EXECUÇÃO DO SÓCIO CEDENTE OU RETIRANTE - INCLUSÃO NA AÇÃO DEPOIS DE TRANSCORRIDOS MAIS DE DOIS ANOS DA AVERBAÇÃO DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF37717 - LT

 

PROCESSO TRT/RO Nº 01463-2011-043-03-00-1

 

Agravantes: Maria Cecília Ribeiro de SÁ Rodrigues e Outros

Agravados: (1) Paulo César Brunetto

                      (2) Medicina UDI Serviços Ltda. - ME e Outra

                      (3) Adriana Silva Saraiva e Outros

 

E M E N T A

 

                EXECUÇÃO DO SÓCIO CEDENTE OU RETIRANTE. INCLUSÃO NA AÇÃO DEPOIS DE TRANSCORRIDOS MAIS DE DOIS ANOS DA AVERBAÇÃO DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. Como bem se sabe, uma vez insolvente a pessoa jurídica, respondem os seus sócios pelas dívidas por ela contraídas, em face da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, plenamente aplicável ao Processo do Trabalho, em que os créditos têm natureza alimentícia e, ainda, em face da proteção ao empregado hipossuficiente. Outrossim, é certo que o sócio cedente responde, solidariamente, perante a sociedade e terceiros pelas obrigações que tinha como sócio até 02 (dois) anos depois de averbada a alteração contratual, atinente ao seu afastamento, a teor do parágrafo único do art. 1.003 do Código Civil Brasileiro. Como, no caso específico dos autos, a retirada do sócio ocorreu de forma regular, com transferência total de suas quotas do capital social da empresa para os sócios remanescentes, tendo sido a alteração contratual devidamente averbada perante a Junta Comercial respectiva, em data muito anterior (quase seis anos) a partir do momento em que a execução voltou-se contra ele (inclusão no polo passivo da demanda), resta nitidamente afastada a responsabilidade do sócio retirante e seus herdeiros, o que se faz em nome do princípio da segurança jurídica que deve pautar os atos jurídicos praticados pelas partes.

                Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Agravo de Petição, interposto em face da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia/MG, em que figuram, como Agravantes, MARIA CECÍLIA RIBEIRO DE SÁ RODRIGUES E OUTROS, e, como Agravados, PAULO CÉSAR BRUNETTO, MEDICINA UDI SERVIÇOS LTDA. - ME E OUTRA, ADRIANA SILVA SARAIVA E OUTROS.

 

R E L A T Ó R I O

 

                O MM. Juiz Marco Aurélio Marsiglia Treviso, em exercício na 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia/MG, através da decisão de fls. 651/652, julgou improcedentes os Embargos à Execução em relação aos embargantes Maria Cecília Ribeiro de Sá Rodrigues, Luis Maria Ribeiro de Sá e José Maria Ribeiro de Sá, e procedentes em relação à embargante Cecília Mercedes MCGuire Ribeiro de Sá.

                Inconformados com a prestação jurisdicional de primeira instância, Maria Cecília Ribeiro de Sá Rodrigues, Luis Maria Ribeiro de Sá e José Maria Ribeiro de Sá interpuseram o Agravo de Petição de fls. 659/669.

                Contraminuta ofertada pelo Exequente, às fls. 673/676.

                Dispensada a remessa dos autos à PRT, uma vez que não se vislumbra interesse público capaz de justificar a intervenção do Órgão no presente feito (artigo 82, II, do RI).

                É o relatório.

 

                VOTO

                JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

                PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO AGRAVO DE PETIÇÃO INTERPOSTO

                Suscita o Exequente a preliminar de não conhecimento do agravo interposto, por ausência de garantia do Juízo e por falta de delimitação da matéria e dos valores impugnados.

                Sem razão, contudo.

                Ao contrário do alegado pelo Exequente, o Juízo encontra-se garantido, conforme se observa dos depósitos realizados às f. 611 e seguintes, em nada alterando este fato, a circunstância de ter sido determinada a exclusão da meeira do sócio retirante do polo passivo da demanda.

                Já em relação à delimitação da matéria e dos valores impugnados, tem-se que é inquestionável a exigência contida no artigo 897, § 1º, da CLT, a qual visa proporcionar maior celeridade ao processo de execução trabalhista e a rápida satisfação da parte remanescente incontroversa.

