PROPOSTA DE ACORDO JUDICIAL - SILÊNCIO - EFEITOS - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF39605 - LT

 

PROCESSO TRT/AP Nº 0010353-98.2018.5.03.0151

 

Agravante: Pedro Walter Barbosa

Agravada: Empresa Brasileira de Correios e Telegrafos

Relator: Oswaldo Tadeu Barbosa Guedes

 

E M E N T A

 

                PROPOSTA DE ACORDO JUDICIAL. SILÊNCIO. EFEITOS. O art. 111 do Código Civil estabelece que "O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa". Todavia, como modalidade de contrato, o acordo judicial não foge à regra e deve representar igualmente o entendimento das vontades das partes, que realizam ajustes e concessões para por fim ao litígio, com o plus de poder ser executado no bojo dos autos do processo em que realizado. Portanto, submete-se às mesmas normas legais que disciplinam os contratos de modo geral e não dispensa a expressa manifestação da vontade. Nesse sentido, não se pode admitir que o silêncio do exequente, diante da formulação de proposta de acordo pelo executado, seja entendido como aceite, mormente em se considerando que igualmente não se trata de situação em que o uso ou a circunstância assim autorizem.

                Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de petição, oriundos da Vara do Trabalho de São Sebastião do Paraíso, em que figuram, como agravante, PEDRO WALTER BARBOSA, e, como agravada, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS.

 

R E L A T Ó R I O

 

                O Juízo da Vara do Trabalho de São Sebastião do Paraíso, pela sentença de f. 2039/2040 (ID. 009b0df), julgou improcedentes os embargos à arrematação opostos pelo executado.

                O executado interpôs agravo de petição às f. 2046/2051 (ID. 1fce833).

                Pretende a reforma da sentença para que seja invalidada a arrematação do bem realizada nestes autos.

                Foram apresentadas contraminutas pelo arrematante e pelo exequente, respectivamente às f. 2053/2063 (ID. 5da6e9f) e às f. 2064/2066 (ID. a775d82).

                É o relatório.

 

                FUNDAMENTAÇÃO

                VOTO

                JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

                Conheço do agravo de petição interposto pelo executado porque foram atendidos os pressupostos legais de admissibilidade.

 

                JUÍZO DE MÉRITO

                ARREMATAÇÃO DE BEM - PROPOSTA DE ACORDO APÓS A PENHORA

                O executado, ora recorrente, pugna para que seja invalidada a arrematação do bem penhorado para o pagamento dos honorários advocatícios por ele devidos com fundamento no art. 903, I, do CPC. Alega, em síntese, que, após a penhora referido bem, foi realizado acordo para o pagamento do débito e que a execução deve se processar em meio menos gravoso para o devedor.

                Examina-se.

                À f. 1969 (ID. 03b591e), quando já publicado o edital para leilão do bem penhorado (f. 1953 - ID. 22c297e), o executado apresentou petição em que propôs ao exequente o pagamento dos honorários advocatícios devidos em 10 parcelas iguais e sucessivas de R$ 474,91.

                Intimado a se manifestar sobre a proposta de acordo, por meio do despacho f. 1970 (ID. 7d477fe), o exequente se manteve silente.

                No caso sob análise, o executado atribui ao silêncio do exequente o valor de anuência à sua proposta de acordo, por meio de manifestação tácita.

                Pois bem.

                É cediço que, no plano da existência do negócio jurídico, a declaração da vontade, assim como o agente emissor, o objeto e a forma, é um dos seus elementos constitutivos. No contexto dos contratos firmados entre particulares, a vontade das partes é a fonte primordial das obrigações contratuais, de modo que o seu objeto, termos e condições são frutos da concordância entre os negociantes, sobre os quais não devem existir dúvidas.

                Importa ainda esclarecer que a vontade poderá ser manifestada de modo expresso, por palavras escritas ou orais, sinais ou gestos, ou, ainda, de modo tácito, desde que resulte de um ato ou comportamento do agente/negociante.

                O acordo judicial, por constituir modalidade de contrato, não foge à regra e deve representar igualmente o entendimento das vontades das partes, que realizam ajustes e concessões para por fim ao litígio, com o plus de poder ser executado no bojo dos autos do processo em que realizado. Assim, submete-se às mesmas normas legais que disciplinam os contratos de modo geral.

                Especificamente sobre as situações em que é dispensada a manifestação da vontade, dispõe o art. 111 do Código Civil que "O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa". (Destaques acrescidos).

                O caso analisado trata de proposta de acordo que implica na redução do montante devido, uma vez que não levou em consideração o valor atualizado do débito executado, e também no seu parcelamento, o que, por óbvio, a partir dos esclarecimentos anteriores, requer obrigatoriamente a expressa manifestação do credor. Em efeitos práticos, haveria renúncia, pelo exequente, de parte do seu crédito e do seu recebimento em única parcela e à vista, pelo que não há como chancelar a tese de anuência tácita.

