É ADMISSÍVEL A SUBCONCESSÃO, COMUM OU PATROCINADA, DE SERVIÇOS PÚBLICOS - SEJA POR CONCESSIONÁRIA PERTENCENTE OU NÃO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA -, DESDE QUE CELEBRADO EM CARÁTER PARCIAL, NA MESMA MODALIDADE DO CONTRATO DE CONCESSÃO INICIAL E COM OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 26 DA LEI Nº 8.987/95 E DEMAIS DISPOSIÇÕES APLICÁVEIS - MEF38680 - BEAP

 

 

                Cuidam os autos de Consulta formulada por prefeito municipal, nos seguintes termos: “Uma empresa concessionária de serviço público contratada por dispensa de licitação pode realizar uma PPP - Parceria Público Privado (sic) com outra empresa para permitir a terceirização da totalidade do objeto contratado ou parte dele”.

                O relator, conselheiro Cláudio Couto Terrão, respondeu ao questionamento da seguinte maneira: a) Não é possível a circunstância trazida pelo Consulente, isto é, delegação realizada por “concessionária de serviço público contratada por dispensa de licitação”, diante do art. 175 da Constituição da República. b) Somente é possível falar em delegação de serviços públicos por concessionária se esta for entidade da Administração Indireta da entidade federativa em cuja competência se encontra o serviço público e, ainda assim, na hipótese restrita de concessão especial (PPP), diante do parágrafo único do art. 1º da Lei nº 11.079/04. Essa delegação dependerá, também, da existência de lei que atribua à concessionária competências inerentes à figura do poder concedente e do atendimento a todas as demais exigências da Lei nº 11.079/04. c) Por fim, não há como uma concessionária delegar a prestação de serviços públicos por meio de concessão comum porque o inciso I do art. 2º da Lei nº 8.987/95 restringe o conceito de poder concedente aos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios).

                Em seguida, foi concedida vista ao conselheiro José Alves Viana, que, por sua vez, proferiu o seguinte parecer, in verbis: “a) Em face do exposto, abro divergência, primeiramente, por entender pela possibilidade de delegação de serviços públicos por concessionária, não somente se esta for entidade da Administração Indireta da entidade federativa em cuja competência se encontra o serviço público, mas no caso também de entidade federativa diversa. b) Em segundo plano, por entender pela possibilidade de delegação realizada por concessionária de serviço público contratada por dispensa de licitação, em hipóteses da Lei nº 8.666/93, quando compatíveis com o próprio instituto da concessão. c) Por fim, entendo pela possibilidade de uma concessionária delegar a prestação de serviços públicos por meio de concessão comum, pelo que dispõe o art. 26 da Lei nº 8.987/95.

                Após a leitura do voto, o conselheiro José Alves Viana fez o seguinte adendo, em relação à extensão do objeto da subconcessão: “d) A subconcessão total do objeto, portanto, não condiz com o próprio art. 26, § 2º, ao determinar que o subconcessionário sub-rogar-se-á nos direitos e obrigações do subconcedente dentre dos limites da subconcessão. e) Dessa forma, como já disse anteriormente, em sendo a PPP uma concessão especial, julgo que tal entendimento deve ser a ela também aplicado. f) Por todo exposto, entendo somente possível a delegação de serviço por concessionária de parte do objeto da concessão.”

