ACIDENTE DO TRABALHO - RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF36837 - LT

 

 

PROCESSO TRT/RO Nº 0010391-18.2015.5.03.0151

 

Recorrentes: (1) Suely Martins de Almeida

                       (2) Embramed Industria e Comercio de Produtos Hospitalares Ltda.

Recorridos: Os Mesmos

Relator: Desembargador Emerson José Alves Lage

 

E M E N T A

 

                ACIDENTE DO TRABALHO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. Pela regra do art. 7º, inciso XXVIII, da CF/88, são direitos dos trabalhadores, urbanos e rurais, além de outros que visem a melhorar a sua condição de vida, seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregado, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa. Pela leitura do citado dispositivo constitucional, pode-se afirmar, numa interpretação puramente literal ou gramatical, que, por regra, a disposição constante do inciso XXVIII do art. 7º da CF/88 preceitua a responsabilidade civil subjetiva do empregador. Contudo, essa interpretação deve ser realizada com acurada atenção, isto não apenas para a descrição apriorística da doença do trabalho, senão para a investigação efetiva de suas causas, para então ser possível aferir os elementos da responsabilidade civil. É que, nessa hipótese, não se pode desprezar a presença do próprio fortuito interno, consistente no fato de que, ao lançar-se na exploração de um determinado empreendimento econômico, o empregador assume, até mesmo por força legal (art. 2º da CLT), todos os riscos inerentes a esse empreendimento, no que se inclui, por certo, o fornecimento de um ambiente laboral sadio, salubre e não perigoso (resumidamente, o viés psicofísico da ambiência e saúde laboral). Daí que, ocorrido um acidente do trabalho ou detectada uma doença laboral, será da ordem natural das coisas que recaia sobre o empregador o ônus de comprovar que o ambiente ou método de trabalho foi oferecido ao empregador com todas as cautelas possíveis.

                Vistos os autos, relatados e discutidos os presentes recursos ordinários interpostos, decide-se.

 

R E L A T Ó R I O

 

                A MM. Juíza do Trabalho Adriana Farnesi Silva, da Vara do Trabalho de São Sebastião do Paraíso, por meio da r. sentença de ID 1b0dbfc, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou parcialmente procedentes os pedidos aduzidos na ação trabalhista movida por SUELY MARTINS DE ALMEIDA em face de EMBRAMED INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS HOSPITALARES LTDA para condenar essa a pagar àquelaindenização por danos morais, no valor de R$ 20.000,00.

                Laudo pericial, elaborado por Jorge Nelson Moinho Peres (ID a6f83fe).

                Aos embargos de declaração opostos pela reclamada (ID 93945d1) foi dado provimento para retificar o erro material apontado (ID 074e4bb).

                Recurso ordinário interposto pela reclamante (ID 9e8c811), pretendendo a revisão do julgado em relação ao valor das indenizações por danos morais e à indenização por danos materiais.

                Procuração (ID 7d62639).

                Recurso adesivo interposto pela reclamada (ID aeed05e), pretendendo a revisão do julgado em relação a responsabilidade civil e valor da indenização por danos morais.

                Procuração (ID f013e8d).

                Preparo regular comprovado (ID 95a69a8 e ae71ce9).

                Contrarrazões pela reclamada (ID bebc11b) e pela autora (ID 69165da).

                Não houve manifestação do Ministério Público do Trabalho, já que neste processo não se vislumbra interesse público a proteger, nem quaisquer das hipóteses previstas no art. 82 do Regimento Interno deste eg. Tribunal Regional do Trabalho.

                É o relatório.

 

                2 - ADMISSIBILIDADE

                Conhece-se do recurso ordinário interposto pela reclamante e do recurso adesivo interposto pela ré, estando presentes os pressupostos de admissibilidade.

                Considerando a identidade das matérias, os recursos serão analisados em conjunto.

 

                3 - FUNDAMENTOS

                3.1 - ANÁLISE CONJUNTA DOS RECURSOS

                3.1.1 - RESPONSABILIDADE CIVIL - VALOR DAS INDENIZAÇÕES

                A ré foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00, decorrentes de doença do trabalho da qual padece a reclamante.