                Contudo, versando o Agravo sobre o alcance da responsabilidade do ex-sócio na execução e de seus herdeiros, tem-se que os Agravantes indicaram nas razões de seu recurso os argumentos atinentes à matéria guerreada, satisfazendo, portanto, o requisito previsto no multicitado artigo.

                Isto posto, rejeito a preliminar suscitada pelo Exequente e, satisfeitos os demais pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade do Agravo de Petição, dele conheço.

 

                JUÍZO DE MÉRITO

                EXECUÇÃO DO SÓCIO CEDENTE OU RETIRANTE. INCLUSÃO NA AÇÃO DEPOIS DE TRANSCORRIDOS MAIS DE DOIS ANOS DA AVERBAÇÃO DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE

                Não se conformam os Agravantes com a r. decisão que os manteve no polo passivo da presente execução. Afirmam que foram incluídos nesses autos para responder por dívida supostamente atribuída ao ex-sócio de uma das empresas executadas, o Sr. Wellington Ribeiro de Sá, sendo que, em razão do seu falecimento, a responsabilidade foi dirigida a seus herdeiros (no caso, os Agravantes). Asseveram que a averbação da retirada do ex-sócio da sociedade ocorreu em 16.04.2010, sendo que, somente em dezembro de 2015 foi formulada a pretensão de que a execução fosse dirigida contra o mesmo, o que foi acolhido em fevereiro de 2016, ou seja, mais de dois anos após a averbação da sua retirada da sociedade. Sustentam que, nos termos do artigo 1032 do Código Civil, a responsabilidade do sócio que se retira da sociedade cessa quando ultrapassados dois anos da averbação da alteração contratual, não subsistindo responsabilidade no período posterior. Argumentam que “os herdeiros, ora Agravantes, embora pudessem ser responsabilizados por alguma obrigação, tal declaração, ou, pelo menos, o pedido de responsabilização deveria ter ocorrido até antes de findo o prazo de 02 (dois) anos do registro da alteração contratual que retirou o ex-sócio da sociedade empresarial” (f. 667).

                Aduzem, sucessivamente, que as empresas executadas “estão em plena atividade, produção e faturamento e podem ser compelidas facilmente a pagar a dívida aqui exigida”. Asseveram que a execução deve ser proposta em desfavor dos atuais sócios. Sustentam ser indevida a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, haja vista a ausência da comprovação do abuso da personalidade jurídica, à época em que o Reclamante prestou serviços em prol das empresas. Afirmam que o ex-sócio somente poderia ser alcançado pela desconsideração se a sua retirada da sociedade fosse declarada nula.

                Examino.

                Para melhor compreensão, faz-se necessário um pequeno relato dos fatos ocorridos nos presentes autos.

                Infere-se da r. sentença de f. 82/86 que o Juízo primevo deu parcial procedência à reclamatória trabalhista para reconhecer a existência do vínculo de emprego entre o Reclamante e a primeira Reclamada (MEDINA UDI SERVIÇOS LTDA. - ME) no período compreendido entre 01.10.1999 a 27.02.2012 e, considerando que as empresas Demandadas pertencem ao mesmo grupo econômico, condenou a segunda Ré (MEDICINA OCUPACIONAL LTDA.), de forma solidária, ao pagamento das parcelas deferidas ao Autor, observado o marco prescricional fixado em 25.08.2006.

                Transitada em julgado e decisão e iniciada a execução, o Juízo primevo homologou os cálculos apresentados pelo Exequente, em razão da concordância das Executadas (f. 142).

                Informado o Juízo que as empresas não possuíam fluxo de dinheiro em conta corrente e nem patrimônio para a garantia do débito (f. 142), aplicando-se a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, foram incluídos, na presente lide, os sócios da segunda Demandada, o Sr. José Maria Ribeiro de Sá e a Sra. Cecília Mercedes MC Guire de Ribeiro de Sá (f. 145).

                Travada a celeuma acerca da possibilidade da responsabilização dos referidos sócios, conforme se infere das petições de fls. 165/172, fls. 189/193, fls. 261/272, fls. 306/310, fls. 343/353, fls. 364/383 e das decisões de f. 257, f. 299 e f. 358, este Regional, em decisão definitiva e transitada em julgado, reconheceu que os referidos sócios eram responsáveis pelos créditos trabalhistas devidos ao Obreiro até 05.08.2010 (fls. 395/397).

