AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO - CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE AUDITORIA, ASSESSORIA E CONSULTORIA CONTÁBIL - SINGULARIDADE DEMONSTRADA - LESÃO AO ERÁRIO - PROVA - AUSÊNCIA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADA - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF34733 - BEAP

 

 

                1. A inexigibilidade de licitação ocorre quando houver hipótese de inviabilidade jurídica de competição, seja porque o fornecedor do produto é exclusivo, ou a contratação é realizada mediante a contratação de serviços técnicos de natureza singular, com profissional de notória especialização.

                2. Tendo em vista que não restou comprovada a ocorrência de prejuízo ao erário e que os serviços contratados foram efetivamente prestados por preços de mercado, aliado ao fato de que a auditoria, consultoria e assessoria contábil tinham natureza singular, não há de se falar em ato ímprobo, e por isso a confirmação da sentença de improcedência do pedido é medida que se impõe.

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0056.09.215495-6/001 - Comarca de ...

 

Apelante  : Ministério Público do Estado de Minas Gerais

Apelados : ..., ..., ..., ... em causa própria, ..., ... em causa própria, ..., ..., ... em causa própria

 

A C Ó R D Ã O

 

                Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

 

DES. EDILSON FERNANDES

Relator

 

V O T O

 

                Trata-se de recurso interposto contra a sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra ... e outros, que julgou improcedente o pedido inicial (ff. 2119/2126v).

                O apelante sustenta que restaram apuradas diversas irregularidades na contratação pelo Departamento Municipal de Saúde Pública - DEMASP da empresa Libertas Auditores e Consultores Ltda., mediante inexigibilidade de licitação e efetuação de pagamento com recursos transferidos ao Fundo Municipal de Saúde, conduta vedada pela Lei nº 4.320/64 e Lei nº 8.142/90. Afirma que além da contratação irregular inicial não é possível concluir que os sucessivos termos aditivos, que prorrogaram a vigência do contrato até 31 de dezembro de 2004, foram a opção mais vantajosa para a Administração. Destaca que o prejuízo ao Fundo Municipal de Saúde é evidente, já que tais contratos totalizam dispêndio à Administração, à época, da quantia de R$ 69.828,55 (sessenta e nove mil, oitocentos e vinte e oito reais e cinquenta e cinco centavos). Ressalta que os recursos do Fundo Municipal de Saúde somente podem ser utilizados para custear as despesas diretamente ligadas às ações de saúde e, não para cobrir a realização de serviços técnicos de caráter administrativo. Argumenta que a DEMASP não obteve êxito em comprovar o requisito da singularidade do serviço prestado, conforme ressaltado pelo Relatório de Fiscalização realizado pela CGU. Assinala que basta o dolo genérico para configurar os atos de improbidade administrativa descritos no artigo da Lei nº 8.429/92. Pugna pelo provimento do recurso, a fim de que os requeridos sejam condenados a ressarcir o Fundo Municipal, pela quantia de R$ 107.868,20 (cento e sete mil, oitocentos e sessenta e oito reais e vinte centavos), devidamente corrigida aos dias atuais, além de ser reconhecida a prática dos atos de improbidade administrativa previstos nos artigos 10, incisos VIII e IX, e artigo 11, caput e inciso I, todos da Lei nº 8.429/92, de modo que sejam condenados nas sanções do artigo 12, incisos II e III, da citada lei (ff. 2128/2157).

                Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

                Versam os autos sobre ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face de ... e outros, objetivando a condenação dos mesmos nas sanções da Lei nº 8.429/92 decorrente da prática, em tese, de atos de improbidade administrativa consistente na irregularidade da contratação pelo Departamento Municipal de Saúde Pública - DEMASP da empresa ..., mediante inexigibilidade de licitação, e efetuação do pagamento com recursos transferidos ao Fundo Municipal de Saúde, o que seria vedado pela Lei nº 4.320/64.

                Inicialmente, não merece prosperar a alegação de inovação recursal, sustenta pela apelada ... (ff. 2159/2168), visto que todas as questões foram declinadas pelo autor, ora apelante, em primeira instância.

                Segundo o Relatório de Fiscalização nº 016/20013, elaborado pela Controladoria Geral da União, a partir de sorteios públicos de municípios dos programas de governo financiados com recursos federais, restou apurado, no Município de ..., o pagamento indevido de despesas com assessoria, consultoria, auditoria e manutenção de softwares, tendo em vista que "o pagamento de despesas com recursos federais descentralizados, para cobrir a realização de serviços técnicos de caráter administrativo, não vinculados diretamente à execução de ações e serviços de saúde, como é caso em tela, contraria o entendimento firmado pelo Tribunal de Contas da União - TCU, conforme dispõe a Decisão TCU nº 600/2000- Plenário, de 15.08.2000." (f. 83-TJ).