                Tampouco é o caso em que as circunstâncias ou os usos atribuam ao silêncio o valor de anuência.

                Sobre esses aspectos, vale pontuar que nem mesmo se trata de hipótese em que o Juízo de Origem teria determinado, no despacho de intimação sobre a proposta de acordo, que a inércia do exequente teria o efeito ou valor de anuência. Nessa hipótese, o Juízo teria apontado à parte que o silêncio teria um efeito jurídico. Logo, se intimado regularmente e silente, essa opção poderia ser considerada uma manifestação tácita. Ainda assim, seria questionável, considerando-se que um acordo não é presumível, mas é fruto da composição entre os agentes.

                Não se pode admitir que, unilateralmente, um dos agentes do negócio jurídico atribua ao comportamento do outro um valor que não é usual e tampouco foi combinado. Tanto que o exequente apresentou impugnação aos embargos à arrematação às f. 2031/2032 (ID. 2af2565), em que disse que o seu silêncio decorreu do desinteresse em realizar a avença.           Sobre a matéria, invoco as célebres e ainda atuais palavras do civilista Caio Mário da Silva Pereira:

 

                (...) Normalmente, o silêncio é nada, e significa a abstenção de pronunciamento da pessoa em face de uma solicitação ambiente. Por via de regra, o silêncio é a ausência de manifestação de vontade, e, como tal, não produz efeitos. Mas, em determinadas circunstâncias, pode significar uma atitude ou um comportamento, e, consequentemente, produzir efeitos jurídicos. 18 Neste caso, deverá ser interpretado como anuência à declaração de vontade. Não se lhe pode atribuir efeito de uma declaração volitiva, pelo simples fato de nada declarar a pessoa. Popularmente costuma-se repetir que "quem cala consente", com isto significando que a falta de recusa explícita equivale a consentimento. Não é, todavia, correta a dedução. O direito romano já se referia ao assunto ao enunciar "qui tacet consentire videtur, si loqui debuisset et otuisset" 19. Com efeito, há situações em que a pessoa não pode ou não deve falar, como no caso de sigilo profissional ou dever de consciência. Ou, ainda, quando o negócio jurídico tenha de resultar de manifestação expressa do querer do agente. Em tais situações, o silêncio não induz anuência, porém somente quando a lei o estabeleça, ou o autorizarem os usos ou circunstâncias do caso. Ao juiz caberá, em cada caso, apreciar a validade do silêncio como expressão volitiva de quem se cala. (...) (Cario Mário da Silva PEREIRA, Instituições de Direito Civil - Introdução ao Direito Civil - Teoria Geral do Direito Civil, vol. I, 23ª ed. Atualizada por Maria Celina Bodin de Moraes, Rio de Janeiro, Forense, 2010, pp. 413 e 414). (Destaques acrescidos).

 

                Para o deslinde da questão, é imprescindível que seja trazido à lume ainda o princípio da boa-fé, que deve nortear não somente os contratantes, conforme o art. 422 do Código Civil, como também todos os partícipes do processo judicial, de acordo com o art. 5º do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho. Nesse sentido, não se há como chancelar a tese do executado, que sinaliza a imposição de um sentido ao silêncio do exequente que implica na renúncia de direitos.

                Deve-se acrescentar ainda que não socorre o agravante a alegação de que a execução se processa pelo modo menos gravoso ao executado porque a norma constante do art. 805 do CPC estabelece uma diretriz de escolha do magistrado quando há vários meios de o exequente promover a execução, o que não se verifica nestes autos.

                Diante do exposto, a tese de existência de vício hábil a invalidar a arrematação perpetrada à f. 1978/1981 (ID. 050b3bc) não se sustenta, motivo pelo qual não merece reparos a sentença.

                Nego provimento.

 

                Conclusão

                Conheço do agravo de petição interposto e, no mérito, nego-lhe provimento.

                OTBG/crmm

 

                Acórdão

                ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua 5ª Turma, em Sessão Ordinária Virtual, realizada em 13, 14 e 15 de outubro de 2020, à unanimidade, em conhecer do agravo de petição interposto e, no mérito, em negar-lhe provimento.

                Tomaram parte no julgamento os Exmos. Desembargadores Oswaldo Tadeu Barbosa Guedes (Presidente e Relator), Paulo Maurício Ribeiro Pires (2º votante) e o Exmo. Juiz Convocado Mauro César Silva (3º votante, substituindo o Exmo. Desembargador Manoel Barbosa da Silva, em gozo de férias regimentais).

                Presente a Representante do Ministério Público do Trabalho, Dra. Maria Helena da Silva Guthier.

Secretária: Rosemary Gonçalves da Silva Guedes.

 

OSWALDO TADEU BARBOSA GUEDES

Desembargador Relator

(TRT/3ª R./ART., Pje, 19.10.2020)

 

BOLT8571---WIN/INTER

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