                A reclamada pretende a revisão da condenação e alega que não há nexo causal, tampouco culpa a justificar a responsabilidade que lhe foi impingida. Pretende, caso mantida a sentença, seja reduzido o valor da indenização deferida.

                A reclamante, por sua vez, requer a majoração do valor da indenização por danos morais, bem como o reconhecimento do direito à indenização por danos materiais.

                Determinada a realização de perícia médica, veio aos autos o laudo de ID a6f83fe, que constatou que, no exercício de atividades de auxiliar de produção, a reclamante realizava trabalho que demandava "Fatores Biomecânicos significativos para surgimento de lesões Osteomusculares Tendíneas de membros superiores e Fatores Biomecânicos altamente significativos para agravamentos, quando o trabalhador já é portador de Patologias Osteomusculares Tendíneas".

                Diagnosticada "Patologia Osteomuscular-tendínea dos membros superiores"-, o perito concluiu que "Em decorrência da Patologia Osteomuscular-tendínea dos membros superiores, restou comprovada incapacidade laboral total e temporária no período de 04.11.2013 a 07.01.2014. Por ocasião da Perícia Oficial, considerando que a periciada ainda apresentava Sinais e Sintomas de Patologia Osteomuscular Tendínea da qual foi acometida, considera o Perito Oficial que não deverá voltar a realizar as mesmas atividades laborais que desempenhava na Empresa reclamada, pela possibilidade de agudização e/ou até agravamento de Patologia da qual é portadora. Da Patologia Osteomuscular Tendínea, restou comprovada limitação funcional da ordem de 27% (TNI)".

                Quanto à etiologia da lesão, foi esclarecido pelo perito que:

 

                "Nexo Causal Estabelecido por etiologia e por agravamento da Patologia Osteomuscular Tendínea da qual a Periciada foi acometida em consequência das atividades laborais prestadas na e para a Empresa reclamada".

 

                Ao longo das respostas aos quesitos formulados pelas partes, o perito reafirmou a relação causal direta entre a doença da qual padece a autora e o trabalho por ela exercido, destacando-se que a possibilidade de concausa foi expressamente rejeitada. Transcreve-se:

 

                "14. Ainda se afirmativo, a alegada doença é típica na idade em que tinha a Reclamante?

                Não. A doença da periciada teve como causa ter ficado exposta aos fatores de Riscos Ergonômicos presentes nas atividades laborais que prestou na e para a Empresa reclamada.

                (...)

                16. O Sr. Perito pode afirmar com absoluta certeza de que o mal que hoje acomete a autora deriva exclusivamente do trabalho exercido na Ré?

                Sim. A doença decorreu em consequência da periciada ter ficado exposta a fatores de Riscos Ergonômicos presentes nas atividades laborais que prestou na e para a Empresa reclamada.

                17. Admite que a atividade possa ser concausa?

                Não."

 

                Indicou o expert que, em razão da doença apresentada, a autora possui restrição para o trabalho exercido:

 

                "Em decorrência da Patologia Osteomuscular-tendínea dos membros superiores, restou comprovada incapacidade laboral total e temporária no período de 04.11.2013 até 07.01.2014. Por ocasião da Perícia Oficial, considerando que a periciada ainda apresentava Sinais e Sintomas de Patologia osteomuscular Tendínea da qual foi acometida, considera o Perito Oficial que não deverá voltar a realizar às mesmas atividades laborais que desempenhava na Empresa reclamada, pela possibilidade de agudização e/ou até agravamento de Patologia da qual é portadora.

                (...)

                Restou comprovada por ocasião da Perícia Oficial limitação funcional dos membros superiores da ordem de 27%. Apresenta ainda restrições para às mesmas atividades laborais que desempenhava na Empresa reclamada."

 

                À ré incumbia, portanto, o ônus de produzir prova de modo a afastar a relação direta entre a doença da autora e as funções por ela exercidas, ilidindo a existência do nexo de causalidade entre a doença diagnosticada e o trabalho desenvolvido, encargo do qual não se desvencilhou.

