NÃO É POSSÍVEL A EXECUÇÃO INDIRETA, POR PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA, DE SERVIÇOS INERENTES À CATEGORIA FUNCIONAL ABRANGIDA PELO PLANO DE CARGOS DA AUTARQUIA, QUANDO NÃO SE TRATE DE CARGOS EXTINTOS OU NÃO HAJA PREVISÃO LEGAL CONTRÁRIA, MESMO QUE EXISTAM POSTOS VAGOS - MEF38705 - BEAP

 

 

                Tratam os autos de Consulta encaminhada por diretor de serviço autônomo de água e esgoto, vazada nos seguintes termos: “Ao se contratar serviços de pessoa física o encargo patronal de INSS, soma-se ao limite de contratação estabelecido no art. 24, incisos I e II da Lei 8.666/93, ou o limite da contratação diz respeito somente ao valor pago ao profissional?; O encargo patronal previdenciário pode ser classificado à conta da natureza da despesa que o gerou ou tem uma classificação mais correta?; Pode-se contratar serviço de pessoa física se existir na autarquia cargo com a mesma função contratada, sendo uma vaga ocupada e outra em aberto?; A contratação de serviços de engenharia pessoa física se encaixa no limite de R$ 8.000,00 ou R$ 15.000,00 anuais?”(sic)

                A fim de guardar a linearidade do raciocínio, o relator, conselheiro Cláudio Couto Terrão, procedeu ao exame das dúvidas suscitadas em ordem diversa da apresentada pelo consulente. De início, relativamente ao terceiro item da Consulta, destacou que este Tribunal deliberou, em prejulgamento de tese acerca da terceirização na Administração Pública, emitindo parecer nos autos da Consulta nº 1024677, no sentido de que é vedada a execução indireta de atribuições inerentes às categorias que compõem o plano de cargos do órgão ou entidade da administração direta, autárquica e fundacional, excepcionadas as disposições legais em contrário e as situações de extinção total ou parcial dos cargos, conforme previsto no art. 3º, IV, do Decreto Federal nº 9.507/18. Acrescentou que, no caso da extinção parcial, por força de previsão legal, os cargos vão sendo extintos gradualmente, à medida que ocorrem as vacâncias; desse modo, ainda que os cargos providos constem do quadro de pessoal do órgão ou da entidade, são considerados parcialmente extintos, uma vez que serão transformados ou excluídos assim que houver a vacância. Dentro desse contexto, considerou vedada a execução indireta do serviço, o qual deve ser prestado por servidores investidos mediante concurso público ou por pessoal contratado, desde que presentes os pressupostos constitucionais caracterizadores da necessidade temporária de excepcional interesse público. Com efeito, respondeu ao terceiro questionamento no sentido de que não é possível a execução indireta, por pessoa física ou jurídica, de serviços inerentes à categoria funcional abrangida pelo plano de cargos da autarquia, quando não se tratar de cargos extintos ou não houver previsão legal contrária, mesmo que existam postos vagos.

                Quanto ao segundo questionamento, a relatoria respondeu em discordância parcial com a tese fixada na Consulta nº 836946, julgada em 15.05.13, e propôs a reforma de entendimento, passando a prevalecer que o encargo patronal previdenciário oriundo da contratação de pessoa física pela Administração Pública: i) não deve ser classificado à conta da natureza da despesa que o gerou; ii) não deve ser registrado sob o código “47 - Obrigações Tributárias e Contributivas”; iii) deve ser classificado como elemento de despesa “13 - Obrigações Patronais”, em código estruturado nº 3.3.90.13, sendo facultativo o acréscimo dos dígitos 7º e 8º (desdobramentos do elemento de despesa) para maiores especificações.

                O conselheiro Gilberto Diniz, em seu voto-vista, manteve o posicionamento vigente e consolidado na resposta dada à consulta supracitada, nos moldes em que passou a expor. De acordo com o conselheiro vistor, o Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público, tanto o vigente à época da resposta dada à consulta, como o em vigor nos dias atuais, acompanha a orientação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) de que a codificação 3.3.90.47 é a mais apropriada para a classificação de despesas decorrentes de obrigações tributárias e contributivas incidentes sobre o valor bruto do contrato de prestação de serviços por terceiros - pessoa física, sem vínculo empregatício, consoante se verifica da especificação dos componentes desse código estruturado, que agrega a categoria econômica, o grupo, a modalidade de aplicação e o elemento. Opinou que os Tribunais de Contas, em se tratando de codificação da despesa pública, devem optar por acompanhar, de forma técnica, as orientações da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), órgão de referência na consolidação das contas públicas, sendo que a adoção de padrões diferenciados pode fragilizar tal consolidação. Prosseguiu demonstrando que a intenção do órgão consolidador é que o elemento de despesa “13” seja utilizado exclusivamente para as despesas previdenciárias decorrentes do pagamento de servidores públicos ativos, inativos e pensionistas, e, por conseguinte, necessariamente vinculado às despesas de pessoal, conforme expresso literalmente no manual editado pelo STN.

