DIREITO IMOBILIÁRIO
- APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL -
ALEGAÇÃO DE ATRASO NA ENTREGA - PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS -
LEGITIMIDADE PASSIVA DA INCORPORADORA - DEVOLUÇÃO DE MONTANTE EXIGIDO A TÍTULO
DE ENTRADA - AUSÊNCIA DE PROVA DE QUITAÇÃO - INDEFERIMENTO - RESTITUIÇÃO DA
PARCELA REFERENTE À COMISSÃO DE CORRETAGEM - INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA AO
CONSUMIDOR - IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO - PRECEDENTES DO STJ - RECURSO NÃO
PROVIDO - SENTENÇA MANTIDA - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS -
MEF34447 - AD
- Legitimidade passiva 'ad
causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder
pela restituição ao consumidor dos valores pagos a título de comissão de
corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, nas demandas em que se
alega prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor (STJ - REsp 1551951/SP, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO,
SEGUNDA SEÇÃO, j. 24.08.2016, DJe 06.09.2016).
- Não havendo prova de que o
consumidor tenha realizado qualquer pagamento a título de entrada, não há que
se falar em acolhimento do pedido de restituição.
- Validade da cláusula
contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a
comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade
autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado
o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da
comissão de corretagem (STJ - REsp 1599511/SP, Rel. Min.
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, j. 24.08.2016, DJe
06.09.2016).
APELAÇÃO
CÍVEL Nº 1.0433.12.020184-6/001 - Comarca de Montes Claros
Apelante: Douglas Freire Araújo
Apelada: Terra Nova Rodobens
Incorporadora Imobiliária Montes Claros II - SPE Ltda
A C Ó R D
à O
Vistos
etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR A PRELIMINAR
E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
DES. JOSÉ MARCOS RODRIGUES VIEIRA
Relator
V O T O
Trata-se de Apelação Cível
interposta da sentença de fls. 112/113-v-TJ, que, nos
autos da Ação de Rescisão Contratual ajuizada por Douglas Freire Araújo em
desfavor de Terra Nova Rodobens Incorporadora
Imobiliária Montes Claros II SPE Ltda., julgou parcialmente procedentes os
pedidos formulados na inicial apenas para declarar a rescisão de contrato
celebrado entre as partes, sem, contudo, determinar a restituição de qualquer
valor ao Autor.
Inconformado, o Autor interpõe
apelação às fls. 116/122-TJ, por meio da qual salienta que os valores pagos à
Ré restaram devidamente demonstrados nos autos por cópias de boletos e recibos,
de modo que, ante a frustração do negócio por culpa da Ré, faz jus ao
ressarcimento da totalidade dos valores despendidos. No tocante à comissão de
corretagem, igualmente sustenta que faz jus à devolução dobrada do que pagou à
Ré, já que, diversamente do que restou consignado na sentença, não há cláusula
contratual prevendo a transferência de tal obrigação ao consumidor. Nestes
termos, pugna pelo provimento do recurso.
Contrarrazões apresentadas pela
Ré às fls. 124/141-TJ, em que suscita preliminar de ilegitimidade passiva no
tocante ao pedido de devolução da comissão de corretagem e, no mérito, postula
a manutenção da sentença nos termos em que proferida.
É o Relatório. Passo a decidir.
Conheço do recurso, presentes os
pressupostos de admissibilidade.
PRELIMINAR
Ilegitimidade
Passiva
Em sede de contrarrazões, a Ré
suscita preliminar de ilegitimidade passiva no tocante ao pedido de devolução
do valor pago a título de comissão de corretagem, ao argumento de que, tendo
sido paga tal importância ao corretor que intermediou a venda do imóvel negociado
entre as partes, sua é a legitimidade para responder por eventual restituição
do montante recebido.