                Em razão do decidido, os referidos sócios e o Exequente acordaram o pagamento da importância líquida de R$ 40.000,00, em prol do Obreiro, que, somados aos demais valores bloqueados nos autos, teriam a declaração de extinção da obrigação, conforme se observa da ata de f. 470.

                Cumprido o acordo e extinta a execução em desfavor dos Executados José Maria Ribeiro de Sá e Cecília Mercedes MC Guire de Ribeiro de Sá (f. 479), remanescendo saldo devedor, em 23.02.2016 (f. 553), foi reconhecida a responsabilidade do ex-sócio Wellington Ribeiro de Sá, haja vista que a sua retirada da sociedade, em 12.06.2008, somente foi averbada em 16.04.2010, o que, a teor do artigo 1.003, parágrafo único, do Código Civil, possivelmente atrairia a sua responsabilização até 16.04.2012.

                Contudo, considerando o falecimento do referido sócio e o encerramento do inventário dos bens deixados pelo espólio, o Juízo primevo reconheceu que “deverão responder pela dívida do espólio os três herdeiros declarados à fl. 526-v, respondendo cada um deles por 1/3 do saldo remanescente do crédito exequendo” (f. 553).

                Garantido o juízo, os Executados interpuseram os Embargos à Execução de fls. 618/625, os quais, todavia, foram julgados improcedentes, conforme decisão de fls. 651/652, tendo o Julgador de origem, no tocante à possibilidade da responsabilização do ex-sócio, asseverado que “não se confunde prazo civil de responsabilidade do ex-sócio pelo passivo da empresa, arts. 1003 e 1032 do CC, com prazo decadencial ou prescricional. Assim, não há que se falar em prescrição ou decadência pelo fato de o ex-sócio falecido e seus herdeiros terem sido chamados a responder pelo crédito exequendo após decorridos mais de dois anos da data da retirada do ex-sócio”.

                Pois bem.

                Da análise do processado extrai-se que o falecido sócio (Wellington Ribeiro de Sá) beneficiou-se dos serviços prestados pelo Exequente, o que, em princípio, autorizaria a responsabilidade dos herdeiros pelo crédito executado. É o que se verifica pelo cotejo do período de duração do vínculo de emprego, 01.10.1999 a 27.02.2012, com a data da saída do quadro societário em 12.06.2008 e com o registro de sua averbação em 16.04.2010 - fls. 58/61.

                Nesse contexto, como bem se sabe, uma vez insolvente a pessoa jurídica, respondem em princípio os seus sócios pelas dívidas por ela contraídas, em face da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, plenamente aplicável ao Processo do Trabalho, em que os créditos têm natureza alimentícia e, ainda, em face da proteção ao empregado hipossuficiente.

                Contudo, é certo que o sócio responde, solidariamente, perante a sociedade e terceiros pelas obrigações que tinha como sócio, até 02 (dois) anos depois de averbada a alteração contratual, a teor do parágrafo único do artigo 1.003 do Código Civil Brasileiro. Destarte, pode-se afirmar que a mera retirada do sócio não o exime, imediatamente, das obrigações sociais anteriores, o que também se coaduna com o artigo 1.032 do mesmo Diploma legal.

                Desse modo, no caso específico dos autos, a despeito de ter se retirado da sociedade após a admissão do Exequente, a averbação da respectiva alteração contratual ocorreu em 16.04.2010 (f. 61), sendo que o sócio e depois seus herdeiros continuaram respondendo pelas obrigações da sociedade até 16.04.2012, ou seja, por 02 (dois) anos após o referido registro.

                Entretanto, a execução se voltou contra os Agravantes apenas em 23.02.2016 (f. 553), quando os herdeiros do falecido ex sócio foram incluídos no polo passivo da execução, sendo que eles já não mais respondiam pelas dívidas contraídas pela sociedade, o que deve ser observado à luz do princípio da segurança jurídica.

