ADICIONAL DE PERICULOSIDADE - AÇÃO REVISIONAL - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF38254 - LT

 

PROCESSO TRT/RO Nº 0010311-07.2015.5.03.0102

 

 

Recorrente: Alder Xavier de Oliveira

Recorrido: Vale S/A

Relator: Danilo Faria

 

E M E N T A

 

                ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. AÇÃO REVISIONAL. Havendo alteração no estado de fato ou de direito, é cabível a ação revisional para a revisão do estatuído na sentença. É que os títulos judiciais que estabelecem parcelas vincendas de trato sucessivo, como o adicional de periculosidade, numa relação jurídica continuativa, torna possível a suspensão do pagamento do plus salarial quando demonstrado o afastamento do trabalhador das condições perigosas. Isto é, prevalecem enquanto não modificada a situação fática ou jurídica que ensejou sua prolação, mas, estão sujeitas à influência da cláusula rebus sic stantibus.

 

R E L A T Ó R I O

 

                Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, oriundos da 1ª Vara do Trabalho de João Monlevade/MG, em que figuram, como recorrente, ALDER XAVIER DE OLIVEIRA e, como recorrido, VALE S/A.

                O Juízo da 1ª Vara do Trabalho de João Monlevade/MG, pela r. sentença de Id 116b66d, cujo relatório adoto e a este incorporo, na ação revisional ajuizada pela Vale S.A., julgou procedente, em parte, o pedido exordial, para determinar que a obrigação de pagar o adicional de periculosidade, imposta pela r. decisão proferida no processo nº. 0166600-94.2003.5.03.0099, seja mantida, apenas, nos meses em que o reclamado exercer atividade periculosa em razão do transporte de vagões tanque, quando efetivamente permanece em área de risco.

                O reclamado recorre da sentença sob o Id 129894e pugnando pela reforma da decisão.

                Contrarrazões apresentadas pela reclamante Vale S.A. sob o Id 97964f9.

                É o relatório.

 

V O T O

 

                Conheço do recurso, porque satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade, bem como das contrarrazões, tempestivamente apresentadas.

 

                MÉRITO

                ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. AÇÃO REVISIONAL.

                De início, cabe mencionar que a questão envolve relação jurídica continuativa, visto que há coisa julgada reconhecendo o direito ao pagamento do adicional de periculosidade ao recorrente, consistente na reclamação trabalhista nº. 0166600-94.2003.5.03.0099, que tramitou perante a 2ª Vara do Trabalho de Governador Valadares. Acerca do tema, o art. 505, I, do CPC/2015, subsidiariamente aplicado, estabelece que:

                Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:

 

                I - se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; (grifei)

 

                É que os títulos judiciais que estabelecem parcelas vincendas de trato sucessivo, como o adicional de periculosidade, torna possível a suspensão do pagamento do plus salarial com o afastamento do trabalhador das condições perigosas. Isto é, prevalecem enquanto não modificada a situação fática ou jurídica que ensejou sua prolação, mas, estão sujeitas à influência da cláusula rebus sic stantibus.

                Foi o que ocorreu na hipótese em tela.

                O Juízo a quo, com respaldo na conclusão pericial, julgou procedente, em parte, a ação revisional, autorizando a supressão da obrigação relativa ao pagamento de adicional de periculosidade, determinando que "seja mantida apenas nos meses em que o reclamado exercer atividade periculosa face ao transporte de vagões tanque, quando efetivamente permanece em área de risco, justificando-se aí o pagamento do respectivo adicional, o qual, aliás, por se tratar de espécie de salário-condição, é devido apenas e enquanto perdurarem as condições mais agravantes à saúde do trabalhador" (Id 116b66d).

                Pretende o reclamado a reforma da decisão para ver condenada a autora ao pagamento do adicional de periculosidade, sustentando que não pode prevalecer o laudo pericial que concluiu pela exposição esporádica. Sustenta que a realidade dos maquinistas e dos milhares de processos já ajuizados em face da Vale sobre o mesmo tema, a autora é sempre condenada no pagamento do adicional de periculosidade. Ressalta que os substituídos tinham como atribuição transportar produtos inflamáveis e poderia acontecer a qualquer hora. Argumenta que, no caso, se encontra configurado o adicional de periculosidade, conforme subitem 16.6.1 da NR 16, pois o tanque de consumo das locomotivas resulta em risco acentuado, equiparando-se, para efeitos de risco, aos tanques de armazenagem, transportando as locomotivas 15.000 litros inflamáveis líquidos. Destaca que, quanto à eletricidade, as decisões do TRT são no sentido de demonstrar a efetiva permanência do recorrente em área de risco, nos termos da OJ 324, in fine, da SDI-1 do C. TST, pois o maquinista acessa um painel elétrico na cabine com 600 volts para ligar a chave de bateria para depois acionar o combustível.

                À análise.

                Quando a questão discutida na ação revisional diz respeito ao pagamento dos adicionais de insalubridade e periculosidade, o artigo 194 da CLT prescreve que: "O direito do empregado ao adicional de insalubridade ou de periculosidade cessará com a eliminação do risco à sua saúde ou integridade física, nos termos desta Seção e das normas expedidas pelo Ministério do Trabalho".

