DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - LEI Nº 9.029/95
- DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF35834 - LT
PROCESSO TRT/RO Nº 0010072-27.2015.5.03.0094
Recorrentes : |
(1) Liderança Limpeza e
Conservação Ltda. (2) Caixa Econômica
Federal (3) Neide Aparecida de
Souza Gregório |
Recorridos : |
Os Mesmos e Universo
Serviços s Assessoria Empresarial Ltda. |
Relatora : |
Cristiana Maria
Valadares Fenelon |
E M E N T A
DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. LEI N. 9.029/95. A
dispensa no momento em que o trabalhador está em situação de vulnerabilidade
diante de enfermidades não plenamente contidas evidencia discriminação. A
dispensa imotivada constitui ato potestativo do
empregador, prescindindo de justificativa, mas não traduz um direito absoluto
capaz de garantir o exercício dessa forma de desligamento com ofensa aos demais
bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. O art. 1° da Lei n°
9.029/95 há de ser interpretado sob a luz dos fundamentos da dignidade da
pessoa humana e do valor social do trabalho inscritos no art. 1º, III e IV, da
Constituição Federal, bem como em conformidade com o princípio da não
discriminação previsto no art. 3º, IV, da Lei Maior e na Convenção 111 da OIT.
Considera-se, desse modo, que o rol das causas de discriminação inserido no
dispositivo é meramente exemplificativo. Há de se ter em vista que o fim
primordial das disposições constitucionais que vedam a discriminação é
resguardar os cidadãos de qualquer exclusão de direitos fundada em critérios
ilegítimos.
R E L A T Ó R I O
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de
Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrentes, LIDERANÇA LIMPEZA E
CONSERVAÇÃO LTDA., CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e NEIDE APARECIDA DE SOUZA GREGÓRIO,
e, como recorridos, OS MESMOS e UNIVERSO SERVIÇOS E ASSESSORIA EMPRESARIAL
LTDA.
O Exmo. Juiz Orlando Tadeu de Alcântara, da Vara do
Trabalho de Sabará, em sentença (id 166b16b), julgou parcialmente procedentes
os pedidos formulados por NEIDE APARECIDA DE SOUZA GREGÓRIO em face da
LIDERANÇA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO LTDA. e da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e extinguiu
o processo, com resolução do mérito, na forma do artigo 487, II, do NCPC, em
relação à UNIVERSO SERVIÇOS E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA.
A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação
Ltda.) recorre (id 4cfa10f), insurgindo-se contra a condenação ao pagamento das
horas extras por labor aos sábados, domingos e feriados, além da multa
normativa.
A 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) recorre (id
4550e1e), irresignada com a responsabilidade
subsidiária.
A reclamante recorre na forma adesiva (id d489420),
suscitando preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de prova, e, no
mérito, insiste no pedido de reconhecimento da dispensa discriminatória e a
pagamento do adicional de insalubridade
Contrarrazões pelas autora e 2ª reclamada (Liderança
Limpeza e Conservação Ltda.) - id db32020 e d9686b9.
Devidamente intimadas (id 56e4678 e 67d2045), as 1ª
(Universo Serviços e Assessoria Empresarial Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica
Federal) reclamadas não apresentaram contrarrazões.
Dispensado o parecer da d. Procuradoria do Trabalho
porque não evidenciadas as situações aludidas no artigo 82, I, do Regimento
Interno deste Tribunal.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
ADMISSIBILIDADE
Conheço dos recursos ordinários porque apropriados,
tempestivos e firmados por procuradores regularmente constituídos (id a11e25d,
2b4394a e 33b37aa). As guias (id f75d489, p. 1-4, 2509973 e 588eaa1) comprovam
o preparo.
Não prospera a alegação da 2ª reclamada (Liderança
Limpeza e Conservação Ltda.), articulada em sede de contrarrazões (id d9686b9,
p. 3), no sentido de que os demais recorrentes não atenderam ao princípio da dialeticidade. As razões recursais apresentam incisiva
impugnação aos fundamentos da decisão, com aptidão para, em tese, desconstituir
o julgado.
A exigência da dialeticidade
do recurso ordinário há de ser interpretada à luz do artigo 899, "caput",
da CLT, que enuncia serem os recursos "(...)interpostos por simples
petição (...)".
