ANÁLISE ATUARIAL DA NECESSIDADE DE CONTRIBUIÇÃO DOS SERVIDORES INATIVOS DE UM SISTEMA PREVIDENCIÁRIO PRÓPRIO MUNICIPAL - MEF37781 - BEAP

 

                                                                                                                                                                                                                        

RENATA LUCIANA DOS REIS MAGALHÃES *

 

 

                INTRODUÇÃO

                O presente trabalho apresentará a partir dos dados coletados, os cálculos realizados e comentários abordando a viabilidade do sistema previdenciário, ante o desempenho financeiro praticado no período selecionado, permitindo aferir sua capacidade de arcar com os compromissos previdenciários assumidos.

                O objetivo é colaborar para novos estudos da legislação e para futuros cálculos atuariais, visando o desenvolvimento, saneamento e auto sustentabilidade do sistema previdenciário brasileiro.

                Na história da Previdência Brasileira, inclusive na municipal, existem numerosos casos onde a metodologia de cálculo das contribuições previdenciárias não apresentaram a técnica atuarial necessária, e, consequentemente, a “poupança” formada pela maioria dos atuais e potenciais inativos, não é suficiente para arcar com sua própria aposentadoria, ocasionando uma contingência passiva que pode arruinar qualquer sistema previdenciário. Tal contingência é facilmente verificada nos dados disponibilizados pelo MPAS.

                Não se pode esquecer ainda que o financiamento de qualquer Sistema Previdenciário depende fundamentalmente da contribuição sobre a folha de salários, o que o torna vulnerável às crises econômicas e políticas, ao desemprego, à “informalização” da economia brasileira, aos baixos salários e à concentração de renda.

                Particularmente, no caso dos Regimes Próprios Municipais, a legislação impõe tal dependência exclusivamente da folha de salários dos servidores concursados, ocupantes de cargo de provimento efetivo:

                É por estas razões que se pretende, sob nova ótica, rever os atuais mecanismos de financiamento do sistema previdenciário brasileiro, em especial o municipal e, através deste trabalho se procura iniciar o estabelecimento de ferramentas de análise, capazes de estimar o impacto nos resultados das contas da previdência, decorrente da contribuição dos servidores aposentados e pensionistas, cuja maior consequência é a crescente alíquota de contribuição patronal e dos servidores em atividade.

 

                A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA

                O objetivo deste trabalho é então, apresentar argumentos técnicos suficientes para demonstrar a necessidade de os inativos pagarem parte da conta da previdência, pois, do contrário, em curto prazo, a sociedade é quem arcará com tudo, afinal, a insolvência de um sistema previdenciário é capaz de aniquilar a economia da localidade de sua abrangência.

                Para solucionar o impasse previdenciário existem propostas na tentativa de transformar a Previdência numa estrutura autossustentável. Tais propostas baseiam-se em:

                • Aumento da contribuição normal do ente empregador ou implantação de uma contribuição de custeio suplementar cada vez mais crescente, a ponto de quem sabe, tornar-se “impagável”;

                • Aumento da alíquota de contribuição dos atuais servidores ativos que, tecnicamente pode ser apurada, mas sob os aspectos jurídicos e legais, existe o limite máximo de 11%;

                • Expansão do universo de contribuintes e, aí, entram os trabalhadores já em gozo de benefício (aposentados e pensionistas);

                É certo que, na atual conjuntura, torna-se necessário repensar o modelo previdenciário, uma vez que indicadores do Ministério da Previdência indicam a proporção de menos de um contribuinte para dois aposentados, o que torna o sistema praticamente inviável.

                Desta forma, a atual situação financeira da previdência urge por estudos para melhoria de seu custeio, estudos estes fundamentados em princípios de eficiência, auto sustentabilidade e bases técnicas atuariais, além do indispensável interesse político, para reforma da legislação brasileira, principalmente a constitucional, sob pena de num futuro próximo, presenciarmos o colapso e total falência dos sistemas previdenciários.

                A ideia de se promover este estudo, apresentando justificativas para a necessária contribuição dos servidores inativos partiu da constatação de que no atual sistema de Regimes Próprios de Previdência, a falência de sua maioria é certa em curto e médio prazo. Não é por outro motivo que o partido dominante no atual governo, de fortes e tradicionais ligações de defesa dos interesses do segmento de servidores públicos, teve de buscar forças novas para aprovar a emenda constitucional que, entre outros importantes ajustes no regime previdenciário dos servidores, criou a contribuição dos inativos que possuem proventos acima do teto máximo de benefício concedido pela previdência social geral.