                Considerando a conclusão apresentada no laudo pericial, tem-se que a reclamante está incapacitada para o trabalho e que a sua patologia relaciona-se diretamente com as atividades exercidas na empresa ré.

                Segundo a regra do art. 7º, inciso XXVIII, da CF/88, são direitos dos trabalhadores, urbanos e rurais, além de outros que visem a melhorar a sua condição de vida, seguro contra acidentes de trabalho, à cargo do empregado, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa.

                Pela leitura do citado dispositivo constitucional, pode-se afirmar, numa interpretação puramente literal, que, por regra, a disposição constante do inciso XXVIII do art. 7º da CF /88 preceitua a responsabilidade civil subjetiva do empregador.

                E, neste sentido, como ressalta do Desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, sempre "haverá culpa do empregador quando não forem observadas as normas legais, convencionais ou técnicas de segurança, higiene e saúde do trabalho. É obrigação legal da empresa cumprir e fazer cumprir tais normas, instruindo os empregados quanto às precauções a tomar, no sentido de evitar acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais, prestando informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular" (p. 244), acrescentando, mais adiante, o mesmo autor, e especificamente quanto às doenças osteomusculares relacionadas ao trabalho - DORT, ser dever do empregador adoção de medidas preventivas para se evitar a incidência deste tipo de lesão ou enfermidade, procedendo o empregador, para tanto, exemplificativamente, a uma "uma análise ergonômica do trabalho, abrangendo levantamento, transporte e descarga individual de materiais; mobiliários e equipamentos dos postos de trabalho; condições ambientais do trabalho e organização do trabalho" (p. 312), citando este mesmo doutrinador, ainda, importante precedente do então Tribunal de Alçada de MG (7ª Câmara Civil, Apelação Cível n. 166.096-0, Relator Juiz José Brandão, Ac. de 18 nov 1993 - Revista Julgados do TAMG, Belo Horizonte, v. 53, p. 174, out-dez 1993), no qual reconheceu-se a culpa patronal, considerando, para tanto, e como razão de decidir, que "age com culpa o empregador, ante a inobservância das normas regulamentadoras da atividade laborativa, respondendo civilmente na hipótese de doença profissional conhecida como tenossinovite, adquirida pelo empregado, sendo devida a indenização a partir da data em que se iniciou o tratamento médico" (p. 312), citações colhidas de sua obra "Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador; 4ª. Edição, SP LTr, 2002.

                E, no caso dos autos, a evidência desta culpa está muito bem delineada e comprovada pela prova pericial acima reproduzida, apresentando-se claro que a reclamada, não obstante os riscos inerentes às condições ambientais de trabalho, notadamente quanto à rotina e dinâmica de trabalho a que esteve submetida a autora, em momento algum adotou as medidas preventivas necessárias para se evitar o seu adoecimento, negligenciando, assim, com seus deveres legais de cautela e legalidade, no sentido de propiciar um ambiente de trabalho ergonomicamente seguro e adequado, tanto que, desta sua negligência e omissão, advieram as lesões que acometem sua ex-empregada, tal como consta da prova técnica, não desconstituída por nenhum outro elemento probatório nos autos.

                Potanto, não há como negar a incidência da culpa como elemento caracterizador do dever de indenizar.

                Mas, mesmo que assim não fosse, a interpretação do disposto no inciso XXVIII, do artigo 7º da CF88, diante de quadros como o delineado neste provesso, deve ser realizada com acurada atenção, atentando-se, parece-nos óbvio, não apenas pela descrição apriorística do acidente de trabalho, senão pela investigação efetiva de suas causas, só assim se podendo aferir, com maior precisão possível, os elementos (filtros) da responsabilidade civil.

