APELAÇÃO CÍVEL - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL DE NOVA SERRANA - APOSTILAMENTO - PREVISÃO NA LEGISLAÇÃO LOCAL - INCONSTITUCIONALIDADE E NÃO RECEPÇÃO - PRECEDENTES DO ÓRGÃO ESPECIAL - DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS - MEF36904 - BEAP

 

 

                1- O apostilamento qualifica-se como garantia conferida ao servidor público efetivo, consubstanciada na continuidade da percepção da remuneração referente ao cargo em comissão que haja exercido por determinado interstício; 2- A Lei Municipal nº 1.562/2000 previa que o servidor que completasse cinco anos de exercício de cargo comissionado teria seu vencimento equiparado àquele de maior valor, desde que o tivesse exercido, no mínimo, pelo período de dois anos; 3- O Órgão Especial deste Tribunal de Justiça já reconheceu a inconstitucionalidade de leis municipais que concedem o apostilamento após a Emenda à Constituição Federal nº 19/1998 e Emenda à Constituição Estadual nº 57/03, bem como a não recepção dos dispositivos de leis municipais editadas anteriormente à Constituição Estadual e que com ela sejam conflitantes.

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0452.17.003698-5/001 - Comarca de ...

 

Apelante(s): Fundo Previdenciário Municipal de ..., ...

Apelado(a)(s): Município de ...

 

A C Ó R D Ã O

 

                Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em <NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO>.

 

DES. RENATO DRESCH

Relator

 

V O T O

 

                Trata-se de Apelação Cível interposta nos autos da ação declaratória c.c. cobrança ajuizada por ..., perante o Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de ..., em face do Município de ..., em que se pretende, em suma, a declaração da estabilidade financeira/apostilamento, com base na Lei Municipal nº 1.562/2000, equiparando-se os vencimentos do cargo efetivo aos do cargo de Secretário Municipal, bem como a condenação ao pagamento da estabilidade financeira desde a data do requerimento administrativo.

                Foi proferida sentença às fls.73/75v., pelo Juiz Rômulo dos Santos Soares, que julgou improcedente o pedido, diante do reconhecimento da inconstitucionalidade do §1º do art. 1º da Lei Municipal nº 1.562/2000.

                Condenou, ainda, o autor ao pagamento das custas e nos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00.

                Foi interposta apelação pelo autor às fls. 77/86 afirmando, em preliminar, que a sentença concentrou sua fundamentação somente na inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 1.562/2000 perante a Constituição Estadual. Pede seja declarada nula a sentença, cassando a decisão. Entende, por ter preenchido os requisitos da lei, faz jus ao apostilamento. Pede reforma da sentença.

                Contrarrazões às fls.90/93. É o relatório.

                Conheço do recurso voluntário, uma vez presentes os pressupostos de admissibilidade.

                A controvérsia se trata em verificar se o autor, servidor do Município de Nova Serrana, faz jus ao apostilamento no Cargo de Secretário Municipal.

                O apostilamento qualifica-se como garantia, conferida ao servidor público efetivo, consubstanciada na continuidade da percepção da remuneração referente ao cargo em comissão, que haja exercido por determinado interstício.

                No âmbito do Município de Nova Serrana, a Lei nº 1.562/2000 dispunha que:

 

                Art. 1º. O art. 104 da Lei 1.548, de 11/02/2000, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Nova Serrana, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos:

                Parágrafo 1º - O servidor que completar cinco anos, consecutivos ou não, de exercício de cargo comissionado terá seu vencimento equiparado àquele de maior valor, desde que o tenha exercido, no mínimo, pelo período de dois anos.

                Parágrafo 2º - Na hipótese deste artigo, a gratificação de função será equiparada ao vencimento do servidor, para todos os efeitos legais.

                Parágrafo 3º - A equiparação referida neste artigo integra o vencimento para todos os efeitos legais, inclusive para aposentadoria.

