EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PREFEITO MUNICIPAL - VERBAS DE INDENIZAÇÃO DE VIAGENS - PRINCÍPIO DA LEGALIDADE - ENRIQUECIMENTO ILÍCITO - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF36887 - BEAP

 

 

                1. As verbas de indenização por deslocamento de viagens realizadas no curso do mandato de prefeito devem ser pagas somente quando instituídas por lei. 2. Ofende o princípio da legalidade o pagamento de verbas de indenização sem prévia previsão legal (lei em sentido estrito). 3. É de serem ressarcidos aos cofres do Município os valores recebidos por prefeito municipal a título de indenização por deslocamento/viagens, por ausência de previsão legal da verba. 4. Configura-se ato de improbidade administrativa aquele gerador de enriquecimento ilícito em virtude do exercício de mandato político, importando em proveito econômico, por inteligência do art. 9º, da Lei federal nº 8.429/1992.

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0378.06.021196-8/001 - Comarca de ...

 

Apelante(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Apelado(a)(s): ...

Interessado(s): Município ...

 

A C Ó R D Ã O

 

                Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, À UNANIMIDADE, EM DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

 

DES. OLIVEIRA FIRMO

Relator

 

V O T O

 

                I. RELATÓRIO

                Trata-se de APELAÇÃO interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS da sentença (f. 710-719), prolatada nos autos da "AÇÃO CIVIL PÚBLICA" por ele proposta em face de ..., ex-prefeito municipal de .../MG. O pedido foi julgado improcedente, sob o fundamento de que a ausência de comprovação das despesas de viagem não configura ato de improbidade administrativa, vez que não existe obrigação legal, e, acaso existente, não restou comprovado o dolo do agente. Condenou o ESTADO ao pagamento de R$ 1.000,00 (um mil reais) a título de honorários da advogada dativa. Sem custas e honorários de sucumbência.

                O apelante alega, em síntese, que:

 

                a) - os valores pagos a título de diárias de viagem eram exorbitantes; b) - havia valores de diárias para um mesmo local, embora em menor número de dias, superior àqueles demais dias; c) - há prova de que no dia 21.2.2005 não esteve ausente do Município, e, mesmo assim, percebeu diária de viagem; d) - também restou comprovado o recebimento de 2 (duas) diárias distintas para um mesmo período de viagens por 2 (dois) Estados ao mesmo tempo; e) - não havia "relatório circunstanciado e de qualquer documento que comprovasse terem as viagens e os gastos realmente ocorrido, despesas de viagem". Requer o provimento do recurso, com a reforma da sentença (f. 722-735).

 

                Contrarrazões: não conhecimento ou provimento do recurso (fls. 797-803).

                Procuradoria de Justiça: pela reforma da sentença, com a condenação do requerido em ato de improbidade, além de cassar a condenação do Estado em pagamento de honorários advocatícios (fls. 748-756).

                Preparo: isento (art. 10, VI da Lei estadual nº 14.939/2003). É o relatório.

 

                II. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

                Não indicou o apelado qualquer ausência de requisito de admissibilidade que impedisse o conhecimento do recurso. Além, verifica-se que as razões de apelação têm correlação com o decidido na sentença, o recurso é tempestivo, e, o MINISTÉRIO PÚBLICO tem interesse em recorrer vez que julgada improcedente a ação por ele proposta.

                Assim, e vistos os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DA APELAÇÃO.

 

                III. MÉRITO

                III - a)

                O art. 29, V da CF trata da remuneração dos prefeitos, determinando a sua fixação pelas respectivas câmaras municipais, por meio de subsídio, observado o que dispõe a Constituição Federal (CF) e os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica. (1)

                No tangente às verbas indenizatórias, o §11 do art. 37 da CF dispõe que: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos

                Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

 

                .......................................................................

                XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsidio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

                .......................................................................

                §11. Não serão computadas, para efeito dos limites remuneratórios de que trata o inciso XI do caput deste artigo, as parcelas de caráter indenizatório previstas em lei. (negrejei)

 

                Na espécie, o requerido/apelado não nega o recebimento das verbas indenizatórias, apenas defende a sua legalidade, decorrente da pertinência com o exercício do mandato de prefeito municipal. Além, diz que as verbas indenizatórias foram recebidas em decorrência de viagens realizadas no período em que ainda vigia o enunciado nº 82 do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG), cancelado em 26.11.2008, que dispunha:

                As despesas de viagem do Chefe do Executivo Municipal são regulares se acompanhadas do relatório dos gastos feitos.