                A partir da documentação enviada pela Controladoria Geral da União, foi instaurado Inquérito Civil nº 0056.09.0001106-8, no qual foram colhidas as provas documentais e testemunhais, visando subsidiar o ajuizamento da presente ação civil pública.

                Alega o autor que, além da indevida utilização de recursos financeiros do Fundo Municipal de Saúde pelo DEMASP, a contratação da empresa ..., sem o prévio certame licitatório, mostra-se flagrantemente irregular, visto que não demonstrada a singularidade do serviço prestado.

                A solução da controvérsia consiste em saber se restaram preenchidos os requisitos necessários à contratação por inexigibilidade de licitação e, em caso negativo, se a conduta dos réus pode ser tipificada como ato de improbidade administrativa, bem como as penalidades que lhe podem ser aplicadas.

                A Lei nº 8.666/93, ao regulamentar o disposto no artigo 37, XXI da Constituição da República, instituiu a obrigatoriedade de licitação toda vez que qualquer das esferas de Poder da República e demais entidades controladas direta ou indiretamente necessitasse de formalizar contratos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações.

                A licitação caracteriza-se como um conjunto de atos administrativos praticados de forma ordenada e sucessiva que objetivam estabelecer a irrestrita igualdade entre os participantes (princípio constitucional da isonomia), bem como a obtenção da proposta mais vantajosa em razão de um negócio jurídico pretendido pela Administração.

                Contudo, a própria lei de regência estabelece as hipóteses em que não haverá licitação, em seus artigos 17, 24 e 25 seja porque dispensada, dispensável ou inexigível.

                Sobre a inexigibilidade de licitação, assim dispõe o supracitado artigo 25:

 

                Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

                I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

                II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e

divulgação;

                III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

 

                A inexigibilidade ocorre, portanto, quando houver hipótese de inviabilidade jurídica de competição, seja porque o fornecedor do produto é exclusivo, ou a contratação é realizada mediante a contratação de serviços técnicos de natureza singular, com profissional de notória especialização.

                A propósito, nos termos da Lei nº 8.666/93, são considerados serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias (artigo 13, caput e inciso III).

                Entretanto, diante da exigência prevista na norma legal (artigo 25, inciso II), revela-se ilegítima a contratação de serviços cuja prestação não apresente qualquer carga de particularização ou peculiaridade, ainda que também sejam considerados serviços técnicos especializados.

                Significa dizer que a contratação dos serviços descritos no artigo 13 da Lei nº 8.666/93 sem licitação pressupõe que sejam de natureza singular, assim entendido aquele que apresenta característica tal que inviabiliza, ou pelo menos dificulta, a sua comparação com outros profissionais também de notória especialização, mas que, sem ser o único, destaca-se entre os demais da mesma área de atuação.

                A propósito, leciona MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO:

 

                A contratação de serviços técnicos enumerados no artigo 13, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação (inciso II); não é para qualquer tipo de contrato que se aplica essa modalidade: é apenas para os contratos de prestação de serviços, desde que observados os três requisitos, ou seja, o de tratar-se de um daqueles enumerados no artigo 13, o de ser de natureza singular, e o de ser o contratado com profissional notoriamente especializado. (...) Quanto à menção, no dispositivo, à natureza singular do serviço, é evidente que a lei quis acrescentar um requisito, para deixar claro que não basta tratar-se de um dos serviços previstos no artigo 13; é necessário que a complexidade, a relevância, os interesses públicos em jogo tornem o serviço singular, de modo a exigir a contratação com profissional notoriamente especializado; não é qualquer projeto, qualquer parecer, qualquer perícia que torna inexigível a licitação. (...) Com relação à notória especialização, o § 1º do artigo 25 quis reduzir a discricionariedade administrativa em sua apreciação, ao exigir os critérios de essencialidade e indiscutibilidade do trabalho, como sendo o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. Tem-se que estar em zona de certeza, quanto a esses aspectos, para ser válida a inexigibilidade (Direito Administrativo, 21ª edição, Atlas, pp. 356/357).

