AÇÃO DE IMPROBIDADE - REPARAÇÃO DE
DANOS AO ERÁRIO MUNICIPAL E APLICAÇÃO DAS PENALIDADES PREVISTAS NA LEI 8.429/92
- CONVÊNIO FIRMADO POR EX-PREFEITO - AÇÃO AJUIZADA PELO MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO,
RELATIVAMENTE A SUPOSTA AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS E MALVERSAÇÃO DE VERBAS
RELATIVAS A RECURSOS OBTIDOS ATRAVÉS DE CONVÊNIO FIRMADO COM O ESTADO -
MEF35273 - BEAP
EMENTA: AÇÃO DE IMPROBIDADE - REPARAÇÃO DE DANOS AO
ERÁRIO MUNICIPAL E APLICAÇÃO DAS PENALIDADES PREVISTAS NA LEI 8.429/92 -
CONVÊNIO FIRMADO POR EX-PREFEITO - AÇÃO AJUIZADA PELO MUNICÍPIO CONTRA
EX-PREFEITO, RELATIVAMENTE A SUPOSTA AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS E
MALVERSAÇÃO DE VERBAS RELATIVAS A RECURSOS OBTIDOS ATRAVÉS DE CONVÊNIO FIRMADO
COM O ESTADO - PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR ILEGITIMIDADE
ATIVA - DEFESA DE INTERESSE PRÓPRIO DO MUNICÍPIO AUTOR - LEGITIMIDADE ATIVA
RECONHECIDA - RECURSO PROVIDO -IMPOSSIBILIDADE DO PROSSEGUIMENTO DO JULGAMENTO
DE MÉRITO - CAUSA NÃO MADURA - INAPLICABILIDADE DO §3º, DO ART. 515, DO CPC -
SENTENÇA ANULADA.
1 - O Município tem legitimidade ativa para propor
ação de ressarcimento, bem como de aplicação das demais penalidades previstas
na Lei 8.429/92, com base em malversação de recursos públicos e ausência de
prestação de contas, mesmo que proveniente de convênio firmado com o Estado.
2 - Não é possível o prosseguimento do julgamento de
mérito, com base no art. 515,§3º, do CPC, quando a causa ainda não se encontra
madura para julgamento, uma vez que não foi encerrada a instrução probatória do
processo, requerida e regularmente deferida pelo Juízo. 3- Recurso provido.
Sentença anulada.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0312.10.000870-4/001 - Comarca
de ...
Apelante(s): Município ...
Apelado(a)(s): ...
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 6º CÂMARA CÍVEL do
Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos
julgamentos, em DAR PROVIMENTO.
DESA. SANDRA FONSECA
Relatora
V O T O
Cuida-se de recurso de apelação, interposto pelo
Município de ..., em face à r. sentença de
fls.327/330, que, nos autos da "ação civil pública por ato de improbidade
administrativa", por ele proposta contra ..., julgou o processo extinto,
sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa, na forma do art. 267, IV, do
CPC, ao fundamento de que o legitimado para pedido de prestação de contas, bem
como o de ressarcimento ao erário, decorrente de suposta malversação de verbas
recebidas através de convênio, é do respectivo ente público convenente, que no
caso é o Estado de Minas Gerais.
Em suas razões de recurso de fls.332/341, o município
apelante alega, em síntese, que é parte legítima para ajuizar ação por atos de
improbidade administrativa de seu ex-gestor, mormente
quando o ente municipal sofre prejuízos orçamentários e financeiros em razão da
ausência de prestação de contas referentes à correta aplicação de verba
recebida em função de convênio estadual.
Sustenta, ainda, que não pretende, tão somente, a
condenação de ressarcimento ao erário, mas, também, das demais penalidades
previstas na Lei 8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa, em razão dos atos
do ex-gestor.
Devidamente intimado, o
apelado não apresentou contra razões, segundo certidão de fls. 345v.
A digna Procuradoria Geral de Justiça, às
fls.350/351/, opinou provimento do recurso.
Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de
admissibilidade.