PRELIMINAR
CERCEAMENTO DE PROVA
A reclamante suscita preliminar de nulidade da
sentença por cerceamento de prova caracterizado pelo indeferimento de perguntas
durante a inquirição do preposto e da testemunhas acerca da quantidade de
pessoas que circulavam na agência bancária, dado relevante para a constatação
da insalubridade decorrente da higienização das instalações sanitárias de uso
público ou coletivo.
O tema foi devidamente esclarecido pela prova oral,
com realce da utilização do banheiro pelo público, sendo destacado que
adentravam cerca de 200 pessoas na agência, por dia. O preposto da 3ª reclamada
(Caixa Econômica Federal) confessou que o banheiro era utilizado pelos clientes
(id 9ea8f22, p. 2).
Insta ressaltar que o Juiz é o destinatário das
provas e, no controle da instrução, deve indeferir as que considerar inúteis ou
protelatórias.
Rejeito.
MÉRITO
RECURSO DA 2ª RECLAMADA (LIDERANÇA LIMPEZA E
CONSERVAÇÃO LTDA.)
HORAS EXTRAS
O Juízo singular deferiu o pagamento de metade do
montante devido pelo labor aos sábados, domingos e feriados, por demonstrado,
pela prova oral, a atividade típica de limpeza da agência em tais dias, tendo a
autor ressaltado o pagamento extrafolha, em montante inferior ao devido.
A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação
Ltda.) refuta o labor aos sábados, domingos e feriados em dias não efetivamente
registrados. Subsidiariamente, requer a exclusão do pagamento nos dias de
afastamentos e férias.
É certo que os cartões de ponto com marcações
predominantemente variáveis e sem vícios aparentes apresentam (id 9eda318), em
tese, aptidão para infirmarem as alegações da inicial. Devem, contudo, ser
contrastados com os demais elementos de convicção.
Os cartões de ponto consignam constante labor aos
sábados, domingos e feriados até dezembro/2011 (id 9eda318, p. 7). Em relação
ao período posterior, o registro de contínuas folgas em tais dias foi infirmado
pela prova oral.
A testemunha Karine
Gonçalves Amaro "não viu a reclamante trabalhando aos sábados e
domingos na limpeza da agência, porém sabe que tais tarefas são típicas da
pessoa que trabalha na limpeza; que durante todo o período que a reclamante
trabalhou a depoente trabalhou na agência" (id 9ea8f22, p. 2). As
declarações revelam a continuidade da frequência inicialmente registrada nos
cartões de ponto, referentes a labor em dias de não funcionamento da agência.
As declarações prevalecem pela contemporaneidade da testemunha, além de
evidenciar uma forma operacional que foi, inclusive, registrada até
dezembro/2011, além de ser plenamente viável e otimizada a prestação de
serviços de limpeza durante os períodos em que não há expediente para os
bancários e atendimentos externos.
As declarações da testemunha são hábeis a
desconstituir os cartões de ponto, nesse aspecto, pois o próprio preposto da 3ª
reclamada (Caixa Econômica Federal) ignora a questão controvertida: "não
sabe dizer se quem trabalhava nos finais de semana, havia ou não necessidade de
identificação" (id 9ea8f22, p. 2).
No que se refere à exclusão de dias de afastamentos,
a sentença já determina o decote.
Mantenho.
MULTA NORMATIVA
O Juízo singular deferiu o pagamento de uma multa
convencional por infração cometida e instrumento coletivo violado.
A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação
Ltda.) refuta a violação a qualquer cláusula convencional.
Houve descumprimento das normas coletivas sobre o
pagamento por labor em dias de repouso ou feriados, além da contratação de
seguro de vida (id a72f360, p. 3 e 5, cláusulas décima, parágrafo único, e
décima quinta), conforme especificado na inicial (id b8ca83e, p. 15), sendo,
portanto, devida a respectiva multa convencional (id a72f360, p. 15, cláusula
sexagésima terceira).
Mantenho.
RECURSO DA 3ª RECLAMADA (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL)
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
O Juízo de origem reconheceu a responsabilidade
subsidiária da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal), por ser beneficiária dos
serviços, sem comprovação de efetiva fiscalização da empresa interposta.