                E é nesse sentido que tenho afirmado que a responsabilidade civil se caracteriza, regra geral, frente a possíveis danos materiais (emergentes e lucros cessantes) e morais, quando presentes o ato ilícito (decorrente de ação dolosa ou culposa do causador de um dano), o dano e o nexo causal - deste último em relação aos dois antecedentes. Entretanto, e como já explicitado, é preciso acurada atenção na análise da presença desses requisitos (filtros) para a configuração do dever da reparação civil, notadamente quando ocorrido no ambiente laboral. É que, nessa hipótese, não se pode desprezar a presença do próprio fortuito interno, consiste no fato de que, ao lançar-se na exploração de um determinado empreendimento econômico, o empregador assume, até mesmo por força legal (art. 2º, da CLT), todos os riscos desse empreendimento, nisso estando incluído, por certo, a atenção e asseguração de um ambiente laboral sadio, salubre e não perigoso (resumidamente, o viés psicofísico da ambiência e saúde laboral), donde se conclui que, ocorrido acidente ou doença profissional, é da ordem natural das coisas que recaia sobre o empregador, a princípio, o ônus de comprovar ter assim gerido o ambiente ou método de trabalho.

                E, na construção ou apuração dessa investigação, em doutrina já se dizia, quando da análise acerca da distribuição do ônus de prova sobre os filtros da reparação civil (dano, nexocausal e culpa), quanto à presença do que se denominou chamar de prova diabólica. Nessa linha de raciocínio, o ofendido, além de lesado em seu patrimônio ou condição psicofísica, ainda se deparava com a difícil ou, às vezes, impossível missão de ter que provar a presença (ou ultrapassar as barreiras) de tais fatos ou elementos (verdadeiros filtros), sendo que, especialmente em situações como a em exame, não é ele o detentor desses meios de prova.

                Incide, na hipótese, o que se denomina fortuito interno que consiste em exigir do empregador a demonstração, de forma clara e inequívoca, que excludentes de culpabilidade comparecem ao caso, afastando-se o seu dever de reparar.

                E não poderia se fazer leitura diferente de nosso ordenamento jurídico, diante das relações laborais ou de emprego, à luz, por exemplo, do próprio Direito Civil, que admite ou disciplina o dever de reparar nas obrigações de terceiros e relações consumeristas, exemplificadas nas hipóteses de fatos do produto e do serviço, sem embargo de tantas outras que poderiam ser mencionadas. Vale dizer: sob o império de uma ordem constitucional que se propõe a valorizar elementos principiológicos como o da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, aliando a isso, sob o viés econômico, uma ordem econômica e social que igualmente se paute pela valorização do trabalho humano, pela função social da propriedade e buscando assegurar a todos existência digna e sob os ditames da justiça social, não parece razoável ou aceitável conceber outra conduta, senão a de que a distribuição do ônus probatório desses elementos (filtros) da reparação civil se faça ou se direcione no sentido de atribuir a quem efetivamente detém o poder de sua produção, no caso, o empregador.

                Parte-se, portanto, da própria existência do fortuito interno (lançar-se à exploração de uma atividade - econômica - que, pelo próprio dinamismo e operacionalidade dos meios de produção, no mundo moderno, já nos submete, em regra, a riscos) para se alcançar, ao fim e ao cabo, a aptidão para a prova. Ocorrido o dano (acidente ou doença profissional), atrelado ao trabalho desenvolvido (nexo causal ou concausal), a culpa inexistirá somente se comprovada alguma de suas excludentes, o que não ocorreu no presente caso, já que a reclamada não produziu qualquer prova nesse sentido.

                Nesse contexto, há de ser acolhida a conclusão da prova pericial, no sentido de que o trabalho executado na reclamada atuou como fator de surgimento da doença, sendo evidente a culpa da empresa.

                Assim, considerada a realidade fática demonstrada pelas provas dos autos, as atividades exercidas na ré acarretaram a lesão, configurando o nexo causal. E se o conjunto probatório revela que o trabalhador sofre sequelas de enfermidade surgida no ambiente de trabalho, caracteriza-se a doença ocupacional classificada como acidente do trabalho.

                À luz dos fundamentos expostos em linhas passadas, a culpa não existirá somente se comprovada alguma de suas excludentes, pela reclamada, que é quem detém a plena ou mais adequada aptidão para produzi-la, encargo do qual ela não se desincumbiu, reitere-se.

