ADICIONAL DE PERICULOSIDADE - ELETRICITÁRIOS - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF38542 - LT

 

PROCESSO TRT/RO Nº 00520-2015-099-03-00-3

 

Recorrentes: (1) Cemig Distribuição S.A.

                       (2) Antônio Carlos Carvalho

Recorridos  : Os Mesmos

 

E M E N T A

 

                ADICIONAL DE PERICULOSIDADE - ELETRICITÁRIOS - Não se admite negociação coletiva para restringir a base de cálculo do adicional de periculosidade do eletricitário ao salário-base, por envolver incidência de norma de ordem pública, portanto, de indisponibilidade absoluta. Todavia, com a revogação da Lei 7.369/85 pela Lei 12.740/12, publicada no Diário Oficial da União em 10.12.2012, a partir dessa data, a base de cálculo do adicional de periculosidade dos eletricitários passa a ser calculada nos termos do artigo 193, § 1º da CLT, certo que a nova regra não poderá retroagir para atingir situações pretéritas, em observância ao artigo 5º, XXXVI, da Constituição da República.

 

R E L A T Ó R I O

 

                A sentença de fls.885/900 julgou parcialmente procedente os pedidos.

                Inconformada, a reclamada aviou o recurso ordinário de fls.916/929, requerendo, preliminarmente, suspensão do processo, em razão do sobrestamento determinado no processo de nº AgR-E-RR-0002157-76.2013.5.03.0067 pelo Exmo. Ministro Ives Gandra, aplicando-se o artigo 543-B, §1º do CPC. No mérito, insurge-se contra condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade, em virtude da base de cálculo adotada; o pagamento do adicional em comento no importe de 30% sobre o salário-base está amparado nas negociações coletivas; o reclamante deve ser condenado ao pagamento de multa por litigância de má-fé, considerando que alterou a verdade dos fatos e utilizou de processo para conseguir objetivo ilegal. Na eventualidade, requer limitação da condenação ao período posterior ao cancelamento do item II da Súmula 364 do TST e anterior à data de publicação da Lei 12.740/2012.

                O reclamante aviou o recurso ordinário de fls. 935/958 arguindo, preliminarmente, a competência desta Especializada para determinar o desconto de contribuições para previdência complementar (cota empregado e empregador) e para que a empregadora arque com a rentabilidade das contribuições do período discutido. No mérito, defende a nulidade de sua adesão a Programa Incentivado de Desligamento (PID), argumentando, em síntese, que a empresa o coagiu a aderir; logo após as dispensas dos empregados que aderiram ao PID, a reclamada iniciou processo de demissão dos empregados que não o fizeram, revelando que não se tratavam de apenas ameaças; não se pretendia mera redução do quadro de empregados, mas sim de exclusão daqueles mais antigos; a prova oral demonstrou emprego de coação, mediante ameaça de demissão, feita pelos gerentes da reclamada. Insiste no direito a diferenças salariais, em decorrência de progressões horizontais. Requer diferenças de horas extras quitadas na vigência do pacto laboral, em razão da não inclusão, na sua base de cálculo, de gratificações e anuênios, bem como pela indevida adoção do divisor 220. Finaliza postulando salário habitação, por entender que todos os integrantes da categoria fazem jus à parcela em questão.

                Apresentadas contrarrazões.

                Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, para emissão de parecer, nos termos do artigo 82 do Regimento Interno deste Tribunal.

 

                VOTO

                JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

                Conheço dos recursos, cumpridos os pressupostos de admissibilidade.

 

                PRELIMINARES

                SUSPENSÃO DO PROCESSO

                O sobrestamento previsto no artigo 543-B do CPC não é aplicável em sede de recurso ordinário perante esta Especializada, uma vez que a redação do artigo se restringe a recursos de natureza extraordinária, que versem sobre matéria objeto de repercussão geral, como tal reconhecida pelo Supremo.

                Rejeito.