A 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) argumenta
que o artigo 71 da Lei 8.666/93 veda a responsabilização da Administração
Pública pelo inadimplemento. Alega que incumbia à recorrida demonstrar a culpa
da Administração na escolha da empresa contratada ou mesmo a falha ou falta de
fiscalização. Ressalta que a responsabilidade subsidiária não alcança multas e
direitos concedidos por convenções coletivas. Subsidiariamente, requer a redução
para apenas uma multa por convenção coletiva desrespeitada, assim como a
limitação disposta no artigo 412 do Código Civil.
A recorrente celebrou contrato de prestação de
serviços de limpeza, jardinagem e controle biológico de pragas com a 2ª
reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) - id 1999287, sendo a autora
destacada para atuar no âmbito da tomadora. A testemunha Karine
Gonçalves Amaro afirma "que trabalhou como terceirizada da Caixa de
2006 a 2015 (...) que durante todo o período que a reclamante trabalhou a
depoente trabalhou na agência", salientando, inclusive, "que
havia um banheiro dentro da agência utilizado pelos clientes, o qual também era
limpo pela reclamante" (id 9ea8f22, p. 2).
Configurada a terceirização de serviços, é irrelevante
a discussão acerca da inexistência de vínculo empregatício com a tomadora.
Competia à 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal) fiscalizar, zelosamente, o
cumprimento dos encargos assumidos pela 2ª reclamada (Liderança Limpeza e
Conservação Ltda.). Mesmo que se admita que ela diligenciou na escolha da
empresa prestadora dos serviços, certo é que assim não procedeu quanto à
fiscalização do cumprimento dos encargos trabalhistas pela empresa contratada.
Logo, deve responder pelo prejuízo ocasionado ao trabalhador, por sua culpa in
vigilando.
O art. 71, §1º, da Lei 8.666/93 não socorre a
demandada. Tal norma, ao resguardar os interesses do Poder Público, excluindo a
sua responsabilidade pelos encargos trabalhistas na hipótese de inadimplência
da empresa fornecedora regularmente contratada, subverte toda a teoria da
responsabilidade civil e atenta contra a Constituição da República.
Ora, admitir-se tal isenção implicaria conceder à
Administração Pública, que se beneficiou da atividade do empregado, um
privilégio injustificável em detrimento da dignidade da pessoa humana e dos
valores sociais do trabalho, que constituem fundamentos do Estado Democrático
de Direito (art. 1º, III e IV, da Constituição da República).
O entendimento adotado não implica a declaração de
inconstitucionalidade do referido dispositivo legal. Apenas imprime-lhe
interpretação, de modo que não há ofensa à Súmula Vinculante 10 do STF.
É bem verdade que a responsabilidade subsidiária do
ente público não decorre do mero inadimplemento do empregador, impondo-se
verificar, em cada caso, se houve ação ou omissão da Administração capaz de
provocar lesão ao patrimônio do trabalhador.
Trata-se de hipótese de responsabilidade civil
extracontratual e subjetiva, que resulta de ato ilícito ou abuso de direito, na
forma prevista pelos artigos 186 e 187 do Código Civil. No caso, porém, resta
patente a omissão da tomadora no acompanhamento do cumprimento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa contratada, dada a inadimplência de
direitos mínimos que seriam facilmente identificados por fiscalização efetiva.
Não há, pois, como absolver a tomadora dos serviços
da responsabilidade que lhe foi imputada, ressaltando-se que não foi
reconhecido o vínculo empregatício com a mesma e, portanto, não há violação do
disposto no art. 37, II, da CF ou contrariedade à Súmula 331, III, do TST.
De acordo com o item VI da Súmula 331 do TST, o
responsável subsidiário deve arcar com o pagamento de todas as parcelas que
sejam inicialmente de responsabilidade do devedor principal, sem qualquer
exceção, estando, portanto, incluídas as verbas trabalhistas e rescisórias,
horas extras e multas previstas nos artigos 467 e 477, § 8º, da CLT. É que sua
posição assemelha-se à do fiador ou do avalista, de modo que, não se verificando
o adimplemento da obrigação pelo devedor principal, incide automaticamente a
responsabilidade daquele que figura na relação jurídica basicamente para
garantir a integral satisfação do credor (Súmula 331, VI, do TST).