 

                Contudo, a Emenda à Constituição Estadual de Minas Gerais 57/2003, que alterou o art. 121 do Ato das Disposições Transitórias, dispõe:

 

                Art. 121 - Ficam revogadas as legislações dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Tribunal de Contas e do Ministério Público referentes a apostilamento em cargo de provimento em comissão ou função gratificada. (grifei)

 

                § 1º Fica assegurado ao servidor ocupante de cargo de provimento efetivo  o direito de continuar percebendo, nos termos da legislação vigente até a data de promulgação desta emenda à Constituição, a remuneração do cargo em comissão ou função gratificada que exerça nessa data, quando dele for exonerado sem ser a pedido ou por penalidade ou quando se aposentar, ficando garantido, para esse fim, o tempo exercido no referido cargo de provimento em comissão ou função gratificada até data a ser fixada em lei.

                § 2º Os Poderes e órgãos a que se refere o "caput" deste artigo encaminharão, no prazo de sessenta dias contados da promulgação desta emenda à Constituição, projeto de lei contendo as regras de transição.

                § 3º Para o Poder ou órgão que não cumprir o prazo previsto no § 2º, adotar-se-á a data de 29 de fevereiro de 2004 como limite para contagem do tempo para efeito de apostilamento. (grifei).

 

                Assim, o instituto do apostilamento foi extinto do ordenamento jurídico pela Emenda Constitucional nº 57/2003 (Constituição Estadual), bem como pela Emenda Constitucional nº 19/1998 (Constituição Federal).

                Não obstante o § 1º, do art. 165, da Constituição Estadual reconhecer a autonomia política, administrativa e financeira dos municípios, a autonomia político-administrativa do Município sofre limitação quanto aos princípios e normas de observação obrigatória previstos na Constituição.

                Verifica-se que, ao exercer o controle de constitucionalidade de normas municipais editadas após a extinção do apostilamento em âmbito estadual, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem decidido que o instituto, após o advento da Emenda nº. 57/2003 revela-se inconstitucional.

                Assim já se manifestou o Órgão Especial do TJMG:

 

                Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador- Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais em face dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 2º, bem como dos arts. 3º, 4º, 5º e 6º, todos da Lei Complementar nº 163/2011, do Município de Divinópolis, que extinguiu o direito à aquisição da estabilidade financeira (apostilamento) no âmbito municipal e estabeleceu regras de transição para regulamentar a situação de servidores que completassem os requisitos necessários ao apostilamento até 31 de dezembro de 2011. A Relatora, Des.ª Vanessa Verdolim, entendeu pela inconstitucionalidade das normas questionadas, sob o fundamento de que violam o art. 37, V, da CF/88, com a redação dada pela EC nº 19/1998 e art. 23, caput, da Constituição Estadual, com a redação dada pela EC nº 57/2003, que estabelecem a limitação quanto à natureza das atribuições dos cargos em comissão, destinados exclusivamente às funções de direção, chefia e assessoramento. Assim, a lei em exame revela-se flagrantemente inconstitucional ao resguardar a servidores públicos efetivos a percepção de verba essencialmente dirigida à remuneração do exercício das funções de direção, chefia e assessoramento. Esse entendimento foi compartilhado pela maioria dos Desembargadores do Órgão Especial, que julgou procedente a representação. Em sentido contrário, merece destaque a divergência inaugurada pelo Des. Bittencourt Marcondes, que não vislumbrou qualquer ofensa à norma do art. 23, caput, da Constituição Estadual. Em seu voto vencido, o Desembargador ressaltou que o apostilamento não garante ao servidor o direito de permanecer no cargo em comissão após a exoneração, mas sim possibilita a aquisição de vantagem pecuniária em valor igual à diferença entre o valor da remuneração do cargo em comissão e o valor da remuneração do cargo efetivo. Asseverou que o fato de o direito ter sido extirpado da Constituição do Estado não significa obstáculo à previsão dessa vantagem no âmbito do Município, que tem autonomia político-administrativa para dispor acerca de seus próprios servidores, por meio de lei de iniciativa do Prefeito. (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.0000.14079551-9/000, Rel.ª Des.ª Vanessa Verdolim Hudson Andrade, DJe disponibilizado em 25.06.2015.) (grifei)

 

                Outrossim, foi ajuizada Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.0000.17.078720-4/000 das leis municipais nº 1.562/2000 e 2.250/2014 de Nova Serrana, que dispõem sobre a incorporação de gratificação de função no âmbito do Poder Legislativo e Executivo do Município, pelo Procurador- Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais.