                A questão primordial, pois, a ser analisada envolve a (im)possibilidade do pagamento das indenizações ao requerido apenas com base em norma infralegal, pois revela-se prejudicial aos demais pontos discutidos.

 

                III - b)

                A autonomia político-administrativa dos municípios concerne ao arranjo dos entes federados e nas suas relações institucionais, isso no plano do pacto federativo. Outra coisa será, ainda, a organização dos poderes no interior desses entes federados.

                No campo das competências, a partir da Constituição Federal, cada instrumento normativo fundamental dos entes federados estabelece as balizas para o exercício do poder. Assim, deve constar a organização dos poderes seja nas constituições estaduais, bem como nas leis orgânicas municipais. Nesses diplomas repousam previstos todos os instrumentos normativos e outros que cada órgão de poder lança mão para cumprir o seu respectivo mister.

                Não restou comprovado nos autos qualquer norma que autorize o pagamento de diárias ao prefeito municipal. Além, a interpretação sistemática da CF determina que a despesa pública esteja vinculada à autorização legal (lei em sentido estrito).

                Impede ressaltar que, nos termos do art. 37 da CF, a Administração Pública, extensível aos seus servidores, devem obediência ao princípio da legalidade, bem como à moralidade. Destarte, toda e qualquer atividade administrativa, e, como consectário qualquer ato administrativo, deve estar condizente com a lei e com o princípio da moralidade, além de outros. Assim, e ao contrário das relações do campo privado, no qual é permitido fazer tudo o que a lei não proíba, no campo administrativo somente é permitido fazer aquilo que previsto em lei.

 

                III - c)

                Cumpre perquirir, então, se os fundamentos aduzidos pelo requerido convencem da legitimidade das verbas que percebeu. Entendo que não. Isso porque tais verbas indenizatórias não têm qualquer lastro em lei no sentido estrito, assim prevista no referido §11 do art. 37 da CF.

                E, em que pese haja previsão no Estatuto dos Servidores Públicos Municipais do pagamento de diárias, tem-se que tal norma não se aplica aos prefeitos municipais, porquanto são detentores de mandato eletivo, e não são servidores públicos, strictu sensu.

                São, pois, agentes políticos e entretêm com o Estado vínculo de natureza exclusivamente política; exerce múnus público de representação e sua condição de cidadão é que os qualifica para o exercício das funções. Os prefeitos municipais, detentores de mandato eletivo, não ocupam cargo público isolado.

                Tampouco se podem considerar os vereadores trabalhadores urbanos para fins do art. 7º, VIII, da CF, posto que não mantenham com o Estado relação de trabalho de natureza profissional e caráter não eventual, sob dependência.

                Pesa considerar que o STF firmou entendimento no sentido de que o agente político, detentor de cargo eletivo, não se enquadra no conceito de trabalhador, pondo-o a salvo da incidência de contribuição previdenciária prevista no art. 195, II, da CF (com redação anterior à EC nº 20/1998).(2)

                Nesse sentido, confira-se excerto de voto do Min. EROS GRAU: O Pleno do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 351.717,

                Relator o Ministro Carlos Velloso, acórdão publicado no DJ de 21.11.2002, declarou a inconstitucionalidade da alínea "h" do inciso I, do artigo 12 da Lei 8.212/91, introduzida pela lei nº 9.506/97 (artigo 13, §1º), que inseriu no rol dos segurados obrigatórios da previdência social "o exercente de mandato eletivo, desde que não vinculado a regime próprio de previdência social".

                O Supremo afirmou que a lei não poderia "criar figura nova de segurado obrigatório da previdência social, tendo em vista o disposto no art. 195, II, CF." (redação anterior à EC 20/989) se referir a contribuição de trabalhadores, e a tanto não se equipara o agente político. A Lei 9.506/97 teria instituído nova fonte de custeio da seguridade social, para a qual era exigível a edição de lei complementar. (STF, T1, RE nº 307529 AgR-ED/PR, j. 21.2.2006, DJ 24.3.2006).

                O desempenho do mandato eletivo não é profissão no sentido ético-jurídico; é atividade nobre e honrosa, exercida, até bem pouco tempo no Brasil, sem qualquer remuneração, de modo gratuito e espontâneo, por ser em favor da polis, ou da civitas, da coisa pública, do interesse geral. Estou em que o regime constitucional dos estipêndios do chefe do Poder Executivo vai ao encontro do princípio da participação política popular, estruturante do Estado Democrático de Direito. Por um lado, a garantia de remuneração favorece o exercício da política por pessoas mais pobres, que não podem abrir mão do salário sem prejuízo da própria sobrevivência. Por outro lado, a proibição de recebimento de qualquer outra espécie remuneratória além do subsídio desestimula o surgimento do "político profissional", no sentido pejorativo da expressão, que representa a mesquinha figura daquele que, do múnus de representação popular, faz profissão e meio de vida, acomodando-se no que de confortável há no exercício do poder.