 

                INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA

                Não se pode determinar aportes a entidade de previdência complementar patrocinada pela empregadora sem antes decidir se determinada parcela integra ou não base de cálculo de contribuição previdenciária, matéria que, segundo o STF, no julgamento dos RE 584453 e 583050, refoge da competência desta Especializada.

                Rejeito.

 

                JUÍZO DE MÉRITO

                RECURSO DA RECLAMADA

                DIFERENÇAS DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE

                A cláusula 19ª do ACT 2008/2009, que ora se cita por amostragem, dispôs o seguinte:

 

                "A partir de 1º (primeiro) de maio de 1996 a CEMIG pagará o Adicional de Periculosidade de forma integral (30% do salário-base), a todos os empregados credenciados para o exercício de atividades de risco em área de risco, credenciamento este efetuado pela Empresa baseado em Norma própria e específica, a qual foi revisada por Grupo de Trabalho composto por representantes da CEMIG e dos Sindicatos" (fl.512).

 

                O entendimento que tem prevalecido no TST é no sentido de que indisponível o direito ao adicional de periculosidade, por se tratar de vantagem resguardada por norma que trata da segurança, saúde e higiene no trabalho.

                Dessa forma, não se admite negociação coletiva para o fim de restringir a base cálculo do adicional de periculosidade. Inválidas, com isso, cláusulas coletivas que determinem essa forma de cálculo do adicional referido, não havendo falar em violação ao artigo 7º, XXVI da CR/88.

                Por outro lado, não se pode olvidar que houve alteração legislativa, com a revogação da Lei 7.369/85 pela Lei 12.740/12, publicada no Diário Oficial da União em 10.12.2012, de forma que, a partir dessa data, a base de cálculo do adicional de periculosidade dos eletricitários passa a se definir pelos termos do artigo 193, § 1º da CLT, ou seja, pelo salário-base. Certo que a nova regra não pode retroagir para atingir situações pretéritas, em observância ao artigo 5º, XXXVI, da CR/88, segundo o qual "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".

                Ante o exposto e considerando-se que, em se tratando de salário condição, não há direito adquirido quanto à forma de pagamento, imune a posterior modificação legislativa, dou provimento parcial ao apelo, para limitar a condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade a 09.12.2012, em razão da publicação da Lei 12.740/2012.

                Não se reconhece incidência do item II da Súmula 364 do TST até seu cancelamento, em 31.05.2011, tendo em vista que súmulas representam mera interpretação.

                Devidos os reflexos deferidos, em face da natureza salarial das parcelas.

                Nesse contexto, não há falar em aplicação de multa por litigância de má-fé ao reclamante.

 

                RECURSO DO RECLAMANTE

                NULIDADE DA DISPENSA - ADESÃO A PROGRAMA

                INCENTIVADO DE DESLIGAMENTO

                Em 06.03.2013, o reclamante assinou termo de adesão a programa incentivado de desligamento (PID), conforme documento de fl.503.

                A única testemunha ouvida declarou que “trabalha na reclamada desde 25 de maio de 1.989; que recebeu a divulgação do programa de incentivo a demissão voluntária; que o funcionário aceita se quiser tal programa; que trabalhou junto com o reclamante; que sabe que o reclamante aceitou o PID; que conhece pessoas que não aceitaram e continuam trabalhando; que, na época do reclamante, os funcionários que se enquadravam nos requisitos do PID assinaram e se afastaram do trabalho; que não houve qualquer pressão ou ameaça para isso; que teve também um PID recente divulgado e várias pessoas não assinaram” (fl.883, grifos acrescidos).

                Como se vê, ao revés do alegado pelo recorrente, a prova oral é contrária à tese de coação, tendo inclusive revelado que “a empresa proporciona que o funcionário possa ir a Belo Horizonte para fazer uma análise mais criteriosa do desligamento e se isso é vantajoso ou não; que é divulgado por e-mail se a pessoa tem interesse de ir; que acha que tem um setor contábil que passa as vantagens e desvantagens de adesão” (fl.883).