Compulsando os autos, verifica-se que o Município de
durante o mandato do réu como Prefeito Municipal, firmou com o Estado de Minas
Gerais, os Convênio nº 101/2003 e 294/2004 (fls.51/57 e 34/41,
respectivamente), cujos objetos eram o aporte de recursos para a aquisição de
materiais de consumo e equipamentos e materiais permanentes.
Por força dos mencionados convênios, o Estado
repassou ao Município o valor total de R$ 98.352,11 (noventa e oito mil,
trezentos e cinqüenta e dois reais, e onze centavos).
O digno Juiz sentenciante entendeu pela ilegitimidade
ativa do Município de ..., ao fundamento de que, tratando-se de convênio, o
legitimado para pedido de prestação de contas, bem como o de ressarcimento ao
erário, decorrente de suposta malversação de verbas recebidas através de
convênio, é do respectivo ente público convenente, que, no caso, é o Estado de
Minas Gerais.
A legitimidade constitui requisito essencial para a
composição do litígio. Deve o autor ser o titular do interesse em relação ao
réu, contido na pretensão inicial, legitimando-o ao ajuizamento da ação, como
dispõe o art. 3º do CPC.
Na lição de MOACYR AMARAL SANTOS:
São legitimados para agir, ativa e passivamente, os
titulares dos interesses em conflito; legitimação ativa terá o titular do
interesse afirmado na pretensão; passiva terá o titular do interesse que se
opõe ao afirmado na pretensão. Fala-se então em legitimação ordinária, porque a
reclamada para a generalidade dos casos. (Primeiras Linhas de Direito
Processual Civil, ed. Saraiva, 19ª ed., 1º vol., 1997, p. 171).
Segundo a teoria adotada
pelo moderno Direito Processual brasileiro, o direito de ação é abstrato, e a
relação processual autônoma em relação ao direito material invocado.
Desta forma, para se
aferir corretamente a noção de "legitimidade", mister se faz atentar
para a autonomia da relação processual.
Cabe, portanto, aferir, no caso
concreto, não se o "direito" buscado pelo autor lhe pertence, mas sim
se é titular do interesse que o levou a propor a ação.
No caso dos autos, bem é de ver
que o que se pretende, na verdade, é o ressarcimento, verdadeira indenização,
relativamente aos prejuízos suportados pelo Município diante da ausência de
prestação de contas válidas pelo ex-alcaíde
municipal, ora réu, e a consequente determinação de devolução dos valores
relativos ao convênio, em razão da suposta malversação da verba recebida, da
não consecução do objeto do convênio, bem como aplicação das demais penas
previstas na Lei 8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa (petição inicial,
fls.18), não havendo pedido de ressarcimento de verbas em nome do Estado de
Minas Gerais.
Nesta esteira, o titular da
pretensão é o Município, pelo que assim se afere a sua legitimidade, sendo
certo, por outro lado, que a procedência, ou não, do pedido, em razão do
reconhecimento, ou não, da responsabilidade pelos danos acusados, e a prática
ou não de atos de improbidade administrativa, a atrair as demais penalidade
previstas em lei, é matéria que concerne ao mérito, e não as condições da ação.
Neste sentido, mutatis mutandi, a jurisprudência
desta c. 6ª Câmara Cível, e deste eg. Tribunal:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO AJUIZADA
PELO MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO REFERENTE A RECURSOS OBTIDOS ATRAVÉS DE
CONVÊNIO FIRMADO PELO MUNICÍPIO COM O ESTADO (SECRETARIA DA EDUCAÇÃO) -
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - INOCORRÊNCIA-MUNICÍPIO - LEGITIMIDADE
ATIVA. Para que o pedido seja considerado juridicamente possível, faz-se mister
que exista abstratamente dentro do ordenamento jurídico ou por este não seja
proibido. O município possui legitimidade ativa 'ad causam' para propor, contra
o seu ex-Prefeito, ação de ressarcimento devido a
suposta malversação de recursos públicos, ainda que proveniente de convênio
firmado com o Estado. (AC nº 1.0086.03.001034-1/001, Rel. Des. EDILSON
FERNANDES, j. 09/08/2005).
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO DER N° 30.099/06.
AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. EX-PREFEITO MUNICIPAL. LEGITIMIDADE PASSIVA
CONFIGURADA. RECEBIMENTO DA INICIAL. INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E
MATERIALIDADE. ART. 17, §8º, DA LEI Nº 8.429/92. RECURSO NÃO PROVIDO. O
recorrente, representante legal do Município de Douradoquara
à época dos fatos narrados na ação civil pública que visa ao reconhecimento da
prática de ato de improbidade administrativa decorrente da ausência de
prestação de contas relativas aos recursos recebidos por meio do Convênio DER
nº 30.099/06, tem legitimidade para figurar no pólo
passivo da demanda. Na hipótese em que se constatar a relevância do pedido com
base em fundados indícios suficientes da prática de ato de improbidade
administrativa, deve a petição inicial ser recebida a fim de os fatos serem
melhor examinados após ampla instrução processual, tendo em vista a supremacia
do interesse público de que reveste a demanda. (AI Cv 1.0431.13.001189-0/001,
Rel. Des. EDILSON FERNANDES, j. 03/12/2013. AÇÃO
DE INDENIZAÇÃO - DANOS CAUSADOS AO ERÁRIO - MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO -
CONDIÇÕES DA AÇÃO - PRESENÇA. Desde que a ação e pretensão se embasam em
alegado prejuízo que estaria sofrendo o Município em decorrência de ato
imputável ao Réu, seu ex-Prefeito, a princípio e em
tese, legítimas são as partes, pois, se há ou não efetivamente o dano e se o
réu é ou não o responsável pela sua ocorrência, tal é matéria de mérito, que
extrapola o exame restrito da preliminar de legitimidade do Município para
pleitear o ressarcimento daquele que aponta como o causador do dano, seu ex-gestor e, portanto, parte legítima passiva para estar na
lide. (...) (AC nº 1.0487.02.000360-3/001, Rel. Des. GERALDO AUGUSTO, j.
15.03.2005, DJ: 08.04.2005).
MUNICÍPIO - CONVÊNIO COM O
ESTADO - RECEBIMENTO DE RECURSOS, SEM POSTERIOR PRESTAÇÃO DE CONTAS - AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO PROPOSTA CONTRA EX - PREFEITO - INICIAL INDEFERIDA,
POR ILEGITIMIDADE ATIVA DO MUNICÍPIO - SENTENÇA CASSADA - PROSSEGUIMENTO DO
FEITO.
I - Possui legitimidade ativa ad
causam o Município para pleitear de ex-Prefeito,
judicialmente, ressarcimento de recursos repassados pelo Estado e que não foram
objeto de prestação de contas, quando, de tal fato, tenha decorrido a suspensão
de repasses de recursos financeiros pelo Estado.
II - O fato de os recursos
transferidos por força de convênio serem originários do Estado não exclui a
legitimidade ativa do Município. (AC nº 1.000.262.784-2/000, Rel. Des. BRANDÃO
TEIXEIRA, j 05.11.2002).
Desta forma, é de rigor o
reconhecimento da legitimidade ativa do Município de ..., para a propositura da
presente ação, sob pena de ser negado ao ente municipal os constitucionais
direitos à ação e acesso à Justiça, devendo ser a respeitável sentença anulada.
Ressalte-se que, no caso dos
autos, não é possível o prosseguimento do julgamento do mérito, na forma do
art. 515, §3º, do CPC, uma vez que a causa não se encontra madura para
julgamento, não tendo sido encerrada a fase de instrução probatória,
verificando-se que já havia sido deferida audiência de instrução e julgamento,
para a oitiva de testemunhas, conforme requerido pelo Ministério Público
(fls.318/322).
Com estes fundamentos, portanto, DOU PROVIMENTO AO
RECURSO, PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando o retorno dos autos à Comarca de
origem, para o regular prosseguimento do processo, sob a presidência do digno
Juízo de primeiro grau. Custas a final.
É como voto.
DES. RONALDO CLARET DE MORAES (JUIZ CONVOCADO)
(REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
DESA. YEDA ATHIAS - De acordo com o(a) Relator(a).
Súmula - "DERAM PROVIMENTO."
BOCO9459---WIN/INTER
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