                Após essas considerações o relator encampou a divergência, notadamente quanto à necessidade de observância à sistemática utilizada pela STN, enquanto órgão central de orientação quanto à matéria, sobretudo porque há termo de cooperação firmado nesse sentido entre este Tribunal e a STN. Ressaltou, contudo, que, especificamente na questão da terceirização lícita e sua adequada classificação e registro - diante da atual normatização que ampliou a possibilidade de terceirização das atividades pela Administração Pública, autorizando, inclusive, que haja terceirização das atividades-fim, desde que não enquadráveis como atividade típica de Estado - deveria ser melhor avaliada pela própria STN à luz da LRF, a fim de que não houvesse burla ao regramento sobre o que deve ser ou não considerado como despesa com pessoal para fins dos limites de responsabilidade fiscal.

                Outrossim, em relação ao primeiro questionamento, o relator observou que a terceirização, como hipótese de contratação de serviços, deve-se pautar nas disposições da Lei nº 8.666/93, entre elas as que preveem a possibilidade de dispensa do procedimento licitatório em razão do reduzido valor, nos termos do art. 24, I e II, do mencionado diploma. Considerando que pessoas físicas e jurídicas obedecem à regimes substancialmente distintos, sob a ótica tributária, previdenciária, entre outras, afirmou não ser possível, no momento de optar pela realização do procedimento licitatório propriamente dito ou pela contratação direta por dispensa em razão do reduzido valor, avaliar com exatidão quais seriam os custos adicionais. Nessas circunstâncias, considerou mais coerente e seguro relacionar o limite da dispensa de licitação ao valor estimado da contraprestação a ser paga pela prestação do serviço e das obrigações dela decorrentes, de incidência indistinta para pessoas físicas ou jurídicas, para não ensejar o tratamento não isonômico entre elas, na medida em que favorecia a contratação direta da que envolvesse menores encargos, em violação ao disposto no art. 3º, caput, da mesma Lei. Diante dessas considerações, concluiu que o encargo patronal devido pela Administração na contratação de serviços de pessoa física não deve ser incluído na apuração dos limites que permitem a dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93, sob pena de inobservância do princípio constitucional da isonomia, nos termos do art. 3º, caput, do mesmo diploma.

                Por derradeiro, quanto ao último questionamento, sublinhou que a dispensa de licitação vinculada ao valor da contratação é definida em percentual sobre os valores estabelecidos no art. 23, I, a, e II, “a”, da Lei nº 8.666/93, os quais foram atualizados pelo Decreto Federal nº 9.412/18, passando o limite da dispensa fundada no art. 24, I, para obras e serviços de engenharia, a corresponder a R$ 33.000,00 (trinta e três mil reais), enquanto a prevista no art. 24, II, para compras e os outros serviços, que não de engenharia, equivale a R$ 17.600,00 (dezessete mil e seiscentos reais), não importando a natureza jurídica do contratado, se pessoa física ou jurídica. Nessa linha, afirmou que a contratação direta de pessoa física, por dispensa de licitação, para a prestação de serviço de engenharia, com fundamento no pequeno valor, deve observar o limite do art. 24, I, da Lei nº 8.666/93, qual seja R$ 33.000,00 (trinta e três mil reais).

                Em face do exposto, os questionamentos do consulente foram respondidos da seguinte maneira: 1. Não é possível a execução indireta, por pessoa física ou jurídica, de serviços inerentes à categoria funcional abrangida pelo plano de cargos da autarquia, quando não se trate de cargos extintos ou não haja previsão legal contrária, mesmo que existam postos vagos; 2. Deve ser utilizado o código estruturado 3.3.90.47 - Obrigações Tributárias e Contributivas - para classificação e registro da cota patronal devida ao INSS, de responsabilidade da Administração Pública, incidente sobre o valor bruto do contrato de prestação de serviços por terceiros - pessoa física, sem vínculo empregatício, e desde que essa contratação se enquadre como terceirização lícita, conforme posicionamento vigente e consolidado na resposta dada à Consulta nº 836946; 3. O encargo patronal devido pela Administração na contratação de serviços de pessoa física não deve ser incluído na apuração dos limites que permitem a dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93, sob pena de inobservância do princípio constitucional da isonomia, nos termos do art. 3º, caput, do mesmo diploma; 4. A contratação direta de pessoa física, por dispensa de licitação, para a prestação de serviço de engenharia, com fundamento no pequeno valor, deve observar o limite atualizado do art. 24, I, da Lei nº 8.666/93. O voto do relator, que encampou o voto-vista do conselheiro Gilberto Diniz, foi aprovado por unanimidade. (Consulta nº 977862, Rel. Cons. Cláudio Couto Terrão, 23.09.2020). Vídeo da sessão de julgamento: TVTCE 36m25s.

 

 

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