DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - LEI Nº 9.029/95 - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF35834 - LT

 

 

PROCESSO TRT/RO Nº 0010072-27.2015.5.03.0094

 

Recorrentes :

(1) Liderança Limpeza e Conservação Ltda.

(2) Caixa Econômica Federal

(3) Neide Aparecida de Souza Gregório

Recorridos   :

Os Mesmos e Universo Serviços s Assessoria Empresarial Ltda.

Relatora      :

Cristiana Maria Valadares Fenelon

 

E M E N T A

 

                DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. LEI N. 9.029/95. A dispensa no momento em que o trabalhador está em situação de vulnerabilidade diante de enfermidades não plenamente contidas evidencia discriminação. A dispensa imotivada constitui ato potestativo do empregador, prescindindo de justificativa, mas não traduz um direito absoluto capaz de garantir o exercício dessa forma de desligamento com ofensa aos demais bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. O art. 1° da Lei n° 9.029/95 há de ser interpretado sob a luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho inscritos no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, bem como em conformidade com o princípio da não discriminação previsto no art. 3º, IV, da Lei Maior e na Convenção 111 da OIT. Considera-se, desse modo, que o rol das causas de discriminação inserido no dispositivo é meramente exemplificativo. Há de se ter em vista que o fim primordial das disposições constitucionais que vedam a discriminação é resguardar os cidadãos de qualquer exclusão de direitos fundada em critérios ilegítimos.

 

R E L A T Ó R I O

                Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrentes, LIDERANÇA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO LTDA., CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e NEIDE APARECIDA DE SOUZA GREGÓRIO, e, como recorridos, OS MESMOS e UNIVERSO SERVIÇOS E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA.

                O Exmo. Juiz Orlando Tadeu de Alcântara, da Vara do Trabalho de Sabará, em sentença (id 166b16b), julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por NEIDE APARECIDA DE SOUZA GREGÓRIO em face da LIDERANÇA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO LTDA. e da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e extinguiu o processo, com resolução do mérito, na forma do artigo 487, II, do NCPC, em relação à UNIVERSO SERVIÇOS E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA.

                A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) recorre (id 4cfa10f), insurgindo-se contra a condenação ao pagamento das horas extras por labor aos sábados, domingos e feriados, além da multa normativa.

                A 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) recorre (id 4550e1e), irresignada com a responsabilidade subsidiária.

                A reclamante recorre na forma adesiva (id d489420), suscitando preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de prova, e, no mérito, insiste no pedido de reconhecimento da dispensa discriminatória e a pagamento do adicional de insalubridade

                Contrarrazões pelas autora e 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) - id db32020 e d9686b9.

                Devidamente intimadas (id 56e4678 e 67d2045), as 1ª (Universo Serviços e Assessoria Empresarial Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas não apresentaram contrarrazões.

                Dispensado o parecer da d. Procuradoria do Trabalho porque não evidenciadas as situações aludidas no artigo 82, I, do Regimento Interno deste Tribunal.

                É o relatório.

 

                FUNDAMENTAÇÃO

                ADMISSIBILIDADE

                Conheço dos recursos ordinários porque apropriados, tempestivos e firmados por procuradores regularmente constituídos (id a11e25d, 2b4394a e 33b37aa). As guias (id f75d489, p. 1-4, 2509973 e 588eaa1) comprovam o preparo.

                Não prospera a alegação da 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.), articulada em sede de contrarrazões (id d9686b9, p. 3), no sentido de que os demais recorrentes não atenderam ao princípio da dialeticidade. As razões recursais apresentam incisiva impugnação aos fundamentos da decisão, com aptidão para, em tese, desconstituir o julgado.

                A exigência da dialeticidade do recurso ordinário há de ser interpretada à luz do artigo 899, "caput", da CLT, que enuncia serem os recursos "(...)interpostos por simples petição (...)".

 

                PRELIMINAR

                CERCEAMENTO DE PROVA

                A reclamante suscita preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de prova caracterizado pelo indeferimento de perguntas durante a inquirição do preposto e da testemunhas acerca da quantidade de pessoas que circulavam na agência bancária, dado relevante para a constatação da insalubridade decorrente da higienização das instalações sanitárias de uso público ou coletivo.

                O tema foi devidamente esclarecido pela prova oral, com realce da utilização do banheiro pelo público, sendo destacado que adentravam cerca de 200 pessoas na agência, por dia. O preposto da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) confessou que o banheiro era utilizado pelos clientes (id 9ea8f22, p. 2).