 

                III - d)

                Considerando que as aludidas verbas de indenização somente por lei em sentido estrito, formal, poderiam ter sido instituídas (princípio da legalidade), tem-se por ilegal o pagamento realizado em favor do requerido.

                Prejudicados, pois, os demais fundamentos aduzidos em defesa (prestação de contas, alegada pertinência das viagens e enunciado revogado de súmula do TCEMG), visto que pressupõem a possibilidade de instituição das verbas por meio do referido decreto, o que, como visto, é vedado.

                Acaso se ultrapassasse tal entendimento, tem-se que nos autos restaram comprovadas diversas irregularidades no pagamento das diárias. Além da ausência de valor definido, o que ocasionava o pagamento de valores de 2 (dois) dias equivalente ao de 3 (três) dias em viagem para um mesmo destino, tem ainda o pagamento de diárias sem a realização de viagem, como no dia 21.2.2005 em que recebeu diária de viagem para o MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE, mas não saiu do MUNICÍPIO DE .../MG,

sendo notificado por Oficial de Justiça, bem como assinado portaria de nomeação no mesmo dia (f. 50-55).

                Quando do inquérito civil, esclareceu o requerido apenas que "nem sempre o Chefe da Administração Pública pode se ausentar do município como sempre planeja, as vezes planeja viajar em um dia, e por motivos de forças maior somente consegue sair em outro" (f. 59). Não há problema algum nesse fato; bem sabido que as atribulações do comando do Executivo municipal causam diversos imprevistos, com adiamento de compromissos. Todavia, havendo adiamento de viagem, não pode o prefeito receber diária por dia em que não viajou. E, reitere-se: que nem há previsão legal para recebimento de diária de viagem pelo prefeito.

                Também há dia em que recebeu diária por estar em BELO HORIZONTE/MG e em BRASÍLIA/DF ao mesmo tempo, desafiando a prova de ser portador do dom da ubiquidade.

                Por fim, tem-se que os relatórios de viagem destacavam apenas o período, o local de destino, o valor e a finalidade das viagens (f. 176-216). E, tal como decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 880662/MG, "Simples relatórios indicativos apenas do motivo da viagem, do número de viajantes e do destino são insuficientes para comprovação de despesas de viagem”. (3)

                Assim, e presentes todas as irregularidades acima destacadas, além da ausência de previsão legal para pagamento de diárias, impõe-se a condenação do requerido ao ressarcimento dos valores recebidos a título de indenização, durante o exercício do mandato de Prefeito Municipal de Lambari/MG, aqui limitado a jan./2005 a mai./2006, como requerido na inicial.

 

                III - e) - Da improbidade administrativa

                Nos termos do art. 9º, da Lei federal nº 8.429/1992, configuram-se como atos de improbidade administrativa aqueles que importam em enriquecimento ilícito em virtude de exercício de mandato municipal auferindo vantagem patrimonial indevida e que causa lesão ao erário municipal. (4)

                No caso, o recebimento de verbas indenizatórias, sem prévia previsão legal, e sem comprovação da realização das viagens, configura dano ao erário, e enriquecimento ilícito, e, como consectário, ato de improbidade administrativa, por ofensa ao princípio da legalidade.

 

                III - f) - Da pena

                Nos termos do art. 12 da Lei nº 8.429/1992, ao fixar as sanções cabíveis, deve-se analisar a extensão do dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente. Vejamos:

 

                Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:

                I - na hipótese do art. 9º, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

                .......................................................................

                Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

                No caso, o requerente pleiteou a aplicação da pena de restituição dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio do requerido.

 

                Assim, constatado o proveito patrimonial do requerido quanto aos valores recebidos a título de indenização pelas viagens realizadas durante o período de jan./2005 a mai./2006, no curso do mandato, o requerido ..., deverá ressarcir ao referido Município, as quantias por ele recebidas, a serem apuradas em liquidação de sentença.

                Lado outro, tem-se que é extremamente reprovável a conduta do chefe do executivo municipal, que deve observância ao princípio da legalidade, e da moralidade pública na condução e administração das receitas e despesas do Município.

