DISPENSA POR JUSTA CAUSA - FALTA GRAVE PRATICADA PELO OBREIRO - ATO DE IMPROBIDADE - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF37874 - LT

 

 

PROCESSO TRT/RO Nº 0010425-85.2016.5.03.0012

 

Recorrentes: 1) André Soares de Araújo

                       2) RRPM Cursos Preparatórios Ltda

Recorridos:  Os Mesmos

Relator:        Paulo Roberto de Castro

 

E M E N T A

 

                DISPENSA POR JUSTA CAUSA - FALTA GRAVE PRATICADA PELO OBREIRO - ATO DE IMPROBIDADE - A justa causa é medida punitiva excepcional e grave que causa sérios entraves profissionais na vida do empregado. Por isso deve ser aplicada nos casos em que a falta disciplinar do empregado seja realmente justificadora da sanção, a ponto de tornar irrecuperável a relação entre as partes. No caso vertente, evidenciando-se que o Autor se fez passar por outro funcionário para utilização, sem autorização, do convênio de taxi da empresa, resta cabalmente configurado o ato de improbidade, a que alude a alínea "a" do art. 482 da CLT, fazendo decair, de modo irremediável, a confiança no empregado. Por traduzir falta gravíssima, autoriza a imediata resolução do contrato de trabalho, ainda que o empregado não tenha cometido infrações anteriores.

 

R E L A T Ó R I O

 

                O M.M. Juízo da 12ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte julgou procedentes, em parte, os pedidos iniciais (Id. e7c1188).

 

                A Reclamada e o Reclamante interpõem recursos ordinários - Id. a30bf59 e 5842fd1, respectivamente.

                Contrarrazões da Reclamada - Id. 46bdd7d.

                Contrarrazões do Reclamante - Id. f037598.

                Não houve remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho para emissão de parecer circunstanciado, ante a ausência de interesse público na solução da controvérsia (art. 82 do Regimento Interno deste TRT).

                É o relatório.

 

                FUNDAMENTAÇÃO

                ADMISSIBILIDADE

                O recurso ordinário interposto pela Reclamada é próprio, tempestivo e a representação está regular (Id. 2eb82a8). Ademais, o recolhimento das custas e do depósito recursal foi comprovado, a tempo e modo (Id. bb2367f).

                Quanto ao recurso apresentado pelo Reclamante, também, é próprio, tempestivo e a representação é regular (Id. 506ca15).

                Conheço de ambos os recursos porque atendidos os pressupostos de admissibilidade.

 

                MÉRITO

                RECURSO DA RECLAMADA

                INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL - VALOR DA INDENIZAÇÃO

                Insurge-se a Reclamada contra a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

                Alega que nunca superiores da empresa chamaram o Reclamante de "metade homem, metade macaco", nunca houve xingamentos na frente de outros empregados, pois todas as pendências e problemas havidos na prestação de serviços ocorriam de forma discreta, individual e respeitosa.

                Sustenta que se ocorreram brincadeiras não foi com o consentimento da empresa, que não permite essas atitudes nas suas dependências.

                Argumenta que ainda que restassem comprovadas as "brincadeiras e piadas" narradas pelo Recorrido, não haveria como entender configurado o dano moral alegado. O ilícito, no caso, ocorreria caso algum colega fizesse alguma alusão direta e ofensiva específica do autor, humilhando-o, por exemplo, o que não se verifica.

                Por fim, assevera que não há prova de dano, nem sua repercussão no mundo jurídico. Que inexiste culpa ou dolo da Recorrente a ensejar a reparação moral intentada pelo Recorrido.

                Sucessivamente, requer a redução do valor arbitrado a título de indenização.

                Ao exame.

                A Reclamada foi condenada ao pagamento da indenização por danos morais em razão do tratamento vexatório a que era submetido o Autor pelos xingamentos que lhe eram dirigidos por parte do Sr. Jobson, seu superior hierárquico (encarregado de manutenção).

                Não resta dúvida de que a honra, a dignidade e a integridade física e psíquica da pessoa são invioláveis, por força de expressa disposição de lei, garantias que têm destacada importância também no contexto do pacto laboral, fonte de dignidade do trabalhador. Daí porque a violação a qualquer desses bens jurídicos, no âmbito do contrato de trabalho, redunda em indenização pelos danos dela decorrentes, tendo em conta que a igualdade preconizada no artigo 5º da Magna Carta deve ser considerada também na relação de respeito que deve nortear o contrato de trabalho.

                O dano moral, conquanto não mensurável por critérios objetivos, enseja uma reparação que dê à vítima o conforto e a esperança de ver mitigado o seu sofrimento e sentimento de menos valia, de descrença.

                Por outro lado, a indenização por dano moral sofrido pelo empregado, no âmbito do contrato de trabalho, pressupõe um ato ilícito consubstanciado em erro de conduta ou abuso de direito, praticado pelo empregador ou por preposto seu, um prejuízo suportado pelo ofendido, com a subversão dos seus valores subjetivos da honra, dignidade, intimidade ou imagem, pelas atribulações, mágoas, aflição e sofrimento íntimos e subjetivos que atingem a alma de um ser humano e ainda um nexo de causalidade entre a conduta injurídica do primeiro e o dano experimentado pelo último.