Em relação à multa convencional, a convenção coletiva
comina a penalidade " para cada cláusula violada". No que se
refere à limitação disposta no artigo 412 do Código Civil, há expressa previsão
na norma coletiva no sentido de que a multa é limitada ao valor do principal
(id a72f360, p. 15, cláusula sexagésima terceira), tendo a sentença determinado
a apuração conforme previsto no instrumento coletivo violado.
Nada a prover.
RECURSO DA RECLAMANTE
DISPENSA DISCRIMINATÓRIA
O Juízo singular não reconheceu qualquer prática
discriminatória na dispensa imotivada no momento em que a autora apresentava
90% da capacidade laboral, em razão de acidente automobilístico sem relação com
o trabalho. Ressaltou que a obreira estava liberada pelo INSS para o retorno ao
trabalho e foi aprovada em exame médico demissional.
A autora afirma que não estava apta a ser dispensada,
devido a limitações médicas no momento do rompimento contratual.
A reclamante foi admitida pela 2ª reclamada (Liderança
Limpeza e Conservação Ltda.) no dia 01.06.2011 para a função de servente, sendo
dispensada sem justa causa no dia 05.04.2013 (id 6f79427, p. 5, b747f40 e
f8805ff). A notificação do aviso prévio (id e70df5b) ocorreu logo após o
término do auxílio doença concedido até 31.03.2013 (id 6602d46).
O afastamento desde outubro/2012 (id 6602d46, p. 2 e
74f223f) foi necessário para a recuperação de enfermidades causadas por
acidente automobilístico, conforme prontuário médico (id 1f185a0, p. 1-5). O
acidente não tem relação com o trabalho. A autora relata, em perícia, que
"no dia 07.09.2012 (feriado), por volta das 14 horas, estava indo para
a igreja juntamente com a sua filha quando foram atropelados por um veículo
(carro)" (id 9595ce0, p. 5).
O exame de corpo de delito descreve a ocorrência de
"atropelamento por automóvel em 07.09.2012 com consequente fratura no
tornozelo esquerdo, joelho esquerdo (trinca) e fratura parcial de um dente e bambeamento de um dente (...) discreta redução da amplitude
de movimentos do joelho esquerdo para flexão" (id 178c5f2).
Embora atestada a aptidão física em exame demissional (id 09ba609, p. 2), a perícia médica constata
movimentos diminuídos em grau leve no tornozelo esquerdo (id 9595ce0, p. 6) e
realça "que após tratamentos especializados (conservadores e
cirúrgicos) não recuperou plenamente a sua saúde (como um todo), permanecendo
sequelas definitivas, com dor crônica e limitação funcional do tornozelo
esquerdo (...). De acordo com o quadro clínico e dados levantados, arbitra a incapacidade
física e laborativa em 10% (dez por cento), restando
a ela, dessa maneira, 90% (noventa por cento) de capacidade para exercer
atividades sociais e ocupacionais compatíveis com sua saúde e condição física"
(id 9595ce0, p. 12).
O perito esclarece que "o fator de não ser
encaminhada para a reabilitação profissional não significa ausência de doença e
muito menos ausência de incapacidade para o trabalho" (id 9595ce0, p.
11).
A cessação do benefício previdenciário não significa
plena aptidão laboral, vez que a obreira com incapacidade parcial também pode
retornar ao trabalho, com adequação das condições do local em que executa as
atividades. A ré, contudo, não oportunizou sequer um dia de trabalho após o término
do benefício previdenciário, optando pela imediata dispensa injusta.
A dispensa quando a autora estava parcialmente
incapacitada e em situação de vulnerabilidade diante de enfermidades não
plenamente contidas evidencia discriminação. A dispensa imotivada constitui
ato potestativo do empregador, prescindindo de
justificativa, mas não traduz um direito absoluto capaz de garantir o exercício
dessa forma de desligamento com ofensa aos demais bens jurídicos preservados
pela ordem constitucional. O art. 1° da Lei n° 9.029/95 há de ser interpretado
sob a luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do
trabalho inscritos no art. 1º, III e IV, da Constituição, bem como em
conformidade com o princípio da não discriminação previsto no art. 3º, IV, da
Lei Maior e na Convenção 111 da OIT. Considera-se, desse modo, que o rol das
causas de discriminação inserido no dispositivo é meramente exemplificativo. Há
de se ter em vista que o fim primordial das disposições constitucionais que
vedam a discriminação é resguardar os cidadãos de qualquer exclusão de direitos
fundada em critérios ilegítimos.