                Nesse contexto, ainda que não se aplique ao caso a responsabilidade objetiva do empregador, a conduta culposa da reclamada respalda responsabilidade civil pelos danos decorrentes da doença adquirida pela reclamante.

                E, no caso, pelos termos da prova produzida (não ilidida nos autos), o acometimento de doença do trabalho demonstra o descumprimento de normas de segurança que competiam à empresa, já que cumpre ao empregador fiscalizar as condições e o ambiente de trabalho ao qual submete os seus empregados, diligenciando, constantemente, no sentido de respeitar e aplicar as normas voltadas para a proteção da saúde do trabalhador, a teor do art. 157 da CLT.

                Das empresas, por sua função social, exige-se uma conduta pró-ativa de antecipação dos riscos para evitar que os equipamentos usados como fatores de sua produção venham a atingir os trabalhadores e sua higidez física.

                E se a conduta do empregador negligente não teve manifesta intenção de lesar o seu empregado, teve, a toda evidência, a intolerável indiferença em face dos previsíveis riscos da atividade laborativa prestada em condições inadequadas, conforme demonstrou a prova produzida.

                As eventuais medidas protetivas adotadas pela reclamada não a eximem de culpa pelos danos sofridos pela reclamante, pois não se mostraram suficientes à eliminação do risco - tanto assim, que a atividade laboral desencadeou a doença da autora.

                Verificou-se, portanto, a presença dos três elementos autorizadores do dever de reparar: a conduta irregular empresária, os danos causados ao autor (moral e material) e o nexo de concausalidade entre a conduta do empregador e os danos sofridos. Ressalta-se, ainda, o fortuito interno decorrente da atividade econômica desenvolvida pela reclamada, conforme já exposto.

                Em relação ao dano moral, este é sempre presumível em caso de doença/acidente do trabalho, prescindindo de prova, pois é desnecessário demonstrar o que ordinariamente acontece (art. 334, I, do CPC) e que decorre da própria natureza humana (dano in re ipsa).

                Quanto ao valor da indenização, ao contrário do dano material, o dano moral não pode ser quantificado pelos métodos comuns, pois não se mostra "líquido e certo", por sua própria natureza. Não obstante, será permitido atribuir-lhe valor que represente um desestímulo para a repetição de atos da mesma natureza, observando-se o princípio da razoabilidade e atentando-se para a gravidade do dano, a condição pessoal da vítima e do autor do ilícito, assim como para as circunstâncias do caso, de modo que se imprima à reparação uma função, a um só tempo educativa e inibitória, representando para a parte ofendida uma "compensação", como um lenitivo destinado a se contrapor à dor da ofensa. Não se estabelece na indenização pelo dano moral uma compensação aritméticomatemática, como no caso do dano material, mas algo que seja capaz de afagar o sofrimento da vítima, decorrente do mal perpetrado.

                A quantia arbitrada não pode significar o enriquecimento sem causa daquele que sofreu a lesão, nem tampouco resultar num valor irrisório que nada represente. Deve ser justa a indenização, fixada em patamares razoáveis, observando-se a gravidade da conduta do agressor, as circunstâncias da causa e a capacidade econômica das partes.

                Considerando os parâmetros acima transcritos, a sorte econômica das partes, o grau de culpa da empresa, a extensão da lesão e os elementos da responsabilidade civil, sem deixar de pontuar o caráter pedagógico dessa reparação, o valor arbitrado (R$ 20.000,00) mostra-se razoável, não havendo justificativa plausível para majorá-lo ou reduzi-lo.

                Por outro lado, o dano material, enseja reparação que corresponda ao dano emergente e aos lucros cessantes, entendendo-se como tais, respectivamente, aquilo que a vítima perdeu e o que deixou de ganhar em decorrência do dano, visando à recomposição do patrimônio do acidentado ao mesmo patamar existente antes do acidente, compreendendo ainda a pensão correspondente à importância do trabalho para o qual se inabilitou a vítima, ou da depreciação que ele sofreu, nos termos do artigo 950 do Código Civil.