                O e-mail juntado pelo reclamante à fl.95 corrobora a declaração da testemunha acima no sentido de que houve atendimento para auxiliar os empregados quanto às vantagens e desvantagens da adesão, conforme se verifica no seguinte trecho:

 

                “Orienta-se aos empregados que se enquadrem nas condições de adesão ao PID, que procurem inteirar-se adequadamente das premissas e vantagens do mesmo, analisando cuidadosamente as implicações atuais e futuras de sua eventual adesão.

                [...]

                Forluz e RH providenciarão atendimento pessoal para esclarecimento de dúvidas, cuja data de início das operações e local serão avisados oportunamente” (fl.95).

 

                A informação de que seria disponibilizado atendimento pessoal para esclarecimento de dúvidas foi repetida no informativo interno denominado “Linha Viva”, tendo sido ainda acrescentado que “esclarecimentos adicionais sobre o programa também [poderiam] ser obtidos com os superintendentes e gerentes de [...] área” (fl.96). O e-mail de fls.99/100 também trata de atendimento para esclarecimentos de dúvidas sobre o PID.

                As notícias de fls.91/92, extraídas do jornal “O Tempo” e do site da CUT, apenas informam a possibilidade de futuras dispensas na reclamada, em razão da redução da tarifa de energia elétrica, nada revelando sobre supostas coações.

                Não bastasse, o acerto rescisório foi homologado pelo SINDIELETRO, sem ressalvas (fls.501/502), como bem salientado pelo juízo de origem.

                A adoção dos critérios descritos no item 2.1 do Programa Incentivado de Desligamento (fl.102) apenas evidencia que a reclamada pretendeu preservar o emprego daqueles que não possuem outra fonte de vencimentos, não podendo prevalecer a tese de que a reclamada pretendia “excluir” empregados mais antigos.

                Nego provimento.

 

                DIFERENÇAS SALARIAIS - PROGRESSÕES SALARIAIS

                A perícia contábil, determinada pelo juízo de 1º grau, apurou o seguinte:

 

                “[...] pelo critério FAIXA DE AVALIAÇÃO, [...] em todo o período em questão, o reclamante se enquadrava dentre os funcionários elegíveis às progressões salariais.

                Conforme consta dos demonstrativos de salários nos autos, entre 01.01.2005 até 05.04.2013, o reclamante recebia salário equivalente ao Nível Salarial 10, na Faixa III.

                Por fim, deve ser informado que, de acordo com o documento de fl.81, para o campo de TEC MANUT DISTRIBUIÇÃO III e TEC SISTEMA ELÉTRICO CAMPO III, o posicionamento salarial máximo seria no Nível Salarial 10 Faixa III” (fl.816).

 

                Conforme consta do laudo, “progressão horizontal é o aumento concedido ao empregado na mesma classe funcional e nível salarial, decorrente de seu desempenho. Para um empregado ser elegível a aumento individual de salários por progressão horizontal é necessário: Não ter tido outra Progressão Horizontal nos últimos 2 anos; Estar com salário posicionado dentro da faixa salarial; Estar classificado nas faixas de avaliação de desempenho relativas aos conceitos A, B e C; Estar há, pelo menos, 1 ano na função atual” (fl.810).

                Questionado se a não concessão de progressões salariais, nos anos em que o reclamante estava elegível, se deu com base em algum dispositivo específico de norma regulamentar que prevê progressões salariais ou se foi fruto de decisão tomada ao arbítrio pelos gerentes, o perito esclareceu que, “no caso do reclamante, pelo critério FAIXA DE AVALIAÇÃO, [...] ele se enquadrava dentre os funcionários elegíveis às progressões salariais. Todavia, no período em questão, o reclamante já estava posicionado no último status de sua função, conforme consta dos documentos de fls.663/664” (fls.827/828, grifos acrescidos).

                O reclamante não logrou infirmar a prova técnica.

                Nego provimento.