Assim, constatada a ilegalidade da dispensa, a autora
teria direito à reintegração ao emprego, com adequação das condições de labor,
a fim de afastar as adversidades à saúde e realizar exame médicos períodos com
sucessivas renovações dos mecanismos de segurança e prevenção à higidez física
da trabalhadora. A autora, contudo, requer somente o pagamento dos salários do
período de afastamento até o trânsito em julgado da decisão, em dobro,
certamente por estar trabalhando, conforme relatado em perícia (id 9595ce0, p.
5).
No entanto, o pedido de pagamento do salário de todo
o período de afastamento até o trânsito em julgado da decisão é desproporcional
ao dano, não apenas pelo desinteresse de imediata reintegração, mas também pelo
longo decurso do tempo, considerada a dispensa no dia 05.04.2013 situação que
ensejaria reparação superior ao triplo do valor deferido nos casos de
desrespeito à estabilidade acidentária prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91,
referente a acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, sendo que autora
sequer sofreu acidente relacionado com o trabalho, sem contabilizar, ainda, o
pagamento em dobro previsto no artigo 4º, II, da Lei 9.029/95. Ademais, a
reclamante não mais enfrenta situação de risco social decorrente do desemprego.
A Súmula 28 do TST delimita o pagamento até a data da
primeira decisão que determinou a conversão da reintegração em indenização
dobrada. No caso, contudo, não foi requerida a reintegração. Assim, sem
descurar das especificidades da causa, fixo a extensão do dano material
correspondente aos salários do período da data da dispensa até o ajuizamento da
ação, a ser pago em dobro, conforme artigo 4º, II, da Lei 9.029/95.
A dispensa arbitrária também caracterizou dano moral
por ofensa à dignidade e à honra da trabalhadora. Inegável a frustração hábil a
desencadear desequilíbrio anímico na ofendida, que passa a nutrir sentimento de
incerteza sobre o desenvolvimento profissional, somado ao receio da manutenção
da própria subsistência. Sentimentos que não se confundem com o mero dissabor.
Quanto ao valor da indenização, considerando as
condições da vítima e do ofensor (id 1a4f9b7, p. 2), o tempo de prestação de
serviços e a gravidade da conduta, fixo a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil
reais). Referido montante visa desestimular novas práticas, sem configurar
enriquecimento indevido.
Reformo para declarar a nulidade da dispensa
imotivada e deferir o pagamento dos salários, férias, terço constitucional, 13º
salário e demais vantagens pecuniárias correspondente ao período da data da
dispensa até o ajuizamento da ação, a ser pago em dobro, acrescidos dos
reajustes legais e normativos conferidos à categoria, com incidência das
contribuições para o FGTS e respectiva indenização de 40%, assim como de
indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais). As
fichas financeiras (id b83831a) não consignam o pagamento de abono por tempo de
serviço.
Invertida a sucumbência na pretensão objeto da
perícia médica, os respectivos honorários periciais fixados na origem deverão
ser pagos pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa
Econômica Federal) reclamadas.
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE
O Juízo de origem indeferiu o pagamento do adicional
de insalubridade, por não constatados agentes nocivos à saúde em exame
pericial.
A reclamante argumenta que a limpeza de sanitários em
agências bancárias com grande circulação de pessoas caracteriza exposição a
agentes insalubres.
O Perfil Profissiográfico
Previdenciário destaca que a autora, no cargo de servente lotada em agência da
Caixa Econômica Federal, realizava a limpeza de sanitários (id 25132d8, p. 2).
