AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR - ASSEGURA DIREITOS
FUNDAMENTAIS - PRISÃO ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU
LEGISLATIVO - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF34513 - BEAP
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR - NECESSIDADE DE PRESENÇA DE RELEVANTE
FUNDAMENTAÇÃO E PERIGO NA DEMORA - CONSTITUIÇÃO ESTADUAL - ASSEGURA DIREITOS
FUNDAMENTAIS - PRISÃO ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU
LEGISLATIVO - INCOMPATIBILIDADE.
Presente a relevante
fundamentação, bem como o perigo na demora da prestação jurisdicional, deve ser
deferida a medida cautelar para suspender a eficácia da lei impugnada.
A Constituição estadual assegura
os direitos fundamentais previstos na Constituição da República, sendo,
portanto, incompatível com aquela a norma que prevê prisão administrativa
decretada pelo Chefe do Poder Executivo ou Legislativo local.
AÇÃO
DIRETA INCONST Nº 1.0000.14.103235-9/000 Comarca de ...
Requerente:
Prefeito Mun ... Representada Por ...
Requerida:
Câmara Munic ...
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, o ÓRGÃO ESPECIAL do
Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos
julgamentos, em CONCEDER A MEDIDA CAUTELAR.
DES. PEDRO BERNARDES
Relator
V O T O
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade
ajuizada pelo Prefeito do Município de ... em face do parágrafo único do art.
61 da Lei Orgânica daquele município, na qual alegou, em síntese, que o
referido dispositivo viola o art. 22 da Constituição da República, ao versar
acerca de matéria de natureza processual e penal; que tal circunstância enseja
violação ao princípio da separação dos poderes, prevista no art. 6º e 173 da
Constituição Estadual.
Teceu outras considerações e requereu a concessão de
liminar para suspensão da eficácia do ato normativo.
Apesar de devidamente intimada (f. 51), a requerida
não se manifestou acerca do pedido cautelar (f. 52).
A concessão de medida cautelar em ação direta de
inconstitucionalidade demanda a comprovação dos requisitos genéricos atinentes
à tutela de urgência, sendo exigida a comprovação de perigo de lesão
irreparável ou de difícil reparação, bem como a relevante fundamentação.
Neste sentido se orienta a jurisprudência:
Para a concessão de medida cautelar é indispensável a
comprovação dos requisitos legais, quais sejam: a) relevância do fundamento (fumus boni iuris);
b) perigo de dano irreparável ou da ineficácia da decisão, se for concedida no
julgamento do mérito (periculum in mora). Ausentes os
requisitos, indefere-se o pedido. (TJMG - Ação Direta Inconst
1.0000.14.076932-4/000, Relator(a): Des.(a) Silas Vieira, ÓRGÃO ESPECIAL,
julgamento em 26.11.2014, publicação da súmula em 12.12.2014)
No caso vertente, o requerente sustentou a
inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 61 da Lei Orgânica do
município de ..., ao argumento de ocorrida violação ao princípio da separação
dos poderes coma usurpação de competência privativa da União.
O dispositivo impugnado possui a seguinte redação:
Parágrafo único - Caberá ao Prefeito e ao Presidente
da Câmara decretar a prisão administrativa dos servidores que lhes sejam
subordinados se omissos ou remissos na prestação de contas de dinheiros
públicos sujeitos à sua guarda.
O requerente alegou que tal dispositivo violaria o
art. 22 da Constituição da República.
Entretanto, falece ao tribunal estadual competência
para o exame de inconstitucionalidade de ato normativo face à Constituição da
República, devendo ser adotado parâmetro disposto na Constituição Estadual, nos
termos do § 2º do art. 125 da Carta Magna.
Portanto, mostra-se inviável, a princípio, a cognição
acerca da suposta violação ao art. 22 da Constituição da República.
Como o art. 6º e 173 da Constituição Estadual foram
invocados em decorrência da alegada violação ao art. 22 da Constituição da
República, também não se cogitaria em sua violação.
Ainda que se olvidasse tal aspecto, tais dispositivos
da Constituição Estadual preceituam a independência entre os Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário no âmbito Estadual e Municipal.
Destarte, eventual usurpação de competência da União
pelo Município não enseja, em tese, violação ao art. 6º e 173 da Constituição
Estadual.
Entretanto, a ação direta de inconstitucionalidade é
dotada de causa de pedir aberta, não sendo o órgão julgador limitado aos
fundamentos apontados na petição inicial, conforme orientação da
jurisprudência:
EMENTA: CONSTITUCIONAL.
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. CPMF. CONSTITUCIONALIDADE. O Plenário desta colenda Corte, ao
julgar a ADI 2.031, rejeitou todas as alegações de inconstitucionalidade do caput e dos §§ 1º e 2º do art. 75 do
ADCT, introduzidos pela Emenda Constitucional 21/99. Isto porque as ações
diretas de inconstitucionalidade possuem causa de pedir aberta. É dizer: ao
julgar improcedentes ações dessa natureza, o Supremo Tribunal Federal afirma a
integral constitucionalidade dos dispositivos questionados (Precedente: RE
343.818, Relator Ministro Moreira Alves). Embargos de declaração rejeitados
(STF, RE 372535 AgR-ED, Relator(a): Min. CARLOS
BRITTO, Primeira Turma, julgado em 09.10.2007, DJe-065
DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT VOL-02314-05 PP-01047).
Assentada tal premissa, tem-se que o art. 4º da
Constituição Estadual assegura os direitos e garantias fundamentais arrolados
na Constituição da República.
Dentre tais direitos fundamentais, destaca-se o art.
5º, LXI que dispõe: "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por
ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos
casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em
lei".
Ora, o dispositivo municipal impugnado, ao permitir a
prisão de servidor por decreto do Prefeito ou do Presidente da Câmara afronta o
direito fundamental acima apontado, que condiciona a prisão a ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo as hipóteses não
aplicáveis ao caso vertente de flagrante delito e transgressão ou crime
militar.
Portanto, neste juízo sumário de cognição,
constata-se relevante fundamentação quanto à inconstitucionalidade do p. único
do art. 61 da lei orgânica do município de ... face ao art. 4º da Constituição
Estadual.
Igualmente, verifica-se, na espécie, a presença de
perigo na demora da prestação jurisdicional a justificar a excepcional medida
de urgência.
É que o dispositivo da lei impugnada prevê que a
possibilidade de decreto irregular de prisão, podendo ocasionar a indevida
violação ao direito de liberdade de inúmeros servidores.
Diante da comprovação de atendimento aos requisitos
legais, deve ser concedida a liminar.
Com estas considerações, DEFIRO A LIMINAR, com
efeitos ex nunc, para suspender a eficácia do
parágrafo único da Lei Orgânica do Município de ..., com a respectiva
publicação, nos termos do § 6º do art. 339 e 340 do Regimento Interno deste tribunal.
É como voto.
OS DEMAIS DESEMBARGADORES VOTARAM DE ACORDO COM O
RELATOR.
Súmula - "CONCEDERAM
A MEDIDA CAUTELAR"
BOCO9371---WIN/INTER
REF_BEAP