                Esse é o entendimento que se extrai do art. 950 do CC, in verbis:

 

                "Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu".

 

                Quando a legislação civil aponta para o dever do empregador de reparar a lesão patrimonial sofrida pelo trabalhador, em razão da sua inabilitação, ainda que parcial, para o trabalho, a leitura desse dispositivo deve estar focada na própria atividade que esse empregado desenvolvia enquanto trabalhando para o beneficiário de sua força de trabalho.

                No caso, foi apurado pela prova técnica que, em razão da doença apresentada, a autora está incapacitada para o trabalho habitualmente executado na empresa ré. Note-se que, conquanto a redução da capacidade laboral tenha sido fixada pelo perito em 27%, o laudo ressalva que a autora apresenta restrições para o exercício das funções desempenhadas na reclamada, recomendando que não volte a realizá-las, sob pena de piora do seu estado de saúde. Transcreve-se:

 

                "Em decorrência da Patologia Osteomuscular-tendínea dos membros superiores, restou comprovada incapacidade laboral total e temporária no período de 04.11.2013 até 07.01.2014. Por ocasião da Perícia Oficial, considerando que a periciada ainda apresentava Sinais e Sintomas de Patologia osteomuscular Tendínea da qual foi acometida, considera o Perito Oficial que não deverá voltar a realizar às mesmas atividades laborais que desempenhava na Empresa reclamada, pela possibilidade de agudização e/ou até agravamento de Patologia da qual é portadora.

                (...)

                Restou comprovada por ocasião da perícia Oficial limitação funcional dos membros superiores da ordem de 27%. Apresenta ainda restrições para às mesmas atividades laborais que desempenhava na Empresa reclamada."

 

                O Juízo de Primeiro Grau considerou que não houve incapacidade permanente, sendo a limitação funcional restrita às atividades antes desempenhadas e, com tais fundamentos, indeferiu o pedido de indenização por danos materiais (pensão mensal e indenização por dano material).

                Data maxima venia do decidido, a reclamante tem direito a receber um valor mensal vitalício, a título de pensão, ainda que se mostre viável o exercício de outro trabalho.

                Na melhor exegese do artigo 950 do Código Civil, o fato de a incapacidade laborativa não ser total, o que, obviamente, obstaria o desempenho de qualquer outra atividade, mas, apenas parcial, não ilide o dever da reclamada de indenizar o empregado que teve, como consequência da conduta empresária negligente, sua ceifada sua capacidade de trabalho, ainda que apenas para a atividade habitualmente exercida por ela (auxiliar de produção).

                Assim, a sentença deve ser reformada no aspecto, para acrescer à condenação a indenização a título de danos materiais, quitada na forma de pensão mensal, conforme parâmetros a seguir expostos.

                Embora o art. 950 do Código Civil permita que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez, caso assim prefira o prejudicado, entende-se, no entanto, que o artigo em questão, quando autoriza a quitação, de uma só vez do valor desta indenização, não se compatibiliza com o Direito do Trabalho, e por isso, não tem aplicabilidade na seara trabalhista.

                Detendo a parcela natureza jurídica de alimentos, razoável e preferível que o seu pagamento se faça mensalmente, para fins de suprir as necessidades básicas do trabalhador além de outras, como as necessárias ao seu acompanhamento médico e psicológico. Assim, a regra legal em destaque se destina com maior afinação às relações de trabalho regidas no próprio Código Civil, comumente de curta duração ou de execução imediata, ao passo que, por regra e a princípio, as relações de emprego são, por característica, de trato sucessivo, renovando-se no tempo.

                E por se tratar de prestação continuada, havendo alteração da situação de fato, pode haver alteração quanto à natureza e até mesmo a continuidade ou permanência da obrigação, o que deverá ser apurado mediante ação própria, se for o caso.

                Logo, reputa-se mais razoável que a pensão seja quitada mensalmente e não em única vez, sendo devida desde a incapacitação (a partir de 04.11.2013, conforme fixado pelo Perito).