A perícia esclarece que "dos 4 (quatro)
banheiros, predominantemente utilizados pelos próprios funcionários do banco os
papeis higiênicos eram depositados em cestos metálicos contendo nos seus
interiores sacos de plástico o que facilita o recolhimento, além do que se
torna mais higiênico. Cabia a autora puxar o saco do cesto seguido do
fechamento da sua boca, através de um nó, e posterior acondicionamento em local
externo a agência para recolhimento por parte de terceirizados da Prefeitura"
(id 2d96fd2, p. 11). Considerou, assim, descaracteriza a insalubridade por
agentes biológicos.
No entanto, descritas as informações científicas e
ambientais, a conclusão da perícia deve passar pela persuasão do julgador, que
não está adstrito ao exame técnico. No caso, a conclusão do expert
é orientada por falsa premissa, pois ressalta que "a reclamante
trabalhava em um ambiente com um contingente, tendo como média 20 funcionários
que faziam o uso de seus banheiros e quando muito este número poderia aumentar
em escala diminuta, posto que estava aberto aos clientes do banco CAIXA e neste
aspecto o bom senso prevalece no sentido que o número de clientes que acessam
internamente o banco para ir nos seus banheiros é extremamente pequeno"
(id2d96fd2, p. 11).
O preposto da 3ª reclamada (Caixa Econômica Federal)
confessa "que na agência tinha banheiro para os clientes" (id
9ea8f22, p. 2).
A prova oral revela que os sanitários não eram de uso
restrito aos empregados da agência e, ao revés, havia elevado número de
usuários. A testemunha Karine Gonçalves Amaro
esclarece " que durante todo o período que a reclamante trabalhou a
depoente trabalhou na agência; que havia um banheiro dentro da agência
utilizado pelos clientes, o qual também era limpo pela reclamante; que na agência
adentravam cerca de 200 pessoas por dia, sendo a depoente responsável pela
distribuição das senhas de atendimento; que nos períodos de pagamento esse
número era modificado para maior; que o banheiro era aberto ao público"
(id 9ea8f22, p. 2).
Os banheiros de agência bancárias de grande
circulação são instalações sanitárias de uso coletivo. A limpeza em tais locais
caracteriza a insalubridade em grau máximo, conforme preconiza a Súmula 448,
II, do TST:
"A higienização de
instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a
respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e
escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo,
incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE 3.214/78 quanto à
coleta e industrialização de lixo urbano".
A exposição ao agente insalubre não foi eventual,
pois a higienização era tarefa ordinária da servente de limpeza, realizada
diariamente.
Não há prova de que os equipamentos de proteção
individual (id 366a262) foram eficientes para a neutralização do agente nocivo,
pois o perito partiu da incorreta premissa de que "o número de pessoas que dentro de uma agencia
bancária faz uso dos banheiros existentes é ínfimo" (id 52770b9, p. 1,
item 3) e, assim, considerou "de todo dispensável saber a periodicidade
de concessão e o prazo para troca de EPIs que a
reclamante chegou a fazer uso" (id 52770b9, p. 4, item 10).
É devido, portanto, o adicional de insalubridade em
grau máximo.
O Tribunal Pleno deste Regional, ao analisar o
Incidente de Uniformização de Jurisprudência nos autos 2343-20.2012.5.03.0040,
assentou o posicionamento contido na Súmula 46 deste Regional, que assim
enuncia:
"ADICIONAL DE
INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. A base de cálculo do adicional de insalubridade
é o salário mínimo, enquanto não sobrevier lei dispondo de forma diversa, salvo
critério mais vantajoso para o trabalhador estabelecido em norma coletiva,
condição mais benéfica ou em outra norma autônoma aplicável. (RA 224/2015,
disponibilização: DEJT /TRT3/Cad. Jud. 25, 28 e 29.09.2015)".
Reformo para acrescer à condenação o pagamento do
adicional de insalubridade, em grau máximo (40%), incidente sobre o salário
mínimo vigente à época. Ante a habitualidade, são devidos reflexos no aviso
prévio, férias, terço constitucional, 13º salário e FGTS acrescido da
indenização de 40%. Deve, também, compor a base de cálculo das horas extras
(Súmula 139 do TST). As fichas financeiras (id b83831a) não consignam o
pagamento de abono por tempo de serviço.
A 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação
Ltda.) deverá emitir guia de perfil profissiográfico
previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato
com agente biológico, nos termos do artigo 58, §§ 1º e 4º, da Lei 8.213/91, no
prazo de 10 dias, contado do recebimento da notificação específica para tal
fim, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) a favor do reclamante.