                Insta ressaltar que o Juiz é o destinatário das provas e, no controle da instrução, deve indeferir as que considerar inúteis ou protelatórias.

 

                Rejeito.

 

 

 

 

 

                MÉRITO

                RECURSO DA 2ª RECLAMADA (LIDERANÇA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO LTDA.)

                HORAS EXTRAS

                O Juízo singular deferiu o pagamento de metade do montante devido pelo labor aos sábados, domingos e feriados, por demonstrado, pela prova oral, a atividade típica de limpeza da agência em tais dias, tendo a autor ressaltado o pagamento extrafolha, em montante inferior ao devido.

                A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) refuta o labor aos sábados, domingos e feriados em dias não efetivamente registrados. Subsidiariamente, requer a exclusão do pagamento nos dias de afastamentos e férias.

                É certo que os cartões de ponto com marcações predominantemente variáveis e sem vícios aparentes apresentam (id 9eda318), em tese, aptidão para infirmarem as alegações da inicial. Devem, contudo, ser contrastados com os demais elementos de convicção.

                Os cartões de ponto consignam constante labor aos sábados, domingos e feriados até dezembro/2011 (id 9eda318, p. 7). Em relação ao período posterior, o registro de contínuas folgas em tais dias foi infirmado pela prova oral.

                A testemunha Karine Gonçalves Amaro "não viu a reclamante trabalhando aos sábados e domingos na limpeza da agência, porém sabe que tais tarefas são típicas da pessoa que trabalha na limpeza; que durante todo o período que a reclamante trabalhou a depoente trabalhou na agência" (id 9ea8f22, p. 2). As declarações revelam a continuidade da frequência inicialmente registrada nos cartões de ponto, referentes a labor em dias de não funcionamento da agência. As declarações prevalecem pela contemporaneidade da testemunha, além de evidenciar uma forma operacional que foi, inclusive, registrada até dezembro/2011, além de ser plenamente viável e otimizada a prestação de serviços de limpeza durante os períodos em que não há expediente para os bancários e atendimentos externos.

                As declarações da testemunha são hábeis a desconstituir os cartões de ponto, nesse aspecto, pois o próprio preposto da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) ignora a questão controvertida: "não sabe dizer se quem trabalhava nos finais de semana, havia ou não necessidade de identificação" (id 9ea8f22, p. 2).

                No que se refere à exclusão de dias de afastamentos, a sentença já determina o decote.

                Mantenho.

 

                MULTA NORMATIVA

                O Juízo singular deferiu o pagamento de uma multa convencional por infração cometida e instrumento coletivo violado.

                A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) refuta a violação a qualquer cláusula convencional.

                Houve descumprimento das normas coletivas sobre o pagamento por labor em dias de repouso ou feriados, além da contratação de seguro de vida (id a72f360, p. 3 e 5, cláusulas décima, parágrafo único, e décima quinta), conforme especificado na inicial (id b8ca83e, p. 15), sendo, portanto, devida a respectiva multa convencional (id a72f360, p. 15, cláusula sexagésima terceira).

                Mantenho.

 

                RECURSO DA 3ª RECLAMADA (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL)

                RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

                O Juízo de origem reconheceu a responsabilidade subsidiária da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal), por ser beneficiária dos serviços, sem comprovação de efetiva fiscalização da empresa interposta.

                A 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) argumenta que o artigo 71 da Lei 8.666/93 veda a responsabilização da Administração Pública pelo inadimplemento. Alega que incumbia à recorrida demonstrar a culpa da Administração na escolha da empresa contratada ou mesmo a falha ou falta de fiscalização. Ressalta que a responsabilidade subsidiária não alcança multas e direitos concedidos por convenções coletivas. Subsidiariamente, requer a redução para apenas uma multa por convenção coletiva desrespeitada, assim como a limitação disposta no artigo 412 do Código Civil.

                A recorrente celebrou contrato de prestação de serviços de limpeza, jardinagem e controle biológico de pragas com a 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) - id 1999287, sendo a autora destacada para atuar no âmbito da tomadora. A testemunha Karine Gonçalves Amaro afirma "que trabalhou como terceirizada da Caixa de 2006 a 2015 (...) que durante todo o período que a reclamante trabalhou a depoente trabalhou na agência", salientando, inclusive, "que havia um banheiro dentro da agência utilizado pelos clientes, o qual também era limpo pela reclamante" (id 9ea8f22, p. 2).