 

                No mesmo sentido, é a orientação do colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

 

                RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. OMISSÃO INEXISTENTE. ART. 535 NÃO VIOLADO. AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO POR MUNICÍPIO DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA SEM LICITAÇÃO. HIPÓTESE EM QUE NÃO HÁ INEXIGIBILIDADE. SERVIÇOS TÉCNICOS NÃO SINGULARES. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 25, II, § 1º C/C 13, V, DA LEI 8.666/93. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11 DA LEI 8.429/92. 1. (...) 2. (...) 3. Nos termos do art. 13, V c/c art. 25, II, § 1º, da Lei 8.666/1993 é possível a contratação de serviços relativos ao patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas sem procedimento licitatório. Contudo, para tanto, deve haver a notória especialização do prestador de serviço e a singularidade deste. A inexigibilidade é medida de exceção que deve ser interpretada restritivamente. 4. A singularidade envolve casos incomuns e anômalos que demandam mais do que a especialização, pois apresentam complexidades que impedem sua resolução por qualquer profissional, ainda que especializado. 5. (...) 6. O STJ possui entendimento de que viola o disposto no art. 25 da Lei 8.666/1993 a contratação de advogado quando não caracterizada a singularidade na prestação do serviço e a inviabilidade da competição. Precedentes: REsp 1.210.756/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 14.12.2010; REsp 436.869/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, DJ 01.02.2006, p. 477. 7. (...) 8. (...) 9. Recurso parcialmente conhecido e.nessa parte provido, com a devolução dos autos para a instância de origem.para a apreciação das penalidades cabíveis. (REsp 1444874/MG, Rel..Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03.02.2015, DJe 31.03.2015).

 

                Nesse contexto, cumpre analisar a contratação direta da empresa ... e as respectivas prorrogações do contrato de prestação de serviço.

                Da análise dos autos, verifico que em 15 de abril de 2001, o Departamento Municipal de Saúde Pública - DEMASP, sob o comando do requerido ..., então Diretor Geral da autarquia municipal, realizou a contratação direta da empresa ... (ff. 186/190-TJ).

                O contrato com prazo de vigência de oito meses e meio, compreendendo o período de 15 de abril de 2001 até 31 de dezembro de 2001, com a possibilidade de prorrogações, estabeleceu o pagamento à contratada no valor total de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais), contendo o seguinte objeto:

                O presente CONTRATO tem por objeto a prestação de serviços técnicos especializados em Auditoria, Assessoria e Consultoria mensal no exercício de 2001, nas áreas de Contabilidade, Orçamento, e Licitações ao Diretor Geral do DEMASP, através dos órgãos: Gabinete do Diretor, Departamento de Contabilidade, Seção de Tesouraria e Departamento de Licitações – a serem executados pela CONTRATADA junto à CONTRATANTE.

                O mencionado contrato foi prorrogado até 31 de dezembro de 2004, mediante realização de quatro termos aditivos, perfazendo o montante de R$ 69.828,55 (sessenta e nove mil, oitocentos e vinte e oito reais e cinquenta e cinco centavos) (ff. 219/222; 233/234; 239 e 248/244-TJ).

                Consta dos autos inúmeros documentos que evidenciam que a empresa Libertas Auditores e Consultores Ltda. possui reconhecimento no mercado e uma equipe formada por técnicos em contabilidade e em administração pública municipal.

                No tocante à singularidade exigida para a contratação por inexigibilidade de licitação do serviço prestado à municipalidade, apesar de não constar tal especificação no objeto, a celebração do contrato teve por finalidade adequar o sistema de contabilidade da autarquia municipal (DEMASP) à nova Lei de Responsabilidade Fiscal, conforme se verifica da requisição de f. 136.

                A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101), em vigor desde maio de 2000, estabeleceu os novos parâmetros a serem seguidos relativos aos gastos públicos de cada ente federativo, promovendo a transparência na Administração. Dessa forma, foi necessária a contratação de consultoria especializada em finanças públicas para conduzir a implementação de novas práticas, atendendo às metas fiscais.

                Em que pese a independência e autonomia entre as instâncias administrativa, civil e criminal, cumpre ressaltar a absolvição dos réus, pelo juízo criminal, nos autos da ação nº 0056.09.215463-4, tendo a colenda Primeira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, em recente julgamento, reconhecido a singularidade do serviço prestado, bem como a notória especialização da empresa ...:

                A sua notória especialização restou amplamente demonstrada nos autos pelos documentos de fls. 146/166, 174/177 e 777/952.

                Resta saber se o serviço ofertado é de natureza singular. Nesse sentido, argumenta o Parquet que o serviço prestado pela empresa ao poder público (auditoria, assessoria e consultoria nas áreas de contabilidade, orçamento e licitações) é despido de excepcionalidade e de singularidade e poderia ter sido realizado por qualquer outro profissional da área.

                Com a devida vênia, entendo que o órgão ministerial não conseguiu demonstrar a ausência de singularidade no serviço prestado, o que impõe a manutenção da absolvição. Explico.

                (...)

                Na espécie, entendo que o serviço prestado é sim singular, pois ele não se limitou a qualquer simples auditoria, assessoria e consultoria nas áreas de contabilidade, orçamento e licitações. Ao contrário. A contratação tinha como finalidade adequar a autarquia (DEMASP) à nova Lei de Responsabilidade Fiscal, conforme a requisição de fl. 131 e a ratificação de inexigibilidade de licitação de fl. 190.