                Percebe-se ainda que não existe fiscalização e controle sobre o Passivo Atuarial das entidades de previdência. O Tribunal de Contas não possui técnicos para tal missão, atendo-se apenas à análise basicamente documental, não se preocupando, pois, com a viabilidade da Entidade e sua capacidade de honrar seus compromissos futuros.

                O atuário deve preocupar-se com a exequibilidade da alíquota de contribuição calculada para os entes e, se necessário for defender a ideia de contribuição dos servidores em inatividade, se isso for um dos meios que possa viabilizar o equilíbrio do sistema previdenciário objeto de seu estudo.

 

                ESCLARECIMENTOS GERAIS

                Segundo Luiz Alberto dos Santos, Advogado, Mestre em Administração e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, “é fato notório que a maior parte dos problemas da previdência social no Brasil decorre da gestão incompetente, da fraude, dos desvios de recursos e da sonegação fiscal ou da inexistência de um sistema de custeio adequado à natureza e complexidade dos regimes previdenciários.”

                Na prática, quando da conclusão do Cálculo Atuarial, o atuário está colocando em números a capacidade de gestão daquele regime de previdência.

                Assim, a questão a ser resolvida no presente trabalho tomará como referência teórica o histórico do ente estatal selecionado, abordando se seu sistema de custeio lhe permite honrar no médio e longo prazo com os compromissos previdenciários assumidos e concluir sobre a necessidade de implantação ou não da cobrança de contribuição dos aposentados. Isso implica em promover estudos atuariais, definir o universo de beneficiários do regime previdenciário, rever a legislação pertinente no âmbito do ente e formular alíquotas de custeio que sejam justas e adequadas ao perfil dos servidores públicos que terão suas aposentadorias mantidas pelo regime de previdência.

                Pela legislação federal atual, o servidor contribuirá com a sua parte - 11% de sua remuneração total - e o ente estatal com, no máximo, o dobro da contribuição do servidor, para assegurar que as despesas com benefícios, no futuro, sejam devidamente custeadas. Essa regra, por óbvio, não impede que os entes federativos arquem com a diferença entre a despesa com os benefícios e a receita oriunda dessas contribuições, até porque o atual gasto com inativos não pode ser distribuído apenas entre os atuais ativos e o ente estatal, mas é de responsabilidade do conjunto da sociedade, em vista da relação de trabalho entre o servidor e o ente estatal.

 

                REALIZAÇÃO DOS CÁLCULOS COLETA DE DADOS

                A pesquisa foi concentrada em uma base de dados de um sistema previdenciário para fins de simulação do cálculo.

                Ainda utilizou-se vasta legislação referente ao estudo em questão, de modo que a mesma pudesse auxiliar no contexto e nas análises. Dentre elas, podemos destacar algumas:

 

                • Constituição Federal;

                • Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998;

                • Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003;

                • Emenda Constitucional nº 47, de 5 de julho de 2005;

                • Lei nº 9717, de 27 de novembro de 1998;

                • Lei nº 10887, de 18 de junho de 2004;

                • Portaria MPAS nº 4992, de 5 de fevereiro de 1999;

                • Medida Provisória nº 167. 19 de fevereiro de 2004.

 

                TRATAMENTO DE DADOS

                A princípio, foram extraídos da base de dados os valores correspondentes a quantitativos de ativos, inativos e pensionistas.

 

                PERFIL DA POPULAÇÃO

                A base de dados utilizada para a simulação do cálculo proposto necessitou de reajustes em virtude da inconsistência de algumas informações. Para os salários, benefícios e datas incorretas foram consideradas as médias destes, respectivamente e, quando da ausência de informações, adotou-se como idade normal de entrada no RGPS a idade de 26 anos e uma família padrão, reduzindo-se em três anos a data de nascimento do servidor do sexo masculino e o contrário, para as servidoras do sexo feminino.

                Realizados os ajustes, a população estudada, em termos quantitativos, ficou distribuída da forma a seguir discriminada, assim como o gasto médio desta por segmento.@@@

 

TABELA 1

Distribuição da população por segmento.

 

Ativos

Inativos

Pensionistas

1092

21

8

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

GRÁFICO 1: Distribuição da população por segmento:

 

 

TABELA 2

Gasto médio da população por segmento.

 

Discriminação

Folha mensal

Quantidade

Remuneração média

Servidores Ativos

Servidores Inativos

Pensionistas

Total

R$ 606.697,07

R$ 14.242,09

R$ 3.072,79

R$ 624.011,95

1092

21

8

1121

R$ 555,58

R$ 678,19

R$ 384,10

R$ 556,66

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

GRÁFICO 2: Gasto médio da população por segmento.