                Desse modo, entende-se que o adicional de periculosidade é somente exigível enquanto persistir a situação fática que o configura. Ocorrendo alteração dessa realidade, cessa, por conseguinte, o direito à percepção do respectivo adicional a partir do momento em que demonstrada a insubsistência do risco.

                Segundo o laudo pericial apresentado (Id a98f3e5), verificou o expert que, na função de Maquinista no transporte de vagões tanque com inflamáveis líquidos, ficou caracterizada a atividade em condição periculosa nos meses destacados, assim, dispondo:

 

                As atividades exercidas pelo Reclamado são ensejadoras de Periculosidade, uma vez que, realizava atividade periculosa face ao transporte de vagões tanque, nos moldes da NR16, Anexo 2, item 1, alínea "b", redação dada pela Portaria 3.214 de 08.06.1978, pelos seguintes meses: JANEIRO DE 2011/AGOSTO DE 2011/JULHO DE 2012/FEVEREIRO DE 2013/MARÇO DE 2013/ABRIL DE 2013/JUNHO DE 2013/JULHO DE 2013/JUNHO DE 2014*. (grifos meus)

 

                * NOS DEMAIS PERÍODOS, as atividades exercidas pelo Reclamado não são ensejadoras de Periculosidade, uma vez que, não realizou atividade periculosa face ao transporte de vagões tanque, nos moldes da NR-16, Anexo 2, item 1, alínea "b", redação dada pela Portaria 3.214 de 08.06.1978.

 

                Entretanto, com relação à exposição à energia elétrica por intervenções em painéis elétricos, constatou que o reclamado, na função de maquinista de viagem, realizava a inspeção de componentes elétricos tais como chaves, contatores, bem como a retirada de sobrecarga elétrica em painéis existentes no interior da locomotiva. Acrescentou que os painéis elétricos são alimentados em 600 (seiscentos) volts em corrente contínua DC. Disse, ainda, que era comum a retirada de sobrecarga elétrica através de acionamento de disjuntores em painéis pelo menos uma vez por mês. Ressaltou que as locomotivas da Reclamante possuem um gerador de energia que produz 600 volts em corrente alternada, que passa através de retificadores de tensão e transformam em corrente contínua de 600 DC que é distribuída para toda a locomotiva e rebaixadas as tensões de 60 a 100 volts DC para utilização em instrumentos.

                Porém, concluiu o expert pela inexistência da periculosidade no trabalho do reclamado, assim delineando, in verbis:

 

                Ao analisar as atividades e ambientes de trabalho do Reclamado verifica-se que estes não se encontram descritos, não estão previstos, no Quadro de Atividades/Áreas de Risco, ficando, assim, prejudicado o enquadramento de suas atividades como ensejadoras de Periculosidade. A locomotiva gera, distribui e consome energia elétrica, mas não esta inserida no Sistema Elétrico de Potência, segundo a definição da NBR 5460 da ABNT. (negritos meus).

 

                Não se diverge do entendimento do perito em relação à caracterização da periculosidade quanto aos produtos inflamáveis, apenas, nos meses destacados.

                Contudo, no que se refere à periculosidade por exposição à energia elétrica por intervenções em painéis elétricos, a NBR-5.460/81 da Associação Brasileira de Normas Técnicas refere que os sistemas elétricos de potência - item nº 4.499 - tratam-se de sistema elétrico que compreende instalação para geração, transmissão e/ou distribuição de energia elétrica. Tecnicamente, as linhas de transmissão consistem nos elementos de conexão entre a fonte geradora e os sistemas de distribuição. Portanto, tem-se por sistema elétrico de potência todo o complexo de geração e distribuição da energia elétrica aos pontos de consumo, a partir dos quais se definem as instalações de consumo de energia elétrica.

                Aliás, a Orientação Jurisprudencial nº 324 da SDI-1 do TST, assim, disciplina:

 

                ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. SISTEMA ELÉTRICO DE POTÊNCIA. DECRETO Nº 93.412/86, ART. 2º, § 1º (DJ 09.12.2003)

                É assegurado o adicional de periculosidade apenas aos empregados que trabalham em sistema elétrico de potência em condições de risco, ou que o façam com equipamentos e instalações elétricas similares, que ofereçam risco equivalente, ainda que em unidade consumidora de energia elétrica. (destacou-se)

 

                Dessarte, o fundamento do TST foi de ampliar a aplicação da Lei nº 7.369/85 (revogada pela Lei 12.740/12), que instituiu o pagamento do adicional de periculosidade para os empregados do sistema elétrico de potência, sendo, ou não, empregado de empresas de energia elétrica. A finalidade dessa lei foi assegurar o pagamento do adicional de periculosidade aos empregados que trabalhem em condições de risco, em face do contato físico com instalações ou equipamentos energizados, podendo sofrer descarga elétrica e vir a falecer ou ter sequelas do acidente, como a incapacitação e a invalidez permanente.