                Configurada a terceirização de serviços, é irrelevante a discussão acerca da inexistência de vínculo empregatício com a tomadora. Competia à 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) fiscalizar, zelosamente, o cumprimento dos encargos assumidos pela 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.). Mesmo que se admita que ela diligenciou na escolha da empresa prestadora dos serviços, certo é que assim não procedeu quanto à fiscalização do cumprimento dos encargos trabalhistas pela empresa contratada. Logo, deve responder pelo prejuízo ocasionado ao trabalhador, por sua culpa in vigilando.

                O art. 71, §1º, da Lei 8.666/93 não socorre a demandada. Tal norma, ao resguardar os interesses do Poder Público, excluindo a sua responsabilidade pelos encargos trabalhistas na hipótese de inadimplência da empresa fornecedora regularmente contratada, subverte toda a teoria da responsabilidade civil e atenta contra a Constituição da República.

                Ora, admitir-se tal isenção implicaria conceder à Administração Pública, que se beneficiou da atividade do empregado, um privilégio injustificável em detrimento da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho, que constituem fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III e IV, da Constituição da República).

                O entendimento adotado não implica a declaração de inconstitucionalidade do referido dispositivo legal. Apenas imprime-lhe interpretação, de modo que não há ofensa à Súmula Vinculante 10 do STF.

                É bem verdade que a responsabilidade subsidiária do ente público não decorre do mero inadimplemento do empregador, impondo-se verificar, em cada caso, se houve ação ou omissão da Administração capaz de provocar lesão ao patrimônio do trabalhador.

                Trata-se de hipótese de responsabilidade civil extracontratual e subjetiva, que resulta de ato ilícito ou abuso de direito, na forma prevista pelos artigos 186 e 187 do Código Civil. No caso, porém, resta patente a omissão da tomadora no acompanhamento do cumprimento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa contratada, dada a inadimplência de direitos mínimos que seriam facilmente identificados por fiscalização efetiva.

                Não há, pois, como absolver a tomadora dos serviços da responsabilidade que lhe foi imputada, ressaltando-se que não foi reconhecido o vínculo empregatício com a mesma e, portanto, não há violação do disposto no art. 37, II, da CF ou contrariedade à Súmula 331, III, do TST.

                De acordo com o item VI da Súmula 331 do TST, o responsável subsidiário deve arcar com o pagamento de todas as parcelas que sejam inicialmente de responsabilidade do devedor principal, sem qualquer exceção, estando, portanto, incluídas as verbas trabalhistas e rescisórias, horas extras e multas previstas nos artigos 467 e 477, § 8º, da CLT. É que sua posição assemelha-se à do fiador ou do avalista, de modo que, não se verificando o adimplemento da obrigação pelo devedor principal, incide automaticamente a responsabilidade daquele que figura na relação jurídica basicamente para garantir a integral satisfação do credor (Súmula 331, VI, do TST).

                Em relação à multa convencional, a convenção coletiva comina a penalidade " para cada cláusula violada". No que se refere à limitação disposta no artigo 412 do Código Civil, há expressa previsão na norma coletiva no sentido de que a multa é limitada ao valor do principal (id a72f360, p. 15, cláusula sexagésima terceira), tendo a sentença determinado a apuração conforme previsto no instrumento coletivo violado.

                Nada a prover.

 

                RECURSO DA RECLAMANTE

                DISPENSA DISCRIMINATÓRIA

                O Juízo singular não reconheceu qualquer prática discriminatória na dispensa imotivada no momento em que a autora apresentava 90% da capacidade laboral, em razão de acidente automobilístico sem relação com o trabalho. Ressaltou que a obreira estava liberada pelo INSS para o retorno ao trabalho e foi aprovada em exame médico demissional.

                A autora afirma que não estava apta a ser dispensada, devido a limitações médicas no momento do rompimento contratual.

                A reclamante foi admitida pela 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) no dia 01.06.2011 para a função de servente, sendo dispensada sem justa causa no dia 05.04.2013 (id 6f79427, p. 5, b747f40 e f8805ff). A notificação do aviso prévio (id e70df5b) ocorreu logo após o término do auxílio doença concedido até 31.03.2013 (id 6602d46).

                O afastamento desde outubro/2012 (id 6602d46, p. 2 e 74f223f) foi necessário para a recuperação de enfermidades causadas por acidente automobilístico, conforme prontuário médico (id 1f185a0, p. 1-5). O acidente não tem relação com o trabalho. A autora relata, em perícia, que "no dia 07.09.2012 (feriado), por volta das 14 horas, estava indo para a igreja juntamente com a sua filha quando foram atropelados por um veículo (carro)" (id 9595ce0, p. 5).

