PRESCRIÇÃO - AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO - DECISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO - MEF39729 - LT

 

PROCESSO TRT/ROT Nº 0010375-36.2020.5.03.0136

 

Recorrente: Rosana Rabelo de Paiva

Recorrida: Caixa Econômica Federal

Relator: Antônio Gomes de Vasconcelos

 

E M E N T A

 

                PRESCRIÇÃO. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. A pretensão relativa ao vale-alimentação sujeita-se à prescrição parcial, ainda que cogitada a alteração de sua natureza jurídica no curso do contrato de trabalho, uma vez que a lesão é de trato sucessivo, não havendo que se falar em ato único patronal. A pretensão decorre de direito já integrado ao patrimônio jurídico da autora, em consonância com artigo 458 da CLT e Súmula 294 do C. TST. Nessa ordem de ideias, não há prescrição total na hipótese do não pagamento do auxílio-alimentação após o desligamento da obreira, evidenciando-se apenas a prescrição quinquenal das parcelas vencidas nos cinco anos que antecedem a propositura da ação, em consonância com artigo 11 da CLT e artigo 7º, XXIX da CF. Recurso provido.

 

R E L A T Ó R I O

 

                O Juízo da 36ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE/MG, pela r. sentença de ID. 513fe41, pronunciou a prescrição quinquenal total da pretensão formulada.

                A reclamante interpôs recurso ordinário (ID. 5ea89f8), insurgindo-se contra a prescrição declarada pela origem. Postula a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Requer a exclusão da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, requerendo, na eventualidade, a redução do valor arbitrado.

                Preparo comprovado (ID. 96073a2).

                Contrarrazões pela reclamada ao ID. 9bd3a81.

                Dispensado o parecer da d. Procuradoria Regional do Trabalho, consoante o art.129 do Regimento Interno deste E. TRT.

                É o relatório.

 

                FUNDAMENTAÇÃO

                I. ADMISSIBILIDADE

                A reclamante apresentou recurso ordinário nos Id 5ea89f8 e 840a653.

                Assim, em aplicação do princípio da unirrecorribilidade recursal, conheço do recurso ordinário interposto no Id 5ea89f8 (o primeiro interposto), deixando de conhecer daquele apresentado no Id 840a653 - segunda manifestação aduzida.

                Conforme tal princípio, a autora somente pode apresentar uma peça processual contendo seu apelo. Como apresentou duas, apenas uma delas será admitida e conhecida, in casu, a primeira aviada.

                Próprio e tempestivo, firmado por procurador regularmente constituído, e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto (Id 5ea89f8). Conheço também das contrarrazões, regularmente processadas.

 

                MÉRITO

                II. MÉRITO

                II. 1. PRESCRIÇÃO

                A reclamante não se conforma com a prescrição declarada pela origem.

                Sustenta que a incontroversa supressão do auxilio alimentação para os aposentados, em 1995, não tem efeitos jurídicos na relação empregatícia que mantém com a ré, porquanto a parcela regularmente percebida incorporou-se ao contrato de trabalho da autora. Aduz que a alteração contratual lesiva somente aplicar-se-ia aos novos contratos de trabalho, não atingindo qualquer direito da autora, nos termos do artigo 468 da CLT e da Súmula 51 do C. TST. Discorda, assim, do acolhimento da prescrição quinquenal total relativamente ao pagamento do auxílio-alimentação, afirmando que o interesse em receber a parcela, na condição de inativa, somente se deu com desligamento, ocorrido em 27.07.2016.

                Nessa ordem de ideias, alega que não há prescrição total, porquanto, no caso do auxílio alimentação, cujo pagamento é mensal e sucessivo, a prescrição é parcial, contando-se do vencimento de cada prestação sucessivamente. Afastada a prescrição total acolhida e pronunciada apenas a prescrição quinquenal parcial, requer sejam julgados procedentes os pedidos constantes na exordial.

                Ao exame.

                A r. sentença pronunciou a prescrição total do direito da autora sob os seguintes fundamentos, verbis:

 

                "Prescrição

                De início, esclareço que não há prescrição bienal a ser pronunciada, uma vez que, considerando a propositura da ação em 15.06.2020, o contrato de trabalho terminou há menos de dois anos do ajuizamento da reclamação trabalhista.

