ATOS
VINCULADOS - MEF34929 - BEAP
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LAURITO MARQUES DE OLIVEIRA *
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MÉRITO ADMINISTRATIVO
Nos atos denominados vinculados, aqueles onde a
liberdade de atuação do administrador é rigorosamente restrita ao expressamente
previsto na lei, todos os elementos encontram-se minuciosamente estipulados no
texto legal e devem ser estritamente observados pelo administrador.
Já nos atos discricionários, assim entendidos aqueles
nos quais a lei confere certa margem de liberdade à atuação do administrador,
possibilitando-lhe decidir sobre a oportunidade e a conveniência da prática do
ato, por meio da escolha de seu objeto e valoração de seus motivos, nem todos
os requisitos de validade são estritamente vinculados.
Nos atos discricionários, vinculam-se,
invariavelmente, à expressa previsão da lei, (1) a competência (qualquer que
seja a espécie do ato, somente poderá ser validamente praticado por aquele a
quem a lei confira tal atribuição), (2) a forma (uma vez prevista em lei,
também deve ser estritamente observada pelo administrador, sob pena de ter-se
declarada a nulidade do ato) e (3) a finalidade (esta, por óbvio, jamais
discricionária, já que a finalidade de qualquer ato sempre será o interesse
público). De outra parte, os requisitos motivo e objeto, como já visto, admitem
a valoração e escolha do administrador, quando da prática de atos desta
espécie.
Esses dois últimos requisitos - motivos e objeto -,
especificamente considerados quanto aos atos administrativos discricionários,
formam o núcleo que costuma ser denominado pela doutrina de mérito
administrativo.
O mérito administrativo consiste, em poucas palavras,
no poder conferido pela lei ao administrador para que ele, nos atos
discricionários, decida sobre a oportunidade e conveniência de sua prática.
Assim, enquanto em um ato vinculado a atuação do
administrador é bastante limitada pela exaustiva descrição legal do todos os
seus elementos, nos discricionários, os requisitos motivo e objeto, formadores
do mérito administrativo, podem ser determinados pelo administrador com
relativa liberdade, dentro dos limites mais ou menos amplos estabelecidos na lei,
justificando a prática ou não do ato e a escolha de seu conteúdo.
No dizer de Hely Lopes
Meirelles, o mérito administrativo consubstancia-se “na valoração dos motivos e
na escolha do objeto do ato, feitas pela Administração incumbida de sua
prática, quando autorizada a decidir sobre a conveniência, oportunidade e
justiça do ato a realizar”.
Justifica-se facilmente essa necessidade de, em
certas circunstâncias, conferir a lei ao administrador o poder de decidir sobre
a oportunidade e conveniência da prática do ato administrativo: só ele,
administrador, estando ali, vivenciando a situação concreta e conhecendo os
meandros da atividade administrativa, tem condições de aferir tais elementos.
Esse é o motivo pelo qual não se admite a aferição do
mérito administrativo pelo Poder Judiciário. Não faria sentido o juiz, órgão
voltado à atividade jurisdicional, muitas vezes distante da realidade e
necessidade administrativas, substituir, pela sua, a ótica do administrador,
que vive aquela realidade no seu dia a dia. Significa que, se fosse dado ao
juiz decidir sobre a legitimidade da valoração de oportunidade e conveniência
realizada pelo administrador na prática de atos discricionários de sua
competência, estaria esse mesmo juiz substituindo o administrador no exercício
dessa atividade valorativa, vale dizer, substituindo o juízo de valor do
administrador, mais afeito às coisas da Administração, pelo seu próprio juízo
valorativo, evidentemente distanciado deste cotidiano.
Para finalizar, registramos o aspecto talvez mais
cobrado em concursos sobre esse tópico: não se deve confundir a vedação de que
o Judiciário aprecie o mérito administrativo com a possibilidade de aferição
pelo mesmo Poder Judiciário da legalidade dos atos discricionários. São coisas
completamente distintas.