                A lei confere ao trabalhador uma indenização a fim de restituí-lo, em tese, ao seu estado anterior, qual seja, ao de não ter sofrido qualquer tipo de lesão. Ficou demonstrado nos autos que a reclamante possui hoje um minusvalia, que impossibilita o trabalho na função anteriormente exercida, o que enseja a reparação pretendida, tanto a título de danos morais quanto materiais.

                Pontue-se, por fim, que as questões relacionadas ao dano estético não devem ser sequer analisadas, pois não há pedido de indenização sob tal fundamento na petição inicial (ID 9446d2a).

                O recurso da reclamante deve ser parcialmente provido para acrescer à condenação a indenização a título de danos materiais, na forma de pensão mensal, correspondente ao valor da última remuneração, devida a partir de 04.11.2013 até o implemento da idade de 75 anos (nos limites do pedido) ou até seu falecimento, devendo a reclamada constituir capital para garantir o pagamento da pensão.

                A esse respeito, entende-se que para garantir o pagamento da pensão mensal e não correr o risco de as empresas rés, por inidoneidade financeira, deixarem de pagar o valor mensal fixado, deverá ser constituído um capital, representado por imóveis ou títulos da dívida pública, nos termos do artigo 533 do CPC/2015, que ficará gravado de inalienabilidade e de impenhorabilidade, até o final do cumprimento da obrigação, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão, nos termos da Súmula 313 do STJ (em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado).

                Pelas razões expostas, nego provimento ao recurso da reclamada e dou provimento parcial ao recurso da autora, nos termos dos fundamentos.

 

                3.2 - RECUROSO DA RECLAMADA - MATÉRIA REMANESCENTE

                3.2.1 - HONORÁRIOS PERICIAIS

                A reclamada postula a redução do valor arbitrado a título de honorários periciais, por reputá-lo exorbitante.

                Mantida a sucumbência da reclamada nas matérias objeto das perícias, é ela responsável pelo pagamento dos honorários periciais.

                O valor fixado pela sentença (R$ 1.000,00) é razoável e adequado para remunerar o trabalho pericial realizado nos autos, e foi arbitrado em patamares convergentes com os requisitos da qualidade e horas de trabalho, remunerando condignamente o perito do juízo pelo trabalho realizado neste processo, sendo, ademais, compatível com os valores que adotados por esta d. Turma em casos semelhantes.

                Nada a prover.

 

                4 - CONCLUSÃO

                Conheço do recurso ordinário interposto pela autora e, no mérito, dou-lhe provimento parcial, para acrescer à condenação da reclamada indenização a título de danos materiais, na forma de pensão mensal, correspondente ao valor da última remuneração recebida, devida a partir de 04.11.2013 até o implemento da idade de 75 anos (nos limites do pedido) ou até seu falecimento, devendo a reclamada constituir capital para garantir o pagamento da pensão.

                Conheço do recurso ordinário adesivo interposto pela reclamada e, no mérito, nego-lhe provimento.

                Mantido o valor da condenação, porque compatível.

 

                FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Primeira Turma, hoje realizada, preliminarmente, à unanimidade, conheceu dos recursos ordinários interpostos; no mérito, sem divergência, deu provimento parcial ao recurso da autora para acrescer à condenação da reclamada indenização a título de danos materiais, na forma de pensão mensal, correspondente ao valor da última remuneração recebida, devida a partir de 04.11.2013 até o implemento da idade de 75 anos (nos limites do pedido) ou até seu falecimento, devendo a reclamada constituir capital para garantir o pagamento da pensão; unanimemente, negou provimento ao recurso da reclamada. Ficou mantido o valor da condenação, porque compatível.

                Tomaram parte no julgamento os Exmos. Desembargadores: Emerson José Alves Lage (Relator), José Eduardo de Resende Chaves Júnior (Presidente) e Maria Cecília Alves Pinto.

                Presente ao julgamento, a il. representante do Ministério Público do Trabalho, Dra. Maria Christina Dutra Fernandez.

                Belo Horizonte, 21 de novembro de 2016.

 

EMERSON JOSÉ ALVES LAGE

Desembargador Relator

 

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 28.11.2016)

BOLT8106---WIN/INTER

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