                Por outro lado, no que diz respeito à prescrição quinquenal total, observo que a condição de inatividade surgiu em 26.07.2016, sendo incontroverso que a extensão do auxílio-alimentação para os aposentados e pensionistas fora suprimida quando a autora tinha mera expectativa de direito, lá nos idos de fevereiro de 1995 (CI DIRAR nº 21/95).

                Como dito no capítulo anterior, não se trata de complementação de aposentadoria propriamente dita, mas de benefício assegurado aos inativos por regulamento empresarial, razão pela qual não se aplicam as Súmulas 326 e 327 do TST, mas sua Súmula 294, que consagra a prescrição total de pretensões relacionadas à alteração lesiva de cláusula contratual.

                Ressalto que o auxílio-alimentação não pode ser considerado como parcela prevista em lei, na medida em que os arts. 457, § 2º, e 458 da CLT não impõem o seu pagamento ao empregador, mas apenas dispõem acerca de sua natureza jurídica. O mesmo raciocínio se aplica à Súmula 241 do TST, a qual sequer se caracteriza como lei, mas como mero verbete de jurisprudência.

                Desse modo, por se tratar de condição benéfica decorrente direta e unicamente do contrato de trabalho, suprimida por ato único do empregador, cabia ao interessado, não obstante a postergação de seus efeitos práticos para a época da inatividade, questionar a licitude da alteração nos cinco anos subsequentes.

                Vale dizer, tratando-se de vantagem assegurada pelo empregador, a possível violação do direito, circunstância deflagradora do curso do prazo prescricional (art. 189 do CC), ocorre no curso do contrato, e não somente com a jubilação, que apenas dá ensejo à sua concretização prática.

                Assim, pronuncio a prescrição quinquenal total da pretensão inicial."

 

                Conforme bem observado pela origem, os efeitos patrimoniais da pretensão autoral são atingidos pela prescrição parcial (quinquenal), já que a lesão se renova mês a mês, alcançando a pretensão de pagamento da verba e dos reflexos sobre as parcelas vencidas nos cinco anos que antecedem a propositura da ação.

                É incontroversa a supressão da parcela controvertida em 1995, para os inativos. Também não há controvérsia quanto à percepção, pela autora, do auxílio alimentação desde o início do pacto laboral até passar para a inatividade, em 26.07.2016.                Contudo, entendo que o não pagamento da verba auxílio-alimentação a cada mês, a partir de 26.07.2016 (ID. 263e3bb - Pág. 2), é que faz gerar o direito da demandante (actio nata).

                Isso porque a empregada teve sua pretensão resistida com a recusa da ré em conceder a parcela após a aposentadoria, nascendo, a partir de então, o interesse de trazer à apreciação judicial a lesão ou ameaça a direito que entende ter.

                A integração salarial da verba alimentação é assegurada pelo artigo 458 da CLT, bem como pela Súmula 294 do C. TST, verbis:

 

                "SUM-294 PRESCRIÇÃO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. TRABALHADOR URBANO. Tratando-se de ação que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente de alteração do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei"

 

                Nessa ordem de ideias, não há prescrição total na hipótese do não pagamento do auxílio-alimentação após o desligamento da reclamante, evidenciando-se apenas a prescrição quinquenal à espécie. Vale dizer, a prescrição alcança a pretensão de pagamento das parcelas vencidas nos cinco anos que antecedem a propositura da ação, em consonância com artigo 11 da CLT e artigo 7º, XXIX da CF.

                Registra-se que não se trata de complementação de proventos de aposentadoria a cargo da entidade de previdência privada, mas de parcela devida aos empregados aposentados a ser quitada pela empregadora, não se aplicando à hipótese o disposto nas Súmulas 326 e 327 do TST.

                Ante todo o exposto, dou provimento ao recurso da reclamante para afastar a prescrição total e determinar o retorno dos autos à origem para o julgamento dos pedidos, como se entender de direito, a fim de evitar supressão de instância.

                Prejudicada a análise do tema de honorários advocatícios, porque atrelados à sucumbência na demanda, a ser novamente aferida quando da análise do mérito propriamente dito.

 

                II. 2. JUSTIÇA GRATUITA

                Postula a autora a concessão dos benefícios da justiça gratuita, indeferidos pela origem.

