EXIGÊNCIA DE DIMENSIONAMENTO DA ESTRUTURA FÍSICA PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO PREVENTIVA E CORRETIVA, RELATIVA À MECÂNICA E ELÉTRICA COM FORNECIMENTO DE PEÇAS E SERVIÇOS DE LANTERNAGEM DE VEÍCULOS: IRREGULARIDADE - MEF38009 - BEAP

 

                O colegiado da Primeira Câmara, na sessão do dia 2.3.2021, apreciou denúncia em face de irregularidades no edital de Pregão Presencial, que visava a contratação de empresa para prestação de serviços de manutenção preventiva e corretiva, relativa à mecânica e elétrica com fornecimento de peças e serviços de lanternagem para veículos da Secretaria Municipal de Saúde.

                A denunciante alegou, em suma, restrição à concorrência, diante da vedação de participação de empresas que não se encontrem dentro dos limites do município, bem como o estabelecimento de prazos exíguos para a realização dos serviços objeto da licitação.

                O Ministério Público junto ao Tribunal, em manifestação preliminar, apresentou apontamentos complementares à denúncia, quais sejam: a) exigência de estabelecimento com espaço físico igual ou maior que 400m² (quatrocentos metros quadrados) de área coberta; b) insuficiência do termo de referência em razão da ausência de orçamento em planilhas de quantitativos e preços unitários; c) exigência de qualificação técnica para parcelas que não as de maior relevância; e d) exigência de comprovação de qualificação técnico-operacional sem exigência de qualificação técnico-profissional.

                Ab initio, o relator, conselheiro substituto Hamilton Coelho, asseverou em sua proposta de voto que o critério geográfico adotado é pertinente com a execução satisfatória do objeto do contrato, uma vez que o deslocamento de veículos poderia implicar em gastos excessivos com combustível e tempo, o que não atenderia ao interesse público, tendo citado precedente desta Corte de Contas exarado nos autos da Denúncia 859053.

                Ressaltou, todavia, que o critério escolhido para a limitação geográfica, qual seja, os limites de determinado município, não é o tecnicamente mais acertado. Desse modo, propôs a expedição de recomendação no sentido de que, nos próximos certames de natureza similar, seja adotado o critério de distância máxima em quilômetros, independentemente do município de prestação dos serviços.

                Em relação à exigência de estabelecimento com espaço físico igual ou maior que 400m² (quatrocentos metros quadrados) de área coberta, a relatoria destacou que a Administração, a fim de alcançar uma proposta mais vantajosa, deve observar os princípios da isonomia e da livre concorrência, sendo vedadas cláusulas ou condições que estabeleçam preferências irrelevantes ao objeto do contrato e que restrinjam ou frustrem o caráter competitivo do certame, conforme dispõe o inciso I, § 1º, do art. 3º da Lei 8.666/1993.

                Salientou, entretanto, que a contratação de serviços não se confunde com a terceirização de mão de obra, porquanto o dimensionamento da estrutura física e da força de trabalho, entre outros fatores práticos necessários ao satisfatório adimplemento do contrato administrativo, devem ser definidos pelo contratado, por sua conta e risco.

                Sendo assim, em consonância com as conclusões do órgão técnico e do órgão Ministerial, o relator concluiu tratar-se de exigência excessiva o dimensionamento da estrutura física, em violação à determinação contida no artigo supracitado, cabendo à própria empresa contratada executar o contrato com a estrutura de que dispuser, desde que atendidos os padrões técnicos e as especificações contratuais.

                No que tange à exiguidade dos prazos previstos no edital para prestação dos serviços, o relator destacou decisão da Segunda Câmara, na sessão de 27.3.2018, no julgamento da Denúncia 912018, de relatoria do Conselheiro Wanderley Ávila, concluindo que, in casu, mostraram-se razoáveis os prazos estabelecidos pelo edital, em face da essencialidade dos veículos da Secretaria de Saúde e, por conseguinte, da necessidade de sua manutenção rápida e prioritária.

                In casu, a relatoria julgou improcedente a Denúncia quanto à alegada insuficiência do termo de referência, em razão da ausência de orçamento em planilhas de quantitativos e preços unitários, considerando o elevadíssimo número de possibilidades de demandas passíveis de surgir em cada veículo, a depender do tipo e frequência de uso, dos trajetos percorridos, de danos causados por terceiros, entre outros fatores, não se mostra razoável exigir, de antemão, especificação das peças e serviços a serem adquiridos.

                Em relação à exigência de qualificação técnica para parcelas que não as de maior relevância, o relator ponderou que o serviço objeto do edital (manutenção preventiva e corretiva, relativa à mecânica e elétrica com fornecimento de peças e serviços de lanternagem), apresenta natureza simples e específica, não sendo razoável exigir a indicação de qual deles ostenta maior relevância, e que, muitas vezes, a prestação desses serviços é indissociável, sendo necessária a aquisição de uma peça para o consequente reparo do veículo, de modo que a indicação, nesse caso, ao contrário de contratações complexas e multifacetadas, não traria efeitos práticos, de maneira que tal apontamento descreve mera formalidade, uma indicação artificial e, possivelmente, prejudicial.

                Destacou, ainda, que os requisitos de qualificação técnica devem guardar pertinência ou similaridade com o objeto licitado. Assim, embora recomendável, a indicação explícita da parcela ou parcelas de maior relevância não é exigida na letra da lei, podendo ser inferida da própria descrição do objeto, conforme preceitua o art. 30, § 1º, I, e § 3º, da Lei 8.663/1993.

                Por fim, o relator entendeu, em linha com a manifestação da unidade técnica, ser lícita a exigência de comprovação de capacidade técnico operacional, independentemente da exigência de comprovação da capacitação técnico-profissional, tendo destacado, nesse diapasão, o posicionamento do TCU no julgamento do Processo nº 012.675/2009-0, Acórdão nº 1942/2009 - P, de relatoria do Ministro André de Carvalho.

                Nessa contextura, o relator, conselheiro substituto Hamilton Coelho, manifestou-se pela procedência parcial da denúncia, propondo, com amparo no disposto no art. 85, II, da Lei Complementar Estadual 102/2008, a aplicação de multa individual de R$ 1.000,00 (mil reais) à responsável, Secretária Municipal de Saúde e única signatária do edital, em face da exigência de que a contratada possuísse estabelecimento com espaço físico igual ou maior que 400m² (quatrocentos metros quadrados) de área coberta, em grave ofensa ao disposto no inciso I, § 1º, do art. 3º da Lei 8.663/93.

                Concluiu, ademais, pela expedição de recomendações no sentido de que, nos certames futuros para contratação de serviços de natureza semelhante, a limitação geográfica seja feita com base no critério de distância máxima em quilômetros, como tem sido a prática da Administração, bem como que, para a escolha da melhor forma de contratação, dentro dos limites legais, sejam resguardadas a isonomia entre os licitantes, a vantajosidade para a Administração e a sustentabilidade, a fim de cumprir o dever constitucional de preservação do meio ambiente, a teor do art. 225, da Constituição da República e do art. 3º da Lei 8.663/93.

                A proposta de voto do relator foi acolhida, por unanimidade.

                [Processo 1066489 - Denúncia. Rel. Cons. Subst. Hamilton Coelho, 2.3.2021]

 

 

BOCO9668---WIN/INTER

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