, § 1º, IV e § 2º, da Lei de Acesso à
Informação, Lei nº 12.527/11.
A Unidade Técnica, em sede de reexame, ratificou a
irregularidade aditada pelo Órgão Ministerial e opinou pela expedição de
recomendação aos responsáveis para que, em atendimento à Lei de Acesso à
Informação e aos princípios da ampla competitividade e isonomia, divulguem
amplamente o novo edital de licitação, inclusive no sítio eletrônico da
Prefeitura Municipal de [omissis], o que foi
ratificado pelo Parquet de Contas em seu
parecer conclusivo.
A Lei nº 12.527/11, Lei de Acesso à Informação, que
regulamenta o direito fundamental ao acesso a informações previsto
constitucionalmente, tem como algumas de suas diretrizes a divulgação de informações
de interesse público, independentemente de solicitações, e a utilização de
meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação.
O art. 8º, § 1º, IV, do citado diploma legal, dispõe:
Art. 8º É dever dos órgãos e
entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação
em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de
interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.
§ 1º Na divulgação das
informações a que se refere o caput, deverão constar, no mínimo:
[...]
IV - informações concernentes a
procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem
como a todos os contratos celebrados;
[...]
§ 2º Para cumprimento do
disposto no caput, os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos
os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem, sendo obrigatória a
divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores (internet).
[...]
§ 4º Os Municípios com população
de até 10.000 (dez mil) habitantes ficam dispensados da divulgação obrigatória
na internet a que se refere o § 2º, mantida a obrigatoriedade de divulgação, em
tempo real, de informações relativas à execução orçamentária e financeira, nos
critérios e prazos previstos no art. 73 - B da Lei Complementar nº 101, de 4 de
maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).
(Grifou-se)
Consoante informação constante no sítio eletrônico do
Município de [...], a sua população foi estimada em 81.119 (oitenta e um mil
cento e dezenove) habitantes pelo IBGE no ano de 2009.
Diante do exposto, considero irregular a ausência de
publicação do aviso de licitação, bem como do inteiro teor do edital e seus
anexos no sítio eletrônico de [...], tendo em vista que o Município tem
população superior a 10.000 (dez mil) habitantes, impondo-se como obrigatória
tal disponibilização, em obediência ao disposto no art. 8º, §4º, da Lei de
Acesso à Informação.
Além disso, a ausência da ampla e irrestrita
divulgação do ato convocatório ofende o princípio da publicidade, expressamente
previsto no art. 37, caput, da Constituição da República e no art. 3º da
Lei nº 8.666/93.
Pelo exposto, conclui-se que, ainda que inexistisse
imposição legal em franquear as informações ao cidadão, caberia aos gestores
públicos prestá-las. Administração transparente é aquela que compartilha com a
sociedade informações de maneira clara e acessível.
O conceito de Administração Pública inclui o de
Administração Transparente. As informações relativas aos procedimentos
licitatórios (edital, resultados, contratos firmados, entre outros) devem estar
disponíveis no sítio eletrônico do órgão ou entidade pública licitante,
estadual ou municipal. Para os municípios que possuam população inferior a
10.000 (dez mil) habitantes, fica dispensada a obrigatoriedade de divulgação na
internet, nos termos do art. 8º, § 4º, da Lei de Acesso à Informação.
(Fonte: Tribunal de
Contas do Estado de Minas Gerais - 2015)
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Contador, auditor, economista, administrador, professor universitário,
consultor do BEAP, diretor técnico da Magnus Auditores.
BOCO9327---WIN
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