                Assim, será concedido o adicional de periculosidade para quem trabalha em condições de risco, exposto à descarga de energia ou que o façam com equipamentos e instalações elétricas similares, que ofereçam risco equivalente, ainda que em unidade consumidora de energia elétrica.

                Nesse contexto, levando-se em conta, que o perito de confiança do Juízo relatou que a locomotiva gerava, distribuía e consumia energia elétrica e, ainda, que a NR-10 (Instalações e Serviços em Eletricidade - Portaria 3.214) estabelece que "as prescrições aqui estabelecidas abrangem todos os que trabalham em eletricidade, em qualquer das fases de geração, transmissão, distribuição e consumo de energia elétrica", circunstância que restou patente no quadro fático delineado na prova técnica, inclusive pelas fotografias ilustrativas colacionadas no laudo, tem-se por caracterizada a periculosidade na hipótese dos autos.

                Assim, em que pese a conclusão pericial, entendo que o reclamado estava sujeito a contato com agente perigoso, esclarecendo-se que o Julgador, nos termos do disposto no artigo 479 do CPC/2015, não está adstrito às conclusões contidas no laudo pericial, quando possui elementos capazes de embasar sua linha de raciocínio (princípio da persuasão racional).

                Pela exposição do autor ao risco de acidentes com o choque elétrico provocado pelos efeitos da eletricidade, podendo resultar em incapacitação, invalidez permanente ou morte, conforme dispõe o artigo 2º-II, § 2º, do Decreto nº 93.412/86, faz jus à percepção do adicional de periculosidade.

                Entendo, portanto, não ter havido alteração na situação fática que existia quando do ajuizamento da ação nº 0166600-94.2003.5.03.0099 e que resultou na condenação da autora ao pagamento do adicional de periculosidade, ainda que por reconhecimento de agente insalutífero diverso - energia elétrica.

                De destacar, por oportuno, que a exposição do reclamado não era eventual. Conforme vem entendendo reiteradamente o TST, eventual seria o contato de um trabalhador que ao longo de vários anos de contrato de trabalho, entra em contato com o agente periculoso poucas vezes durante todo o período contratual. A exposição que se dá todos os dias, por curtos períodos de tempo, é reconhecida como intermitente, ensejando a percepção do adicional de periculosidade.

                Desse modo, dou provimento ao apelo do reclamado para cassar a ordem de obrigação de pagamento do adicional de periculosidade, apenas, nos meses em que o reclamado exercer atividade periculosa em razão do transporte de vagões tanque, sendo devido o adicional de periculosidade, nos termos da decisão 0166600-94.2003.5.03.0099.

                Em face da improcedência da ação, reverte-se a condenação ao pagamento das custas processuais à autora, no valor de R$ 1.000,00, calculadas sobre o valor da causa (R$ 50.000,00).

                Reverte-se à autora a responsabilidade pela satisfação dos honorários periciais, tendo em vista a sucumbência no objeto da perícia - artigo 790-B da CLT.

 

                Conclusão do recurso

                Conheço do recurso ordinário do reclamado e, no mérito, dou-lhe provimento para cassar a ordem de obrigação de pagamento do adicional de periculosidade, apenas, nos meses em que o reclamado exercer atividade periculosa em razão do transporte de vagões tanque, mantendo-se incólume a determinação de pagamento do adicional de periculosidade, nos termos da decisão 0166600-94.2003.5.03.0099.

                Em face da improcedência da ação, reverte-se a condenação ao pagamento das custas processuais à autora, no valor de R$ 1.000,00, calculadas sobre o valor da causa (R$ 50.000,00).

                Reverte-se à autora a responsabilidade pela satisfação dos honorários periciais, tendo em vista a sucumbência no objeto da perícia - artigo 790-B da CLT.

DF/eli

 

                ACÓRDÃO

                Fundamentos pelos quais,

                O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da sua Quinta Turma, hoje realizada, sob a presidência do Exmo. Desembargador Márcio Flávio Salem Vidigal, presente a Exma. Procuradora Maria Helena da Silva Guthier, representando o Ministério Público do Trabalho, computados os votos dos Exmos. Desembargadores Manoel Barbosa da Silva e Marcus Moura Ferreira, JULGOU o presente processo e, à unanimidade, conheceu do recurso ordinário do reclamado e, no mérito, deu-lhe provimento para cassar a ordem de obrigação de pagamento do adicional de periculosidade, apenas, nos meses em que o reclamado exercer atividade periculosa em razão do transporte de vagões tanque, mantendo-se incólume a determinação de pagamento do adicional de periculosidade, nos termos da decisão 0166600-94.2003.5.03.0099. Em face da improcedência da ação, reverteu a condenação ao pagamento das custas processuais à autora, no valor de R$ 1.000,00, calculadas sobre o valor da causa (R$ 50.000,00). Reverteu à autora a responsabilidade pela satisfação dos honorários periciais, tendo em vista a sucumbência no objeto da perícia - artigo 790-B da CLT.

                Belo Horizonte, 25 de outubro de 2016.

 

DANILO FARIA

Juiz Convocado Relator

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 03.11.2016)

 

BOLT8337---WIN/INTER

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