                Neste sentido, inclusive, é o seguinte julgado do c. TST:

 

                “AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.SÓCIO RETIRANTE. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. PRAZO. PROVIMENTO. Por prudência, ante a possível afronta direta e literal ao artigo 5º, LIV, da Constituição Federal, o destrancamento do recurso de revista é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO.1. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.SÓCIO RETIRANTE. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. PRAZO. PROVIMENTO. O quadro fático delineado pelo egrégio Tribunal Regional permite observar três marcos temporais cruciais para a solução da demanda: i) prestação dos serviços para a empresa executada, no período de 05.09.1994 a 24.06.1996; ii) retirada do recorrente do quadro social da empresa executada em 29.11.2000, e iii) redirecionamento da execução para o sócio retirante apenas no ano de 2010. Neste sentido, o egrégio Tribunal Regional, ao manter a execução contra o ex-sócio da executada, utilizando-se da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, com fundamento apenas no fato de que o ora recorrente se beneficiou dos serviços prestados pelo reclamante por figurar, à época, como sócio da empresa, não observou o princípio constitucional do devido processo legal, sem o qual ninguém pode ser privado dos seus bens. Anote-se, ainda, que manter a d. decisão do egrégio Tribunal Regional importaria em grave insegurança jurídica nas relações trabalhistas e civis, pois equivaleria a dar guarida à eternização das obrigações delas decorrentes, hipótese que vai de encontro às garantias fundamentais previstas no artigo 5º da Constituição Federal. O executado, portanto, não pode ser privado de seus bens, em decorrência de responsabilidade por obrigações sociais, após o transcurso do prazo de dois anos da averbação de sua retirada do quadro social da empresa perante a Junta Comercial. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento” (Processo: RR - 302100-71.1996.5.02.0046 Data de Julgamento: 03.02.2016, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12.02.2016).

 

                Doutro tanto, sobreleva ressaltar que não há qualquer indício de prova nos autos acerca de fraude perpetrada pelos sócios quanto às alterações contratuais efetuadas.

                Neste sentido, tem-se que o afastamento do sócio, de forma regular, com transferência total de suas quotas do capital social da empresa e respectiva alteração contratual devidamente averbada perante a Junta Comercial, em data anterior à sua inclusão no polo passivo da execução e já tendo decorrido a desvinculação há muito mais de 02 (dois) anos, tal fato acarreta o afastamento da responsabilidade do sócio cedente, em nome da antes mencionada segurança jurídica que deve pautar os atos jurídicos praticados pelas partes.

                Saliente-se que o entendimento acima referenciado não se trata da aplicação do instituto da prescrição intercorrente, ao contrário do alegado pelo Exequente em contraminuta, tratando-se os autos de matéria totalmente diversa.

                Diante disso, dou provimento ao Agravo de Petição interposto para determinar a exclusão dos Agravantes Maria Cecília Ribeiro de Sá Rodrigues, Luis Maria Ribeiro de Sá e José Maria Ribeiro de Sá do polo passivo da demanda, a fim de que a execução não seja contra eles dirigida.

                Em razão do decidido, resta prejudicado o exame das demais matérias suscitadas pelos Agravantes.

 

 

 

                CONCLUSÃO

                Rejeito a preliminar de não conhecimento arguida pelo Exequente e conheço do Agravo de Petição. No mérito, dou-lhe provimento para determinar a exclusão dos Agravantes Maria Cecília Ribeiro de Sá Rodrigues, Luis Maria Ribeiro de Sá e José Maria Ribeiro de Sá do polo passivo da demanda, a fim de que a execução não seja contra eles dirigida.

 

                Fundamentos pelos quais,

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da sua Oitava Turma, hoje realizada, julgou o presente processo e, à unanimidade, rejeitou a preliminar de não conhecimento arguida pelo Exequente e conheceu do Agravo de Petição; no mérito, sem divergência, deu-lhe provimento para determinar a exclusão dos Agravantes Maria Cecília Ribeiro de Sá Rodrigues, Luis Maria Ribeiro de Sá e José Maria Ribeiro de Sá do polo passivo da demanda, a fim de que a execução não seja contra eles dirigida.

                Belo Horizonte, 05 de outubro de 2016.

 

Firmado por assinatura digital

MÁRCIO RIBEIRO DO VALLE

MRV/p Desembargador Relator

 

(TRT/3ª R./ART., DJ/MG, 11.10.2016)

 

BOLT8239---WIN/INTER

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