                Entretanto, diante da Lei nº 2.486, de 09.10.2017, que revogou a Lei nº 1.562/2000, a ação foi extinta por perda de objeto, nos termos do art. 485, VI, do CPC/15.

                Não obstante, como o instituto do apostilamento foi extinto no ordenamento jurídico, por força da EC nº 19/98, assim como pela Emenda à Constituição Estadual nº 57/2003, não há como deferir a pretensão do autor.

                Esse é o entendimento deste Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

 

                EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA - SERVIDOR PÚBLICO - MUNICÍPIO DE NOVA SERRANA - APOSTILAMENTO - LEI 1.562/2000 E 1823/2005 - NÃO RECEPÇÃO - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 53/2003 - VEDAÇÃO EXPRESSA - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - PRECEDENTES

                - DESPROVIMENTO.

                - Não obstante o § 1º, do art. 165, da Constituição Estadual reconheça a autonomia política, administrativa e financeira dos municípios, necessário ressalvar que sua Lei Orgânica e demais leis locais devem observar os princípios da Constituição da República e da Carta Estadual. (Apelação Cível 1.0452.15.003331-7/001. Relator:

                Des. Carlos Levenhagen. Órgão Julgador: 5ª Câmara Cível. Data de Julgamento: 13/04/2018. Publicado em 18.04.2018)

                EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PRELIMINAR - DECADÊNCIA - REJEIÇÃO - APOSTILAMENTO - EMENDA CONSTITUCIONAL N. 57/2003 - EXPRESSA VEDAÇÃO - LEI MUNICIPAL - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO - SENTENÇA MANTIDA.

                - Não há que se falar em decadência para administração rever os atos eivados de ilegalidade, em busca do ressarcimento ao erário, nos termos do artigo 37, §5º da Constituição Federal.

                - Consiste o instituto do apostilamento no benefício concedido ao servidor público, detentor de cargo efetivo, que após exercer cargo comissionado por um determinado período de tempo estabelecido em lei, retorna ao cargo de origem ou aposenta-se, com a prerrogativa de permanecer recebendo a remuneração equivalente ao cargo em comissão por ele antes ocupado.

                - O apostilamento foi extirpado do nosso ordenamento jurídico, por força da Emenda à Constituição da República nº 19 de 1998, assim como pela Emenda à Constituição Estadual nº 57 de 2003.

                - Ainda que invocada a autonomia municipal para legislar sobre os direitos e deveres dos servidores que lhe são afetos, resta evidente que as leis municipais devem ser elaboradas em compatibilidade com os comandos orientadores da administração pública previstos nos textos constitucionais, cabendo aos municípios afastar a possibilidade de restabelecimento de benefícios controvertidos, sob pena de violação aos princípios previstos no artigo 37, da Constituição da República, assim como do artigo 13, da Constituição Estadual.

                - A continuidade da situação posta nos autos, com o pagamento dos vencimentos correspondentes ao cargo comissionado aos servidores do Município de Veríssimo indevidamente apostilados, implica em ofensa à Constituição Federal e ao princípio da simetria. (Apelação Cível 1.0701.15.023826-2/001. Relator: Des. Paulo Balbino. Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível. Data de Julgamento: 07.12.2017. Publicado em 23.01.2018)

 

                Portanto, impõe-se a improcedência do pedido. Diante do exposto, nego provimento ao recurso.

                Respeitados os limites definidos pelo art. 85, § 3º, I, do CPC/15, majoro os honorários para R$ 1.800,00, nos termos do art. 85, §§ 1º e 11, do CPC/15.

                Custas na forma da lei.

                DES. KILDARE CARVALHO - De acordo com o(a) Relator(a).

                DES. MOREIRA DINIZ - De acordo com o(a) Relator(a).

 

Súmula - "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO"

 

 

BOCO9622---WIN/INTER

REF_BEAP