Sobre o tema, é cediço que a
legitimidade dos envolvidos na lide se vincula à titularidade da relação
material discutida, razão pela qual relata LIEBMAN (tradução de CÂNDIDO RANGEL
DINAMARCO):
Legitimação
para agir ('legitimatio
ad causam') é a titularidade (ativa ou passiva) da ação. O problema da
legitimação consiste em individualizar a pessoa a que pertence o interesse de
agir (e, pois, a ação) e a pessoa com referência à qual ['nei cui confronti'] ele existe; em outras palavras, é um
problema que decorre da distinção entre a existência objetiva do interesse de
agir e a sua pertinência subjetiva.
(...)
Entre
esses dois problemas, ou seja, o da existência do interesse de agir e o da sua
pertinência subjetiva, o segundo é que deve ter precedência, porque só em
presença dos dois interessados diretos é que o juiz pode examinar se o
interesse exposto pelo autor efetivamente existe e se ele apresenta os
requisitos necessários (Manual de Direito Processual Civil. 3ª ed., São Paulo:
Malheiros, 2005, p. 208-9).
Neste contexto, exemplifica
FREDIE DIDIER JR.:
Parte
legítima é aquela que se encontra em posição processual (autor ou réu)
coincidente com a situação legitimadora, "decorrente de certa previsão
legal, relativamente àquela pessoa e perante o respectivo objeto
litigioso". Para exemplificar: se alguém pretende obter uma indenização de
outrem, é necessário que o autor seja aquele que está na posição jurídica de
vantagem e o réu seja o responsável, ao menos em tese, pelo dever de indenizar
(Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, 11ª ed., Salvador: Juspodivm, 2009,
p. 186).
Assim a legitimidade da parte decorre
da titularidade dos interesses em conflito e deve ser analisada de forma
abstrata, desvinculada de apreciação probatória e da discussão acerca do
mérito.
No caso dos autos, sem embargo
dos argumentos expendidos, tenho que a legitimidade da incorporadora Apelada é
cristalina, pois, figurando como promitente-vendedora do imóvel e recaindo a
discussão sobre eventual abusividade da transferência
do encargo ao consumidor, é de se aplicar entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1551951/SP, processado sob a sistemática dos recursos
repetitivos:
RECURSO
ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL.
INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS.
CORRETAGEM. CLÁUSULA DE TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO DE
ABUSIVIDADE. TEORIA DA ASSERÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA INCORPORADORA.
VALIDADE DA CLÁUSULA. SERVIÇO DE ASSESSORIA TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI).
COBRANÇA. DESCABIMENTO. ABUSIVIDADE.
1.
TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.1. Legitimidade passiva 'ad
causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder
pela restituição ao consumidor dos valores pagos a título de comissão de
corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, nas demandas em que se
alega prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor.
(...)
(STJ
- REsp 1551951/SP, Rel. Min. PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, j. 24.08.2016, DJe
06.09.2016).
Com tais considerações, REJEITO
A PRELIMINAR.
DES. PEDRO ALEIXO - De acordo
com o(a) Relator(a).
DES. RAMOM TÁCIO - De acordo com
o(a) Relator(a).
DES. JOSÉ MARCOS RODRIGUES
VIEIRA (RELATOR)
MÉRITO
O Autor ajuizou a presente ação
alegando ter celebrado contrato de promessa de compra e venda de imóvel com a
Ré, mas que, em razão do atraso na entrega da unidade, postulou a rescisão da
avença com a restituição de todos os valores pagos, inclusive comissão de
corretagem.
Após os trâmites legais e não
havendo controvérsia quanto ao pleito de rescisão contratual, os pedidos foram
julgados parcialmente procedentes na origem, o que ensejou a interposição do
presente recurso de apelação pelo Autor, nos termos já relatados.
Nesta conjuntura, decretada a
rescisão do pacto sem declaração de culpa, e tratando-se de decisão irrecorrida no particular, cinge-se a matéria objeto de
insurgência à verificação da pertinência do pedido de restituição dos valores
que o consumidor Apelante alega ter pago à Ré, valores estes que seriam
referentes aos montantes exigidos a título de entrada, bem como a título de
comissão de corretagem.