Senão, vejamos: o que o Judiciário não pode é
invalidar, devido ao acima explicado, a escolha pelo administrador (resultado
de sua valoração de oportunidade e conveniência administrativas) dos elementos
motivo e objeto desses atos, que formam o chamado mérito administrativo, desde
que feita essa escolha dentro dos limites da lei. Ora, no ato administrativo
discricionário, além desses dois, temos outros três elementos não vinculados
(competência, finalidade e forma) e, por conseguinte, podem, e devem, ser
aferidos pelo Poder Judiciário quanto à sua legalidade. Vale repisar: o ato
discricionário, como qualquer outro ato administrativo, está sujeito à
apreciação judicial; apenas em relação a dois de seus elementos - motivo e
objeto - não há, em princípio, essa possibilidade.
TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES
A motivação (declarar, por escrito, o motivo que
ensejou a prática do ato), como regra, é elemento obrigatório dos atos
administrativos. A teoria administrativa tradicional entendia presente essa
obrigatoriedade apenas nos atos vinculados, afirmando ser ela prescindível nos
atos ditos discricionários. Diferentemente dessa posição ortodoxa, a doutrina e
a jurisprudência atuais, em face da evolução do Estado democrático de direito e
dos princípios, entre outros, da ampla defesa e do contraditório, da isonomia,
da publicidade e da moralidade, têm realçado a obrigatoriedade de motivação
expressa também dos atos administrativos discricionários, como regra geral.
Logo, atualmente, podemos afirmar que, devido aos
princípios acima enumerados, a regra geral para qualquer ato administrativo é a
declaração por escrito dos motivos que justificaram sua prática, regra essa que
não encontra nenhuma exceção relativamente aos atos vinculados. No tocante aos
atos discricionários, somente muito excepcionalmente pode ser dispensada sua
motivação escrita e a tendência é de que mesmo essas hipóteses excepcionais
acabem por desaparecer de nosso ordenamento.
Tanto é assim que, hoje, é difícil encontrarmos
exemplos de atos em que a Administração esteja dispensada de motivar a sua
prática. O exemplo mais tradicionalmente citado é a nomeação e a exoneração ad nutum de servidor ocupante de cargo comissionado. Com
efeito, para tais atos de nomeação e exoneração, fica a Administração
dispensada da motivação expressa. Não significa isso que não existia o motivo,
o qual é requisito indispensável para a validade para qualquer ato e é a causa
justificadora de sua prática, mas sim que, nestes casos, excepcionalmente, fica
o administrador dispensado de declarar expressamente esse motivo.
Exatamente nesses raros casos em que a lei permite
sejam praticados atos sem motivo declarado é que ganha importância a denominada
Teoria dos Motivos Determinantes.
Segundo a Teoria dos Motivos Determinantes, quando a
Administração declara o motivo que determinou a prática de um ato
discricionário que, em princípio, prescindiria de motivação expressa, fica
vinculada à existência do motivo por ela, Administração, declarado. Esse motivo
indicado, entendido como justificativa da realização do ato, deve existir e ser
legítimo. Havendo desconformidade entre a realidade e o motivo declarado ou não
sendo ele causa justificável, torna-se possível a declaração da invalidade do
ato pelo Poder Judiciário. O ato nessas condições é nulo.
Exemplificando: conforme comentamos antes, a
nomeação/exoneração do comissionado independe de motivação declarada. O
administrador pode, assim, nomear e exonerar sem estar obrigado a apresentar
qualquer motivação; no entanto, caso ele decida por motivar seu ato, ficará
vinculado à existência e validade do motivo exposto. Analisemos o caso da
exoneração do servidor: a autoridade competente pode exonerá-lo livremente, sem
dar qualquer justificativa a ninguém; agora, se ele exonera e afirma no ato de
exoneração que o está fazendo porque o servidor, por exemplo, é inassíduo, é possível ao servidor contestar este motivo
perante o Judiciário, comprovando, se for o caso, sua inexistência. Assim, se o
servidor não possuía nenhuma falta nem atrasos ao serviço durante o período em
que esteve comissionado, clara ficaria a inexistência do motivo declarado como
determinante do ato de exoneração. Esse ato, portanto, seria inválido e esta
nulidade poderia ser declarada ou pela própria Administração ou pelo Poder
Judiciário.