                Analiso.  O instituto da assistência judiciária visa possibilitar ao jurisdicionado a promoção dos seus direitos, em consonância com o princípio de amplo e irrestrito acesso à Justiça, preconizado nos incisos XXXV, LV e LXXIV do art. 5º da CF. Portanto, ao meu ver, para que o trabalhador faça jus à justiça gratuita, basta a declaração de miserabilidade, desde que não infirmada por prova em contrário.

                Observe-se que, de acordo com o art. 1º da Lei 7.115/83, em pleno vigor, " a declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira". No mesmo sentido, o § 3º do art. 99 do CPC dispõe: "Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural".

                Não se olvida das inovações inseridas na Consolidação das Leis do Trabalho pela Lei 13.467/17, que conferiu nova redação ao art. 790 da CLT, em seus §§3º e 4. Contudo, adota-se, aqui, a teoria da heterointegração dos subsistemas processuais (civil e trabalhista), para eleger a regulamentação mais adequada à presente situação. Nestes termos, a norma mais adequada é a da legislação processual civil (art. 99, CPC) que confere presunção de veracidade à declaração firmada por pessoa natural quanto à insuficiência de recursos, para fins de concessão da gratuidade da justiça. E não apenas isso, condiciona o indeferimento do pedido de justiça gratuita à comprovação nos autos da ausência dos pressupostos para a concessão da benesse, devendo o magistrado, antes de indeferir o pleito, facultar à parte requerente a comprovação de tais pressupostos.

                A matéria tem, pois, tratamento mais benéfico ao hipossuficiente na seara processual civil, o que mais se coaduna com o princípio constitucional do acesso à justiça. Não se pode privilegiar o demandante cível em detrimento do demandante empregado que, com muito mais razão, via de regra, é hipossuficiente e necessita do benefício.

                Dessarte, para que seja deferida a justiça gratuita, basta a declaração de hipossuficiência econômica do postulante, nos termos do art. 790, §3º, CLT, art. 99, "caput", §3º, CPC/2015 e Súmula 463 do C. TST, o que restou observado pela autora, consoante a declaração de ID. 807c192.

                Dou, pois, provimento ao recurso da autora para conceder-lhe os benefícios da justiça gratuita.

                Conclusão do recurso

                Pelos fundamentos acima, não conheço do recurso ordinário de Id 840a653 e conheço do recurso ordinário interposto pela reclamante no Id 5ea89f8, atendidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. No mérito, dou-lhe provimento para afastar a prescrição total e determinar o retorno dos autos à origem para o julgamento dos pedidos, como se entender de direito, a fim de evitar supressão de instância. Concedo à reclamante os benefícios da justiça gratuita. Faculta-se à autora requerer a restituição das custas junto à autoridade arrecadadora competente.

                Fundamentos pelos quais, o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária da Egrégia Décima Primeira Turma, hoje realizada, julgou o referido processo e, à unanimidade, não conheceu do recurso ordinário de Id 840a653; conheceu do recurso ordinário interposto pela reclamante no Id 5ea89f8; no mérito, por maioria de votos, deu-lhe provimento para afastar a prescrição total e determinar o retorno dos autos à origem para o julgamento dos pedidos, como se entender de direito, a fim de evitar supressão de instância; concedeu à reclamante os benefícios da Justiça gratuita; facultou à autora requerer a restituição das custas junto à autoridade arrecadadora competente.; vencido o Exmo. Juiz Convocado Mauro Cesar Silva, quanto à concessão da Justiça Gratuita à obreira.

                Tomaram parte neste julgamento os Exmos. Desembargador Antônio Gomes de Vasconcelos (Relator), Juízes Convocados Mauro Cesar Silva (Vaga do Exmo. Desembargador Luiz Antônio de Paula Iennaco) e Vicente de Paula Maciel Júnior (substituindo a Exma. Desembargadora Juliana Vignoli Cordeiro).

                Presidiu a Sessão de Julgamento o Exmo. Desembargador Marco Antônio Paulinelli de Carvalho.

                Presente o Ministério Público do Trabalho, representado pela Dra. Lutiana Nacur Lorentz.

                Sustentação Oral: Dr. Evandro Braz de Araújo Júnior, pela Reclamante.

                Belo Horizonte, 30 de setembro de 2020.

                Secretária: Adriana Iunes Brito Vieira.

 

ANTÔNIO GOMES DE VASCONCELOS

Relator

 

(TRT/3ª R./ART., Pje, 01.10.2020)

 

BOLT8584---WIN/INTER

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