Primeiramente, no tocante à
importância que teria sido paga a título de entrada, sustenta o Recorrente que
os valores quitados restaram devidamente demonstrados nos autos por cópias de
boletos e recibos, de modo que, ante a frustração do negócio por culpa da Ré,
faz jus ao ressarcimento da totalidade da importância.
Contudo, não obstante a
alegação, compulsados os autos, não se verifica a juntada de qualquer boleto ou
recibo de quitação.
Assim, havendo expressa negativa
da Ré quanto ao adimplemento de tal importância, cabia ao Autor o ônus de
demonstrar a quitação, do qual, à evidência, não se desincumbiu.
Reitere-se que, ao contrário do
afirmado nas razões recursais, não fora trazido ao feito qualquer recibo de
pagamento, de modo que se tem por descumprida a disposição do art. 320 do
Código Civil, in verbis:
Art.
320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular,
designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por
este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do
seu representante.
Deste modo, não demonstrado o
pagamento de qualquer valor a título de entrada, não há que se falar em
acolhimento do pedido de restituição.
Por outro norte, em relação ao
pedido de devolução do valor pago a título de comissão de corretagem, ressalto
que, diante do posicionamento do STJ, firmado em recurso representativo de
controvérsia, passei a considerar legítima a cobrança, desde que embasada em
cláusula contratual específica e destacada.
Neste sentido:
RECURSO
ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA.
VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA DE
TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. VALIDADE. PREÇO TOTAL. DEVER DE
INFORMAÇÃO. SERVIÇO DE ASSESSORIA TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). ABUSIVIDADE DA
COBRANÇA.
I
- TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015:
1.1.
Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a
obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra
e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente
informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do
valor da comissão de corretagem.
1.2.
Abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do
serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado
à celebração de promessa de compra e venda de imóvel.
II
- CASO CONCRETO:
2.1.
Improcedência do pedido de restituição da comissão de corretagem, tendo em
vista a validade da cláusula prevista no contrato acerca da transferência desse
encargo ao consumidor.
Aplicação
da tese 1.1.
2.2.
Abusividade da cobrança por serviço de assessoria
imobiliária, mantendo-se a procedência do pedido de restituição.
Aplicação
da tese 1.2.
III
- RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
(STJ
- REsp 1599511/SP, Rel. Min. PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, j. 24.08.2016, DJe
06.09.2016).
Na hipótese em apreço, verifico
que a cláusula 15.1 do contrato (fl. 29-TJ) é expressa ao imputar ao comprador
a obrigação de pagar a aludida comissão de corretagem.
Não bastasse, o documento de f.
32-TJ, colacionado pelo próprio Requerente, demonstra que o comprador, de forma
destacada, efetuou o pagamento da aludida comissão de corretagem diretamente em
favor do corretor, de modo que, em tal conjuntura, não paira qualquer dúvida de
que o consumidor foi plenamente cientificado quanto à natureza, à origem, ao
destinatário e ao montante do pagamento que estava realizando.
Em assim sendo, não havendo
declaração de culpa da Ré pela rescisão da avença, tem-se por igualmente
improcedente o pedido de restituição do valor pago a título de comissão de
corretagem.
Com tais considerações, NEGO
PROVIMENTO AO RECURSO para manter incólume a sentença recorrida.
Em relação às custas e aos
honorários, mantenho o que restou estabelecido na decisão apelada, sendo certo
que, nos termos do art. 85, § 11, do CPC de 2015, fixo honorários recursais em
proveito dos procuradores da Apelada no importe de R$ 1.000,00, suspensa a
exigibilidade das verbas nos termos do art. 98, § 3º, do CPC de 2015.
DES.
PEDRO ALEIXO - De acordo com o(a) Relator(a).
DES.
RAMOM TÁCIO - De acordo com o(a) Relator(a).
Súmula - "REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM
PROVIMENTO À APELAÇÃO."
BOAD10008---WIN/INTER
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