                O exame de corpo de delito descreve a ocorrência de "atropelamento por automóvel em 07.09.2012 com consequente fratura no tornozelo esquerdo, joelho esquerdo (trinca) e fratura parcial de um dente e bambeamento de um dente (...) discreta redução da amplitude de movimentos do joelho esquerdo para flexão" (id 178c5f2).

                Embora atestada a aptidão física em exame demissional (id 09ba609, p. 2), a perícia médica constata movimentos diminuídos em grau leve no tornozelo esquerdo (id 9595ce0, p. 6) e realça "que após tratamentos especializados (conservadores e cirúrgicos) não recuperou plenamente a sua saúde (como um todo), permanecendo sequelas definitivas, com dor crônica e limitação funcional do tornozelo esquerdo (...). De acordo com o quadro clínico e dados levantados, arbitra a incapacidade física e laborativa em 10% (dez por cento), restando a ela, dessa maneira, 90% (noventa por cento) de capacidade para exercer atividades sociais e ocupacionais compatíveis com sua saúde e condição física" (id 9595ce0, p. 12).

                O perito esclarece que "o fator de não ser encaminhada para a reabilitação profissional não significa ausência de doença e muito menos ausência de incapacidade para o trabalho" (id 9595ce0, p. 11).

                A cessação do benefício previdenciário não significa plena aptidão laboral, vez que a obreira com incapacidade parcial também pode retornar ao trabalho, com adequação das condições do local em que executa as atividades. A ré, contudo, não oportunizou sequer um dia de trabalho após o término do benefício previdenciário, optando pela imediata dispensa injusta.

                A dispensa quando a autora estava parcialmente incapacitada e em situação de vulnerabilidade diante de enfermidades não plenamente contidas evidencia discriminação. A dispensa imotivada constitui ato potestativo do empregador, prescindindo de justificativa, mas não traduz um direito absoluto capaz de garantir o exercício dessa forma de desligamento com ofensa aos demais bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. O art. 1° da Lei n° 9.029/95 há de ser interpretado sob a luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho inscritos no art. 1º, III e IV, da Constituição, bem como em conformidade com o princípio da não discriminação previsto no art. 3º, IV, da Lei Maior e na Convenção 111 da OIT. Considera-se, desse modo, que o rol das causas de discriminação inserido no dispositivo é meramente exemplificativo. Há de se ter em vista que o fim primordial das disposições constitucionais que vedam a discriminação é resguardar os cidadãos de qualquer exclusão de direitos fundada em critérios ilegítimos.

                Assim, constatada a ilegalidade da dispensa, a autora teria direito à reintegração ao emprego, com adequação das condições de labor, a fim de afastar as adversidades à saúde e realizar exame médicos períodos com sucessivas renovações dos mecanismos de segurança e prevenção à higidez física da trabalhadora. A autora, contudo, requer somente o pagamento dos salários do período de afastamento até o trânsito em julgado da decisão, em dobro, certamente por estar trabalhando, conforme relatado em perícia (id 9595ce0, p. 5).

                No entanto, o pedido de pagamento do salário de todo o período de afastamento até o trânsito em julgado da decisão é desproporcional ao dano, não apenas pelo desinteresse de imediata reintegração, mas também pelo longo decurso do tempo, considerada a dispensa no dia 05.04.2013 situação que ensejaria reparação superior ao triplo do valor deferido nos casos de desrespeito à estabilidade acidentária prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91, referente a acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, sendo que autora sequer sofreu acidente relacionado com o trabalho, sem contabilizar, ainda, o pagamento em dobro previsto no artigo 4º, II, da Lei 9.029/95. Ademais, a reclamante não mais enfrenta situação de risco social decorrente do desemprego.

                A Súmula 28 do TST delimita o pagamento até a data da primeira decisão que determinou a conversão da reintegração em indenização dobrada. No caso, contudo, não foi requerida a reintegração. Assim, sem descurar das especificidades da causa, fixo a extensão do dano material correspondente aos salários do período da data da dispensa até o ajuizamento da ação, a ser pago em dobro, conforme artigo 4º, II, da Lei 9.029/95.

                A dispensa arbitrária também caracterizou dano moral por ofensa à dignidade e à honra da trabalhadora. Inegável a frustração hábil a desencadear desequilíbrio anímico na ofendida, que passa a nutrir sentimento de incerteza sobre o desenvolvimento profissional, somado ao receio da manutenção da própria subsistência. Sentimentos que não se confundem com o mero dissabor.