Sucumbente no objeto da perícia atinente à
insalubridade, os respectivos honorários periciais fixados na origem deverão
ser pagos pelas 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa
Econômica Federal) reclamadas.
Conclusão do recurso
Pelo exposto, conheço dos recursos ordinários
interpostos pelas 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.), 3ª
reclamada (Caixa Econômica Federal) e reclamante, rejeito a preliminar de
nulidade da sentença por cerceamento de prova suscitada pela autora e, no
mérito, nego provimento aos recursos das 2ª (Liderança Limpeza e Conservação
Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas e dou parcial provimento ao
recurso da reclamante para, nos termos da fundamentação: a) declarar a nulidade
da dispensa imotivada; b) deferir o pagamento em dobro dos salários
correspondentes ao período da data da dispensa até o ajuizamento da ação,
conforme parâmetros delimitados na fundamentação; c) acrescer à condenação o
pagamento da indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00 (dez mil
reais); d) deferir o pagamento do adicional de insalubridade, em grau máximo
(40%), incidente sobre o salário mínimo vigente à época, com os reflexos
definidos na fundamentação; e) determinar que a 2ª reclamada (Liderança Limpeza
e Conservação Ltda.) emita guia de Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato
com agente biológico, no prazo e sob as cominações constantes dos fundamentos;
e f) condenar as 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica
Federal) reclamadas ao pagamento dos honorários periciais fixados na sentença
pelas perícias médica e de insalubridade. Custas pelas 2ª (Liderança Limpeza e
Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas, no importe
adicional de R$ 1.000,00, calculadas sobre R$ 50.000,00, valor provisoriamente
acrescido à condenação.
ACÓRDÃO
Fundamentos pelos quais,
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região,
em sessão ordinária da sua Sétima Turma, hoje realizada, sob a presidência do
Exmo. Desembargador Paulo Roberto de Castro, presente o Exmo. Procurador Arlélio de Carvalho Lage,
representante do Ministério Público do Trabalho, computados os votos do Exmo.
Des. Paulo Roberto de Castro e do Exmo. Juiz convocado Cleber Lúcio de Almeida
(substituindo o Exmo. Des. Marcelo Lamego Pertence),
JULGOU o presente processo e, unanimemente, conheceu dos recursos ordinários
interpostos pelas 2ª reclamada (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.), 3ª
reclamada (Caixa Econômica Federal) e reclamante, rejeitou a preliminar de
nulidade da sentença por cerceamento de prova suscitada pela autora e, no
mérito, sem divergência, negou provimento aos recursos das 2ª (Liderança
Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas e deu
parcial provimento ao recurso da reclamante para, nos termos da fundamentação:
a) declarar a nulidade da dispensa imotivada; b) deferir o pagamento em dobro
dos salários correspondentes ao período da data da dispensa até o ajuizamento
da ação, conforme parâmetros delimitados na fundamentação; c) acrescer à
condenação o pagamento da indenização por dano moral no importe de R$ 10.000,00
(dez mil reais); d) deferir o pagamento do adicional de insalubridade, em grau
máximo (40%), incidente sobre o salário mínimo vigente à época, com os reflexos
definidos na fundamentação; e) determinar que a 2ª reclamada (Liderança Limpeza
e Conservação Ltda.) emita guia de Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, considerada a caracterização de insalubridade por contato
com agente biológico, no prazo e sob as cominações constantes dos fundamentos;
e f) condenar as 2ª (Liderança Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa
Econômica Federal) reclamadas ao pagamento dos honorários periciais fixados na
sentença pelas perícias médica e de insalubridade. Custas pelas 2ª (Liderança
Limpeza e Conservação Ltda.) e 3ª (Caixa Econômica Federal) reclamadas, no
importe adicional de R$ 1.000,00, calculadas sobre R$ 50.000,00, valor
provisoriamente acrescido à condenação.
Belo Horizonte, 1 de setembro de 2016.
CRISTIANA MARIA VALADARES FENELON
Relatora
(TRT/3ª R./ART., Pje, 01.09.2016)
BOLT7899---WIN/INTER
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