                No caso em exame, encontram comprovados os requisitos caracterizadores do dano moral assim caracterizado por atitudes de desrespeito, humilhação e grosserias.

                Ao analisar a prova oral, o juízo de origem destacou que:

 

                "O reclamante se emocionou ao declarar em seu depoimento que conhece o Sr. Jobson, encarregado de manutenção, que o Sr. Jobson fazia piadas com ele, agarrando na sua blusa e dizendo que era chefe dele e que ele era metade gente, metade macaco, por causa de problemas na sua orelha.

                Já a preposta da reclamada, verifiquei que mentiu ao afirmar que nunca soube de nenhuma ofensa de Jobson para com o reclamante, seja, porque tive que fazer a pergunta três vezes, seja porque ficou muito tensa na hora da resposta, abaixou o olhar, e quando lhe disse que estava faltando com a verdade, buscou com o olhar o advogado da empresa, como se tentasse obter um auxílio nesse momento.

                Por fim, a testemunha Leda Maria declarou que viu, uma vez, Jobson falando ao reclamante que ele era metade homem, metade macaco, que o reclamante não fazia brincadeiras ou piadas com Jobson." (pág. 8/9 - Id. e7c1188).

 

                Com efeito, quando se trata de avaliação da prova oral produzida, deve a instância revisora prestigiar a valoração do conjunto probatório produzida pelo juízo de primeiro grau, em virtude do contato pessoal com as testemunhas, estando em melhores condições de estabelecer seu grau de credibilidade a partir de seu comportamento e de sua atitude em audiência, que os autos não têm como registrar.

                Portanto, restou comprovada conduta imprópria desrespeitosa e abusiva adotada pelo preposto da Reclamada. Compatibilizando todas as informações prestadas pela prova produzida, está claro que a Ré agiu de forma abusiva no tratamento para com o Autor, sujeitando-o a situação vexatória humilhante e totalmente desnecessária no âmbito da prestação de serviços. O constrangimento sofrido se agrava mais no presente caso porquanto ocorrido na presença de colegas.

                O exercício do poder disciplinar deve visar antes de tudo recuperar o empregado para o caminho da exação funcional e nunca desestabiliza-lo emocionalmente.

                Portanto, na forma dos artigos 186 e 927 do CC, tem lugar a indenização por danos morais requerida, decorrente do assédio moral sofrido pelo autor.

                No que tange à fixação do quantum a ser pago a título de indenização é extremamente delicada, em face da inexistência de norma legal que discipline o tema. Assim, o valor da reparação do dano moral deve ser fixado por arbitramento. O juiz quando do arbitramento deve considerar o grau de culpa do agente, as condições sócio econômicas das partes, assim como o bem jurídico lesado valendo-se de critérios de proporcionalidade e razoabilidade definidos pela doutrina e jurisprudência.

                Além disso, tal valor deve mostrar-se razoável e suficiente para atender os fins a que se destina (caráter punitivo e pedagógico).

                A situação verificada nos autos clama por condenação que possa desestimular novas práticas, certamente sem configurar uma forma de enriquecimento indevido.

                Assim, considerando o dano sofrido pelo autor e as circunstâncias que envolveram o fato, entendo que o valor fixado pelo juízo de origem (R$ 9.000,00) é razoável e proporcional, não havendo que se falar em redução do valor da indenização.

                Nego provimento.

 

                CUSTAS PROCESSUAIS

                Tendo sido mantida a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, bem como o valor arbitrado pelo juízo de origem, não há que se falar m redução ou restituição das custas processuais pagas pela Reclamada.

                Nego provimento.

 

                RECURSO DO RECLAMANTE

                REVERSÃO DA JUSTA CAUSA - ALTERAÇÃO CONTRATUAL LESIVA

                Recorre o Reclamante contra o indeferimento do pedido de reversão da justa causa que lhe foi aplicada.

                Afirma que sua conduta não se reveste da gravidade suficiente a justificar uma dispensa por justa causa. Sustenta que trabalhou na Reclamada por quase 13 anos sem tomar sequer uma advertência, não podendo ser considerado indisciplinado.

                Argumenta que a utilização de táxi pelos funcionários da Reclamada era recorrente e normal para aqueles funcionários que extrapolavam seu horário de trabalho e ficavam após as 22:00 hs, fato confirmado pela testemunha Leda Maria.

                Sustenta que a subtração do benefício da utilização do táxi constitui alteração contratual lesiva, portanto, ilegal, e não pode embasar a justa causa aplicada.

                Examina-se.

                Haverá justa causa para a dispensa do empregado quando houver violação séria das principais obrigações do contrato de trabalho, destruindo de tal forma a confiança nele votada que torne impossível a subsistência da relação de emprego.

                Tal penalidade, por irradiar consequências deletérias na vida profissional, funcional e pessoal do trabalhador, requer prova estreme de suspeita, de modo a não deixar dúvidas no espírito do Julgador.