 

                DIFERENÇAS DE HORAS EXTRAS – INCLUSÃO DAS

                GRATIFICAÇÕES E ANUÊNIOS NA BASE DE CÁLCULO

                Em que pese a demonstração do recorrente, verifico que a reclamada incluiu a gratificação de supervisor e o anuênio na base de cálculo das horas extras quitadas no contracheque de fl.455, razão pela qual mantenho o indeferimento do pedido de diferenças de horas extras nesse aspecto.

                Nego provimento.

 

                DIFERENÇAS DE HORAS EXTRAS – ADOÇÃO DO DIVISOR 200

                É incontroverso que o reclamante cumpria jornada de 08 horas diárias, de segunda a sexta-feira, o que representa 40 horas semanais (fls.08 e 405).

                O fato de a cláusula 38ª do ACT (fl.525) estabelecer que a jornada semanal dos empregados da CEMIG é de 40 horas, o sábado considerado dia útil remunerado para todos os efeitos legais, não conduz ao entendimento, por si só, de que tem aplicação o divisor 220. Em referida cláusula não se fez qualquer referência ao divisor a ser utilizado.

                Aplicável, com isso, o entendimento consubstanciado na Súmula 431 do TST:

 

                “SALÁRIO-HORA. EMPREGADO SUJEITO AO REGIME GERAL DE TRABALHO (ART. 58, CAPUT, DA CLT). 40 HORAS SEMANAIS. CÁLCULO. APLICAÇÃO DO DIVISOR 200 Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora.”

                Súmulas representam entendimento jurisprudencial solidificado, em uniformização que incumbe ao Tribunal Superior do Trabalho, e como tal, encerram postulados interpretativos dos próprios dispositivos legais aplicáveis em necessária harmonização com os preceitos constitucionais e princípios também interpretados, daí que não se pode pretender sejam aplicadas apenas a partir da alteração de sua redação.

                Não havendo cogitar em aplicação, por analogia, da Súmula 124 do TST, que é específica para a categoria dos bancários, dou provimento ao apelo do reclamante, data venia do entendimento originário, para deferir diferenças de horas extras decorrentes da aplicação do divisor 200, com reflexos em RSR (OJ 394 da SDI-1 do TST), férias+1/3, 13º salário e aviso prévio (item “4” de fl.24), limitadas a setembro de 2012, já que admitido na inicial que, a partir de então, a reclamada passou a aplicar o referido divisor (fl.08).

 

                SALÁRIO-HABITAÇÃO

                Infere-se dos instrumentos coletivos juntados aos autos que a cláusula relativa ao salário-habitação não limita a concessão do benefício, como asseverado pela reclamada (fl.424), apenas fixa teto para pagamento. A título de exemplo, cita-se a cláusula 24ª do ACT 2008/2009 (fls.518/519).

                Desse modo, dou provimento para deferir o pagamento de salário-habitação, durante todo período imprescrito do contrato de trabalho, observado o teto fixado nas normas coletivas.

 

                CONCLUSÃO

                Conheço dos recursos, e, no mérito, dou-lhes provimento parcial: a) ao da reclamada, para limitar a condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade a 09.12.2012; b) ao do reclamante, para acrescer à condenação, cujo valor arbitrado mantenho, por ainda compatível, diferenças de horas extras decorrentes da aplicação do divisor 200, com reflexos, nos termos do corpo do voto, limitadas a 01.09.2012 e salário-habitação.

 

                FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

                O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, em sessão da Terceira Turma, hoje realizada, à unanimidade, conheceu dos recursos; no mérito, sem divergência, deu-lhes provimento parcial: a) ao da reclamada, para limitar a condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade a 09.12.2012; b) ao do reclamante, para acrescer à condenação, cujo valor arbitrado fica mantido, por ainda compatível, diferenças de horas extras decorrentes da aplicação do divisor 200, com reflexos, nos termos do corpo do voto, limitadas a 01.09.2012 e salário-habitação.

                Belo Horizonte, 16 de novembro de 2016.

 

Luís Felipe Lopes Boson

Relator

 

 

(TRT/3ª R./ART., DJ/MG, 28.11.2016)

 

BOLT8379---WIN/INTER

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