                Quanto ao valor da indenização, considerando as condições da vítima e do ofensor (id 1a4f9b7, p. 2), o tempo de prestação de serviços e a gravidade da conduta, fixo a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Referido montante visa desestimular novas práticas, sem configurar enriquecimento indevido.

                Reformo para declarar a nulidade da dispensa imotivada e deferir o pagamento dos salários, férias, terço constitucional, 13º salário e demais vantagens pecuniárias correspondente ao período da data da dispensa até o ajuizamento da ação, a ser pago em dobro, acrescidos dos reajustes legais e normativos conferidos à categoria, com incidência das contribuições para o FGTS e respectiva indenização de 40%, assim como de indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais). As fichas financeiras (id b83831a) não consignam o pagamento de abono por tempo de serviço.

                Invertida a sucumbência na pretensão objeto da perícia médica, os respectivos honorários periciais fixados na origem deverão ser pagos pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas.

 

                ADICIONAL DE INSALUBRIDADE

                O Juízo de origem indeferiu o pagamento do adicional de insalubridade, por não constatados agentes nocivos à saúde em exame pericial.

                A reclamante argumenta que a limpeza de sanitários em agências bancárias com grande circulação de pessoas caracteriza exposição a agentes insalubres.

                O Perfil Profissiográfico Previdenciário destaca que a autora, no cargo de servente lotada em agência da Caixa Econômica Federal, realizava a limpeza de sanitários (id 25132d8, p. 2).

                A perícia esclarece que "dos 4 (quatro) banheiros, predominantemente utilizados pelos próprios funcionários do banco os papeis higiênicos eram depositados em cestos metálicos contendo nos seus interiores sacos de plástico o que facilita o recolhimento, além do que se torna mais higiênico. Cabia a autora puxar o saco do cesto seguido do fechamento da sua boca, através de um nó, e posterior acondicionamento em local externo a agência para recolhimento por parte de terceirizados da Prefeitura" (id 2d96fd2, p. 11). Considerou, assim, descaracteriza a insalubridade por agentes biológicos.

                No entanto, descritas as informações científicas e ambientais, a conclusão da perícia deve passar pela persuasão do julgador, que não está adstrito ao exame técnico. No caso, a conclusão do expert é orientada por falsa premissa, pois ressalta que "a reclamante trabalhava em um ambiente com um contingente, tendo como média 20 funcionários que faziam o uso de seus banheiros e quando muito este número poderia aumentar em escala diminuta, posto que estava aberto aos clientes do banco CAIXA e neste aspecto o bom senso prevalece no sentido que o número de clientes que acessam internamente o banco para ir nos seus banheiros é extremamente pequeno" (id2d96fd2, p. 11).

                O preposto da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) confessa "que na agência tinha banheiro para os clientes" (id 9ea8f22, p. 2).

                A prova oral revela que os sanitários não eram de uso restrito aos empregados da agência e, ao revés, havia elevado número de usuários. A testemunha Karine Gonçalves Amaro esclarece " que durante todo o período que a reclamante trabalhou a depoente trabalhou na agência; que havia um banheiro dentro da agência utilizado pelos clientes, o qual também era limpo pela reclamante; que na agência adentravam cerca de 200 pessoas por dia, sendo a depoente responsável pela distribuição das senhas de atendimento; que nos períodos de pagamento esse número era modificado para maior; que o banheiro era aberto ao público" (id 9ea8f22, p. 2).

                Os banheiros de agência bancárias de grande circulação são instalações sanitárias de uso coletivo. A limpeza em tais locais caracteriza a insalubridade em grau máximo, conforme preconiza a Súmula 448, II, do TST:

 

                "A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano".

 

                A exposição ao agente insalubre não foi eventual, pois a higienização era tarefa ordinária da servente de limpeza, realizada diariamente.

                Não há prova de que os equipamentos de proteção individual (id 366a262) foram eficientes para a neutralização do agente nocivo, pois o perito partiu da incorreta premissa de que "o   número de pessoas que dentro de uma agencia bancária faz uso dos banheiros existentes é ínfimo" (id 52770b9, p. 1, item 3) e, assim, considerou "de todo dispensável saber a periodicidade de concessão e o prazo para troca de EPIs que a reclamante chegou a fazer uso" (id 52770b9, p. 4, item 10).

                É devido, portanto, o adicional de insalubridade em grau máximo.

