É INDEVIDA A DEDUÇÃO DO VALOR DA CONTRIBUIÇÃO DO MUNICÍPIO AO FUNDEB DA BASE DE CÁLCULO DO DUODÉCIMO REPASSADO À CÂMARA MUNICIPAL - MEF38543 - BEAP

 

 

                Tratam os autos de representação formulada por Presidente de Câmara Municipal, sob a alegação de que o Chefe do Poder Executivo estaria realizando repasse à Casa Legislativa em valor inferior ao disposto na Constituição da República, tendo em vista que a Prefeitura exclui da base de cálculo das transferências para a Câmara Municipal as receitas provenientes da contribuição do Município ao FUNDEB, em desconformidade com as decisões deste Tribunal, a exemplo daquelas proferidas na Representação nº 1066488 e na Consulta nº 837614.

                Ab initio, o Relator, Conselheiro Substituto Hamilton Coelho destacou que, na Constituição da República, adotou-se o princípio da separação e harmonia entre os poderes, assegurando-lhes autonomia administrativa e financeira, ficando a cargo do Poder Executivo a transferência dos recursos devidos aos demais Poderes, nos termos estabelecidos nas respectivas leis orçamentárias, sendo-lhe vedado deixar de efetuar os repasses na sua integralidade, sob pena de cometimento, pelo gestor, de crime de responsabilidade.

                Sendo assim, as verbas previstas no art. 29-A da Constituição devem ser necessariamente transferidas ao Poder Legislativo Municipal, tendo em vista a essencialidade de suas atribuições na estrutura da República, sob pena de violação a direito líquido e certo das Câmaras Municipais, acarretando prejuízos consideráveis, de difícil reversão, conforme esclarecido no acórdão proferido na Representação nº 1047798, de relatoria do Conselheiro Wanderley Ávila.

                No referido art. 29-A, o legislador constituinte estipulou os limites à despesa do Poder Legislativo Municipal e determinou a adoção, como base de cálculo, do “somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior”. Vale destacar que o constituinte derivado, ao determinar a base de cálculo para os repasses, se referiu à “receita tributária” e não mencionou dedução de qualquer parcela.

                Nesse sentido, o Relator asseverou que a definição da base de cálculo para fins de fixação do montante a ser repassado às Câmaras Municipais não deve se pautar pela definição de Receita Corrente Líquida, consagrada na Lei Complementar nº 101/2000, o que resultaria na diminuição das transferências constitucionais e legais e implicaria desvirtuamento da mens legis.

                Assim, a orientação consagrada nesta Corte de Contas é no sentido de que o valor correspondente à contribuição do Município ao FUNDEB compõe a base de cálculo dos recursos repassados pelo Poder Executivo à Câmara Municipal, parcela que não se confunde com os recursos oriundos da União e dos Estados repassados ao FUNDEB, que não integram a base de cálculo a que se refere o art. 29-A da CR, conforme disposto na Decisão Normativa nº 06/2012 deste Tribunal e nos pareceres emitidos nas Consultas nº 837614, 838450, 876036, 859122 e 862565.

                Isso posto, encontra-se assentada, definitivamente, a distinção entre: 1) os recursos que o município transfere para contribuir com o FUNDEB, provenientes de sua arrecadação ordinária, os quais integram a base de cálculo para fins de repasse ao Legislativo; e 2) o total de recursos que, posteriormente, será disponibilizado ao ente local por meio do FUNDEB, montante calculado em razão do número de alunos a cada ano, a ser utilizado para financiar a educação básica. É dizer que o dinheiro direcionado, via FUNDEB, aos serviços municipais de ensino tem destino certo, não constitui receita do ente local e nem, portanto, base de cálculo de repasse ao Legislativo.

                Nesse diapasão, a relatoria destacou que, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 985499, o Supremo Tribunal Federal fixou, de maneira definitiva, a interpretação do Poder Judiciário acerca da matéria, em consonância àquela já consolidada nesta Corte de Contas.

                Assim, a exclusão dos recursos destinados ao FUNDEB pelo Município da base de cálculo do repasse duodecimal, além de configurar afronta a normativos, à jurisprudência da Suprema Corte do País e deste Tribunal, e à legislação de regência, poderia acarretar danos irreparáveis ao Legislativo Municipal, razão pela qual o Relator se manifestou pela procedência da representação para determinar ao Chefe do Poder Executivo Municipal que cumpra o disposto na Decisão Normativa nº 06/2012 e na Consulta nº 837614 deste Tribunal, abstendo se de promover descontos fundamentados na decisão do Superior Tribunal de Justiça no Recurso em Mandado de Segurança nº 44.795, reformada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 985499, sob pena de aplicação da multa prevista no art. 85, inciso III, da Lei Complementar nº 102/2008.

                Diante da especificidade do tema e da existência de relevante divergência jurisprudencial ao tempo dos fatos, a relatoria deixou de propor a aplicação de multa pelos repasses a menor promovidos anteriormente a esta decisão.

                A proposta de voto do Relator foi aprovada, por unanimidade.

                [Processo nº 1072609 - Representação. Rel. Cons. Subst. Hamilton Coelho, deliberado em 2.2.2021]

 

 

BOCO9731---WIN/INTER

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