                Em razão da novidade da lei de responsabilidade fiscal, o objeto do contrato caracteriza situação anômala e peculiar, pois demanda do profissional conhecimento interdisciplinar e em matéria cujas jurisprudência e doutrina ainda não haviam se consolidado. Além disso, é possível extrair que as consultorias e as auditorias realizadas ensejariam a adequação dos contratos utilizados pela autarquia à nova lei, os quais serviriam de paradigma para contratos futuros, bem como para novas práticas de governança. Logo, a complexidade do caso impede a obtenção de solução satisfatória a partir da contratação de qualquer empresa para a realização dos serviços. (Apelação Criminal 1.0056.09.215463-4/001, Relator(a): Des.(a) Flávio Leite, 1ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 31.05.2016, publicação da súmula em 10.06.2016).

                Ademais, o ilustre representante do Ministério Público não conseguiu demonstrar que prorrogações do contrato causaram prejuízo para municipalidade, mormente considerando a profunda mudança trazida pela nova legislação, que passou a obrigar que as finanças fossem apresentadas detalhadamente ao Tribunal de Contas, sob pena de gerar graves consequências para o gestor público.

                Demonstrada a necessidade de reorganização da rotina contábil da DEMASP, entendo que o serviço prestado era sim de natureza singular, enquadrando-se na hipótese de inviabilidade de competição.

                Também não constato prova de que houve conluio entre os réus no processo licitatório, valendo anotar que o próprio apelante requereu o julgamento antecipado da lide (f. 1649), assumindo, assim, por ocasião da entrega da tutela jurisdicional, o ônus da prova não produzida no curso do devido processo legal.

                Outrossim, a circunstância de ter ocorrido pagamento das despesas com auditoria, assessoria e consultoria, de caráter administrativo, com os recursos federais destinados à execução de ações e serviços de saúde não caracteriza, por si só, a prática de ato de improbidade, não havendo nos autos prova de que o Município de Barbacena tenha sofrido prejuízo patrimonial ou a empresa requerida tenha obtido proveito ilícito com a contratação sem o prévio procedimento licitatório, visto que houve a devida prestação dos serviços para o Poder Público.

                Embora qualquer violação aos princípios da Administração Pública contidos no 'caput' do artigo 37, da Constituição da República possa constituir ato de improbidade administrativa, há que se perquirir, entretanto, a intenção do agente, para verificar se houve dolo ou culpa, pois, do contrário, não ocorrerá o ilícito previsto na lei.

                A doutrina (MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, in, (Direito Administrativo, 18ª ed., editora Atlas, pp. 726/728) e a jurisprudência (REsp. nº 827.445/SP, Rel. p/ acórdão Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, j. 02.02.2010) tem se manifestado no sentido da imprescindibilidade da comprovação dos elementos subjetivos para que se repute uma conduta como ímproba, sendo que para a configuração dos atos de improbidade que tipificados nos artigos 9º e 11, da LIA é necessária a presença do elemento subjetivo doloso, ainda que genérico, pressuposto inocorrente no presente caso.

                Com efeito, é preciso verificar se existe indício de má-fé que revele a presença de um comportamento desonesto do agente público, pois não basta a prática de um ato ilegal, tendo em vista que, se for inconsistente, não será passível de reparação.

                Significa dizer que se não houver lesão, ou se esta não restar demonstrada, o agente não poderá ser condenado a ressarcir os cofres públicos.

                Enquanto a boa-fé se presume, em um Estado Democrático de Direito (artigo 5º, LVII, da CRFB - princípio da presunção de inocência), a má-fé deve ser comprovada, o que não ocorreu nos presentes autos.

                Tendo em vista que não restou comprovada a ocorrência de prejuízo ao erário municipal e que os serviços contratados foram efetivamente prestados por preços de mercado, aliado ao fato de que a auditoria, consultoria e assessoria contábil tinha natureza singular, não há de se falar em ato ímprobo, por isso a confirmação da sentença de improcedência do pedido é medida que se impõe.

                Por fim, destaco que inexiste cerceamento de defesa ante o indeferimento da prova testemunhal e documental requerida pelos réus se os fatos relevantes à solução do conflito se encontram suficientemente comprovados por meio de documentos anexados aos autos, sobretudo quando o julgamento é pela improcedência do pedido inicial.

                NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

                Isento de custas recursais, na forma da lei.

                DESA. SANDRA FONSECA - De acordo com o Relator.

                DESA. YEDA ATHIAS - De acordo com o Relator.

 

Súmula - "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."

 

 

BOCO9400---WIN/INTER

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