AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR - ASSEGURA DIREITOS FUNDAMENTAIS -
PRISÃO ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU LEGISLATIVO - DECISÃO DO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF34507 - BEAP
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR - NECESSIDADE DE PRESENÇA DE RELEVANTE
FUNDAMENTAÇÃO E PERIGO NA DEMORA - CONSTITUIÇÃO ESTADUAL - ASSEGURA DIREITOS
FUNDAMENTAIS - PRISÃO ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU
LEGISLATIVO - INCOMPATIBILIDADE.
Presente a relevante
fundamentação, bem como o perigo na demora da prestação jurisdicional, deve ser
deferida a medida cautelar para suspender a eficácia da lei impugnada.
A Constituição estadual assegura
os direitos fundamentais previstos na Constituição da República, sendo,
portanto, incompatível com aquela a norma que prevê prisão administrativa
decretada pelo Chefe do Poder Executivo ou Legislativo local.
AÇÃO
DIRETA INCONST Nº 1.0000.14.103235-9/000 Comarca de ...
Requerente:
Prefeito Mun ... Representada Por ...
Requerida:
Câmara Munic ...
A C Ó R D
à O
Vistos etc., acorda, em Turma, o
ÓRGÃO ESPECIAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na
conformidade da ata dos julgamentos, em CONCEDER A MEDIDA CAUTELAR.
DES. PEDRO BERNARDES
Relator
V O T O
Trata-se de ação direta de
inconstitucionalidade ajuizada pelo Prefeito do Município de ... em face do
parágrafo único do art. 61 da Lei Orgânica daquele município, na qual alegou,
em síntese, que o referido dispositivo viola o art. 22 da Constituição da
República, ao versar acerca de matéria de natureza processual e penal; que tal
circunstância enseja violação ao princípio da separação dos poderes, prevista
no art. 6º e 173 da Constituição Estadual.
Teceu outras considerações e
requereu a concessão de liminar para suspensão da eficácia do ato normativo.
Apesar de devidamente intimada
(f. 51), a requerida não se manifestou acerca do pedido cautelar (f. 52).
A concessão de medida cautelar
em ação direta de inconstitucionalidade demanda a comprovação dos requisitos
genéricos atinentes à tutela de urgência, sendo exigida a comprovação de perigo
de lesão irreparável ou de difícil reparação, bem como a relevante
fundamentação.
Neste sentido se orienta a
jurisprudência:
Para a concessão de medida
cautelar é indispensável a comprovação dos requisitos legais, quais sejam: a)
relevância do fundamento (fumus boni
iuris); b) perigo de dano irreparável ou da
ineficácia da decisão, se for concedida no julgamento do mérito (periculum in mora). Ausentes os requisitos, indefere-se o
pedido. (TJMG - Ação Direta Inconst
1.0000.14.076932-4/000, Relator(a): Des.(a) Silas Vieira, ÓRGÃO ESPECIAL,
julgamento em 26.11.2014, publicação da súmula em 12.12.2014)
No caso vertente, o requerente
sustentou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 61 da Lei Orgânica
do município de ..., ao argumento de ocorrida violação ao princípio da
separação dos poderes coma usurpação de competência privativa da União.
O dispositivo impugnado possui a
seguinte redação:
Parágrafo único - Caberá ao
Prefeito e ao Presidente da Câmara decretar a prisão administrativa dos
servidores que lhes sejam subordinados se omissos ou remissos na prestação de
contas de dinheiros públicos sujeitos à sua guarda.
O requerente alegou que tal
dispositivo violaria o art. 22 da Constituição da República.
Entretanto, falece ao tribunal
estadual competência para o exame de inconstitucionalidade de ato normativo
face à Constituição da República, devendo ser adotado parâmetro disposto na
Constituição Estadual, nos termos do § 2º do art. 125 da Carta Magna.
Portanto, mostra-se inviável, a
princípio, a cognição acerca da suposta violação ao art. 22 da Constituição da
República.
Como o art. 6º e 173 da
Constituição Estadual foram invocados em decorrência da alegada violação ao
art. 22 da Constituição da República, também não se cogitaria em sua violação.
Ainda que se olvidasse tal
aspecto, tais dispositivos da Constituição Estadual preceituam a independência
entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário no âmbito Estadual e
Municipal.
Destarte, eventual usurpação de
competência da União pelo Município não enseja, em tese, violação ao art. 6º e
173 da Constituição Estadual.
Entretanto, a ação direta de
inconstitucionalidade é dotada de causa de pedir aberta, não sendo o órgão
julgador limitado aos fundamentos apontados na petição inicial, conforme
orientação da jurisprudência:
EMENTA: CONSTITUCIONAL.
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. CPMF. CONSTITUCIONALIDADE. O Plenário desta colenda Corte, ao
julgar a ADI 2.031, rejeitou todas as alegações de inconstitucionalidade do caput e dos §§ 1º e 2º do art. 75 do
ADCT, introduzidos pela Emenda Constitucional 21/99. Isto porque as ações
diretas de inconstitucionalidade possuem causa de pedir aberta. É dizer: ao
julgar improcedentes ações dessa natureza, o Supremo Tribunal Federal afirma a
integral constitucionalidade dos dispositivos questionados (Precedente: RE
343.818, Relator Ministro Moreira Alves). Embargos de declaração rejeitados
(STF, RE 372535 AgR-ED, Relator(a): Min. CARLOS
BRITTO, Primeira Turma, julgado em 09.10.2007, DJe-065
DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT VOL-02314-05 PP-01047).
Assentada tal premissa, tem-se
que o art. 4º da Constituição Estadual assegura os direitos e garantias
fundamentais arrolados na Constituição da República.
Dentre tais direitos
fundamentais, destaca-se o art. 5º, LXI que dispõe: "ninguém será preso
senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade
judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei".
Ora, o dispositivo municipal
impugnado, ao permitir a prisão de servidor por decreto do Prefeito ou do
Presidente da Câmara afronta o direito fundamental acima apontado, que
condiciona a prisão a ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo as hipóteses não aplicáveis ao caso vertente de flagrante
delito e transgressão ou crime militar.
Portanto, neste juízo sumário de
cognição, constata-se relevante fundamentação quanto à inconstitucionalidade do
p. único do art. 61 da lei orgânica do município de ... face ao art. 4º da
Constituição Estadual.
Igualmente, verifica-se, na
espécie, a presença de perigo na demora da prestação jurisdicional a justificar
a excepcional medida de urgência.
É que o dispositivo da lei
impugnada prevê que a possibilidade de decreto irregular de prisão, podendo
ocasionar a indevida violação ao direito de liberdade de inúmeros servidores.
Diante da comprovação de
atendimento aos requisitos legais, deve ser concedida a liminar.
Com estas considerações, DEFIRO
A LIMINAR, com efeitos ex nunc, para suspender a
eficácia do parágrafo único da Lei Orgânica do Município de ..., com a
respectiva publicação, nos termos do § 6º do art. 339 e 340 do Regimento
Interno deste tribunal.
É como voto.
OS DEMAIS DESEMBARGADORES
VOTARAM DE ACORDO COM O RELATOR.
Súmula
- "CONCEDERAM A MEDIDA CAUTELAR"
BOCO9371---WIN/INTER
REF_BEAP