 

 

                Observados os valores acima, é possível constatar que neste estudo de caso, os gastos com os servidores inativos e pensionistas representam aproximadamente 3% da folha mensal da população. Portanto, em uma população onde os inativos serão mais representativos, certamente, o cálculo se mostrará mais viável.

 

                PREMISSAS E HIPÓTESES

                Com o intuito de apresentar um estudo mais próximo à realidade, os regimes e métodos financeiros bem como as premissas e hipóteses atuariais, foram empregados atendendo aos limites estabelecidos na legislação vigente, conforme descrito a seguir.

 

Ø       Estrutura Atuarial:

·          13 contribuições anuais;

·          Taxa real de juros de 6% ao ano ou sua equivalência mensal;

·          Projeção de crescimento anual de salários: 1%;

·          Projeção de crescimento anual dos benefícios: 1%;

·          Taxa de turn-over (rotatividade): 0;

·          Idade de início das contribuições para o RGPS: 26 anos;

·          Taxa administrativa de 2% sobre o valor total da remuneração dos servidores;

 

Ø       Estrutura Biométrica:

·         O Sobrevivência e mortalidade: Annuit Table - AT 1949;

·         O Entrada em Invalidez: Álvaro Vindas;

·         O Mortalidade de Inválidos: IAPC;

·         O Fator de capacidade dos salários: 100%;

·         O Fator de capacidade dos benefícios: 100%.

 

                Para os regimes próprios de previdência social a legislação permite a adoção dos regimes financeiros de capitalização, repartição de capitais de cobertura e repartição simples. Neste estudo, para o cálculo da aposentadoria normal e sua reversão em pensão, foi utilizado o regime de capitalização, uma vez que é possível estimar o início de gozo do benefício do servidor. Porém, para a pensão por morte, a aposentadoria por invalidez e sua reversão em pensão, foi utilizado o regime de repartição de capitais de cobertura, onde é desconhecida a ocorrência dos eventos e, as despesas decorrentes da concessão destes benefícios normalmente superam um ano.

 

                SÍNTESE DOS RESULTADOS

                Diante do exposto neste estudo, os benefícios também foram estimados conforme as regras previstas na EC nº 20/1998, na EC nº 41/2003 e EC nº 47/2005, sendo considerado para o cálculo da concessão destes, a regra da aposentadoria integral e, em qualquer hipótese, garantido um benefício inicial equivalente ao salário mínimo vigente à época.

 

Aposentadoria normal

 

 


x                                 r                                 W

Entrada em invalidez do servidor ativo.

 

Reversão em pensão do servidor inativo inválido.

 

Reversão em pensão do servidor inativo.

 

 

 

 

 

 

 

 


Pensão do servidor ativo.

 

 

 


FIGURA 1: Benefícios assegurados.

 

                No que tange aos benefícios assegurados por este Instituto foram calculados apenas as aposentadorias e a pensão por morte, conforme demonstrado na ilustração acima e, estipulado um percentual de 1% a.a. para os demais benefícios e de 2% a.a. para cobertura das despesas administrativas, permitindo assim, conhecer o plano de custeio normal total do sistema.

 

TABELA 4

Plano de custeio normal

 

Benefícios

Percentual (Puro)

Aposentadoria Normal

Aposentadoria por Invalidez

Pensão Por Morte de Ativo

Rev. Aposentadoria Normal em Pensão

Rev. Aposentadoria por Invalidez em Pensão

Auxílio-doença

Salário-maternidade

Auxílio-Reclusão

Salário-família

Despesa Administrativa

15,08%

1,21%

2,78%

0,46%

0,12%

1%

1%

1%

1%

2%

Sub-Total

Benefícios Concedidos

25,65%

0,24%

Total

25,41%

 

                Cumpre informar ainda que o percentual total de custeio normal é fixado em 11% para o servidor ativo e o mínimo de 11% até o dobro deste, para o Ente, sendo que para os servidores inativos e pensionistas é cobrado apenas o percentual de 11% sobre o valor que exceder o teto do INSS, conforme os arts. 4, 5 e 10, da Lei nº. 10887/2004, in extenso.

 

                “Art. 4º A contribuição social do servidor público ativo de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, para a manutenção do respectivo regime próprio de previdência social, será de 11% (onze por cento), incidente sobre a totalidade da base de contribuição.

                Art. 5º Os aposentados e os pensionistas de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, contribuirão com 11% (onze por cento), incidentes sobre o valor da parcela dos proventos de aposentadorias e pensões concedidas de acordo com os critérios estabelecidos no art. 40 da Constituição Federal e nos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional no 41, de 19 de dezembro de 2003, que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social.