                Após, o conselheiro em substituição Hamilton Coelho pediu vista, e respondeu à Consulta do seguinte modo, in verbis: “a) Conforme assinalado no voto do relator, em face do disposto no art. 175 da Constituição da República, no inciso II do art. 2º da Lei nº 8.987/95, e na Lei nº 9.074/95, a concessão de serviço público deve ser necessariamente precedida de licitação, ressalvando-se, contudo, a hipótese de inexigibilidade de licitação, quando é impossível a competição. Ilícita, assim, a contratação de concessionária por dispensa de licitação, ainda que se trate de entidade integrante da Administração Pública; b) Patente a impossibilidade, destacada tanto no voto do relator quanto do Conselheiro José Alves Viana, de concessionária empresa privada celebrar PPP, em razão da ausência de participação de parceiro público; c) É lícito, conforme frisado nos votos dos Conselheiros Cláudio Couto Terrão e José Alves Viana, que concessionárias integrantes da Administração Indireta vinculadas ao ente em cuja competência se encontra o serviço público celebrem PPP, nos termos da Lei nº 11.079/04; d) Considerando o disposto no art. 26 da Lei nº 8.987/95, no qual se admite a subconcessão e não se estabelece distinção quanto à forma de constituição da concessionária, é admissível - conforme demonstrado no voto do Conselheiro José Alves Viana - a subconcessão comum, nos termos do contrato de concessão, desde que haja autorização do poder concedente e licitação prévia, independentemente de a concessionária ser empresa privada ou entidade da Administração Indireta, de qualquer esfera; e) Por idênticas razões, lícita a subconcessão via PPP por concessionárias que constituem entidades desvinculadas do ente em cuja competência se insere o serviço público prestado, pois, no parágrafo único do art. 1º da Lei de PPP, previu-se a aplicação desse regramento legal às entidades da Administração Indireta, conclusão delineada no voto do Conselheiro José Alves Viana; e f) Por fim, a subconcessão, prevista no art. 26 da Lei nº 8.987/95, deve obrigatoriamente ser parcial, vez que a subconcessão integral implicaria a descaracterização da própria relação inicial, configurando-se nova concessão, ressalva também consignada pelo Conselheiro José Alves Viana.”

                Pediu vista, em seguida, o Conselheiro Wanderley Ávila. Votou não ser possível, via de regra, que uma empresa concessionária de serviço público, contratada por dispensa de licitação, transfera o objeto contratado (parcial ou totalmente) a outra empresa via parceria público-privada. Adiante, esclareceu que - em reforço e adaptação ao primeiro item dos requisitos trazidos pelos Conselheiros Cláudio Couto Terrão e Hamilton Coelho - a regra geral supramencionada, segundo a qual deve ser realizada a licitação e evitada terceirização, pode ser excepcionada nas seguintes hipóteses a serem observadas cumulativamente: a) necessidade de a concessionária ser entidade da Administração Indireta, mas não necessariamente do ente federativo em cuja competência se encontra o serviço público, pois o art. 24, incisos VIII e XXII, não fazem essa restrição - ao revés, adotam o conceito previsto no art. 6º, XI, da própria Lei nº 8.666/93; b) existência de lei que atribua à concessionária competências inerentes à figura do poder concedente; c) necessidade de que a lei responsável pela criação da entidade da Administração Pública Indireta atribua competência para celebração do contrato de concessão, em observância aos princípios da legalidade e da segurança jurídica, bem como evitando-se transferência indevida de um encargo intrínseco à própria entidade da Administração Pública Indireta; d) indelegabilidade de competências decisórias imperativas e coercitivas da Administração Pública (como, a título exemplificativo, a fiscalização em sentido amplo e também o poder de polícia), pois constituem um núcleo que não pode ser transferido a particulares, sob pena de prejuízo ao interesse público; e) subconcessão mediante prévia licitação na modalidade concorrência, com previsão da concessão no ato convocatório; f) necessidade de motivação tanto por parte do poder concedente quanto por parte do destinatário do serviço; g) obrigatoriedade de autorização do poder que contratará a prestação de serviço; h) observância das Leis 8.666/93, 8.987/95 e 11.079/04, no que forem aplicáveis. Advertiu, ainda, que “a licitude das contratações previstas nesta consulta deve ser sempre analisada à luz do caso concreto”, observada a legislação aplicável, e ressaltou, ao final, que, com relação aos demais apontamentos, acompanhava, naquela oportunidade “as conclusões das letras ‘b’ a ‘f’ do voto do Conselheiro Hamilton Coelho”, que bem sintetizara os votos proferidos até então.

                O conselheiro Sebastião Helvecio, então, pediu vista dos autos, se posicionando quanto aos entendimentos proferidos acima, da forma que se segue.