                O Tribunal Pleno deste Regional, ao analisar o Incidente de Uniformização de Jurisprudência nos autos 2343-20.2012.5.03.0040, assentou o posicionamento contido na Súmula 46 deste Regional, que assim enuncia:

 

                "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. A base de cálculo do adicional de insalubridade é o salário mínimo, enquanto não sobrevier lei dispondo de forma diversa, salvo critério mais vantajoso para o trabalhador estabelecido em norma coletiva, condição mais benéfica ou em outra norma autônoma aplicável. (RA 224/2015, disponibilização: DEJT /TRT3/Cad. Jud. 25, 28 e 29.09.2015)".

 

                Reformo para acrescer à condenação o pagamento do adicional de insalubridade, em grau máximo (40%), incidente sobre o salário mínimo vigente à época. Ante a habitualidade, são devidos reflexos no aviso prévio, férias, terço constitucional, 13º salário e FGTS acrescido da indenização de 40%. Deve, também, compor a base de cálculo das horas extras (Súmula 139 do TST). As fichas financeiras (id b83831a) não consignam o pagamento de abono por tempo de serviço.

                A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) deverá emitir guia de perfil profissiográfico previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato com agente biológico, nos termos do artigo 58, §§ 1º e 4º, da Lei 8.213/91, no prazo de 10 dias, contado do recebimento da notificação específica para tal fim, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) a favor do reclamante.

                Sucumbente no objeto da perícia atinente à insalubridade, os respectivos honorários periciais fixados na origem deverão ser pagos pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas.

 

                Conclusão do recurso

                Pelo exposto, conheço dos recursos ordinários interpostos pelas 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.), 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) e reclamante, rejeito a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de prova suscitada pela autora e, no mérito, nego provimento aos recursos das 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas e dou parcial provimento ao recurso da reclamante para, nos termos da fundamentação: a) declarar a nulidade da dispensa imotivada; b) deferir o pagamento em dobro dos salários correspondentes ao período da data da dispensa até o ajuizamento da ação, conforme parâmetros delimitados na fundamentação; c) acrescer à condenação o pagamento da indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais); d) deferir o pagamento do adicional de insalubridade, em grau máximo (40%), incidente sobre o salário mínimo vigente à época, com os reflexos definidos na fundamentação; e) determinar que a 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) emita guia de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato com agente biológico, no prazo e sob as cominações constantes dos fundamentos; e f) condenar as 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas ao pagamento dos honorários periciais fixados na sentença pelas perícias médica e de insalubridade. Custas pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas, no importe adicional de R$ 1.000,00, calculadas sobre R$ 50.000,00, valor provisoriamente acrescido à condenação.

 

                ACÓRDÃO

                Fundamentos pelos quais,

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da sua Sétima Turma, hoje realizada, sob a presidência do Exmo. Desembargador Paulo Roberto de Castro, presente o Exmo. Procurador Arlélio de Carvalho Lage, representante do Ministério Público do Trabalho, computados os votos do Exmo. Des. Paulo Roberto de Castro e do Exmo. Juiz convocado Cleber Lúcio de Almeida (substituindo o Exmo. Des. Marcelo Lamego Pertence), JULGOU o presente processo e, unanimemente, conheceu dos recursos ordinários interpostos pelas 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.), 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) e reclamante, rejeitou a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de prova suscitada pela autora e, no mérito, sem divergência, negou provimento aos recursos das 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas e deu parcial provimento ao recurso da reclamante para, nos termos da fundamentação: a) declarar a nulidade da dispensa imotivada; b) deferir o pagamento em dobro dos salários correspondentes ao período da data da dispensa até o ajuizamento da ação, conforme parâmetros delimitados na fundamentação; c) acrescer à condenação o pagamento da indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais); d) deferir o pagamento do adicional de insalubridade, em grau máximo (40%), incidente sobre o salário mínimo vigente à época, com os reflexos definidos na fundamentação; e) determinar que a 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) emita guia de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato com agente biológico, no prazo e sob as cominações constantes dos fundamentos; e f) condenar as 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas ao pagamento dos honorários periciais fixados na sentença pelas perícias médica e de insalubridade. Custas pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas, no importe adicional de R$ 1.000,00, calculadas sobre R$ 50.000,00, valor provisoriamente acrescido à condenação.

                Belo Horizonte, 1 de setembro de 2016.

 

CRISTIANA MARIA VALADARES FENELON

Relatora

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 01.09.2016)

BOLT7899---WIN/INTER

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