                Art. 10. (...)

                "Art. 2º A contribuição da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, aos regimes próprios de previdência social a que estejam vinculados seus servidores não poderá ser inferior ao valor da contribuição do servidor ativo, nem superior ao dobro desta contribuição. (...)”

 

TABELA 5

Plano de custeio total

 

Item

Custeio Normal

Ente Público

Servidor ativo

Servidor inativo

Pensionista

14,41%

11,00%

11,00%

11,00%

 

                Entretanto, o estudo proposto procura verificar a viabilidade do sistema, considerando a contribuição dos servidores inativos e pensionistas em 11% sobre o valor da parcela dos proventos dos benefícios concedidos.

                Nesse sentido, a diferença encontrada entre o percentual de 25,65% e 25,41%, representa o percentual de contribuição dos benefícios concedidos, logo, uma redução do custeio normal total em 0,24% e consequentemente da contribuição patronal em percentual equivalente, uma vez que a alíquota do servidor ativo é fixada em 11%. Essa redução de percentual é explicada pelo valor atual das contribuições futuras dos benefícios concedidos dos aposentados e pensionistas, conforme demonstrado na Tabela 3.

 

TABELA 3

Reservas Matemáticas

 

Discriminação

Valores

(-) Valor Atual dos Benefícios Futuros (aposentados)

(+) Valor Atual das Contribuições Futuras (aposentados)

(-) Valor Atual dos Benefícios Futuros (pensionistas)

(+) Valor Atual das Contribuições Futuras (pensionistas)

Reserva Matemática de Benefícios Concedidos - RMBC

(-) Valor Atual dos Benefícios Futuros

(+) Valor Atual das Contribuições Futuras

Reserva Matemática de Benefícios a Conceder - RMBaC

R$              3.328.456,71

R$                 366.130,24

R$                 470.719,37

R$                   51.779,13

R$            (3.381.266,71)

R$           29.136.660,04

R$           14.786.485,10

R$          (14.350.174,94)

 

                Além do custeio normal mencionado, o regime pode apresentar um custeio suplementar utilizado para amortizar déficits ou insuficiências apuradas e levantadas nas avaliações atuariais. O déficit técnico é encontrado pela diferença, quando negativa, entre Ativo Líquido e o Passivo Atuarial ou Reserva Matemática.

                Contudo, não foi possível identificar a existência de um superávit ou déficit técnico, uma vez que não é conhecido o valor do ativo e do montante estimado da compensação previdenciária a receber do INSS, logo, para que o plano ficasse equilibrado, seria necessário que a soma desses dois itens totalizassem a soma da reserva matemática de benefícios concedidos e a conceder apresentados na Tabela 3.

                As etapas descritas nos itens anteriores representam à coleta de informações, as bases técnicas e os resultados encontrados que atuarão como subsídios para a etapa final, que é concluir sobre a viabilidade do sistema previdenciário, apontando a necessidade ou não de contribuição previdenciária dos servidores inativos e pensionistas.

 

                CONCLUSÕES

                Por fim, o estudo proposto consistiu em um estudo de caso, onde se buscou comprovar que a viabilidade dos sistemas de previdência pode estar na implantação da contribuição previdenciária dos servidores já em período de benefício.

                Todavia, a aplicação deste parâmetro requer primeiramente a instituição de uma legislação que regulamente a situação, bem como, um estudo aprofundado no Regime interessado, visando identificar as peculiaridades deste e a necessidade ou não da adoção desta contribuição.

                É conhecido que o plano de benefícios de alguns Institutos encontram-se atualmente equilibrados financeiramente e atuarialmente à luz das disposições legais, logo, possuem capacidade suficiente para honrar com os compromissos futuros, podendo gerar nesse caso, uma situação conflitante no Município, em virtude da cobrança desnecessária de uma alíquota.

                Situação contrária também pode ser observada em outros Institutos, onde é notória a necessidade de uma outra fonte de custeio que contribuiria para equilibrar as contas e viabilizar o sistema previdenciário. Tal fonte é a contribuição dos servidores inativos. Há de se considerar ainda as peculiaridades de cada população em estudo afinal; o presente estudo baseou-se em um Regime Próprio com apenas 3% de inativos. Sabemos de casos onde a população inativa representa cerca de 10 a 20% dos beneficiários do Regime e, nestes casos, a contribuição dos servidores aposentados e pensionistas contribuirá em muito para a solvência do Instituto em curto e médio prazo.

 

 

* Contadora, Auditora, Consultora, Graduanda em Ciências Atuariais, Colaboradora do BEAP.

 

 

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