                Dispensa de licitação prévia à concessão: observou que a Constituição da República, no inciso XXI do art. 37, dispõe que “as obras, serviços, compras e alienações” seriam contratados mediante licitação”, conferindo discricionariedade ao legislador ordinário para ressalvar determinados casos desse regramento. Já o caput do art. 175, diferentemente, ao preconizar que os contratos de concessão e permissão devem ser precedidos de licitação, o constituinte houve por bem acrescentar o vocábulo “sempre”, conferindo eficácia plena ao dispositivo, impassível de restrição pelo legislador comum, inviabilizando, portanto, a dispensa do certame licitatório prévio à contratação de concessionária. Por outro lado, entendeu que o art. 175 da Constituição da República não viola a concessão de serviços públicos que não seja precedida de certame licitatório por inexigibilidade; o legislador ordinário fica impedido, na verdade, de instituir exceção à regra - como feito no art. 24 da Lei nº 8.666/93, uma vez que a inexigibilidade decorre de circunstâncias fortuitas que inviabilizam a competição, fora da discricionariedade conferida ao legislador ordinário. Acompanhou, portanto, o conselheiro Cláudio Couto Terrão, no sentido de ser ilícita a celebração de contrato de concessão de serviço púbico por dispensa de licitação, em virtude do que dispõe o art. 175 da Constituição da República.

                Hipótese de realização de parceria público-privada pela concessionária de serviço público para a transferência, total ou parcial, do objeto do contrato: alteou que tanto o art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 11.079/04 quanto o art. 2º, I, da Lei nº 8.987/95 restringem o âmbito de sua aplicação a entidades da Administração Pública, razão pela considerou inviável que uma entidade da iniciativa privada figurasse como poder concedente. Entendeu que o cerne da indagação do consulente se tratava de potencial subconcessão por parte da concessionária se serviços públicos - afinal, o consulente faz referência direta ao objeto de terceirização do objeto contratado, situação na qual a concessionária não figuraria como poder concedente, mas, sim, como concessionária-subconcedente, o que, em tese, seria admitido pelo art. 26 da Lei nº 8.987/95, aplicável às concessões comuns e patrocinadas - nos termos do art. 2º, §§ 1º e 3º da Lei nº 11.079/04. Acrescentou que, nos termos do art. 26, caput e §§ da Lei nº 8.987/95, a subconcessão é admitida desde que presentes, cumulativamente, autorização no contrato de concessão; autorização expressa do poder concedente; e realização de prévio certame licitatório. Respondeu, portanto, ser viável, em tese, a subconcessão, comum ou patrocinada, por parte de concessionária de serviços públicos - pertencente ou não à Administração Pública -, desde que celebrado à imagem do contrato de concessão inicial e observados os requisitos do art. 26 da Lei nº 8.987/95. Acompanhou os conselheiros que lhe antecederam, entendendo lícita a subconcessão celebrada por concessionária que seja entidade da Administração Indireta do ente federativo em cuja competência se encontra o serviço público prestado; acompanhou a divergência inaugurada pelo conselheiro José Alves Viana, no que entende ser lícita a subconcessão celebrada por concessionária que seja entidade pertencente a Administração Indireta de ente federativo diverso daquele em cuja competência se insere o serviço público; e inaugurou divergência para entender lícita, a princípio e em tese, a subconcessão celebrada por concessionária que seja entidade privada. Quanto à extensão do objeto da subconcessão, acompanhou o conselheiro José Alves Viana, nesse particular, para entender possível somente a subconcessão parcial, na medida em que a integral implicaria a descaracterização da própria relação inicial, configurando-se nova concessão. Por fim, salientou que, prevalecendo esse entendimento, restaria revogado parcialmente o entendimento constante da Consulta nº 837532, respondida na Sessão do Pleno de 22.9.2010, na parte em que se admitira a subconcessão total do objeto do contrato.

                Por todo o exposto, respondeu ao consulente, em tese, nos seguintes termos: a) é ilícita a concessão de serviço púbico por dispensa de licitação, diante do disposto no art. 175 da Constituição da República; b) é admissível a subconcessão, comum ou patrocinada, de serviços públicos - seja por concessionária pertencente ou não à Administração Pública -, desde que celebrado em caráter parcial, na mesma modalidade do contrato de concessão inicial e com observância dos requisitos do art. 26 da Lei nº 8.987/955 e demais disposições aplicáveis. Aprovado o voto-vista do conselheiro Sebastião Helvecio, vencido em parte o conselheiro relator, o conselheiro José Alves Viana e o conselheiro substituto Hamilton Coelho. (Consulta nº 911962, Rel. Cons. Cláudio Couto Terrão, 23.09.2020). Vídeo da sessão de julgamento: TVTCE 15m12s.

 

 

BOCO9745---WIN/INTER

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