                Assim, para motivar o rompimento contratual, a alegação da prática de falta grave deve ser analisada de forma rígida, diante do expressivo dano econômico que avulta dessa modalidade rescisória.

                A comunicação da dispensa, emitida no dia 26.02.2016, foi exarada nos seguintes termos:

 

                "Fica o contrato de trabalho rescindido por justa causa em razão da falta abaixo

discriminada:

                - Nos dias 16.02.2016 (terça-feira) e 22.02.2016 (segunda-feira), utilizou-se sem autorização, o Convênio de Táxi da Empresa para ir embora e se identificou indevidamente como outro funcionário da empresa que não estava presente no horário do uso do transporte." (Id. e7c1188)

 

                Entendo que, no caso dos atos, restou cabalmente demonstrado que o Autor praticou ato de insubordinação, indisciplina e improbidade, ao se fazer passar por um superior hierárquico para requisitar, sem autorização, táxi pelo convênio da empresa.

                Em seu depoimento o próprio Autor admite que "houve reunião na empresa, na qual o depoente foi informado de que não poderia mais requisitar táxi".

                Peço vênia para transcrever trecho da sentença, que analisou brilhantemente as provas constantes dos autos e cujos fundamentos, não infirmados nas razões recursais, adoto como razão de decidir, verbis:

 

                "O reclamante se recusou em depor, ao ser perguntado se na ligação para a cooperativa o funcionário dizia que ele está pedindo o táxi, ou pede o táxi a requerimento de Rafael ou Júnior, e qual o motivo de ter dado, ao chamar o táxi no dia 22, outro número de telefone diverso de Júnior. Tal recusa atrai a consequência processual cabível, qual seja, a confissão fícta dos fatos narrados na defesa (art. 385, § 1º, c/c art. 386, do CPC).

                Além disso, em seu depoimento, o reclamante declarou que houve reunião na empresa, na qual o depoente foi informado de que não poderia mais requisitar táxi, que esta reunião ocorreu cerca de um mês antes de ser dispensado, que depois dessa reunião o depoente pediu táxi, uma vez, no dia 22, que o uso desse táxi foi autorizado por Júnior, que Rafael não estava presente, Júnior estava e que confirma que é sua a voz na gravação ofertada pela empresa.

                Todavia, José Júnior Cristovão de Abreu, afirmou que não podia autorizar o reclamante a usar táxi, só a gerente dele, que nunca fez essa autorização e que o reclamante fez um pedido de táxi, utilizando o seu nome.

                Analisando o conjunto probatório, verifico que o uso do táxi no dia 16.02.2016 não teve a autorização do Sr. Júnior, porque ele se encontrava na Bahia e, no dia 22.02.2016 sem conhecimento da chefia, o reclamante se passou pelo Sr. Junior em evidente prática de falsidade ideológica.

                Os documentos anexados pela reclamada comprovam que no período de 15.02.2016 a 18.02.2016, o Sr. Junior estava de viagem a serviço em Salvador/BA e que os serviços solicitados pelo reclamante foram prestados.

                O reclamante tinha pleno conhecimento das regras estabelecidas pela reclamada, no que se refere à proibição do uso de táxi. Conforme depoimento da testemunha José Junior Cristovão de Abreu, tal proibição ocorreu em função da empresa ter identificado que ele usou táxi nas suas férias e que não estava prestando serviços para a empresa nessa ocasião." (págs. 4/5 - Id. e7c1188). (Destacou-se)

 

                O ato ensejador da justa causa, a meu ver, encontra-se robustamente configurado, traduzindo ato de insubordinação, indisciplina e improbidade, na medida em que se fez passar por outro funcionário para burlar as regras da empresa, vulnerando por completo a confiança sobre a qual se alicerça a continuidade da relação de emprego, o que justifica a rescisão do vínculo por justa causa, nos termos do art. 482, "a", da CLT.

                Nego provimento.

 

                Conclusão do recurso

                Conheço de ambos os recursos. No mérito, nego-lhes provimento.

 

                Acórdão

                Fundamentos pelos quais

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da sua Sétima Turma, hoje realizada, sob a presidência do Exmo. Desembargador Paulo Roberto de Castro (ad hoc), presente o Exmo. Procurador Arlélio de Carvalho Lage, representante do Ministério Público do Trabalho, computados os votos da Exma. Juíza convocada Sabrina de Faria Froes Leão (substituindo o Exmo. Des. Marcelo Lamego Pertence) e do Exmo. Juiz convocado Vitor Salino de Moura Eça (substituindo a Exma. Desa. Cristiana Maria Valadares Fenelon), JULGOU o presente processo e, unanimemente, conheceu de ambos os recursos. No mérito, por maioria de votos, negou-lhes provimento. Vencida a Exma. Juíza Sabrina de Faria Froes Leão, que reduzia a indenização por dano moral para R$ 5.000,00.

                Belo Horizonte, 20 de outubro de 2016.

PAULO ROBERTO DE CASTRO

Relator

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 20.10.2016)

 

BOLT8258---WIN/INTER

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