É oportuno ainda esclarecermos o seguinte: dissemos
que a declaração do motivo que levou a Administração a praticar um ato
discricionário vincula a Administração à existência e legitimidade desse
motivo, mesmo que para a prática daquele ato não fosse inicialmente exigida a
motivação expressa. Isso não significa que, ao declarar o motivo determinante
da prática de um ato discricionário a Administração converta-o em ato
vinculado. De forma alguma. O ato continua sendo ato discricionário em sua
origem, o que significa que houve a liberdade do administrador na decisão
quanto à oportunidade e conveniência da prática do ato. O que ocorre é que, uma
vez feita essa decisão discricionária, o administrador resolveu declarar os
motivos que determinaram a valoração por ele realizada conforme permitido pela
lei. A declaração desse motivo, após o exercício da atividade discricionária da
qual resultou a prática do ato, vincula a Administração à existência e
legitimidade desse motivo declarado, conforme exemplificado acima, o que não
significa transformar o ato em ato vinculado.
DESFAZIMENTO DO ATO ADMINISTRATIVO
O ato administrativo em vigor permanecerá no mundo
jurídico até que algo capaz de alterar esta situação lhe aconteça. Uma vez
publicado, esteja eivado de vícios ou não, terá vigência e deverá ser cumprido,
em respeito ao atributo da presunção de legitimidade, até que ocorra
formalmente o seu desfazimento do ato administrativo, que poderá ser
resultante do reconhecimento de sua
ilegitimidade, de vícios na sua formação, ou poderá simplesmente advir da
desnecessidade de sua existência, isto é, mesmo legítimo o ato pode tornar-se
desnecessário e pode ser declarada inoportuna ou inconveniente a sua
manutenção.
Dessa distinção surge a noção de revogação e
anulação, espécies do gênero desfazimento do ato administrativo.
A anulação corre nos casos em que existe ilegalidade
no ato administrativo, e, por isso, pode ser feita pela própria Administração
(controle interno) ou pelo Poder Judiciário.
A anulação do ato, uma vez que este ofende a lei ou
princípios administrativos, opera efeitos retroativos, ex tunc, isto é, retroage à origem do ato, desfazendo as
relações dele resultantes. O ato nulo não gera direitos ou obrigações para as
partes, não cria situações jurídicas definitivas e não admite convalidação (a
doutrina ortodoxa não admite a existência de atos administrativos anuláveis, os
quais seriam passíveis de saneamento).
Essa regra - o ato nulo não gera efeitos -, porém, há
que ser excepcionada para com os terceiros de boa-fé que tenham sido atingidos
pelos efeitos do ato anulado. Em relação a esses, em face da presunção de
legitimidade que norteia toda a atividade administrativa, devem ser amparados
os direitos nascidos na vigência do ato posteriormente anulado. É o caso, p.
ex, do servidor que é ilegitimamente nomeado para um cargo público.
Anulada a sua nomeação, deverá ele, em princípio,
repor todos os vencimentos percebidos ilegalmente, mas, em amparo aos terceiros
de boa-fé, permanecerão válidos todos os atos por ele praticados no desempenho
(ilegítimo) de suas atribuições funcionais.
A revogação resulta de atos válidos, legítimos,
perfeitos, mas que tornaram-se inconvenientes, inoportunos, desnecessários. Na
lição do professor Hely Lopes Meirelles, “revogação é
a supressão de um ato administrativo legítimo e eficaz, realizada pela
Administração - e somente por ela - por não mais lhe convir sua existência”.
Entende a Administração que o ato tornou-se inconveniente ao interesse público.
A revogação tem por fundamento o poder discricionário, somente pode ser
realizada pela própria Administração e pode, em princípio, alcançar qualquer
ato desta espécie, resguardados, entretanto, os direitos adquiridos. Em todos
os casos, como o ato revogado era um ato perfeito e operante, sua revogação
somente pode produzir efeitos proativos, ex nunc.
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* Contador, Auditor, Diretor da Magnus Auditores e
Consultores Associados, Consultor de BEAP.
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