AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR - ASSEGURA DIREITOS
FUNDAMENTAIS - PRISÃO ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU
LEGISLATIVO - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF34645 - BEAP
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA
CAUTELAR - NECESSIDADE DE PRESENÇA DE RELEVANTE FUNDAMENTAÇÃO E PERIGO NA
DEMORA - CONSTITUIÇÃO ESTADUAL - ASSEGURA DIREITOS FUNDAMENTAIS - PRISÃO
ADMINISTRATIVA POR CHEFE DO PODER EXECUTIVO OU LEGISLATIVO - INCOMPATIBILIDADE.
Presente a relevante fundamentação, bem como o perigo
na demora da prestação jurisdicional, deve ser deferida a medida cautelar para
suspender a eficácia da lei impugnada.
A Constituição estadual assegura os direitos
fundamentais previstos na Constituição da República, sendo, portanto,
incompatível com aquela a norma que prevê prisão administrativa decretada pelo
Chefe do Poder Executivo ou Legislativo local.
AÇÃO DIRETA INCONST Nº
1.0000.14.103235-9/000 - Comarca de ...
Requerente : Prefeito Mun ...
Representado por ...
Requerido :
Câmara Munic ...
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, o ÓRGÃO ESPECIAL do
Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos
julgamentos, em CONCEDER A MEDIDA CAUTELAR.
DES. PEDRO BERNARDES
Relator
V O T O
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada
pelo Prefeito do Município de ... em face do parágrafo único do art. 61 da lei
orgânica daquele município, na qual alegou, em síntese, que o referido
dispositivo viola o art. 22 da Constituição da República ao versar acerca de
matéria de natureza processual e penal; que tal circunstância enseja violação
ao princípio da separação dos poderes, prevista no art. 6º e 173 da
Constituição estadual.
Teceu outras considerações e requereu a concessão de
liminar para suspensão da eficácia do ato normativo.
Apesar de devidamente intimada (f. 51), a requerida
não se manifestou acerca do pedido cautelar (f. 52).
A concessão de medida cautelar em ação direta de
inconstitucionalidade demanda a comprovação dos requisitos genéricos atinentes
à tutela de urgência, sendo exigida a comprovação de perigo de lesão
irreparável ou de difícil reparação, bem como a relevante fundamentação.
Neste sentido se orienta a jurisprudência:
Para a concessão de medida
cautelar é indispensável a comprovação dos requisitos legais, quais sejam: a)
relevância do fundamento (fumus boni
iuris); b) perigo de dano irreparável ou da
ineficácia da decisão, se for concedida no julgamento do mérito (periculum in mora). Ausentes os requisitos,
indefere-se o pedido. (TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.14.076932-4/000,
Relator(a): Des.(a) Silas Vieira, ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 26.11.2014,
publicação da súmula em 12.12.2014)
No caso vertente, o requerente sustentou a
inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 61 da lei orgânica do município
de ..., ao argumento de ocorrida violação ao princípio da separação dos poderes
coma usurpação de competência privativa da União.
O dispositivo impugnado possui a seguinte redação:
Parágrafo único - Caberá ao Prefeito e ao Presidente
da Câmara decretar a prisão administrativa dos servidores que lhes sejam
subordinados se omissos ou remissos na prestação de contas de dinheiros
públicos sujeitos à sua guarda.
O requerente alegou que tal dispositivo violaria o
art. 22 da Constituição da República.
Entretanto, falece ao tribunal estadual competência
para o exame de inconstitucionalidade de ato normativo face à Constituição da
República, devendo ser adotado parâmetro disposto na Constituição Estadual, nos
termos do § 2º do art. 125 da Carta Magna.
Portanto, mostra-se inviável, a princípio, a cognição
acerca da suposta violação ao art. 22 da Constituição da República.
Como o art. 6º e 173 da Constituição Estadual foram
invocados em decorrência da alegada violação ao art. 22 da Constituição da
República, também não se cogitaria em sua violação.
Ainda que se olvidasse tal aspecto, tais dispositivos
da Constituição Estadual preceituam a independência entre os Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário no âmbito estadual e municipal.
Destarte, eventual usurpação de competência da União
pelo Município não enseja, em tese, violação ao art. 6º e 173 da Constituição
Estadual.
Entretanto, a ação direta de inconstitucionalidade é
dotada de causa de pedir aberta, não sendo o órgão julgador limitado aos
fundamentos apontados na petição inicial, conforme orientação da
jurisprudência:
EMENTA: CONSTITUCIONAL.
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. CPMF. CONSTITUCIONALIDADE. O Plenário desta colenda Corte, ao
julgar a ADI 2.031, rejeitou todas as alegações de inconstitucionalidade do
caput e dos §§ 1º e 2º do art. 75 do ADCT, introduzidos pela Emenda
Constitucional 21/99. Isto porque as ações diretas de inconstitucionalidade
possuem causa de pedir aberta. É dizer: ao julgar improcedentes ações dessa
natureza, o Supremo Tribunal Federal afirma a integral constitucionalidade dos
dispositivos questionados (Precedente: RE 343.818, Relator Ministro Moreira
Alves). Embargos de declaração rejeitados (STF, RE 372535 AgR-ED,
Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 09.10.2007, DJe-065 DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT
VOL-02314-05 PP-01047).
Assentada tal premissa, tem-se que o art. 4º da
Constituição Estadual assegura os direitos e garantias fundamentais arrolados
na Constituição da República.
Dentre tais direitos fundamentais, destaca-se o art.
5º, LXI que dispõe: "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por
ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos
casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em
lei".
Ora, o dispositivo municipal impugnado, ao permitir a
prisão de servidor por decreto do Prefeito ou do Presidente da Câmara afronta o
direito fundamental acima apontado, que condiciona a prisão a ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo as hipóteses não
aplicáveis ao caso vertente de flagrante delito e transgressão ou crime
militar.
Portanto, neste juízo sumário de cognição,
constata-se relevante fundamentação quanto à inconstitucionalidade do p. único
do art. 61 da lei orgânica do município de ... face ao art. 4º da Constituição
Estadual.
Igualmente, verifica-se na espécie a presença de
perigo na demora da prestação jurisdicional a justificar a excepcional medida
de urgência.
É que o dispositivo da lei impugnada prevê que a
possibilidade de decreto irregular de prisão, podendo ocasionar a indevida
violação ao direito de liberdade de inúmeros servidores.
Diante da comprovação de atendimento aos requisitos
legais, deve ser concedida a liminar.
Com estas considerações, DEFIRO A LIMINAR, com
efeitos ex nunc,
para suspender a eficácia do parágrafo único da lei orgânica do Município de
..., com a respectiva publicação, nos termos do § 6º do art. 339 e 340 do
Regimento Interno deste tribunal.
É
como voto.
OS DEMAIS DESEMBARGADORES VOTARAM DE ACORDO COM O
RELATOR.
Súmula - "CONCEDERAM
A MEDIDA CAUTELAR."
BOCO9384---WIN/INTER
REF_BEAP