                Assim, e considerando que o requerido é dedicados à vida política municipal; que a conduta por ele praticada é reprovável, condeno-o, ainda, na suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (três) anos, nos termos do art. 12, I da Lei nº 8.249/1992. Deverá, ainda, pagar multa civil no valor de 3 (três) vezes o valor do dano ao erário.

 

                III - g) - Dos juros e da correção monetária

                Sobre a condenação de ressarcimento dos valores indevidamente recebidos pelo requerido incidem juros e correção monetária. Destarte, a partir da citação, termo inicial dos juros de mora, devem incidir juros de 1% (um por cento) ao mês até a data do efetivo pagamento e correção monetária, pelo IPCA, desde cada recebimento indevido.

 

                V - CONCLUSÃO

                POSTO ISSO, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO para reformar a sentença, e julgar procedente o pedido inicial, condenando ... em ato de improbidade administrativa, e nas sanções descritas na fundamentação.

                Custas: pelo requerido.

Sem honorários recursais, vez que se trata de AÇÃO CIVIL PÚBLICA proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS.

                É o voto.

                DES. WILSON BENEVIDES

                Acompanho o judicioso voto proferido pelo Em. Desembargador Relator, para dar provimento ao recurso e julgar procedente a Ação Civil Pública, condenando o requerido pela prática de atos de improbidade.

                Isso porque, ainda que não compartilhe do mesmo entendimento do II. Desembargador Relator de que a indenização por viagens realizadas em serviço devem ser instituídas por lei em sentido estrito, o acervo probatório permite extrair diversas irregularidades no pagamento das diárias ao réu.

                Há elementos de prova que indicam o pagamento em duplicidade de diárias de viagens, bem como o ressarcimento de valores desembolsados em viagem supostamente ocorrida em data na qual o Prefeito encontrava-se na cidade de Lambari, sem olvidar as quantias astronômicas para a época.

                Verifica-se, ainda que os relatórios das viagens vieram desacompanhados de qualquer comprovante de despesas com hospedagem, alimentação, etc.

                Desse modo, conclui-se que as despesas de viagens não atendem ao interesse público, mormente porque o relatório tal qual confeccionado sequer permite que seja feito um controle dos gastos ali realizados, dada a insuficiência de dados quanto à destinação dos recursos empenhados.

                A propósito, no REsp 880662/MG, o Ministro Relator Castro Meira elucidou que "simples relatórios indicativos apenas do motivo da viagem, do número de viajantes e do destino são insuficientes para comprovação de despesas de viagem".

                Ademais, nos termos do artigo 70, parágrafo único, da Constituição da República, é dever do agente público prestar contas de seus atos, seja ao Poder Legislativo, seja à população. Na sua falta, torna-se dificultosa ou praticamente impossível o controle de sua atuação.

                Estabelece o citado dispositivo: Art. 70. (omissis)

                Parágrafo único: Prestará contas qualquer pessoa física ou entidade pública que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos ou pelos quais a União responde, ou que, em nome dela, assuma obrigações de natureza pecuniária.

                Desse modo, não havendo justa razão que legitime o descumprimento de regramento normativo quanto à forma de prestação de despesas com viagens, a conduta narrada na exordial leva a entender senão pela má-fé do demandando.

                Importa frisar que, ainda que as contas do Prefeito Municipal tenham sido aprovadas pelo Tribunal de Contas, nada obsta que o Poder Judiciário examine a questão sob outra ótica, notadamente diante da previsão do artigo 21, II, da Lei de Improbidade, no sentido de que "a aplicação das sanções previstas nesta lei independe (...) da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo tribunal ou conselho de contas".

                É, pois, evidente que os princípios informadores da administração pública, notadamente os que se referem à moralidade, à impessoalidade, à preponderância do interesse público sobre o particular foram malferidos a partir da conduta irresponsável assumida pelo requerido.

                Assim sendo, diante do caso concreto, reputo razoáveis e proporcionais as penalidades aplicadas no voto da relatoria, consistente no ressarcimento do valor das viagens, na suspensão de direitos políticos pelo prazo de 08 anos e multa civil no importe de três vezes o valor do dano.

                É como voto.

                DESA. ALICE BIRCHAL - De acordo com o(a) Relator(a).

Súmula - "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO"

 

                1 - V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I; (...).

                2 - Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

 

                .......................................................................

                II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (negrejei).

 

                3 - REsp 880662/MG - T2 - Rel. Min. CASTRO MEIRA - j. 15.2.2007 - Dje 1.3.2007.

                4 - Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta lei, e notadamente:

 

                I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

                .......................................................................

                XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

                XI - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1ºdesta lei.

 

 

BOCO9619---WIN/INTER

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